Ainda assim, quem não quiser desrespeitar a célebre máxima deve aceder com algum avanço ao informativo site do Vaticano — que até tem versão em português — e consultar a lista de aparições semanais do carismático Francisco. As audiências semanais, por exemplo, ocorrem às quartas-feiras e exigem a reserva de um bilhete gratuito.

Escrito isto, e não desfazendo, Roma não se esgota, longe disso, na figura papal. Nem em tudo o que consta de qualquer guia de bolso: o Coliseu, o Panteão, a Capela Sistina ou a Fontana di Trevi (atualmente em obras). Não se esgota Roma, nem os ditados sobre ela. Há outros dois que devem ser levados muito mais em conta, mesmo que isso implique adulterar, ligeiramente, o seu significado: “em Roma, sê romano” — e “quem tem boca vai a Roma”. Ser romano, neste caso, implica sobretudo comer como um romano. E comer como um romano pressupõe, não raras vezes, comer muito — conta-se, aliás, que no auge do Império era habitual vomitar-se entre pratos só para conseguir comer mais e mais. E com tanta coisa boa para provar, quem tem boca tem mesmo de ir a Roma.

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A Basílica de São Pedro à noite. Não se vê o Papa, mas a vista é bonita e a confusão é menor.
(foto: © Tiago Pais / Observador)

Ok, mas porquê nesta altura?

A razão principal para visitar a capital de Itália nesta altura encontra-se numa das margens do Tibre, o rio que a atravessa. O Lungo Il Tevere — ao longo do Tibre, em tradução literal — começou a 12 de junho e estende-se até ao último dia de agosto. É, há treze anos, o grande festival de verão da cidade, reunindo na margem esquerda do rio, entre as pontes Sublicio e Sisto, sítios para comer, beber, dançar, jogar, fazer compras, assistir a apresentações, exposições, peças de teatro, declamações de poesia ou concertos dos mais variados géneros. E a entrada é gratuita, logo ainda mais recomendável.

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Perto de uma das entradas do evento fica o Freni e Frizioni, um dos bares mais frequentados pelos locais para cumprir a velha tradição italiana do aperitivo: entre as 19h e as 22h, a compra de uma bebida dá direito a aceder a um buffet que se destaca — em comparação com outros — por uma oferta de pratos vegetarianos acima da média. A especialidade da casa é o clássico Spritz, mas há criações com nomes tão sugestivos como Ramone Fizz, Oscar White ou El Hombre Araña. Até às 02h da manhã todos os cocktails custam 10€.

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Os barmen do Freni e Frizioni em ação. No copo à direita, o Spritz, a especialidade da casa.
(foto: © Tiago Pais / Observador)

Por essa mesma zona, Trastevere, ser uma das mais visitadas por turistas, não faltam restaurantes que os tentam caçar a todo o custo. É preciso, por isso, cuidado para não entrar ao engano numa das várias trattorias que se anunciam como very typical mas que de típico só têm mesmo o padrão das toalhas de mesa. Na Da Enzo Al 29 não terá esse problema. Dois conselhos: reserve ou, caso não tenho tido hipótese de o fazer, apareça bem cedo, por volta das 19h, e coloque o seu nome na lista de espera. O outro é não escolher só com base no menu, há sempre sugestões diárias que vão variando conforme o mercado e a disposição de quem cozinha. Em caso de dúvida, os clássicos da cozinha romana, do cacio e pepe (tonnarelli, um primo do esparguete, com queijo pecorino e pimenta) à coda alla vaccinara (estufado de rabo de boi) não deixam ninguém ficar mal. E o tiramisú final, feito com ovos biológicos e servido num copo, muito menos.

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A carbonara do Da Enzo Al 29 é um hino às carbonaras deste mundo.
(foto: © Tiago Pais / Observador)

Outras duas excelentes opções neste campeonato mais tradicional, ambas com esplanadas, argumento importante nesta época, já que o calor em Roma mói e não é pouco: Flavio al Velavevodetto, em Testaccio, onde se come ótima pasta caseira, em diferentes formas e contextos, e Da Cesare al Casaletto, onde deve explorar as entradas: os friti misti (um combinado de fritos, do bacalhau à flor de courgette) e as almôndegas são imperdíveis. Perto do Da Cesare fica uma das entradas para a Villa Doria Pamphilj, um dos maiores parques públicos da cidade, com 184 hectares de longos e sinuosos relvados, onde é frequente haver concertos e outros espetáculos. Atenção, contudo, ao horário — o parque fecha as portas às 21h diariamente. E este não é o único espaço verde que vale a pena visitar: Villa Borghese, no centro, onde fica a galeria homónima, ou a Passeggiata del Gianicolo, que oferece uma das melhores vistas panorâmicas da cidade, também são boas opções de passeio.

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A esplanada (ou parte dela) do Da Cesare Al Casaletto.
(foto: © Tiago Pais / Observador)

Em Monti, que foi considerado um dos bairros mais cool da Europa, não faltam lojas de jovens criadores, tanto na área do design como na da moda. O Mercato Monti acontece todos os domingos do mês (exceto o último) e é uma boa oportunidade para ficar a conhecer o trabalho de alguns desses mesmos criadores. O bairro de Pigneto, mais a Este, não teve direito a distinções recentes mas tem uma oferta assinalável para quem procura divertimento/alimento em bares/restaurantes com algum conceito, como o histórico Necci dal 1924. Ainda em Pigneto, referência ao I Porchettoni, onde se come, entre outras coisas, porchetta (o leitão italiano, recheado com especiarias) ao peso ou no pão. Anthony Bourdain provou e gostou.

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Uma das (muitas) esplanadas do bairro de Pigneto. (foto: © Tiago Pais / Observador)

E por falar em pão, um guia sobre comida em Roma nunca ficaria completo sem pizza à fatia. Neste campeonato vastíssimo, seguem duas recomendações valiosas: uma pela localização, o centralíssimo Forno Campo de Fiori, que se divide em dois espaços, pizzaria e padaria, e outra pela criatividade e qualidade da matéria-prima, o Pizzarium, no Prati, junto ao Vaticano. Este último espaço pertence a Gabriele Bonci, um padeiro/pizzaiolo que é também figura de proa da gastronomia romana e que tem ainda uma padaria com o seu apelido na Via Trionfale, perto da estação de metro Ottaviano, que merece, igualmente, visita. Já nos derivados da pizza, destaque para os cartuchos recheados do Trapizzino, em Testaccio, — com recheios que vão das almôndegas à língua de vitela estufada — onde a seleção de cerveja artesanal é um bónus muito interessante.

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Os cones da Trapizzino, para agarrar e levar (mas devolvendo o suporte no final).
(foto: © Tiago Pais / Observador)

Este guia acabaria na perfeição com uma recomendação de gelados mas seria quase redundante: difícil, em Roma, é sair mal servido neste capítulo. Ainda assim, as geladarias Fatamorgana, espalhadas por vários bairros da cidade, ou a Panna & Co. em Testaccio valem a menção.