Mais de 200 municípios tinham em 2023 tarifas sociais para o abastecimento de água, saneamento e resíduos a famílias carenciadas, que, no entanto, em muitos deles ficam aquém dos descontos recomendados pela entidade reguladora, revelou esta segunda-feira a Deco Proteste.
Segundo um estudo da associação de defesa dos consumidores, entre os 308 municípios, em 2023 eram 236 as câmaras com tarifa social no abastecimento de água, 224 com tarifa social no saneamento e 209 com tarifa social nos resíduos sólidos.
Em relação a 2022, o número cresceu, representando mais 18 concelhos com este desconto na água, mais 21 no saneamento, e mais 20 nos resíduos sólidos urbanos.
A Deco Proteste destacou que ainda há muitos municípios que contrariam recomendações da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) e não têm tarifas sociais de água, resíduos e saneamento, e, mesmo quando as disponibilizam, aplicam-nas com valores incomportáveis para muitas famílias com rendimentos mais baixos.
Apesar de ser recomendada pela ERSAR e pela lei, a aplicação de uma tarifa social ainda é “de adesão voluntária” e os critérios de acesso variam e dependem “da criatividade” do município, referiu.
Segundo a recomendação de 2023 da ERSAR, o desconto deve incidir sobre um consumo máximo de até 10 metros cúbicos (m3) mensais (120 ao ano) e ser aplicado aos três serviços (abastecimento, saneamento e resíduos), de forma que o custo não ultrapasse para cada serviço uma taxa de esforço máxima de 1% do rendimento anual das famílias carenciadas (representando um rendimento familiar anual de referência de até 6.272,64 euros, segundo a Deco).
Desta forma, de acordo com as contas da associação, as tarifas sociais representam mais do que 1% da taxa de esforço de famílias carenciadas em 154 dos 236 municípios com tarifa social no abastecimento de água, assim como em 71 dos 224 municípios com tarifa social no saneamento e em 18 dos 209 com tarifa social nos resíduos sólidos.
A Deco destacou que estes descontos das tarifas sociais são aplicados apenas ao limite de 10m3 por mês “e algumas entidades gestoras praticam preços desproporcionais a partir deste nível de consumo”, defendendo maior adaptação dos atuais tarifários sociais, para que garantam a acessibilidade económica a rendimentos menores.
A associação de consumidores defendeu que as tarifas sociais deveriam estender-se aos consumos de até 15 m3 mensais (180 m3 anuais) quando as famílias carenciadas tenham quatro elementos, já que dificilmente estes agregados conseguem gastar menos de 10 m3 por mês e não são elegíveis para outros descontos, como os disponíveis para famílias numerosas.
A Deco analisou ainda as taxas de esforço para as famílias em dois níveis de consumo – 120 e de 180 m3 -, depois de aplicada a tarifa social, em 15 municípios identificados num estudo anterior como tendo as tarifas gerais de abastecimento de água mais caras do país em 2023 (Carregal do Sal, Tondela, Mortágua, Santa Comba Dão, Tábua, Santa Maria da Feira, Amarante, Arouca, Baião, Celorico de Bastos, Cinfães, Fundão, Ourém, Esposende e Oliveira de Azeméis).
À exceção de Santa Maria da Feira, onde não existe qualquer tarifa social, em todos estes concelhos as famílias têm uma taxa de esforço abaixo do 1% de referência para o caso de 120 m3 de abastecimento, sendo assim garantida a acessibilidade económica.
O mesmo não acontece para o caso de um abastecimento de 180 m3, já que, neste caso, em sete concelhos (Amarante, Arouca, Baião, Celorico de Basto, Cinfães, Fundão e Esposende), “ainda que mais reduzidos, os preços ficaram acima daquilo que uma família com dificuldades pode pagar”.
“No Fundão, a taxa de esforço fica abaixo de 1% nos 120 m3, mas mantém-se em 1,99% nos 180 m3, quase o dobro do recomendado”, salientou a Deco, acrescentando que a tarifa social mais vantajosa, nestes concelhos, está em Oliveira Azeméis, com 0,49% e 0,74% de taxa de esforço, para 120 e 180 metros cúbicos.
Ainda segundo a Deco, apesar de registadas melhorias em relação ao ano anterior, ainda há falta de transparência na divulgação da existência de tarifas sociais nos municípios que as aplicam, o que é “(mais) um obstáculo que as famílias carenciadas têm de transpor para que lhes seja feita justiça social”.
Em 2022, eram 117 os municípios para os quais não foi possível encontrar informação sobre a aplicação ou não da tarifa social da água e agora são 21, entre os 236 que a praticam.
No saneamento, a informação é facultada em 199 municípios dos 224 com tarifa social (apesar de ser difícil detetá-la em 25 casos), enquanto nos resíduos há informação em 185 dos 209 concelhos que aplicam esta taxa (embora em 28 seja difícil encontrá-la).
A Deco destacou que não considerou neste estudo municípios que têm apenas descontos para idosos ou estudantes e não para famílias em situação de carência económica, que deve ser o principal objetivo da tarifa social.