A Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CRESAP), entidade autónoma responsável pelo recrutamento dos altos quadros do Estado, foi esta sexta-feira à Assembleia da República pedir aos deputados da comissão parlamentar de Orçamento e Finanças um alargamento da sua esfera de ação. Entre as muitas propostas deixadas pelo presidente da comissão, João Bilhim, destaca-se o pedido de maior intervenção nas universidades, nas autarquias e nas regiões. O objetivo é fazer com que “todos os gestores da administração pública” fiquem abrangidos pelo método de seleção através de concursos públicos, e “não apenas alguns”, disse.

O caso das universidades foi chamado à atenção pelo deputado centrista Artur Rego, que deu o exemplo das “nomeações abusivas” feitas nas universidades numa altura em que as carreiras dos professores estão “congeladas”, o que faz com que, segundo o deputado, os altos quadros tenham de “entrar pela porta do cavalo”. Em resposta, João Bilhim, que foi ao Parlamento no âmbito da audição anual obrigatória de supervisão do funcionamento da Cresap, concordou que os dirigentes universitários têm um “estatuto próprio” que serve de “capa” para fugir aos concursos públicos. E apontou-lhes o dedo. “O modelo de concurso público ou serve para todos ou então não serve para ninguém”, disse.

“O facto de a Universidade ter autonomia inscrita na própria lei fundamental tem permitido que os dirigentes da Universidade estejam cobertos por uma capa em que não estão submetidos ao estatuto de dirigente da Administração”, afirmou.

Além de uma maior raio de ação, João Bilhim defendeu ainda a ideia de que a Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública deixasse de ser tutelada pelo Ministério das Finanças e passasse a estar sob a alçada direta da Assembleia da República, com os mesmos direitos que têm as comissões autónomas inseridas nesse regime. Isto é, com direito a “cobrar pelos serviços prestados”. E sugeriu mesmo um modelo de pagamento: 10% do salário anual do dirigente que está a ser recrutado. Um valor simbólico, disse, já que “o preço de mercado de qualquer empresa privada de recrutamento é um salário, por inteiro, do quadro que estão a recrutar”. A medida, no entanto, não foi bem recebida pelos deputados, nomeadamente pela bloquista Mariana Aiveca, que se manifestou contra.

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Depois de, como noticiou o Observador, a Cresap ter sido intimada pelo Tribunal Administrativo de Lisboa a divulgar toda a informação e documentos com a fundamentação para a escolha ou exclusão dos candidatos – que são sujeitos a uma primeira avaliação curricular e depois a uma entrevista até chegarem a uma short list de três nomes, que é apresentada ao Governo – João Bilhim reiterou que está a dar cumprimento à decisão judicial, mas não “concorda” com ela.

“Sou obrigado a dar todos os elementos constitutivos da decisão do júri, nomeadamente o resultado do teste psicológico (que é feito na avaliação de perfil de gestor público e não nos procedimentos concursais). Sinceramente não gostava que fizessem isso comigo, que espalhassem assim o meu nome”, disse, argumentando que recebeu queixas de candidatos que disseram que não se concorriam se a sua participação fosse divulgada publicamente, “por medo de represálias”.

Nesse sentido, e apesar das críticas dos deputados da oposição aos muitos casos que evidenciam a “falta de transparência” e a “arbitrariedade de critérios”, João Bilhim defendeu precisamente que se mantivesse o “caráter sigiloso” do processo, “pelo menos até à decisão final do júri”.

Ainda questionado pelos deputados sobre os atrasos dos ministros na nomeação de dirigentes públicos, que têm feito manchetes nos jornais por alguns processos de escolha estarem pendentes há quase um ano, João Bilhim propôs no Parlamento que fosse estabelecido um limite de 45 dias para os governantes optarem por um dos três nomes da short list. O mesmo pediu para os casos de designação de dirigentes em regime de substituição – uma alternativa que tem sido muitas vezes usada pelas tutelas para fugir à obrigação de recorrer aos concursos públicos para preencher vagas nos ministérios.

“O regime de substituição deve ser a exceção”, disse, sublinhando que a Cresap tem um prazo de 30 dias para desencadear o concurso e chegar aos três nomes finalistas, pelo que “não faz sentido os ministérios recorrerem ao regime de substituição se houver um planeamento adequado de gestão dos recursos humanos”. João Bilhim admitiu ainda que “houve situações em que se abusou” do regime de substituição, mas, questionado pelo deputado comunista Jorge Machado sobre a percentagem de gestores que entraram efetivamente para a administração pública depois de terem desempenhado o cargo em regime de substituição, não deu resposta.