A polícia moçambicana justificou esta segunda-feira a detenção do ativista social Milo Samuel, em Pemba, na sexta-feira e por mais de 20 horas, dizendo que queria garantir a sua própria segurança.
“Ele estava numa avenida de muito movimento, estava na via pública e poderia ter sofrido um ataque de qualquer pessoa” que discordasse “daquilo que ele apresentava nos seus cartazes”, disse Eugénia Nhamussua, chefe de comunicação no comando provincial de Pemba, em conferência de imprensa.
“Ele não foi proibido de manifestar-se, qualquer cidadão na República de Moçambique tem direito à manifestação, no entanto, devemos observar os preceitos indicados pela Constituição. Vamos fazer os nossos pedidos” ao Conselho Municipal, referiu.
Ao mesmo tempo, devem ser comunicadas as ações para garantir proteção, acrescentou.
A necessidade de autorização é um dos argumentos com que a polícia moçambicana habitualmente impede qualquer sinal público de protesto, apesar de ser um argumento sucessivamente desmentido por diversas entidades — a anterior das vezes pela procuradora-geral da República (PGR), Beatriz Buchili, que há um mês disse no parlamento que “o direito à manifestação está constitucionalmente consagrado como um direito fundamental” e “o seu exercício não pode ser limitado ou condicionado”.
Já em 2022, também no parlamento, a PGR tinha esclarecido que a manifestação não está sujeita à autorização de entidades estatais, bastando apenas uma comunicação sobre a data, número aproximado de participantes e pontos de partida e de chegada.
A porta-voz da polícia foi ainda questionada esta segunda-feira sobre o facto de, em março, a polícia ter também impedido em Pemba uma marcha de homenagem póstuma ao ‘rapper’ Azagaia — célebre pelos temas de intervenção — e Eugénia Nhamussua referiu que na altura “houve uma ordem de serviço que o comando provincial recebeu” de nível central por suspeitas de incitação à violência.
Milo Samuel foi detido na sexta-feira na primeira esquadra de Pemba e restituído à liberdade no sábado, depois da mobilização de ativistas que levaram um advogado até à esquadra.
Milo saiu sem prestar declarações, conduzido pela polícia para um veículo em que foi levado para casa.
“Não quero mais ser deslocado” lia-se num dos cartazes empunhado por Milo Samuel, sozinho, numa das principais ruas de Pemba, numa alusão a cerca de um milhão de pessoas que tiveram de fugir para aquela cidade e para outros locais devido aos ataques armados no interior da província.
Noutro cartaz estava escrito: “Nós queremos eleições distritais”, cujo adiamento deverá ser votado no parlamento por proposta da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo).
Abudo Gafuro, ativista social que acompanhou o caso, descreveu que havia ainda outros dois cartazes em que o jovem se queixava da dificuldade em ter emprego, porque lhe exigem sempre alguma experiência, e em que escreveu que para ter uma oportunidade é preciso ser membro partidário.
“Estão a tentar silenciar a sociedade civil”, referiu Gafuro, ao comentar a ação da polícia, lançando um apelo “para que haja abertura, liberdade de expressão e de manifestação”.
Abudo Gafuro questionou se é crime “manifestar-se livremente, obedecendo às regras e normas da Constituição e do seu artigo 51”.