“No fio da navalha”. Foi esta a expressão utilizada por Vítor Bruno para descrever o atual momento do FC Porto, que chegou à Bélgica a atravessar uma maré negativa como não se via há mais de década e meia: três derrotas consecutivas — Lazio (2-1), Benfica (4-1) e Moreirense (2-1). A contestação já era evidente, mas voltou a subir de tom depois da eliminação da Taça de Portugal. Ainda no domingo, os adeptos concentraram-se junto ao Estádio do Dragão à espera da equipa e André Villas-Boas e Jorge Costa chegaram mesmo a falar com os descontentes. A dupla manteve a confiança em Vítor Bruno e ficou à espera de uma resposta aos desaires.

Ida até aos adeptos junto à garagem, a conversa no Olival, Vítor Bruno seguro mas obrigado a dar uma resposta: o momento do FC Porto

Apesar de a situação interna estar longe do pretendido, o cenário europeu dá mais margem de manobra, dado que apenas 12 equipas são eliminadas e os dragões entraram na segunda metade da fase de Liga com quatro pontos e em lugar de playoff. Ainda assim e olhando noutra perspetiva, a derrota em Bruxelas podia atirar o FC Porto para fora do top 24 e deixar a equipa que, no início da temporada, se assumiu como candidata a conquistar o troféu em situação conturbada. Mais, caso voltassem a perder, os dragões somavam um registo inédito desde 1964/65: quatro derrotas consecutivas.

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Ficha de jogo

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Anderlecht-FC Porto, 2-2

5.ª jornada da fase de Liga da Liga Europa

Lotto Park, em Bruxelas (Bélgica)

Árbitro: Morten Krogh (Dinamarca)

Anderlecht: Colin Coosemans; Thomas Foket (84′), Jan-Carlo Simic, Zanka Jorgensen, Moussa N’Diaye; Mario Stroeeykens, Mats Rits, Leander Dendoncker (Yari Verschaeren, 84′); Samuel Edozie (Francis Amuzu, 60’), Tristan Degreef (Anders Dreyer, 73’) e Kasper Dollberg (Luis Vázquez, 72’)

Suplentes não utilizados: Mads Kikkenborg, Timon Vanhoutte;Theo Leoni, Nilson Angulo e Amando Lapage

Treinador: David Hubert

FC Porto: Diogo Costa; João Mário (Martim Fernandes, 46’), Nehuén Pérez, Otávio Ataíde, Francisco Moura; Stephen Eustáquio (Fábio Vieira, 82’), Alan Varela; Pepê (Gonçalo Borges, 75’), Nico González, Wenderson Galeno; Samu Aghehowa

Suplentes não utilizados: Cláudio Ramos; Tiago Djaló, Zaidu Sanusi, Vasco Sousa, Danny Namaso, André Franco, Fran Navarro, Rodrigo Mora e Zé Pedro

Treinador: Vítor Bruno

Golos: Galeno (24’, gp), Degreef (52’), Fábio Vieira (83′) e Amuzu (86′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a N’Diaye (28’), João Mário (34’), Nico (44’) e Vítor Bruno (63’)

Deste modo e só com a vitória na cabeça, Vítor Bruno chamou 26 jogadores para a viagem à Bélgica, deixando os lesionados Marko Grujic e Deniz Gül, bem como Wendell, por opção técnica, na cidade do Porto. O histórico estava longe de ser favorável, já que os paars-wit tinham vencido todos os jogos realizados em casa frente ao FC Porto (1-0 em 2000 e 1994, 4-0 em 1982 e 3-0 em 1978), pelo que era imperativo contar com o plantel na máxima força e apresentar um onze de gala, longe dos testes de Moreira de Cónegos.

“Fazer história é um propósito pelo qual nos temos de guiar. O FC Porto já jogou aqui quatro vezes e nunca marcou golos. Queremos deixar uma marca positiva. Somos muito positivos no nosso trabalho. Há ciclos e tocou-nos a nós. São fases. Sou a cara e assumo a responsabilidade pelo momento desportivo do clube, mas durmo de forma tranquila porque faço o meu melhor. Tenho cinco meses como treinador principal, mas tenho uma vida ligada ao futebol. Este momento negativo não me espanta”, abordou o treinador portista na antevisão à partida.

Em sentido inverso, o Anderlecht entrou esta quinta-feira em campo a viver um grande momento, durante o qual goleou o Cercle Brugge (fora, 0-5) e o Gent (casa, 6-0). A positividade era extensível à Liga Europa, com os belgas a ocuparem o quinto posto com três vitórias e um empate. “Não estamos a olhar muito para a situação do FC Porto. Sabemos que é um grande equipa e, tal como no Anderlecht, se perdermos dois ou três jogos surge a pressão. Vamos tentar ser dominantes, jogamos em casa, numa competição onde estamos estado bastante bem, por isso o nosso objetivo é sermos dominantes, independentemente do adversário. O FC Porto é uma grande equipa, estamos ansiosos por fazer uma grande partida”, afirmou, por sua vez, o técnico David Hubert.

As cartas estavam então em cima da mesa e, frente a um conjunto histórico no panorama europeu — ganhou cinco provas europeias nas décadas de 70 e 80 (uma Taça UEFA, frente ao Benfica, em 1983, duas Supertaças Europeia, em 1976 e 1978, e duas Taças das Taças, em 1976 e 1978 —, Vítor Bruno fez alterações relativamente ao jogo contra o Moreirense e a grande novidade prendeu-se com a titularidade de Otávio Ataíde, que não jogava desde 15 de setembro. A acompanhar o central estiveram ainda Diogo Costa, Stephen Eustáquio, Wenderson Galeno e Samu Aghehowa.

À imagem do que tem sido o presente do clube, o FC Porto até começou com a bola, mas sofreu um golo com apenas… 14 segundos de jogo (que acabou por não contar): após o Anderlecht recuperar a bola, Kasper Dolberg isolou-se, atirou para a baliza, mas estava em fora de jogo no momento do passe e o lance acabou invalidado. Os dragões reagiram a essa primeira ameaça e começaram a intensificar a pressão perante os belgas que, ainda assim, continuaram mais perto de marcar e com facilidade em circular a bola. Depois de ultrapassar João Mário na direita, Samuel Edozie conduziu para a baliza e, sem ângulo, tentou o golo, mas Diogo Costa defendeu (13′).

Os azuis e brancos começaram a aproximar-se da área belga e, pouco depois, na sequência de um canto, Francisco Moura tentou corresponder de cabeça, mas foi pontapeado por Tristan Degreef e o árbitro assinalou penálti após ver as imagens. Na cobrança, Galeno atirou colocado, Colin Coosemans ainda adivinhou o lado, mas não conseguiu evitar o golo inaugural (24′). A primeira malapata estava assim ultrapassada: pela primeira vez na história, o FC Porto marcou em casa do Anderlecht. A partir daí, a equipa de Bruno assumiu uma postura mais defensiva e tentou apostar no contra-ataque. Na última jogada do primeiro tempo, o guarda-redes português foi chamado a intervir e correspondeu da melhor forma a um remate forte de Leander Dendoncker de fora da área (45+4′).

Ao intervalo, o treinador portista retirou João Mário, que teve várias dificuldades para parar Edozie, e colocou Martim Fernandes, mas nem por isso conseguiu evitar mais um bom arranque do Anderlecht, que teve Mats Rits a cabecear ao poste (48′). Pouco depois, Pepê perdeu a bola para Rits em zona proibida e o médio serviu Degreef para o seu primeiro golo na equipa principal (52′). O empate trouxe nova acalmia no encontro, com os belgas a perderem o caudal ofensivo do início da segunda parte e os portugueses a começarem a assumir as rédeas da partida.

Depois de um período dominado pelas alterações e algumas faltas, o FC Porto voltou a criar perigo já na parte final da partida e através de um lance individual de Galeno, que deambulou da linha para o meio para desferir um remate em arco que saiu ao lado (77′). Logo a seguir e na primeira vez em que tocou na bola, Fábio Vieira foi descoberto por Nico no corredor central e, de fora da área, colocou a bola entre Coosemans e o poste, voltando a adiantar a equipa portuguesa (83′). Contudo, o lado direito voltou a meter água e, na resposta, Francis Amuzu recebeu junto à linha, fletiu para dentro e, com um remate cruzado que ainda desviou em Otávio, empatou o jogo (86′).

Na derradeira oportunidade da partida, Gonçalo Borges arrancou pelo corredor direito e deixou para trás os opositores, conduziu para o meio e, já dentro da área, fez um remate rasteiro para mais uma intervenção decisiva de Coosemans (90+5′). Na sequência do lance, a defesa evitou que Galeno chegasse ao bis. Feitas as contas, o FC Porto somou o quarto encontro sem vencer mas, por outro lado, amealhou um importante ponto que lhe permite subir, à condição, ao 19.º lugar, com cinco pontos.