Não era apenas uma tarefa complicada, era a tarefa mais complicada olhando para aquilo que tinha sido a última temporada. Como é que alguém poderia substituir Erling Haaland no B. Dortmund? Não era possível, de forma direta. Poderia eventualmente dar para ir disfarçando mas não era possível. Mas o clube não teve dúvidas em relação ao sucessor do norueguês que rumara ao Manchester City e apostou forte em Sébastien Haller, avançado marfinense de 28 anos que tinha sido uma das revelações da época em serviço do Ajax com 34 golos e nove assistências em 43 jogos incluindo os dez golos na fase de grupos da Champions que o tornaram um dos poucos a marcarem em todos os jogos. Dentro das opções, escolheram o “melhor”.

“A notícia que nos deixou em choque”: Haller brilhou na Champions, assinou pelo B. Dortmund e 12 dias depois foi diagnosticado com um tumor

No entanto, o azar voltou a bater à porta da equipa de Dortmund e, neste caso, do próprio Haller. Quando estava ainda na pré-temporada, sem se ter estreado pela nova equipa da Bundesliga (já tinha passado pelo Eintrach Frankfurt entre 2017 e 2019), o avançado foi diagnosticado com um tumor maligno nos testículos e abandonou de forma temporária o futebol, fazendo sessões de quimioterapia entre duas operações. Menos de seis meses depois, com a equipa abaixo do esperado na classificação mas sempre mais preocupada com a situação do jogador marfinense do que propriamente em acelerar o regresso, Haller voltou a treinar.

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Duas cirurgias, quatro rondas de quimioterapia, o regresso aos relvados: os longos seis meses de Haller tiveram um final feliz

“Quando soube liguei aos meus irmãos para que fossem passar a noite com a nossa mãe porque a minha tia, que também era a sua melhor amiga, morreu de cancro em fevereiro de 2020. Isso ainda não foi ultrapassado e sabia que não ia lidar bem com esta notícia. Tive de ser forte mentalmente, estar bem rodeado e dizer a mim mesmo que com esta atitude ia conseguir superar este momento. Para quê ter medo? Se tiver de acontecer alguma coisa, vai acontecer. Se tiveres um certo controlo vais ter medo, mas não me restava outra coisa a não ser confiar nos médicos, que foram excecionais comigo. A quimioterapia destruiu-me por dentro e a operação por fora. Depois da quimioterapia, ainda que te sintas bem, pareces na mesma uma pessoa doente. Tens uns olhos escuros, não tens cabelo, os lábios escuros… Nos primeiros dias tinha a voz que parecia que estava constipado, falava baixo, não tinha força”, recordou em entrevista ao L’Équipe.

“Foi muito complicado. Os meus filhos viram a minha cara mudar.” As piores memórias de Haller no dia em que volta à Champions

O B. Dortmund precisava de uma rampa de lançamento na temporada para poder ainda chegar aos lugares cimeiros, Haller quis dar o exemplo em campo como já tinha dado fora dele. Foi como um talismã, que fez a estreia na época a 22 de janeiro e perdeu apenas um dos 18 jogos que fez na Bundesliga e contra um Bayern em convulsão (já lá iremos). Começou como suplente, acabou como titular. Não teve rendimento direto com golos e assistências no início, acabou a ser a chave da ultrapassagem para o primeiro lugar com um golo ao Wolfsburgo (6-0), dois ao B. Mönchengladbach (5-2) e mais dois ao Augsburgo (3-0) de forma consecutiva nas três derradeiras jornadas. Faltava apenas mais um triunfo com o Mainz e o título estaria ganho.

Havia muito ainda em disputa na Bundesliga. Acesso à Champions vai quarto lugar entre Union Berlim e Friburgo, lugares europeus entre Bayer Leverkusen, Wolfsburgo e Eintracht Frankfurt, fuga à descida de escalão entre Augsburgo, Estugarda, Bochum e Schalke 04. No entanto, existiam dois jogos em específico que centravam todas as atenções, com o B. Dortmund a receber o Mainz com mais dois pontos do que o Bayern, que jogava fora com o Colónia. Em 90 minutos, tudo mudou num final de loucos: Coman colocou cedo os bávaros na frente, o B. Dortmund saiu a perder ao intervalo com 2-0 com golos de Hanche-Olsen (15′) e Onisiwo (24′), Raphael Guerreiro reduziu aos 69′, o Colónia empatou de penálti aos 81′ por Ljubicic (resultado que voltava a deixar o B. Dortmund campeão) mas Musiala fez o 2-1 aos 89′, sendo que o 2-2 por Süle em Dortmund no sexto minuto de descontos de nada valeu para tirar a vitória do Bayern.

Desta forma, o Bayern conseguiu anular a sua pior época com o 11.º título consecutivo – este não era propriamente um cenário expectável nesta última jornada. Quando Julian Nagelsmann, treinador dos bávaros, foi dispensado numa altura de paragem por causa das seleções apesar de ter afastado o PSG nos oitavos da Champions. Falavam da má relação com alguns jogadores, do rendimento da equipa que estava a cair, das queixas internas que existiam sobre a forma de ser do técnico que é ainda hoje o mais caro de sempre. Chegou Tuchel, o castelo desmoronou por completo: apesar de ter começado com uma vitória frente ao B. Dortmund, seguiram-se as eliminações da Liga dos Campeões (Manchester City) e da Taça da Alemanha (Friburgo) e mais deslizes no Campeonato que recolocaram o adversário direto na luta até à ultrapassagem na penúltima jornada após nova derrota com o RB Leipzig e nova reviravolta no final.