O ministro da Economia disse esta segunda-feira à Lusa que Portugal gostaria de ser englobado no grupo de países beneficiários de isenção de visto para entrar na China e que a vontade foi comunicada a Pequim. À margem do Fórum Macau, Pedro Reis, defendeu também que há espaço “para afinar o regulamento” do Fundo de Cooperação e Desenvolvimento China-Países de Língua Portuguesa, em vez de se criar um novo fundo.

“Portugal sinalizou essa matéria, que gostaríamos muito de ser englobados no grupo de países” com a isenção, disse Pedro Reis à Lusa, em Macau, onde se encontra em representação de Portugal na 6.ª conferência ministerial do Fórum de Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa, mais conhecido como Fórum de Macau.

O governo chinês alargou em março a política de isenção de vistos para estadias de até 15 dias a seis países europeus — Suíça, Irlanda, Hungria, Áustria, Bélgica e Luxemburgo —, depois de ter inicialmente adotado a mesma medida para Alemanha, Espanha, França, Itália e Países Baixos, no final do ano passado.

A medida colocou Portugal entre os poucos países da Europa Ocidental cujos nacionais não beneficiam da isenção para entrar no território da segunda maior economia mundial. Pedro Reis notou que a questão foi referida durante a cimeira sino-lusófona, que arrancou no domingo e decorre até terça-feira na região semiautónoma chinesa.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Achamos um belíssimo instrumento, muito pragmático, muito ajustado à cadência da cooperação económica que se quer aqui promover. É preciso, hoje em dia, ser muito ágil nessa matéria. Ainda por cima quando vemos parceiros europeus com acesso a esse regimento. Portanto, sinalizámos pela positiva que já existam cerca de 10 países, em duas vagas, e seria interessante para nós podermos aceder a esse instrumento também”, disse.

Sobre as razões que levaram Pequim a não incluir até agora Portugal, o ministro da Economia remeteu a resposta para a parte chinesa: “é uma pergunta mais para a China do que para Portugal”. “O dever institucional de Portugal é colocar como interessante [o acesso à isenção] e o nosso empenho em também termos acesso a esse instrumento”, considerou.

Em março, o embaixador português em Pequim, Paulo Nascimento, disse à Lusa “não entender” o critério que levou as autoridades chinesas a excluir Portugal. “Não acredito que haja aqui discriminação negativa, no sentido de dizer que a China está a fazer isso para sinalizar alguma coisa a Portugal, não acho que seja esse o caso”, afirmou. “Mas não consigo entender o critério”, disse.

Por seu lado, o embaixador chinês em Lisboa, Zhao Bentang, previu que a inclusão aconteça na próxima fase de isenção de vistos, um processo gradual baseado no volume de trocas comerciais, intercâmbios pessoais e projetos de cooperação entre os dois países.

“Na próxima fase, com a ampliação, acho que Portugal vai integrar a lista de isenção de vistos. Para promover uma medida, uma política, é sempre necessário um processo gradual”, justificou o diplomata em março à agência Lusa, notando que os primeiros países na lista de Pequim “têm maior quantidade de intercâmbios pessoais e de negócios ou têm mais projetos de cooperação”, e logo maior necessidade de deslocações à China.

A adoção pela China de uma política de isenção de vistos para nacionais de diversos países, que inclui também Malásia ou Singapura, decorre após uma quebra de 80% no investimento estrangeiro direto no país, em 2023, face a 2022, e a uma redução de 60% do número de visitantes no ano passado, face a 2019, o último ano antes da pandemia da covid-19.

Ministro da Economia diz haver espaço “para afinar regulamento” do fundo sino-lusófono

No âmbito da conferência, o ministro da Economia disse que também é possível haver espaço “para afinar o regulamento” do Fundo de Cooperação e Desenvolvimento China-Países de Língua Portuguesa, com regras de acesso criticadas por membros do bloco, mas rejeitou ser necessário outro fundo.

“Às vezes, há espaço para afinar o regulamento do fundo, não tem necessariamente que dar um salto tão quântico a criar outros fundos para responder às expectativas”, disse à Lusa Pedro Reis.

O fundo de cooperação, no valor de mil milhões de dólares (938 milhões de euros), foi criado há 10 anos pelo Banco de Desenvolvimento da China e pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Macau.

Este mecanismo já investiu 500 milhões de dólares (469 milhões de euros) nos países lusófonos, anunciou, em outubro, Shi Wenju, presidente da entidade gestora, o Fundo de Desenvolvimento China-África.

As regras de acesso ao capital têm sido alvo de críticas por parte de países membros da estrutura multilateral, como foi o caso da embaixadora de Moçambique em Pequim, Maria Gustava, que pediu no ano passado a “flexibilização no acesso aos fundos existentes“, apontando para a necessidade de mudanças.

As empresas interessadas em obter apoio devem garantir um investimento mínimo de cinco milhões de dólares (4,7 milhões de euros) e o fundo sino-lusófono apenas financia 20%, explicou à Lusa, em maio de 2022, o presidente da Associação Comercial Internacional para os Mercados Lusófonos, Eduardo Ambrósio.

No que diz respeito ao investimento de metade do fundo num total de dez projetos no espaço de dez anos, Pedro Reis notou que “não é tão pouco significativo como” se tem ouvido falar. “Acho que é um arranque. Seria de esperar agora uma aceleração, até porque, mesmo nesta matéria dos fundos, às vezes os primeiros anos são menos projetos, e depois ganha uma tração natural. Muitas vezes, nos fundos, a segunda fase tem muito mais capacidade de investir”, disse.

Defendendo que os projetos “têm que ter tempo para respirar”, Pedro Reis considera “mais importante consolidar, densificar, revisitar” este fundo “do que estarem-se a criar outros fundos”. “O importante seria fazer chegar este fundo a uma lógica mais de impacto e de PME”, constatou.

Inicialmente prevista para 2019, a sexta conferência ministerial foi adiada para junho de 2020, devido às eleições para o parlamento de Macau, mas com a pandemia da covid-19 acabou por não se realizar.

Num balanço a mais de duas décadas do Fórum de Macau, criado em 2003, o ministro da Economia considerou que “ter este espaço de diálogo com a China” é um “benefício para todos os países” membros.

“Para a China porque me parece que lhe permite uma maior visibilidade e proximidade à realidade dos projetos de investimento, aos momentos da exportação, à agenda cultural, à importância do aspeto linguístico. E para os nossos países, e nomeadamente falando obviamente por Portugal, acaba por ser uma revisitação e um balanço e uma redinamização desta agenda global”, declarou Pedro Reis.

O Fórum de Macau integra, além da China, nove países de língua portuguesa: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

Cinco conferências ministeriais foram realizadas no território em 2003, 2006, 2010, 2013 e 2016, durante as quais foram aprovados Planos de Ação para a Cooperação Económica e Comercial.

Países lusófonos querem desenvolver cooperação com a China através do Fórum de Macau

Na abertura da conferência, o desenvolvimento da cooperação entre a China e os países lusófonos através do Fórum de Macau foi o foco das intervenções dos representantes dos Estados-membros.

Na primeira intervenção, o vice-presidente do comité permanente da Assembleia Popular Nacional chinesa, Li Li Hongzhong, defendeu a necessidade de reforçar o papel de Macau na cooperação entre a China e os países de língua portuguesa para a “construção conjunta de uma economia mundial aberta e inclusiva”.

Para isso, o responsável, que também integra politburo do Comité Central do Partido Comunista chinês, propôs incentivos à exportação da China, como seguros de créditos, e também mais acordos comerciais para agilizar a importação de produtos lusófonos.

Em representação do Governo português, o ministro da Economia defendeu a necessidade de continuar “a tirar partido das potencialidades” do Fórum de Macau enquanto “plataforma privilegiada para um diálogo contínuo e frutífero” entre a China e o bloco lusófono.

“Desejamos que o Fórum se afirme cada vez mais como verdadeira plataforma de cooperação ao serviço do desenvolvimento comum, com resultados tangíveis para todos”, disse Pedro Reis. Para os próximos anos, o “principal desafio será a crescente consolidação do valor acrescentado e da marca distintiva”, tendo Macau um “papel crucial a desempenhar na dinamização das atividades do Fórum”, centradas no diálogo, na cooperação e no trabalho conjunto.

O governante português lembrou que a criação do Fórum de Macau, em 2003, representa “o reconhecimento pela China do valor estratégico da herança linguística e cultural no território e da importância económica” dos países lusófonos.

Os representantes dos nove países lusófonos, presentes na sexta conferência ministerial do Fórum de Macau, destacaram a importância do organismo como mecanismo de solidariedade e de cooperação bilateral, mas também a necessidade de reforçar o desenvolvimento das oportunidades de negócio, sem deixarem de elogiar a persistência da China em manter esta plataforma de cooperação entre Estados-membros.

Já o ministro do Comércio chinês, Wang Wengtao, o novo plano de ação 2024-27, a ser aprovado esta tarde, vai ser a “força motriz” do desenvolvimento do Fórum de Macau.