É preciso recuar a 2016, quando António Sampaio da Nóvoa anunciou a candidatura às eleições presidenciais. Foi derrotado pelo favorito Marcelo Rebelo de Sousa e não conseguiu o apoio de nenhum dos principais partidos à esquerda, nem PS (o partido não apoiou ninguém de forma oficial, mas Carlos César e Ana Catarina Mendes anunciaram o apoio ao ex-reitor e agora Conselheiro de Estado), nem BE, nem PCP.

Mas não foi assim que foi recebido na Casa do Alentejo, em Lisboa. Sampaio da Nóvoa foi cabeça de cartaz de uma sessão pública na campanha da CDU, esta quinta-feira, com o título “Abril: Democracia, Liberdade, Cultura” e discursou durante largos minutos, perante uma casa cheia, a rebentar pelas costuras, de uma audiência maioritariamente (ou exclusivamente) comunista.

Ao Conselheiro de Estado juntaram-se o historiador e antigo militante comunista José Neves e a escritora Ana Margarida Carvalho, mas foi Sampaio da Nóvoa o destaque da tarde. O antigo candidato presidencial discursou durante largos minutos, colheu tantos aplausos como António Filipe e não deu espaço para que sobrassem dúvidas sobre o que essa visita significou. Apesar de ter recusado falar aos jornalistas, comentou com o Observador que foi “apenas uma presença“, no que definiu como “um debate” sobre a cultura. Uma visita, um discurso e aplausos, mas sem um apoio público a Paulo Raimundo ou um apelo ao voto na CDU.

[Já saiu o primeiro episódio de “Operação Papagaio”, o novo podcast plus do Observador com o plano mais louco para derrubar Salazar e que esteve escondido nos arquivos da PIDE 64 anos. Pode ouvir também o trailer aqui.]

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Veio até à Casa do Alentejo por uma “obrigação cívica”, de quem quer contribuir para debates, mas apenas “no campo democrático”. Aliás, o diagnóstico do país não é favorável. O ex-reitor da Universidade de Lisboa encontra “cansaço e até desilusão” nas ruas e uma descrença “fatal”, que alimenta “os movimentos contra a democracia e liberdade”.

Podemos estar à beira de uma fragmentação dramática das nossas sociedades. Precisamos da ousadia de um pensamento e de uma ação diferente. A coragem hoje não se define com as lutas dos passado, mas sim das lutas do futuro. Infelizmente, o que vemos é a repetição dos mesmos tempos e das mesmas ideias, com pouca ou nenhuma novidade, como se caminhássemos alegremente para o abismo

Como contributo para o debate político, o Conselheiro de Estado trouxe a proposta de “novos direitos humanos”, uma expressão “imperfeita”, como admitiu o próprio. Separa os antigos, já cantados por Sérgio Godinho: “Paz, pão, habitação” e enumera direitos económicos e sociais e tenta puxar o debate político para um conjunto de novos direitos, de “temas que já estão a transformar o mundo”.

E foi aí que conquistou os primeiros aplausos. Enumerou os “direitos da terra”, com o combate às alterações climáticas no centro, onde encontra propostas políticas “mínimas, sem ambição e que deixam quase tudo na mesma”. Os direitos “do digital”, em que pediu a determinação do mundo digital como “um bem público comum” e os direitos “dos migrantes e mobilidades”.

Aqui escolheu o alvo e com pontaria. Para a Europa e para a direita portuguesa, personificada num nome – Pedro Passos Coelho – que trouxe a imigração e a segurança do país para o debate em plena campanha eleitoral: “Como é possível vivermos em paz com a vergonha da indiferença perante as mortes do mediterrâneo?” Questionou. “O pouco que se diz sobre isso é para falar da insegurança“.

Apesar de não anunciar o apoio à CDU, ou na verdade, de não a ter mencionado de todo no seu discurso, Sampaio da Nóvoa confessou ter o objetivo político de “ajudar” a defender uma “política que não fique refém do pequeno caso”. E de ser uma ponte para a “moderação” e para o “diálogo” entre pessoas que “pensam de maneiras diferentes”, mas traça uma linha vermelha. “Sinto uma revolta dentro de mim contra forças antidemocráticas, contra as tendências que nos arrastam para o ódio e para a violência”.