O icónico líder do movimento nacional palestiniano Yasser Arafat morreu faz segunda-feira 20 anos e o legado de resistência e de liderança permite que seja lembrado como o “pai” da Nação palestiniana, confrontada atualmente com uma guerra contra Israel.

Yasser Arafat morreu a 11 de novembro de 2004 num hospital militar de Paris, continuando a existir grandes dúvidas sobre se o antigo líder da Organização de Libertação da Palestina (OLP) foi um construtor ou um destruidor da paz, defende Paul Cainer num artigo publicado no The Jeswish Chronicle, de que é correspondente para o Médio Oriente, África e Europa Oriental,

No artigo, o também fundador do recentemente criado Centro de Jornalismo Internacional de Conflitos (CJIC) questiona-se sobre o que teria acontecido se Arafat tivesse vivido mais tempo — morreu aos 75 anos — sobretudo no impacto que poderia ter causado nos acontecimentos em Gaza, evitando a cisão aberta entre a Fatah e o Hamas, que conduziu em 2006 a uma guerra civil sangrenta.

E, depois, do que saísse da sua provável intervenção na guerra entre a Fatah, que passou a controlar a Cisjordânia, e o Hamas, que ganhou o poder na Faixa de Gaza, que impacto poderia também ter tido na unidade dos dois movimentos.

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“E isso poderia ter evitado, ou atrasado, a tomada de poder pelo Hamas, que permitiu aos extremistas islâmicos controlar Gaza e construir a sua rede de ‘resistência’ acima e abaixo do solo. Teria então o Hamas sido incapaz de lançar os seus ataques de 7 de outubro de 2023 em Israel”, questionou Cainer ao antigo diretor israelita de três divisões dos serviços de segurança interna, o Shin Bet.

A resposta de Shalom Ben Hanan não podia ser mais lacónica: “Isto é o Médio Oriente. Quem sabe?”.

Até nas circunstâncias da morte de Arafat as opiniões continuam divergentes: são “misteriosas” para os palestinianos, que argumentam que foi envenenado pelos israelitas, enquanto Ben Hanan sustenta que o líder da OLP morreu de causas naturais.

“Exorto os investigadores de segurança ou o sobrinho de Arafat a apresentarem qualquer prova. Isto é um conto de fadas que têm andado a contar: culpar Israel por tudo. Até o assassínio de [John Fitzgerald] Kennedy!”, desdramatizou.

Enquanto os palestinianos e os apoiantes de todo o mundo recordam a liderança e o empenho de Arafat na causa palestiniana, o aniversário da sua morte ocorre num momento de profunda tragédia para o povo palestiniano.

O ataque israelita a Gaza, que começou a 7 de outubro de 2023, já custou a vida a mais de 43.600 palestinianos e mais de 102.900 feridos, na maioria mulheres e crianças. Milhares de corpos continuam presos sob escombros, inacessíveis devido aos bombardeamentos em curso.

Na Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental, mais de 780 palestinianos foram mortos, incluindo 167 crianças, desde o início do ataque israelita.

Yasser Arafat, nascido em Jerusalém a 4 de agosto de 1929, foi uma figura central do movimento de libertação palestiniano durante mais de meio século. Educado no Cairo, desempenhou, desde muito jovem, um papel ativo no movimento nacionalista palestiniano, lembra a agência noticiosa palestiniana WAFA.

Na década de 1950, Arafat cofundou a Fatah, a maior fação da OLP, e tornou-se o seu porta-voz em 1968. Como líder da OLP a partir de 1969, a sua capacidade de resistência e desafio face às pressões militares e diplomáticas israelitas granjearam-lhe uma admiração generalizada.

Factualmente, Arafat tornou-se um símbolo da resistência palestiniana, em especial quando, em 1974, se tornou o primeiro dirigente palestiniano a discursar perante a Assembleia Geral das Nações Unidas, com a célebre declaração: “Trago um ramo de oliveira e a arma de um combatente da liberdade. Não deixem que o ramo de oliveira caia da minha mão”.

Tanto a WAFA como Cainer referem que, ao longo da sua liderança, Arafat enfrentou muitos desafios, desde confrontos militares com as forças israelitas até ao isolamento diplomático.

Em 1987, Arafat desempenhou um papel fundamental no apoio à Primeira Intifada (sublevação) contra a ocupação israelita, ao mesmo tempo que se empenhava em esforços diplomáticos para encontrar uma solução pacífica.

A sua capacidade para navegar na complexa paisagem política ficou ainda mais demonstrada em 1993, quando assinou os Acordos de Oslo com o então primeiro-ministro israelita, Yitzhak Rabin, um acordo que, pela primeira vez, reconheceu o direito dos palestinianos à autodeterminação, o que lhe valeu, em dezembro de 1994, o prémio Nobel da Paz, ao lado de Shimon Peres e Yitzhak Rabin.

Nos anos que antecederam a sua morte, Arafat continuou a ser uma figura de grande importância para o povo palestiniano. Após o fracasso da Cimeira de Camp David, em 2000, Arafat recusou-se a aceitar as exigências israelitas que, na sua opinião, comprometeriam os direitos palestinianos, nomeadamente o controlo de Jerusalém.

Esta posição levou à eclosão da Segunda Intifada e provocou novas pressões por parte de Israel. No final de 2001, as forças israelitas cercaram o complexo de Arafat em Ramallah, um cerco que durou até à sua morte em novembro de 2004.

“Embora Arafat não esteja fisicamente presente, o legado continua a moldar a identidade palestiniana e a luta pela justiça. A visão de uma Palestina livre, a tenacidade perante as adversidades e a capacidade de reunir o povo em torno de uma causa comum estão profundamente enraizadas na consciência nacional”, escreve a WAFA.