O Observatório do Racismo e Xenofobia e a Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa suspenderam uma pós-graduação fortemente criticada por ter apenas formadores brancos para abordar o racismo, anunciou esta terça-feira a diretora da instituição.
Em resposta a um pedido de esclarecimento da agência Lusa, Margarida Lima Rego disse, por escrito, que “a faculdade e o Observatório não tiveram qualquer intenção de minimizar temas que são importantes e relevantes para qualquer sociedade, nem discriminar pessoas“.
A reação de Margarida Lima Rego surge após a notícia divulgada segunda-feira pela agência Lusa, dando conta da “Pós-graduação em Racismo e Xenofobia”, cujo painel de formadores era constituído por pessoas brancas, o que conduziu a muitas críticas nas redes sociais, em resposta às várias publicações que foram reproduzindo o anúncio do evento.
Anúncio de pós-graduação em racismo ministrada só por brancos retirado após críticas
No esclarecimento, a diretora da NOVA School of Law (Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa) refere que “a inclusão e diversidade são condições indispensáveis para o cumprimento da missão do Observatório do Racismo e Xenofobia, uma iniciativa de âmbito nacional prevista no Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação 2021-2025, lançado pelo anterior Governo”.
E explicou que a pós-graduação em causa foi aprovada em julho pelo conselho científico, mas com “um programa diverso e inclusivo, designadamente quanto à origem étnico-racial dos/as formadores/as“.
“Entre o momento da aprovação e o da sua operacionalização, ocorreram diversas alterações. A principal foi a indisponibilidade de alguns/as formadores/as em lecionarem a pós-graduação. Isso motivou ajustamentos no programa que acabou por não refletir os princípios da diversidade e inclusão”, adiantou.
[Já saiu o terceiro episódio de “A Grande Provocadora”, o novo podcast Plus do Observador que conta a história de Vera Lagoa, a mulher que afrontou Salazar, desafiou os militares de Abril e ridicularizou os que se achavam donos do país. Pode ouvir aqui, no Observador, e também na Apple Podcasts, no Spotify e no Youtube. E pode ouvir aqui o primeiro episódio e aqui o segundo.]
Garante Margarida Lima Rego que o programa publicitado, e que na segunda-feira já não estava a ser anunciado, depois das críticas que motivou, “era diferente do anteriormente apreciado pelo conselho científico“.
“Tratou-se de uma falha interna e a NOVA School of Law já está a tomar medidas para que tal não volte a suceder”, disse, afirmando lamentar “a polémica criada com o anúncio da criação da pós-graduação”. “A Faculdade e o Observatório não tiveram qualquer intenção de minimizar temas que são importantes e relevantes para qualquer sociedade, nem discriminar pessoas e decidiu suspender a pós-graduação, que não irá avançar nestes moldes”, indicou.
Questionada sobre as críticas à composição do Observatório, disse que este “foi uma criação recente e ainda em construção“. “Aquando da sua criação, fora explicitamente referido em reunião do conselho científico desta faculdade que deveria ser garantida uma equipa que, na sua composição, se paute pelos valores da diversidade e inclusão, dando voz às principais categorias de pessoas historicamente discriminadas. Esta continua a ser a minha posição”, referiu.
Além da escolha dos formadores, o tema de um dos painéis da pós-graduação — “O racismo existe mesmo?” também motivou várias críticas, com muitos afrodescendentes a queixarem-se de, mais uma vez, serem invisíveis.
Paula Cardoso, jornalista e criadora da rede Afrolink, foi das primeiras a denunciar o que classifica de “chocante” e “insultuoso”.
A autora disse à Lusa que a composição dos formadores e a abordagem de certos temas a chocaram, mesmo sendo uma criação de um Observatório que considera ter uma estrutura e práticas racistas.
E por isso acredita que agora será ainda maior a contestação à existência do Observatório como ele está, que já acontece porque a sua composição e liderança não respondem ao que foi defendido no Plano de combate ao racismo e discriminação.
“Não faz sentido nenhum. É como uma organização que combate a discriminação contra as mulheres ser composta apenas por homens”, disse.