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Um cargo com muito trabalho, o desconhecimento da indemnização e uma venda parcial da TAP. A audição a João Nuno Mendes em 7 pontos

Este artigo tem mais de 1 ano

João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, inaugurou as inquirições às sextas-feiras. Diz ter estado em poucos processos da TAP, ainda assim esteve no que conduziu ao auxílio de emergência.

João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, garante que a TAP não vai ser vendida na totalidade
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João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, garante que a TAP não vai ser vendida na totalidade

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, garante que a TAP não vai ser vendida na totalidade

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, inaugurou as audições às sextas-feiras na comissão parlamentar de inquérito à TAP, e teve de ser interrompido para os deputados poderem ir votar no Plenário. A inquirição acabou por saltar a segunda ronda.

Diz ser conhecido por ver os detalhes todos dos dossiers em que está envolvido, e, por isso, não deu informações sobre processos em que não esteve. Foi assim com a indemnização de Alexandra Reis, com o cheque pago a 55 milhões a David Neeleman, com a saída de João Weber Gameiro, e mais profundamente sobre a evolução do plano de reestruturação.

Assume que já leu o plano de reestruturação, pelo menos em partes, e que no Ministério das Finanças o acesso à parte confidencial é possível para quem dele necessite — “mas não é numa lógica de o terem no computador”, disse numa alusão ao facto de Eugénia Correia, chefe de gabinete de João Galamba, ter dito que no Ministério das Infraestruturas apenas o adjunto exonerado Frederico Pinheiro tinha o plano e que este não estava no arquivo do Ministério.

João Nuno Mendes acompanhou a TAP quando foi chamado a coordenar, em maio de 2020, o grupo de trabalho para estudar a modalidade de auxílio de Estado à transportadora. Depois ingressou no governo, como secretário de Estado no Ministério das Finanças, primeiro com João Leão, depois com Fernando Medina. E se na inquirição estava como ex-secretário de Estado do Tesouro, foi também na pele de secretário de Estado das Finanças que apareceu. E, por várias vezes, realçou o enorme trabalho que o Ministério tem e que o próprio teve na altura da pandemia e depois quando acumulou a pasta do Tesouro com a das Finanças em 2022.

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1 João Nuno Mendes era secretário de Estado das Finanças em janeiro e fevereiro de 2022 quando Alexandra Reis esteve a negociar a saída da TAP. Não tinha a tutela da empresa. A 30 de março desse ano passa a acumular esta pasta das Finanças com a do Tesouro e até final de novembro, quando entrou (por poucos dias) Alexandra Reis na secretaria de Estado do Tesouro. João Nuno Mendes voltou a ter apenas a pasta das Finanças. Na comissão de inquérito à TAP, na audição que decorreu esta sexta-feira, 2 de junho, garantiu que só soube da indemnização a Alexandra Reis “quando se tornou pública”, ou seja, quando a notícia do Correio da Manhã, a 24 de dezembro de 2022, tornou público o montante de 500 mil euros. E garante que não teve conhecimento de uma notícia do Expresso, em maio de 2022, que já referia a possibilidade de Alexandra Reis ter saído com uma indemnização milionária. Nessa altura, da notícia do Expresso, garante que não teve “nenhum contacto da engenheira Alexandra Reis nem tive conhecimento dessa notícia. Não tomei nenhuma nota sobre isso, nem conhecimento sobre esse artigo”. Declara este desconhecimento justificando que acumulava duas pastas com muitas empresas para tutelar e muitas atividades.

O PSD, através de Hugo Oliveira, ainda foi dizendo que “era sua obrigação” saber e informar o ministro. “Tenho de discordar totalmente daquilo que diz. Não soube nada do processo relacionado com a saída com indemnização de Alexandra Reis, soube quando se tornou pública”.

Mais tarde, Alexandra Reis acabou nomeada para a NAV, mas João Nuno Mendes não sabe quem sugeriu o seu nome a Fernando Medina. “Não fui eu a indicar nome de Alexandra Reis [para a NAV]” a Fernando Medina e “não sei quem tenha sido”. E, nesse momento, “a única ideia que retive foi que ela tinha estado na TAP, e era o curriculum de uma pessoa com experiência no setor aéreo, foi o que retive. Não tinha noção se saiu mais cedo [da TAP], antes do fim do mandato”, já que diz estar focado “em levar para a frente a NAV”. Mais uma vez diz que o processo de saída da TAP “escapou-me por completo”. O PS também tinha questionado João Nuno Mendes sobre se nunca tinha sido abordada a saída de Alexandra Reis nem os seus motivos. A resposta foi lacónica: “Não”. Além de assumir como normal e habitual o procedimento que levou a gestora à NAV.

Enquanto Alexandra Reis foi presidente da NAV, o secretário de Estado assume que reuniu uma vez com a gestora, em setembro de 2022, e foi o contacto direto que teve com Alexandra Reis até depois a ex-administradora da TAP integrar a secretaria de Estado do Tesouro, em novembro de 2022. Ainda assim, admite que Alexandra Reis possa ter participado em reuniões — em 2020 “eram sobretudo por Teams” — no âmbito do grupo de trabalho que João Nuno Mendes coordenou para o auxílio de emergência, mas “não era a principal interlocutora”. Tinha, quando entrou para a NAV, diz, “conhecimento do seu curriculum, e naturalmente tinha bom curriculum”, assumindo ainda que “tive muito bom contacto com ela enquanto secretária de Estado do Tesouro, no período curtíssimo”.

2 O plano de reestruturação da TAP aconteceu no seguimento de um auxílio de emergência do Estado, de 1,2 mil milhões de euros, que tinha de ser reembolsado em seis meses. Sem esse reembolso, o plano de reestruturação avançou. João Nuno Mendes coordenou o grupo de trabalho que propôs, em maio de 2020, o modelo de ajuda pública. Sobre as negociações do plano de reestruturação “não vivi por dentro” — “o plano reestruturação não teve a minha liderança” mas ainda assim assume ter participado em algumas reuniões –, mas sobre a proposta do grupo de trabalho diz-se “inteiramente confortável com as decisões tomadas”.

Na altura da proposta, os privados fizeram saber que não iam acompanhar a capitalização e pretendiam um subsídio ou uma ajuda temporária, e isso não era possível dada a situação financeira da TAP. “A preocupação de todos era nesta lógica de salvar a empresa”. E, garantiu ainda, “sem plano reestruturação, não havia forma de aprovar a capitalização empresa que salvou a companhia de bandeira”.

E quando confrontado pelo deputado do Bloco, Pedro Filipe Soares, sobre se haveria “deformação da posição do trabalho e instrução para o grupo de trabalho da necessidade de entrada [de auxílio público] desta forma”, João Nuno Mendes responde: “Quem me conhece sabe que não faço um trabalho com uma pré-encomenda, aquilo que foi a proposta do grupo de trabalho resultava da nossa convicção, nunca houve nenhuma encomenda para que a proposta de grupo trabalho tivesse um determinado formato”. O formato auxílio de emergência mais plano de reestruturação “ficou confirmado com o que aconteceu depois”, e por isso garante que “nunca houve nenhum tipo de pressão nesse sentido”, nem do ministro das Finanças, nem do secretário de Estado do Tesouro, nem do ministro das Infraestruturas nem do secretário de Estado das Infraestruturas. “O governo queria uma solução. O governo não tinha apenas o problema da TAP”, diz, reafirmando “total confiança no trabalho que foi feito”.

Bruxelas, acrescenta, não teve dúvidas de que a TAP não podia ter um auxílio Covid, porque já estava em dificuldades financeiras. Atira para cima da mesa alguns números: a TAP SA (companhia aérea) estava com capitais próprios de 135 milhões e a SGPS tinha uma dívida para com a SA de 800 milhões, não tendo sido provisionada, uma dívida que foi praticamente em resultado da situação da manutenção do Brasil. E começava a ter dívidas a fornecedores de 300 milhões. “Como é que defendíamos que não era uma empresa em dificuldades financeiras?”, questionou João Nuno Mendes.

João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, inquirido na comissão à TAP

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

3O Governo, nas palavras do secretário de Estado das Finanças, tem “muita confiança nas decisões da Comissão Europeia” nestes processos de auxílio de Estado em tribunal europeu. O da TAP está no tribunal, não havendo nenhum contra o Estado mas sim os que envolvem a Comissão Europeia. “O Estado português intervém, assiste, nalguns desses processos em que possa estar em causa ajuda à TAP”, disse João Nuno Mendes, mostrando “grande confiança nos serviços jurídicos da Comissão Europeia e confiança de que o processo possa ser ultrapassado naquilo que à TAP possa ser feito”, até porque “as ajudas estão concedidas”. Neste momento o GPEARI (Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais Ministério das Finanças) está a fazer o acompanhamento do processo em colaboração com a REPER, que também tem todos os contactos com a Comissão. “É uma matéria de muita importância, mas temos muita confiança nas decisões da Comissão até pela própria exigência que impõe nas negociações com estados. Boa parte dessa exigência resulta da necessidade da Comissão Europeia demonstrar que as suas decisões são compatíveis com o direito da concorrência”.

4 A privatização da TAP em curso, a qual João Nuno Mendes tem em mãos e que garante não ser uma obrigação perante Bruxelas, não vai ser para a totalidade do capital. Garantia dada pelo secretário de Estado das Finanças. “O que tem sido expresso pelo senhor primeiro-ministro é que o processo seja conduzido — a decisão final que carece ser tomada” — de forma a ser “compatível com uma participação de cariz estratégico na empresa.” Esta foi uma primeira resposta para acrescentar, mais tarde, “é nosso entendimento que [o Governo] não está aberto a vender a totalidade da empresa”. E reafirmou: “Não vai vender a totalidade da TAP, convicção que existe no Governo, expressa muito recentemente pelo primeiro-ministro”. Outra garantia deixada é que o processo de privatização vai ser conduzido pelo Governo e não pela TAP, assumindo que a contratação — João Nuno Mendes não compreende mas não tinha de saber como é que a Evercore está a trabalhar há quase um ano sem contrato — da consultora foi da transportadora.

A TAP ainda achou que podia vir a conduzir ela própria a privatização. “Nunca foi solicitado à TAP qualquer tipo de trabalho de consultoria. O que foi esclarecido foi que o processo de privatização era conduzido exclusivamente pelo Estado português, em que os consultores serão autonomamente decididos pelo Estado”, mas, acrescentou, “a TAP poderá ter assumido que seria ela própria a ter o papel de condução do processo”, mas quando “essa possibilidade foi aventada, o governo liminarmente rejeitou. Mesmo que não fosse legal é uma questão de conflito interesses. O Governo é que conduz privatização. E no market sound dissemos que nenhuma informação confidencial podia ser mostrada a qualquer concorrente nem qualquer data room podia ser estabelecido”.

E reafirma: “A TAP tomou uma iniciativa de procurar consultoria e fazer market sound. O Ministério das Finanças não fez qualquer pedido. Compreendo que a TAP queira preparar-se para o futuro, e preparar a construção de sinergias”.

TAP não está sobrecapitalizada e Governo “não está aberto a vender a totalidade da empresa”, diz secretário de Estado das Finanças

5 Não vai ser vendida na totalidade e o que vai devolver da ajuda aos portugueses será visto depois. “Devemos aguardar o processo privatização da empresa”, respondeu João Nuno Mendes quando questionado sobre se a TAP não irá devolver nada dos 3,2 mil milhões de euros que já foram injetados. O secretário de Estado das Finanças garante ainda que a TAP não está sobrecapitalizada, apesar da última injeção de 980 milhões (a de 2022) não ter sido realizada na totalidade. Está previsto que seja feita em mais duas tranches, uma em 2023 e outra em 2024. E é isso que tem levado a oposição a afirmar que se está a pagar (cerca de 700 milhões) para vender a empresa. João Nuno Mendes discorda com esta visão, já que diz que o bolo dos 3,2 mil milhões de euros já está nos capitais próprios da empresa, que sem esses 980 milhões de euros voltaria a ter capitais próprios negativos. Por isso, garante não estar sobrecapitalizada. E lembra que o Estado ficou impedido de colocar mais dinheiro na TAP durante 10 anos.

6 David Neeleman saiu da TAP com um cheque de 55 milhões de euros. E nas várias inquirições tem sido perguntado como se calcularam esses valores. Ainda ninguém soube dizer. E João Nuno Mendes não foi mais esclarecedor. “Não consigo elucidar”. Até porque, disse, “não tive qualquer intervenção nesse processo, não tenho nenhuma informação objetiva a prestar sobre essa matéria. Conhecia a dificuldade que existia em concretizar o auxílio em face das dificuldades que havia com acionistas privados”. Sendo secretário de Estado das Finanças, o valor não o fez tocar campainhas? João Nuno Mendes, admitindo ser um valor elevado, recorda que o país estava em plena pandemia. E desfia o conjunto de dossiers que tinha em mãos: moratórias da banca de 40 mil milhões, garantias das ajudas às empresas, intervenção de Portugal nos programas comunitários, escalada da dívida pública, financiamento do Estado, défice a subir e produto a cair, auditoria independente ao Novo Banco, nacionalização da Efacec. “Não nos faltavam matérias de grandes preocupações”.

Como se calcularam os 55 milhões pagos a Neeleman? A pergunta voltou e secretário de Estado das Finanças responde: “Não consigo elucidar”

7 Confrontado com a mensagem de Hugo Mendes para a ex-CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener (cujo processo de contratação João Nuno Mendes diz não ter tomado parte), de que a sua porta de entrada no Governo era apenas o Ministério das Infraestruturas, o secretário de Estado comentou apenas que um gestor público “não tem de acatar o que quer que lhe diga o membro do governo e se entender que está a transmitir algo que o ultrapassa, o gestor público está protegido para exercer funções com independência”, tendo de exercer o “sentido de autonomia, a sua liderança, o sentido de independência e conhecer a limitação entre o poder político e executivo que existe numa empresa. Não pode acatar o que quer que lhe seja dito pelo membro do Governo”.

E ainda sobre o papel dos gestores públicos — João Nuno Mendes foi, antes, presidente da Águas de Portugal — garante que há duas leis que têm de ter sempre presentes – o estatuto de gestor público e a lei de enquadramento orçamental.

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