O olfato é um dos sentidos mais poderosos do corpo humano, diretamente ligado às emoções, sentimentos e memórias, daí que não seja de espantar que a indústria da perfumaria alcance, anualmente, receitas milionárias. Em 2013, esse valor foi de 27 mil milhões de euros e tem vindo a crescer de ano para ano, estimando-se que, em 2018, esteja a rondar os 41 mil milhões de euros. São muitos zeros, tendo em conta que um perfume dura muito tempo e não é um produto que estejamos constantemente a comprar.

Que a beleza é um universo maioritariamente feminino já sabíamos, mas que 33% dos perfumes de homens são usados pelas mulheres é um dado interessante e que diz muito das tendências globais. Talvez seja um fenómeno da geração Y (nascidos nas décadas de 80 e 90) e dos Millennials que não se regem por rótulos. Estaremos nós a deixar de comprar, então, aquilo que uma etiqueta masculina ou feminina diz?

A era dos perfumes sem rótulos

Os perfumes unissexo não são necessariamente uma novidade. CK One de Calvin Klein foi o primeiro perfume a surgir no mercado com a legenda unisex, em 1994, baseado em notas cítricas que tendem a ser usadas por ambos os sexos. Mas outras marcas lhe seguiram os passos: Jo Malone, Tom Ford, Acqua di Parma, Hermès, Kiehl’s, Jean Paul Gaultier, entre outros. O site americano Racked, a propósito deste tema, fez um artigo onde recolheu opiniões de homens e mulheres sobre o mesmo perfume unissexo. Neroli Portofino, a fragrância unisex de Tom Ford, teve opiniões interessantes:

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  • “Cheira a um homem rico em férias” (opinião feminina);
  • “É um cheiro viril, como uma virilidade europeia” (opinião masculina);
  • “É um cheiro forte, masculino mas há algo de profundo” (opinião feminina);
  • “Cheira a jasmim, talvez seja um perfume para a primavera porque parece-me muito feminino” (opinião feminina);
  • “Este perfume é ótimo, cheira a um homem limpo” (opinião masculina).

O engraçado nestas opiniões é que são completamente transversais. Há quem diga que é um perfume masculino. Há quem diga que é feminino. É a magia desta tendência das fragrâncias sem género. Não são demasiado femininas, nem demasiado masculinas. E isto vai completamente contra tudo o que se tem vindo a fazer há décadas e décadas, onde os perfumistas são educados em dicotomias tradicionais: rosas são para os cheiros femininos, almíscar para os cheiros masculinos. E se andamos a combater, ano após ano, a tradição “azul para os meninos e rosa para as meninas”, porque não aplicar a mesma ideia também aos perfumes que usamos?

Compramos pelo rótulo ou pelo aroma?

Kilian Hennessy, fundadora dos perfumes By Kilian, diz em entrevista à Fashionista que “o estado da indústria é de mau gosto. Dior ainda está a vender J’Adore, que saiu em 1999. Os clássicos têm de se readaptar a um novo reino porque o paradigma está a mudar.” E que reino é este? O reino onde as caraterísticas de um perfume ditadas pelo género estão a ser contrariadas e a balança está a pender para um mercado unissexo com que qualquer pessoa se pode identificar. E se pensarmos que os perfumes masculinos são tão apreciados pelas mulheres, faz sentido que possamos usar fragrâncias que contenham notas também para homens. Acaba por ser um equilíbrio.

Straight to Heaven é o perfume mais vendido de By Kilian e tem por base rum, patchouli e madeira de cedro — notas pesadas e masculinas. Não tem citrinos nem flores, notas clássicas nas fragrâncias femininas, mas a fundadora diz que é o segundo mais vendido entre as mulheres, o que mostra que quando o rótulo não diz se um perfume é de homem ou mulher, as pessoas escolhem de acordo com a emoção que o aroma exala.

Tendência de nicho ou o futuro da perfumaria?

Já em 2006, o New York Times falava de uma nova geração de pessoas entediada pelas interpretações convencionais de masculinidade e feminilidade e do crescimento de um mercado de aromas sem distinção de sexo. E se, na altura, este era um mercado de nicho sem hipótese de concorrer com os grandes bestsellers, a verdade é que as coisas estão a mudar. Em 2015, entre os perfumes mais vendidos estava Neroli Portofino, o unisex de Tom Ford. E em 2016, entre os grandes lançamentos do ano encontra-se CK2 de Calvin Klein — o lançamento acontece 20 anos depois de CK One, que viria a mudar a indústria da perfumaria para sempre.

CK2 acabou de chegar a Portugal e, seguindo as tendências digitais, chega com uma hashtag: #the2ofus, que simboliza um perfume sem estereótipos, tradicionalismos e que celebra relações mais ricas que se afastam do “eu” e se aproximam do “nós”. Qualquer coisa como: “nós” podemos usar o mesmo cheiro.

Para quem já ficou curioso, além de CK One e CK2, há mais perfumes unisex em Portugal que reunimos em fotogaleria e que vão fazer qualquer pessoa render-se — homem ou mulher.