O primeiro-ministro, Luís Montenegro, respondeu esta terça-feira às críticas de que foi alvo por parte do líder do PS, Pedro Nuno Santos, e da líder do BE, Mariana Mortágua, a propósito das suas declarações sobre a violência doméstica — e devolveu a acusação de “ligeireza” ao socialista, frisando que é Pedro Nuno Santos quem “não vê a realidade que tem diante dos seus olhos”.

A polémica desenrolou-se na segunda-feira, quando Luís Montenegro participou numa conferência sobre o combate à violência doméstica, em que considerou que o aumento do número de casos nos últimos anos resulta essencialmente do aumento do número de denúncias, mas não de um aumento do número de crimes praticados.

“Um dos fenómenos que aconteceu nos últimos anos foi precisamente que muita coisa saiu do armário onde estava escondida. Eu não quero, repito, chocar ninguém, mas tenho consciência de que o aumento a que assistimos em alguns anos não significa um aumento real, significa um aumento de conhecimento”, afirmou Montenegro na segunda-feira.

O chefe de Governo acrescentou ainda que, na sua opinião, Portugal “já foi muito pior desse ponto de vista”.

Montenegro atribui aumento de casos de violência doméstica a mais denúncias e não a “aumento real”

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As palavras de Montenegro motivaram reações imediatas à esquerda. O líder da oposição, Pedro Nuno Santos, acusou o primeiro-ministro de “ligeireza” e de desrespeito pelos factos.

“O cidadão Luís Montenegro tem o direito de achar coisas, mas a um Primeiro-ministro exige-se menos ligeireza e mais respeito pelos factos, especialmente quando falamos de violência exercida sobre mulheres”, escreveu o líder do PS no Twitter. “A Polícia Judiciária registou 344 mulheres violadas entre janeiro e setembro. Este ano foram assassinadas 25 mulheres em Portugal. Afirmar, perante estes factos, que a realidade ‘já foi muito pior’, é, no mínimo, uma enorme falta de sensibilidade, empatia e respeito pelas vítimas.”

Também através das redes sociais, a líder do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, criticou Montenegro por aquelas palavras: “Montenegro, que ordena operações para aumentar a ‘perceção’ de segurança, tem a ‘perceção’ de que a violência contra mulheres não aumentou (apenas as queixas). Menos perceções e mais factos aconselhariam o PM a levar mais a sério o maior problema de segurança interna — este.”

Pedro Nuno acusa Montenegro de ligeireza e falta de respeito por vítimas de violência

Esta terça-feira, porém, Luís Montenegro voltou ao assunto. Na cerimónia de tomada de posse dos diretores da PJ e dos Serviços Prisionais, Luís Montenegro destacou que a violência doméstica “é um dos crimes prioritários na investigação criminal”, sendo “talvez o mais violento de todos” os crimes.

“É um autêntico crime de terror”, disse Montenegro, sublinhando que a violência doméstica “atenta contra a dignidade humana, atenta contra aquilo que é mais fundamental na vida de uma pessoa” e “marca esse alguém para sempre”.

“Fico perplexo como é que perante a evidência da profundidade deste tipo de crimes, como outros, mas este em particular, perante o aprofundamento dos traumas, das circunstâncias absolutamente trágicas com que as suas vítimas ficam para sempre marcadas, como é que se pode querer desviar a atenção, nomeadamente no que concerne a uma coisa que tem a ver com o trabalho das forças de investigação”, afirmou o primeiro-ministro.

Montenegro fez questão de reafirmar o que disse na segunda-feira: “Pelo trabalho que o legislador fez ao fazer desse crime um crime público; pelo trabalho que muitas organizações fazem de apoio às vítimas; e pelo trabalho das forças de investigação, seja a PJ, seja a GNR, seja a PSP, o trabalho que foi feito nos últimos anos fez com que a criminalidade participada neste caso concreto tivesse aumentado.”

“E nós temos de ter noção que esse aumento significa muito do resultado do trabalho e não tanto o aumento da criminalidade em si. Porque evidentemente não há um dado estatístico que compare aquilo que estava escondido com aquilo que está à mostra”, acrescentou.

“Se há quem pense que dizer isto é olhar com ligeireza para esta tipologia criminal, eu diria que ligeiro é aquele que não vê a realidade que tem diante dos seus olhos”, disse ainda. “Ligeiro é aquele não olha para essa realidade e não lhe dá a resposta que tem de ser dada.”