As eleições presidenciais são vendidas aos eleitores como eleições de candidatos independentes, mas, na verdade, há sempre partidos escondidos atrás dos candidatos, mais ou menos visíveis, mais ou menos aceites, com mais ou menos agrado. As eleições deste ano trazem algumas originalidades. O candidato apoiado pelo PSD e pelo CDS diz que lhe é indiferente o apoio dos partidos, o PS não conseguiu escolher entre dois candidatos, a candidata apoiada pelo BE não reconhece contributo financeiro do partido no orçamento e há mais candidatos fora do sistema partidário do que em eleições anteriores. Só o PCP se mantém fiel à tradição e assume que o partido está por trás e na frente da candidatura de Edgar Silva.

Mas, afinal, há ou não partidos por detrás dos candidatos presidenciais?

Os três candidatos na frente das sondagens apresentaram-se como independentes, mas cada um com um argumento diferente. Se Marcelo Rebelo de Sousa sabe que não era o candidato preferido de Passos Coelho e o apoio do PSD demorou a chegar, Sampaio da Nóvoa, que numa primeira fase acreditava ter o apoio oficial do PS, viu o partido dividir-se depois de Maria de Belém entrar na corrida. Mas passando uma lupa pelas campanhas dos principais candidatos, há vestígios de aparelho dos partidos um pouco por todo o lado.

Marcelo Rebelo de Sousa é o mais esforçado em esconder ou evitar o apoio do PSD e do CDS, apesar de os dois partidos estarem por todo o lado a fazer campanha pelo professor catedrático de Direito – aliás, foi o próprio Marcelo que andou durante mais de um ano a visitar dezenas de estruturas locais sociais-democratas a festejar os 40 anos do PSD, numa espécie de pré-campanha antes de anunciar a candidatura. Ou seja, convencer o partido chegou antes do anúncio, agora, Marcelo preferiu uma campanha ao estilo one man show, dizendo que é independente e que nem conta que Passos Coelho apareça no roteiro dos 15 dias de campanha eleitoral.

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Na estrutura de campanha, o aparelho não é muito visível, mas Marcelo conta com os contactos de Miguel Relvas, ex-dirigente do PSD, e de Rodrigo Moita de Deus, que chegou a ser vice-presidente do PSD no primeiro mandato de Passos Coelho e que é o diretor da agência de comunicação do candidato.

Nos discursos e nos atos oficiais, Marcelo tenta mostrar a independência. Afinal, o apoio do PSD e do CDS chegou já o candidato estava no terreno e o professor nem quer contar com donativos que saiam das contas dos dois partidos: “Não aceitarei donativos de partidos, empresas ou particulares, apenas o trabalho e a colaboração de voluntários. A minha candidatura não depende do apoio de nenhum partido ou organização e não sou o candidato de nenhuma fação, partido, coligação, maioria ou minoria. Não nomearei comissões de honra ou de candidatura”, disse na apresentação da candidatura. No orçamento que entregou no Tribunal Constitucional, Marcelo conta apenas gastar 157 mil euros, e nem um euro saído das contas dos partidos. Pelo menos no orçamento, o resto se verá nas contas finais.

Sampaio da Nóvoa e Maria de Belém com PS a transbordar

Com tanto candidato para apoiar, António Costa decidiu dar carta branca e não apoiar oficialmente nenhum. Com isso evitou que a divisão no partido tomasse proporções públicas maiores, que o PS gastasse dinheiro que agravassem as contas já de si difíceis, mas não evitou que os apoios e a estrutura se dividissem entre Sampaio da Nóvoa e Maria de Belém. Se o primeiro tem metade do secretariado do PS atrás de si, a segunda diz que tem um grande apoio de autarcas.

O antigo reitor da Universidade de Lisboa foi o primeiro a entrar na corrida na área socialista e reuniu logo os dois ex-presidentes da República do PS, Mário Soares e Jorge Sampaio, e escolheu para mandatário nacional do PS outro socialista: Correia de Campos. Mas os socialistas transbordam na campanha de Sampaio da Nóvoa, nos apoios e na organização. Para orientar e dirigir a campanha, Nóvoa chamou Pedro Delgado Alves, deputado socialista e que esteve envolvido na campanha de Manuel Alegre em 2011. Ainda na estrutura da campanha, Nóvoa chamou Pedro Sales, que chegou a ser dirigente do Bloco de Esquerda e que foi, até às legislativas, assessor de imprensa do partido.

Mas é como apoiantes que os socialistas mais saltam à vista. Na contabilidade imediata, Nóvoa tem pelo menos dois ministros como apoiantes: Augusto Santos Silva e Matos Fernandes. E tem o presidente do partido e líder parlamentar, Carlos César.

Se Sampaio da Nóvoa não conseguiu o apoio oficial do PS, conseguiu do Livre e do Tempo de Avançar. É por isso que na lista de apoiantes destacados aparecem Rui Tavares e Ana Drago.

Já o apoio socialista a Maria de Belém Roseira anda longe da atual direção e até do atual Governo. João Soares é o único dos ministros que lhe eu apoio. Maria de Belém foi presidente do PS enquanto António José Seguro era secretário-geral e é na ala segurista que se notam os mais entusiastas. O tiro de partida até foi dado por Ana Gomes, mas depois foram outros socialistas como Eurico Brilhante Dias a ajudar no lançamento. Francisco Assis, Alberto Martins, Carlos Zorrinho e João Proença são mais alguns dos nomes que suportam Belém.

No que toca a apoios, Maria de Belém tem ainda um homem forte do aparelho do partido, Jorge Coelho, e do presidente da distrital de Lisboa (FAUL), Marcos Perestrello. Se Sampaio da Nóvoa conseguiu ex-chefes de Estado, Maria de Belém reúne históricos socialistas como Manuel Alegre, que volta a estar em campos opostos ao de Soares numas eleições presidenciais, Alberto Martins e Vera Jardim. Mas há mais dois nomes de destaque.

Ainda na área socialista, Henrique Neto reúne algum apoio ligado a partidos ou que passaram por governos. Mas que hoje já não têm peso partidário nem no Executivo. É o caso de Campos e Cunha, Medina Carreira, Henrique Gomes, Mira Amaral e o ex-ministro da Educação, Nuno Crato.

Há partido? Há. Assumiu o apoio? Sim, com certeza

Há esquerda à esquerda do PS as presidenciais ainda são o que eram: ou seja, um espaço de lançamento de valores do partido que cria espaço mediático e político. É assim no Bloco de Esquerda e assim no PCP. Com uma pequena nuance, Marisa Matias, a candidata apoiada pelo BE, não reconhece donativos do partido no orçamento.

A estrutura é a do partido e nem sequer é negado. Marisa Matias é apoiada pelos bloquistas, deputados dirigentes e também ex-dirigentes. Na página de apoio, aparecem logo testemunhos de deputados do BE como Mariana Mortágua, Pedro Filipe Soares e José Manuel Pureza, mas também de Catarina Martins e três fundadores do partido: Francisco Louçã, Fernando Rosas e Luís Fazenda. Mas a candidata bloquista vai buscar ainda apoio a outras áreas políticas. É o caso do fundador do PS e chefe da Casa Civil dos presidentes Mário Soares e Jorge Sampaio, que abandonou o partido mais tarde, Alfredo Barroso.

Contudo, Marisa Matias não inscreve no orçamento de campanha qualquer donativo partidário. É a primeira vez que um candidato apoiado pelo BE o faz. Em 2011, o BE apoiou Manuel Alegre (tal como o PS) e o candidato tinha inscrito um apoio partidário de meio milhão de euros dos dois partidos, mas recebeu apenas 310 mil euros. Em 2006, Francisco Louçã teve o apoio de 98 mil euros do Bloco de Esquerda.

Edgar Silva é o candidato que assume a ligação direta ao PCP e ao PEV por inteiro. O candidato não o esconde, e o PCP também não. Foi apresentado como o escolhido pelos comunistas e é o único que inscreve contribuição do partido no Orçamento que entregou no Tribunal Constitucional. Ao todo, Edgar Silva registou 342.250 euros como contributo dos partidos. Uma verba superior ao que Francisco Lopes recebeu em 2011 (180 mil euros), mas inferior à ajuda que o partido deu a Jerónimo de Sousa em 2006 (418 mil euros depois de ter previsto no Orçamento um valor de 717,5 mil euros).