O plano de criação de uma nova empresa para agrupar os ativos africanos foi chumbado na assembleia-geral desta sexta-feira, informou o banco em comunicado enviado ao regulador de mercado, a CMVM. A proposta obteve 63,08% dos votos mas chumbou, em parte, porque a empresária angolana Isabel dos Santos votou contra, através da Santoro Finance (empresa sua que detém 18,6% do capital do BPI mas que vota com mais devido à limitação dos direitos de voto). A Santoro já reagiu, pedindo à administração que encontre “alternativas viáveis” e volta a falar em fusão com o BCP.

A assembleia-geral “não aprovou a Cisão do Banco BPI, em virtude de não ter sido alcançada a maioria qualificada de dois terços dos votos emitidos da qual dependia a sua aprovação; a proposta em causa obteve os votos favoráveis de 63,08% dos votos emitidos”, informa o BPI.

Citado pela Bloomberg, o presidente do BPI, Artur Santos Silva, diz aos jornalistas que esta proposta da cisão dos ativos africanos “é a melhor solução para o banco” e para resolver o problema em torno da exposição a Angola. Mas não foi aprovada pelos acionistas.

Fernando Ulrich, presidente da Comissão Executiva, esclareceu finalmente que o prazo para a solução do problema com o BCE é 10 de abril. Defendendo que “o melhor interesse” do banco não foi salvaguardado, Ulrich afirmou que as “negociações entre as partes vão continuar para resolver esta questão”, acrescentou o responsável.

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O chumbo e o voto contrário de Isabel dos Santos eram previsíveis, depois de a empresa angolana Unitel (onde tem 25% e que é parceira do BPI no BFA angolano) ter considerado “desrespeitosa” a forma como o BPI apresentou esta proposta. A empresária angolana já tinha rejeitado no início do ano, de forma “final e decisiva” a proposta da cisão, que – recorde-se – teria um efeito neutro para os acionistas do BPI porque estes receberiam ações da nova empresa na exata proporção das ações que têm no atual BPI. Nessa nova empresa estariam agrupados os ativos africanos do BPI, isto é, os 50,1% no BFA, e participações em bancos em Moçambique (BCI a 30% e BPI Moçambique a 100%).

O resultado da votação indica, também, que os espanhóis do CaixaBank votaram favoravelmente a esta proposta que tinha como objetivo a resolução de um problema criado pelo BCE em Angola. No final de 2014, o BCE deixou de considerar a supervisão angolana equivalente à europeia.

A decisão do BCE teve dois efeitos:

  • O primeiro foi o de obrigar o banco a contabilizar o risco da sua exposição à dívida pública angolana e dos créditos ao Banco Nacional de Angola a 100%. Antigamente, com a equivalência da supervisão, cada investimento desses só penalizava os rácios de capital em 0% ou 20%. Assim, os rácios de capital do banco foram penalizados e isso teve de ser incorporado pela instituição.
  • O outro problema, bem mais complexo, é o de que as regras do BCE não permitem que um banco tenha uma exposição superior a 25% dos fundos próprios a uma geografia onde não haja equivalência de supervisão. Segundo o CaixaBI, a exposição do BPI a Angola supera em mais de três mil milhões de euros o máximo previsto. O que significa que, para diluir essa exposição e cumprir o máximo de 25%, o BPI teria de fazer um aumento de capital na ordem dos 12 mil milhões de euros, uma impossibilidade que permite, contudo, ter uma noção aproximada das implicações da decisão do BCE para o BPI.

As atenções já se viraram, entretanto, para outra proposta feita pelo Conselho de Administração do BPI, de levantar a limitação dos direitos de voto que contribuiu, por exemplo, para este chumbo na assembleia-geral de hoje. Essa nova proposta será decisiva para o futuro do BPI e para definir a sua estrutura acionista.

Santoro volta a falar em fusão com o BCP

O presidente do Conselho de Administração da Santoro, Mário Leite da Silva, defendeu hoje, no Porto, que a administração do BPI deve focar-se na procura de “alternativas viáveis” à cisão dos ativos em África.

“Penso que não interessa avaliar se a cisão é boa ou é má. O problema desta hipótese, na opinião da Santoro, é que a solução da cisão não é viável. Aqui há uns meses foram estudadas outras alternativas que até teriam o acordo da própria Santoro, só que (…) , por exemplo, uma delas foi chumbada pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários. Não faz sentido a Santoro insistir numa solução que não é viável. O mesmo se aplica a esta cisão simples”, afirmou o representante da segunda maior acionista do banco depois da assembleia-geral que chumbou a cisão.

Questionado sobre se entre as alternativas se poderá incluir uma fusão no sistema financeiro, Mário Leite da Silva disse que o “movimento de consolidação em Portugal faz sentido, mas não resolve por si só este problema”, admitindo aceitar que uma fusão venha a ditar o fim da blindagem dos estatutos do BPI.

Sobre a questão da desblindagem dos estatutos, tema sobre o qual o Conselho de Administração anunciou, na quinta-feira, ter apresentado uma proposta para eliminar o limite atualmente existente nos direitos de votos que impede que qualquer acionista vote com mais de 20%, Mário Leite da Silva sublinhou que “atendendo ao momento, às circunstâncias específicas, deve ser considerado”.

“Tenho a ambição de que o BPI pudesse ser parte ativa em movimentos de consolidação em operações que tragam maior racionalidade ao setor financeiro português e nessa operação que concretamente a Santoro propôs, convidou a administração do BPI e do BCP a estudarem, pressuponha um aumento de capital substancial para reembolso dos CoCos e pressupunha a desblindagem dos estatutos”, afirmou o presidente da Santoro.