Coliformes fecais, bactérias, vírus, protozoários e “um número infinito de microorganismos patogénicos”. É disto que as águas de dois locais no Rio de Janeiro, que vão acolher provas dos Jogo Olímpicos, estão cheias, quando falta praticamente um ano para o arranque da prova. Os níveis de poluição são elevados, sobretudo, em duas zonas: a Baía de Guanabara e a Lagoa Rodrigo de Freitas, onde se vão realizar as competições, por exemplo, de vela ou canoagem. Esta é um problema dos grandes, já que estas substâncias podem entrar no corpo humano através da boca, olhos, ouvidos ou uma qualquer ferida.

Este, e outros avisos, constam no estudo realizado pela Associated Press (AP), divulgado na quinta-feira, o primeiro que examinou as águas que acolherão provas nos Jogos Olímpicos de 2016. O trabalho recolheu amostras entre março e julho, num período em que já muitos atletas que estarão nos Jogos — que se realizam de 5 a 21 de agosto de 2016 — treinaram nessas águas. “Esta é, de longe, a pior qualidade de água que vimos nas nossas carreiras”, defendeu Ivan Bulaja, treinador da seleção austríaca de vela, na classe de 49er, que chegou a participar nos Jogos de 2008, em Pequim.

Os efeitos, segundo a AP, poderão ir desde vómitos, diarreia a febre elevada, que impedirão os atletas de competir durante vários dias. David Hussl, um dos velejadores austríacos, já adoeceu devido ao contacto com as águas desta baía. “Já tive altas temperaturas [corporais] e problemas no estômago. Acaba sempre por ser um dia completo na cama e, depois, dois ou três sem competir”, lamentou.

A Baía de Guanabara é o local mais problemático. O The Guardian, aliás, escreve que há centenas de objetos à deriva nas águas, desde tubos de plástico, bolas de futebol vazias, bonecos, sofás e até eletrodomésticos. Tudo isto junto a um cheiro constante a esgoto. “O que vemos aí é basicamente esgoto bruto. É toda a água, não tratada, que vem de sanitas, chuveiros e de qualquer coisa que as pessoas atirem para o lava-loiças, tudo misturado”, descreveu John Griffitt, um biólogo marinho norte-americano, que também foi citado pela agência noticiosa responsável pelo estudo. O especialista salientou que, em algumas amostras recolhidas, o número de vírus e bactérias registados era 1,7 milhões de vezes ao permitido nas praias da Califórnia, estado norte-americano.

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Members of a local rowing club practice among floating dead fish at the Rodrigo de Freitas Lagoon that will host rowing and canoeing events during Rio 2016 Olympic Games in Rio de Janeiro, Brazil, on April 16, 2015. Workers of  Rio de Janeiros Municipal Cleaning Company (Comlurb) have already collected 37,4 tons of dead fish in a week.  AFP PHOTO / YASUYOSHI CHIBA        (Photo credit should read YASUYOSHI CHIBA/AFP/Getty Images)

É comum aparecerem centenas de peixes mortos a boiarem nas águas da Lagoa Rodrigo de Freitas. Foto: YASUYOSHI CHIBA/AFP/Getty Images)

No Brasil, sobretudo no Rio de Janeiro, a maioria das águas dos esgotos não é tratada, sendo descarregada diretamente para rios e riachos da cidade, como salientou o Estado de São Paulo. Mas o governo brasileiro, ao que parece, não reconhece que os níveis de contaminação das águas sejam motivo de preocupação.

Leonardo Daemon, gerente da qualidade da água no Instituto de Estadual do Ambiente (INEA), garantiu que tanto as águas da Baía de Guanabara como as da Lagoa Rodrigo de Freitas — que desde a década de 90 tem sido alvo de milhões de euros de investimento em projetos de limpeza das águas –, cumprem os requisitos mínimos para uso recreativo. “Qual é a norma que tem de ser seguida para a quantidade de vírus na água? Você não tem um padrão para contacto com a água, [não tem] uma norma que transfira a quantidade de vírus em relação à saúde humana”, disse, ao jornal brasileiro.

Nos testes que efetua a estas águas, o Comité Olímpico Internacional (COI) apenas monitoriza o nível de bactérias, não medido a presença de vírus. “Recebemos garantias, da parte da Organização Mundial de Saúde e de outras entidades, que não existe um risco significativo para a saúde dos atletas”, disse Richard Budgett, diretor médico do COI, à Associated Press.  Os Jogos Olímpicos de 2016 levará cerca de 10 mil atletas ao Rio de Janeiro, vindos de quase 200 países. Perto de 1.400 competirão em provas que decorrerão nas águas da Baía de Guanabara e da Lagoa Rodrigo de Freitas.