Já passava hora e meia do arranque do debate, ia o plenário da Assembleia da República a meio das exigentes votações de artigos específicos do Orçamento, e Augusto Santos Silva perde a paciência. O burburinho e movimentações no plenário são intensas, sobretudo na bancada socialista onde salta à vista a azáfma eleitoral interna. O presidente da Assembleia da República — ele mesmo socialista e apoiante de um dos lados — pede aos “colegas que estão a realizar mini reuniões neste plenário” para que as façam “fora do plenário”. Mas é como se nada fosse. “Nem se dão conta…”, desabafa Santos Silva com o microfone ainda ligado.

Se no primeiro dia da discussão na especialidade as intervenções já foram todas em tom eleitoral, ao segundo dia impôs-se ainda a realidade interna do PS. Não que não tenha sido visível também no primeiro dia, mas nesta sexta-feira o candidato à liderança esteve mais tempo no plenário e as romarias à últimas fila do plenário onde ele estava sentado foram em maior número. Pedro Nuno Santos não parou, sempre ao telefone ou em conversas com quem ia rodando pelas cadeiras ao seu lado: ora a deputada Joana Lima, ora o seu diretor de campanha e também deputado Francisco César, ora o deputado e seu apoiante Pedro Delgado Alves.

A última fila da bancada socialista quando faltava pouco para o fim do debate. Pedro Nuno entre apoiantes e na fila à frente o seu diretor de campanha.

Outro ponto de passagem para o pedronunismo nestes dias tem sido o lugar de Alexandra Leitão, que é a coordenadora da moção do candidato. Aliás, quando Augusto Santos Silva faz o aviso à navegação, o apoiante de Pedro Nuno e deputado João Paulo Rebelo estava de pé a trocar impressões com Leitão. O presidente da Assembleia da República queixava-se de dificuldades de “concentração” na votação do OE, perante a agitação no plenário, e dirigiu-se concretamente ao deputado, advertindo-o, mas trocou-lhe o apelido: “João Paulo Correia”… João Paulo Rebelo nem se virou e continuou a conversa com a deputada e coordenadora da moção do seu candidato no partido.

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Ao contrário de ontem, em que saiu para ir almoçar com Álvaro Beleza, esta sexta Pedro Nuno Santos ficou até ao final do debate, o que fez com que a última fila da bancada estivesse especialmente povoada para aquela fase da discussão — normalmente as últimas filas desmobilizam mais cedo. E ficou até para lá do final. acabando sozinho no plenário, ao telefone, ao lado do seu diretor de campanha.

Já toda a gente tinha saído do plenário e Pedro Nuno ainda estava ao telefone, ao lado do seu diretor de campanha, Francisco César. 

O adiamento da oficialização da demissão do Governo por parte do Presidente da República teve como objetivo a aprovação do Orçamento para 2024, permitindo que ele entre em vigor a 1 de janeiro como estava planeado. Também adiou ao oficialização da dissolução da Assembleia da República, já que a partir desse momento as legislativas têm um máximo de 60 dias para se realizarem e o PS precisava de um período mais dilatado para a reorganização interna. Toda este ajustamento de calendários fez com que o Parlamento esteja em funções, mas com a sua morte anunciada e com uma campanha interna do PS e a pré-campanha das legislativas em campo. E isso transpira a cada reunião do plenário.

Pelo meio uma única novidade orçamental: a aprovação pela maioria da alteração da IL que vai forçar o Governo (demissionário) a estudar a possibilidade e as condições de integração dos profissionais liberais e trabalhadores independentes nos regimes de licenças de parentalidade. Mas mesmo pelo meio, já que tudo entrou neste debate, até uma interrupção vinda da bancada do Chega para saudar a presença nas galeria de Marine Le Pen e o presidente da AfD alemã — já que foi recusada uma conferência de imprensa nos espaços comuns do Parlamento e não seria feita nenhuma referência pela Mesa às visitas presentes a convite do Chega.

TAP aqueceu debate e Pedro Nuno serviu à oposição

No debate em si não foi muito diferente do dia anterior e desta vez foi a TAP a entrar no debate, através da proposta de alteração da Iniciativa Liberal que pretende “devolver aos cidadãos os montantes obtidos com a privatização da TAP”. E também aqui a questão vai dar ao candidato à liderança do PS — que ainda não estava na sala na altura e, por isso, não ouviu Filipe Melo, do Chega, dizer que a companhia aérea “é o maior cemitério de ministros deste Governo”.

Melo falou mesmo nos dois ex-governantes agora deputados, referindo-se a João Galamba (que nessa altura já não estava no plenário) e Pedro Nuno Santos, atirando: “Um está em campanha preparando-se para novamente desgraçar a TAP e outro anda aí pelos corredores”. O deputado disse que é o momento da esquerda não tocar mais neste dossiê e da direita “dar um rumo” à companhia.

Também no PSD a conversa foi dar a Pedro Nuno, com Paulo Moniz a chamar-lhe “extremista impulsivo”, por ter dado 3,2 mil milhões de euros dos portugueses e de agora “não ter coragem para rever o seu retorno como receita”. Não seria o único na bancada a usar como arma de arremesso o socialista que concorre contra José Luís Carneiro. Também o deputado Nuno Carvalho, da mesma bancada, lembrou as críticas que Pedro Nuno fez ao Orçamento e desafiou a bancada socialista a “responder” às mesmas críticas.

Com Medina na equipa, Carneiro não quer mexer no OE. Pedro Nuno não esclarece

No PCP, aproveitou-se a deixa da TAP também para desafiar o PS, mas a manter a empresa pública e cancelar a privatização. “Agora que já pagamos para a TAP ficar equilibrada, vamos entregá-la a interesses estrangeiros?”, questionou Bruno Dias.

A defesa socialista ficou a cargo de Eurico Brilhante Dias que garantiu o “orgulho” no trabalho do Governo na saúde, na educação e na TAP, que colocou como “uma empresa que contribui positivamente para o Orçamento”. “O nosso legado está à vista” disse acusando a direita de só “fazer com que o país ande para trás. O país não vai parar nem no 10 de março”. E enquanto o Parlamento não se dissolve, vai avançado com o 10 de março dentro dele. E com o 15 e 16 de dezembro das diretas do PS também.