Há poucas coisas na história de Chuck Blazer que não pareçam saídas diretamente de um filme. Senão veja-se: em 1989 estava desempregado e praticamente falido; em 2011 tinha-se tornado no único americano do comité executivo da FIFA; nesse mesmo ano, os serviços secretos norte-americanos detiveram-no enquanto descia a Quinta Avenida numa cadeira de rodas elétrica. Eis o homem que decidiu cooperar com a Justiça para expor a corrupção na FIFA e que desencadeou o que aconteceu a 27 de maio, um dos dias mais negros da história do futebol.

A história de como chegamos às sete detenções e às 14 acusações deduzidas esta quarta-feira contra executivos do órgão máximo do futebol mundial começa em novembro de 2011, na Quinta Avenida, em Nova Iorque. Depois de mais de dez anos a receber milhões de dólares em alegados subornos e comissões, Chuck Blazer foi perseguido pelo FBI avenida abaixo para saber porque é que não tinha pago nem um cêntimo em impostos. Surpreendido na cadeira de rodas elétrica que usa há anos, devido à extrema obesidade, Chuck acabou por aceitar cooperar com as autoridades em troca de penas mais leves pelos crimes cometidos.

Chuck Blazer é acusado pela Justiça dos Estados Unidos de ter estado envolvido em esquemas de corrupção relativos à escolha de países para vários Mundiais, enquanto secretário-geral da Confederação de Futebol da América do Norte, Central e das Caraíbas (CONCACAF). A situação terá começado em 1990 e só teve fim em 2010, quando Blazer votou pela realização do Mundial de 2018 na Rússia, quando se esperava que votasse pelo Reino Unido, pouco depois de uma visita ao Kremlin descrita pelo BuzzFeed – que lhe dedicou um extenso perfil em junho do ano passado.

Blazer foi secretário-geral da CONCACAF entre 1990 e 2011, organização que ajudou a implementar e largamente responsável pela promoção do futebol nos Estados Unidos, país onde a modalidade é secundária relativamente ao basquetebol, ao baseball e futebol americano. Concomitantemente, entre 1996 e 2013, Chuck fez parte do comité executivo da FIFA, órgão a quem cabe a decisão de onde se realizam os campeonatos mundiais.

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O apartamento só para gatos do Pai Natal

Hoje com 70 anos e um cancro muito grave no cólon, Chuck Blazer admitiu ser culpado de dez crimes (fuga aos impostos, lavagem de dinheiro, fraude bancária e extorsão, entre outros). Só pelo crime de extorsão, lembra o Guardian, pode ir parar à prisão por 20 anos. Foi na esperança de obter uma suavização da pena que Blazer começou a desenrolar o novelo do obscuro mundo da FIFA em 2011.

Foi assim, por exemplo, que a mando do FBI, Blazer foi aos Jogos Olímpicos de Londres em 2012 encontrar-se com diversos executivos do mundo do futebol. As conversas terão sido todas gravadas e serviram de base à investigação. Mas não foi esta a única contribuição: o americano também deu ao FBI uma lista de 44 altos dirigentes da FIFA que se crê estarem envolvidos em esquemas de corrupção e extorsão.

A história foi revelada em novembro pelo tablóide americano New York Daily News, que descreve parte da opulenta vida de Chuck Blazer durante os anos em que esteve ligado diretamente ao futebol. Blazer fez um acordo com a CONCACAF que lhe conferia uma comissão de 10% de todo o dinheiro que entrasse naquela organização. Isso não só lhe granjeou a alcunha de “Mr. Ten Percent” (Sr. 10%), como lhe abriu as portas que lhe permitiram deixar de ser um desempregado dos subúrbios para se tornar num dos homens mais influentes do soccer, modalidade na altura em expansão nos Estados Unidos.

Chuck, homem obeso e de farta barba que o faz assemelhar-se ao Pai Natal – algo que o próprio admite no blogue pessoal -, tem dois apartamentos num dos arranha-céus mais luxuosos de Nova Iorque, o Trump Tower. Um deles, diz-se, é só para os gatos. Mas o luxo não fica por aqui: condomínios nas Bahamas, jatos privados, convivência íntima com Nelson Mandela, João Paulo II, Vladimir Putin, entre outros, faziam parte da sua vida diária.

Em 2013, Chuck deixou de pertencer ao comité executivo da FIFA e desde então raramente apareceu em público, focado nas sucessivas operações a que foi sujeito devido ao cancro de que sofre.