Uma equipa de astrónomos da Universidade de Cambridge, em Inglaterra, observou um planeta fora do sistema solar, a 70 anos-luz, que acreditam que poderá estar completamente coberto por um oceano em ebulição com águas profundas. Outra equipa da Universidade de Montreal, no Canadá, tem uma visão algo diferente: embora tenha chegado à mesma composição química da atmosfera do planeta, não acredita que haja nele condições para a existência de um oceano. De qualquer forma, nenhuma das equipas tem dados que permitam comprovar a existência de vida.

As observações da equipa de Cambridge — feitas pelo telescópio James Webb, da Nasa, conta o The Guardian — detetaram vapor de água e assinaturas químicas de metano e dióxido de carbono na atmosfera do exoplaneta, que na Terra podem ser de origem geológica ou ser o resultado da atividade de seres vivos. O exoplaneta (assim chamado porque está fora do sistema solar) foi descoberto em 2019, tem o dobro do raio da Terra e está a cerca de 70 anos-luz de distância.

Segundo a equipa de Cambridge, citada pelo jornal, esta mistura química é consistente com a existência de um oceano que cobrirá a superfície do planeta, e com uma atmosfera rica em hidrogénio. Mas as condições marítimas não serão as mais convidativas, acrescentam.

O oceano pode estar a mais de 100 graus (Celsius) ou mais”, afirmou ao The Guardian Nikku Madhusudhan, o professor que liderou a investigação. Com uma pressão atmosférica elevada, um oceano tão quente pode ser líquido, segundo entendem — “mas não é claro se seria habitável”. Uma das interpretações é que pode tratar-se de um “planeta hiceânico”, que como o Observador já aqui explicou, é ainda uma hipótese, dado que não foi encontrado um planeta que encaixe na descrição. Um planeta hiceânico deve ser quente, embora não demasiado, ter um tamanho entre a Terra e Neptuno, estar coberto por um oceano e, idealmente, conseguir conter vida como a conhecemos.

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Esta interpretação é defendida num artigo publicado na revista Astronomy and Astrophysics Letters, mas é contestada por uma equipa da Universidade de Montreal, no Canadá, que também observou o exoplaneta. Esta equipa detetou a mesma composição química na atmosfera, mas argumenta que o planeta seria demasiado quente para ter água em estado líquido (estimam que a temperatura ascenda aos 4.000ºC).

Além disso, entendem que a atmosfera terá demasiado vapor de água para que possa existir um oceano. Os investigadores canadianos acreditam que o exoplaneta terá uma superfície rochosa coberta por uma atmosfera densa em hidrogénio e vapor de água.

Ambas as equipas detetaram dissulfureto de carbono, que na Terra está ligado a processos biológicos mas também pode advir de outras fontes. Por outro lado, não foi detetado qualquer sinal de sulfureto de dimetilo, que na Terra é produzido por seres vivos.

Segundo o The Guardian, um dos lados do exoplaneta está recorrentemente na escuridão, o que cria um contraste extremo de temperaturas. Na interpretação de Nikku Madhusudhan, isto significa que esse lado “poderia potencialmente ter condições de habitabilidade”. Porém com a pressão dezenas ou centenas de vezes superior à da superfície da Terra e vapor a sair do oceano, a atmosfera seria “esmagadora”, escreve o jornal. A equipa acredita que as águas podem atingir profundidades de dezenas a centenas de quilómetros.

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Os investigadores salientam que é preciso cautela nas conclusões e que estes resultados não significa que encontraram vida fora da Terra. Mas são avanços para o conhecimento de “novos ambientes para os quais não temos equivalente no sistema solar”, resume Jo Barstow, astrónoma na Open University, em Inglaterra, que não participou nestas observações.

Nos últimos anos, outras investigações encontraram indícios da existência de oceanos em exoplanetas.

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