Em 1840, nascia algures nas cozinhas do Palácio de Buckingham um dos bolos mais icónicos de sempre: celebrava a união da rainha Vitória e do príncipe Alberto, pesava 135 quilos, tinha 2,7 metros de diâmetro e 35 centímetros de altura numa só camada. Incluía esculturas complexas feitas de açúcar. “Há bolos que fazem História: o da rainha Vitória de Inglaterra até resultou em teses de mestrado!”, lembra o chef Hélio Loureiro.
Próximo da Casa Real portuguesa há várias décadas, monárquico “por convicção” e não “por tradição”, tem um presente especial para marcar o casamento da infanta Maria Francisca, filha do meio dos duques de Bragança, D. Duarte Pio e Isabel Herédia, que casa com Duarte Martins, a 7 de outubro, na Basílica do Convento de Mafra.
Não admira, pois, que aquela que é uma das peças mais simbólicas de um casamento venha da sua parte: “O bolo sou eu que faço questão de oferecer“, revela o chef, responsável por preparar os menus do arraial de dia 6 de outubro, na véspera da cerimónia, e do jantar de dia 7, em Sintra. “É tão desafiante este bolo como o bolo do casamento da minha filha”, brinca o chef. Faz sentido: conheceu D. Duarte Pio nos tempos em que este ainda era solteiro, tornou-se próximo da família e viu a infanta Maria Francisca crescer.
Mantendo a coerência com o resto da oferta gastronómica, o bolo de casamento faz homenagem a Portugal, neste caso em particular ao norte do país: “É inspirado na filigrana de Gondomar“, conta. É um dos símbolos do folclore, mais uma tradição bem portuguesa, lembra. “Sei que diz muito à família real e sei que a infanta gosta destas tradições. Estar presente um elemento tão português, para quem vem de fora, também é interessante”, acrescenta, numa alusão à lista de convidados, que inclui muitas casas reais de outros países.
Com recheio de nozes, será “complexo do ponto de vista da decoração”, mas o resultado será leve e elegante, acredita: “Resulta muito bem porque é branco por cima de branco”, diz. Vai ser trabalhado com uma cobertura em glacê real (ou royal frosting), uma mistura de açúcar em pó, creme tártaro, sumo de limão e claras de ovo. A base, prateada, também conta com alguns artefatos alusivos à filigrana.
Com o dia do casamento dividido em duas partes, o bolo será servido ainda em Mafra, nos claustros do Palácio Convento de Mafra, durante o cocktail, que decorrerá após a cerimónia religiosa — depois, o círculo mais próximo segue para a casa da família em Sintra, onde vai decorrer o jantar. Significa então que o bolo será protagonista num momento em que vão estar presentes até 1200 convidados.
“Vai ser um bolo grande”, descreve o chef. Mas, afinal, quanto é que é grande? A conta é a seguinte: “O tamanho do bolo tem que ver com o peso. Normalmente, contamos 100 gramas de bolo por pessoa, portanto serão 150 quilos”, conta. “São cerca de 60 quilos de açúcar, 60 quilos de noz e 250 ovos.”
Será, de certo, um bolo com patamares — falta é, à data em que escrevemos este artigo, perceber o número de andares. Vindo diretamente do Porto, é precisamente o seu transporte que levanta as dúvidas. “Ele vai ter de ser montado lá [em Mafra]. Se de três ou de cinco andares é que ainda não sabemos.”
Um bolo “mais ou menos igual” para ser degustado no terreiro D. João V
Antes do cocktail servido aos convidados do casamento, haverá um momento de partilha com os populares que marcarem presença a um passo do terreiro D. João V. “Achamos que as pessoas que estão lá fora merecem ser servidas primeiro e merecem estar com a noiva. Ou seja, quando eles estiverem casados saem para estar um bocadinho com as pessoas lá fora e cortam esse bolo. Depois há o bolo, mais ou menos igual, para os convidados, que vão entrando para o cocktail”, adiantou em primeira mão ao Observador Isabel Herédia, confirmando a existência de não um mas sim de dois bolos envolvidos nestes festejos — também este a cargo do chef Hélio Loureiro.
Casamento real. Do anel de noivado aos dois vestidos sem esquecer a tiara da rainha d. Amélia
Uma das curiosidades é que o bolo, ou neste caso os bolos, serão uma surpresa para a noiva, que desconhece o resultado final. No final da cerimónia em Mafra, quando os convidados do casamento rumarem a Sintra para o copo de água ao cair do dia, já não haverá bolo para cortar. “Há sobremesas, mas o bolo já foi.”, acrescenta ainda a mãe da noiva.