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11 grandes devedores da Caixa: cinco estão em liquidação - e há mais quatro que não pagam

Entre os grandes devedores de alto risco da Caixa Geral de Depósitos, há empresas em liquidação e outras que não estão a pagar empréstimos. Perdas de mais de mil milhões já terão sido reconhecidas.

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A lista dos maiores devedores em risco da Caixa Geral de Depósitos (CGD) não é oficialmente conhecida. A Caixa e o Ministério das Finanças recusaram entregá-la à comissão parlamentar de inquérito que investigou as causas de recapitalização do banco. Mas há um conjunto de grandes devedores com empréstimos em risco que são públicos. No ano passado até foi divulgada uma lista de 11 investidores que estariam nessa situação, no verão de 2015, que nunca foi desmentida. Alguns destes casos têm vindo a público, com números, nos processos de recuperação e insolvência que entraram no sistema judicial.

Entre os maiores devedores de risco da CGD, há sociedades que foram declaradas insolventes e que se encontram em processo de liquidação. Só nos últimos dois meses, aconteceram três casos, todos com sotaque espanhol. Dois em Portugal — a Artlant (fábrica da ex-La Seda em Sines) e a Acuinova (unidade de aquacultura da Pescanova em Mira), declaradas insolventes em julho — e um em Espanha — a sociedade imobiliária Reyal Urbis que foi para liquidação em junho.

Juntam-se a outras duas grandes devedoras da Caixa que já estavam em processo de liquidação, a Finpro e várias sociedades do Grupo Espírito Santo. No ranking das maiores dores de cabeça no crédito concedido, há ainda, pelo menos, quatro sociedades que não estão a pagar todos os empréstimos ao banco do Estado, encontrando-se em situação de incumprimento.

A Soares da Costa — viu o PER (Processo Especial de Revitalização) recusado pelo juiz, estando agora a preparar um novo plano. Duas concessionárias de autoestradas estão em incumprimento com os bancos financiadores e a sociedade gestora do resort de Vale do Lobo também tem crédito vencido.

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As perdas estão quase todas reconhecidas. Ao longo do último ano, a Caixa Geral de Depósitos reforçou substancialmente as imparidades, sobretudo com a chegada à administração de António Domingues. Foi para cobrir as perdas provocadas pela limpeza de maus créditos que foi necessária uma recapitalização tão generosa.

Essa foi, também, a principal razão para a apresentação de prejuízos históricos em 2016 no valor de 1.859 milhões de euros. Está já aqui incluída grande parte dos prejuízos que a Caixa teve de encaixar com a insolvência e incumprimento de grandes devedores. Só as empresas em liquidação, a que se somam a Soares da Costa, que só será viabilizada à custa de um grande perdão de dívida, terão custado 1.400 milhões de euros em perdas de crédito.

O Observador sabe que os casos mais problemáticos foram provisionados quase na totalidade, pelo que o banco público não terá perdas adicionais com estas operações, apesar das falências conhecidas nos últimos dias. Isso mesmo foi afirmado pelo deputado socialista João Galamba, em reação a notícias sobre o impacto negativo das insolvências das unidades da La Seda e da Pescanova.

Mas isto não significa que as perdas não tenham acontecido, no passado ou até no presente. Ainda no primeiro semestre, a Caixa registou mais 300 milhões de euros em imparidades de crédito líquidas.

A comissão parlamentar de inquérito ao banco pediu a lista dos 100 maiores créditos, data de concessão e informação sobre reestruturações e/ou renegociações, bem como o nível de cumprimento, mas a sua entrega foi recusada em nome do sigilo bancário e segredo de supervisão. O relatório que não chegou a ser aprovado, apresentado pelo socialista Carlos Pereira, limitou-se a questionar o racional económico de operações como a La Seda e Vale do Lobo. Entretanto, o caso chegou à justiça.

A audição a Armando Vara foi uma das mais aguardadas na comissão de inquérito à Caixa

MIGUEL A. LOPES/LUSA

O Ministério Público está a investigar suspeitas de ocultação de passivo na concessão de créditos da Caixa, sobretudo a partir de 2007. Na mira estão decisões dos órgãos de gestão do banco em várias áreas que são passíveis de configurar o crime de gestão danosa. O inquérito visa os grandes devedores do banco que obrigaram ao registo de imparidades de 1.401 milhões de euros, refere o acórdão do Tribunal da Relação que dá ordem ao Banco de Portugal para entregar documentos ao Ministério Público”.

“Os elementos já reunidos sustentam a suspeita de que a CGD foi confrontada com a necessidade de proceder ao registo de imparidades (desvalorização de ativos) que tiveram em grande parte origem na concessão de crédito, com violação de normas de racionalidade de gestão, nomeadamente no que tange à prestação de garantias, ou outras perdas, sobretudo na área do investimento.”

O MP assinala que as condições destes contratos foram alteradas várias vezes, nomeadamente no que toca a garantias. Denuncia a omissão de alguns registos de incumprimento, como triggers (gatilhos) de imparidades. E diz que foram detetados clientes com operações vencidas que estavam classificados como créditos sem incumprimento.

"Os elementos já reunidos sustentam a suspeita de que a CGD foi confrontada com a necessidade de proceder ao registo de imparidades (desvalorização de ativos) que tiveram em grande parte origem na concessão de crédito, com violação de normas de racionalidade de gestão, nomeadamente no que tange à prestação de garantias, ou outras perdas, sobretudo na área do investimento."

Algumas destas operações estarão relacionadas com os casos mais bicudos que são do domínio público. A lista divulgada em junho do ano passado pelo jornal Correio da Manhã tinha por base um relatório da comissão de auditoria interna da Caixa, entregue ainda ao Governo liderado por Pedro Passos Coelho, em agosto de 2015.

Este relatório chegou a ser entregue aos deputados da comissão de inquérito, mas de tal forma rasurado que não permitia identificar os clientes do crédito da Caixa. Apesar das cautelas, os devedores, a exposição da Caixa e as imparidades (perdas reconhecidas em balanço) foram notícia, amplamente reproduzida por outros órgãos de comunicação social.

Caixa tem 2,3 mil milhões de euros em risco. Quem deve mais?

Pescanova Portugal e Brisal na lista de devedores da Caixa

A lista de grandes créditos em risco divulgada em 2016:

  1. Artlant (fábrica da La Seda em Sines) — empréstimos de 476,4 milhões de euros — imparidades de 214 milhões de euros
  2. Efacec (Grupo de engenharia detido pelo Grupo Mello e Têxtil Manuel Gonçalves que vendeu principal empresa a Isabel dos Santos) — empréstimos de 303 milhões de euros — imparidades de 15,2 milhões de euros.
  3. Vale do Lobo (resort de luxo no Algarve) — empréstimos de 282,9 milhões de euros — imparidades de 138 milhões de euros.
  4. Autoestradas Douro Litoral (concessionária da autoestrada no Grande Porto) — empréstimos de 271,3 milhões de euros — imparidades de 181,4 milhões de euros.
  5. Grupo Espírito Santo (várias empresas não financeiras do GES) — empréstimos de 237 milhões de euros — imparidades de 79 milhões de euros.
  6. Grupo Lena (construtora, turismo, concessões) — empréstimos de 225 milhões de euros — imparidades de 76,7 milhões de euros.
  7. António Mosquito (investidor angolano com dois grandes investimentos em Portugal — a Soares da Costa e a Global Media, dona da TSF e DN e JN) — empréstimos de 178 milhões de euros — 49,2 milhões de imparidades.
  8. Reyal Rubis (imobiliária espanhola) — empréstimos de 166,6 milhões de euros — imparidades de 133 milhões de euros.
  9. Finpro (sociedade de investimentos em infraestruturas) — empréstimos de 123,9 milhões de euros — 24,8 milhões de imparidades.
  10. Brisal (concessionária da autoestrada A17) — Empréstimo de 37,9 milhões — imparidades de 22,7 milhões de euros.
  11. Acuinova (fábrica da Pescanova em Mira) — Empréstimo de 37,9 milhões de euros — imparidades de 22,7 milhões de euros.

Esta lista de créditos em risco representava empréstimos de 2,4 mil milhões de euros para imparidades de mais de 1.038 milhões de euros, em números que seriam de 2015. O Observador foi avaliar a evolução de cada um destes grandes devedores, através da consulta de documentos públicos, entre os quais processos que constam no portal da justiça, o Citius, e os relatórios e contas mais recentes disponíveis.

La Seda/Fábrica de Sines

A fábrica lançada pelo grupo espanhol La Seda em Portugal era o maior devedor da CGD. O apoio financeiro foi dado ao grupo químico catalão, falido, e à fábrica de Sines, declarada insolvente no final do mês. Mas a exposição da Caixa está reduzida a zero, garantiu Paulo Macedo durante a apresentação dos resultado semestrais.

A fábrica da Artlant iniciou a produção em 2012

A relação com o grupo químico La Seda começou há mais de dez anos. A CGD acompanhou o investimento de grupos portugueses na empresa catalã com a intenção de trazer um projeto fabril para Portugal que veio a ser classificado como PIN (potencial interesse nacional) durante o Governo de José Sócrates, em 2007.

A Caixa foi financiadora e tornou-se acionista da própria La Seda. Acabou por ficar também com uma participação na empresa portuguesa criada para a construção da fábrica em 2010, tendo sido igualmente a grande financiadora do investimento de 400 milhões de euros feito em Sines. A principal cliente da fábrica de PTA, a matéria prima plástica usada para vários artigos, a própria La Seda, acabou por fechar as portas, deixando a unidade sem clientes suficientes.

A Artlant foi para recuperação judicial e o PER foi aprovado em 2015. Na altura, foram reclamados créditos de 690 milhões de euros. A fatia de leão, de 520,6 milhões de euros, pertencia à Caixa. No rol dos credores estava ainda a agência para o investimento, a AICEP, com um financiamento a fundo perdido de 33 milhões de euros.

O acordo que viabilizou a unidade de Sines assentou num perdão da dívida de 189,5 milhões de euros, diz o relatório e contas de 2015 da Artlant consultado pelo Observador. Apesar do PER e da redução do número de trabalhadores, a Artlant acabou por ser declarada insolvente em julho, a pedido de um credor, a Sociedade de Montagens Metalomecânicas.

Para além da Caixa e da AICEP, outros credores são a Mediterrean Shipping Company e a Águas de Santo André. A estratégia para limitar perdas passa por encontrar um novo investidor que fique com a unidade de Sines, no entanto, desde 2009 que a Caixa procura um parceiro estratégico do setor químico para este projeto.

Grupo Efacec

A exposição à Efacec, em cerca de 300 milhões de euros, era anterior à venda do seu principal ativo, a Efacec Power Solutions, a Isabel dos Santos. A transação realizado em 2015 permitiu reestruturar o grupo até então controlado pela José de Mello e pela Têxtil Manuel Gonçalves. E foi uma das condições negociadas com os bancos financiadores, onde se destacava a Caixa Geral de Depósitos.

Negócio protagonizado por Isabel dos Santos permitiu a reestruturação do grupo Efacec

Antes da venda, o grupo Efacec enfrentava uma dívida bancária superior a 400 milhões de euros e tinha já entrado em incumprimento em algumas operações, revela uma reserva do auditor às contas de 2014 da Efacec Capital que era então a detentora dos ativos do grupo português de engenharia. No relatório consultado pelo Observador, a PwC revelava a existência de incumprimentos de rácios financeiros em alguns contratos de crédito que resultaram numa sobreavaliação do passivo não corrente e subvaliação do passivo corrente de 281 milhões de euros.

A análise às contas de 2014, alertava que a “incerteza quanto à capacidade do grupo solver os seus compromissos está dependente da negociação da isenção de cumprimento dos rácios económicos e financeiros com as instituições bancárias, na sequência do acordo para a alienação da Efacec Power Solutons”.

A venda de uma posição de 66% da principal empresa à empresária angolana, filha de José Eduardo dos Santos, permitiu levar para a frente a reestruturação financeira da Efacec, gerando um encaixe da ordem dos 200 milhões de euros que terá servido para pagar dívida. O efeito é visível nas contas de 2015 da empresa de investidores portugueses que ficou com 27,4% da Efacec Power Solutions. O relatório da MGI Capital, sucessora da Efacec Capital, aponta para um lucro da ordem dos 100 milhões de euros, graças à mais-valia obtida na venda da principal empresa, e um passivo bancário de 129 milhões de euros.

Vale do Lobo

É um dos projetos mais polémicos financiados pela Caixa Geral de Depósitos, talvez porque combina luxo (um resort em Vilamoura), política (Armando Vara terá sido o decisor na Caixa) e justiça (é um dos inquéritos da operação Marquês). A sociedade gestora está a operar e, não obstante os elevados prejuízos já reconhecidos pela Caixa, existem garantias reais (a hipoteca sobre imóveis e terrenos) que têm valor no mercado.

https://observador.pt/2017/03/22/armando-vara-responde-sobre-creditos-polemicos-na-caixa/

Apesar destas garantias e da convicção manifestada pelo antigo administrador, Armando Vara, de que a Caixa não irá perder dinheiro com Vale do Lobo, a realidade dos números desmente-o, pelo menos para já.

O relatório e contas de 2016, consultado pelo Observador, mostra uma sociedade com capital próprio negativo de 158 milhões de euros (em falência técnica), — empréstimos bancários de 450 milhões de euros por pagar e dívidas ao fiscoVale do Lobo até aderiu ao PERES (Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado).

Uma das residências do resort de luxo, situado em Vilamoura

Photography by Fernando Guerra

A Caixa é de longe o maior perdedor neste negócio onde meteu dinheiro na dupla qualidade de acionista, através da Wolfpart que adquiriu 25% da sociedade gestora em 2006, e financiadora. As contas do ano passado de Vale do Lobo indicam que os financiamentos atribuídos pela Caixa totalizavam 320,5 milhões de euros, divididos por mais de dez empréstimos, concedidos, renovados ou até reestruturados entre 2006 e 2010, que estão vencidos e em incumprimento. Há também créditos do BCP e do Montepio.

O auditor, a Deloitte, levanta várias reservas às contas e contabiliza um passivo bancário de 450 milhões de euros, incluindo juros por pagar. Os resultados operacionais da atividade — que é sobretudo venda de imóveis e exploração de campos de golfe — até são positivos, apesar dos prejuízos de 14,5 milhões de euros.

Autoestradas Douro Litoral

É mais um grande devedor que está em incumprimento com os bancos. A Caixa faz parte do sindicato bancário que financiou esta concessão rodoviária, onde a Brisa é a maior acionista (45%) e na qual participam as construtoras Teixeira Duarte, Alves Ribeiro, Tâmega e Zagope (Andrade Gutierrez).

Circular regional externa do Porto

Fernando Pereira / Global Imagens

O concurso foi lançado em 2004, ainda no tempo de Durão Barroso, e adjudicado no primeiro Governo de Sócrates. A concessão envolveu a construção de 76 quilómetros, divididos pela a A41 (circular regional exterior do Porto, ou CREP), A32 e A43.

É uma concessão clássica de autoestrada, financiada com crédito e paga por portagens onde o risco é todo privado. Mas os privados cedo avançaram com um pedido de indemnização milionário de 1.350 milhões de euros contra o Estado por causa do impacto das portagens nas Scut e por alterações no traçado.

O tribunal arbitral condenou, já este ano, o Estado a pagar 218 milhões de euros até 2034. Este valor, muito abaixo do pedido, não fará uma diferença substancial no desequilíbrio da concessão que há vários anos não cumpre as condições do contrato de financiamento feito com os bancos, essencialmente porque o tráfego ficou sempre muito abaixo do previsto. As contas da concessionária de 2016 revelam um capital próprio negativo de 1.265 milhões de euros e prejuízos acumulados de 1.525 milhões de euros, que traduzem as consequências do incumprimento financeiro.

O projeto envolveu capitais alheios de 850 milhões de euros, dos quais a maior fatia coube ao BEI (Banco Europeu de Investimentos) que entrou com 500 milhões de euros. O BEI exige que os seus empréstimos tenham uma garantia bancária assegurada por bancos comerciais que é executada quando o financiado entra em incumprimento. Esta condição agrava as perdas dos bancos envolvidos no financiamento, como a Caixa, que terá uma exposição superior a 200 milhões de euros, o BCP e o Santander Totta.

Grupo Espírito Santo

A Caixa Geral de Depósitos é credora de várias sociedades do Grupo Espírito Santo que foram declaradas insolventes desde o colapso do grupo e do banco em 2014. Um levantamento feito pelo Observador aos processos que corriam apenas nos tribunais portugueses em 2015, apontava para reclamações de crédito por parte do banco público de mais de 400 milhões de euros.

GES deixa rasto de 1.300 milhões de dívidas em Portugal. Caixa é o maior credor

O banco público surgia como o maior credor do GES em Portugal, uma posição que estaria em linha com a quota de mercado do banco no mercado nacional. No entanto, os valores exigidos nestes processos divulgados no portal da justiça deverão ficar aquém do total. As maiores insolvências — sobretudo das holdings Espírito Santo Internacional e Rioforte — correram no Luxemburgo e não se conhece a lista dos credores.

Colapso do BES e GES obrigou à venda da Herdade da Comporta

© Hugo Amaral

No caso da Caixa, sabe-se que parte dos financiamentos, um pouco mais de cem milhões de euros, estava garantida pelos terrenos da Herdade da Comporta Fundo de Investimento Imobiliário, o que dava ao banco do Estado uma palavra decisiva na venda deste ativo. A alienação da Herdade da Comporta, controlada pela Rioforte, chegou a estar suspensa por ordem do tribunal. O negócio acabou por se fazer já este ano com o empresário Pedro Almeida que assumiu a dívida de 110 milhões de euros à Caixa.

Mas nem todos os financiamentos tinham garantias tão sólidas como os terrenos da Comporta. A Caixa chegou a financiar a Espírito Santo Irmãos em troca de um colateral constituído por ações da Espírito Santo Financial Group, que perderam todo o valor quando a holding acionista do BES foi suspensa na bolsa para acabar na insolvência.

Grupo Lena

A exposição do banco do Estado ao Grupo Lena ultrapassaria os 200 milhões de euros em 2015. Boa parte do valor, sabe o Observador, não resulta de empréstimos concedidos à Construtora do Lena, mas a financiamentos e garantias bancárias executadas no quadro de contratos de parcerias publico-privadas (PPP). A construtora do Lena é acionista de várias concessões, incluindo a Brisal, que está em incumprimento.

O Observador analisou o relatório de contas consolidadas da holding Lena SGPS, de 2015, que aponta para financiamentos bancários de 634 milhões de euros, sem revelar a que bancos, e reconhece a existência de prestações vencidas em algumas operações. É referido, por exemplo, um crédito vencido de 10,5 milhões de euros, em relação à qual estavam a decorrer negociações com as instituições bancárias para resolver o incumprimento. Em 2015, a holding do grupo Lena teve prejuízos de 4,5 milhões de euros depois de ter registado lucros de 18,7 milhões de euros no ano anterior.

Encontro entre o presidente da Lena, à esquerda, e o então primeiro-ministro, José Socrates, em 2010

PAULO CUNHA/LUSA

Com o foco na construção, e uma grande diversificação setorial (do turismo aos media) e geográfica, o grupo com sede em Leiria até estava a sobreviver num dos setores mais sacrificados na crise. Mas a associação ao caso Sócrates e à Operação Marquês, abalaram a imagem do Grupo Lena. A investigação do Ministério Público aponta para suspeitas de corrupção e pagamentos feitos pela empresa em troca de contratos. Vários altos responsáveis, incluído o presidente, foram constituídos arguidos.

O presidente executivo, Joaquim Paulo da Conceição, já admitiu em comunicado os danos de reputação, a “qual tem sido injustificada, cruel e despudoradamente lançada na lama, a troco de nada, num processo para o qual se sente arrastado circunstancialmente sem nada ter feito para tal”. E assume que esta situação coloca em causa a “sobrevivência e a manutenção” dos mais de 10 mil postos de trabalho a nível mundial.

Mas não é só a Operação Marquês. O grupo Lena tinha ganho contratos importantes na Venezuela, negociados durante as viagens do primeiro-ministro, José Sócrates, que o país dificilmente terá capacidade de cumprir. E detinha uma importante presença em Angola, abalada pela crise económica e pela desvalorização do petróleo. No mercado doméstico foi feita uma reestruturação dos negócios com a venda de vários ativos e o encerramento de outros. A Lena Hotéis e Turismo está em PER (Processo Especial de Revitalização).

António Mosquito

O empresário angolano tem sido associado a investimentos importantes em duas empresas em Portugal, ainda que também seja apontado como intermediário de outros interesses económicos. A exposição da Caixa a António Mosquito estará relacionada sobretudo com créditos concedidos às empresas onde comprou participações, a construtora Soares da Costa e a Global Media (antiga Controlinveste que detém a TSF, o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias).

No caso da Global Media, a Caixa está longe de ser o maior financiador e nem sequer entrou no processo de execução das ações detidas por Joaquim Oliveira que transformou o BCP e o Novo Banco em acionistas da empresa onde estão também António Mosquito e Luís Montez.

Há mais de um ano que a Soares da Costa está em processo de revitalização com salários em atraso

JOSÉ COELHO/LUSA

A exposição aos investimentos de António Mosquito estará concentrada na Soares da Costa, empresa com forte presença em Angola. A construtora entrou no PER (Processo Especial de Revitalização) em 2016 e não está a pagar aos credores. O PER chegou a ser aprovado pela maioria dos votos dos credores, graças a uma ampla participação dos trabalhadores, e apesar do voto negativo do maior credor, precisamente a Caixa Geral de Depósitos. O banco do Estado reclamou 165 milhões de euros e votou contra a proposta que previa um perdão de 75% da dívida à banca.

O plano de recuperação da Soares da Costa acabou por cair, devido à recusa do juiz na sua homologação e a empresa está a preparar a apresentação de um novo PER com segundo processo de levantamento de créditos. Não se sabe ainda como irá o banco público votar.

Juiz trava processo de recuperação da construtora Soares da Costa

Há, entretanto, notícias de que a posição de António Mosquito seria comprada pelos gestores portugueses da empresa, apoiados por investidores nacionais.

Reyal Urbis

Foi um dos maiores grupos imobiliários de Espanha, liderado por Rafael Santamaria, e protagonizou o segundo maior processo de falência que durou quatro anos a chegar a um desfecho. Em junho deste ano, os credores, com o Estado espanhol à cabeça, recusaram uma proposta que previa perdões entre 80% e 90% da dívida que totaliza mais de 4.600 milhões de euros.

Em 2013, a Reyal Urbis pediu a proteção judicial de credores, tendo suspendido os pagamentos. A crise económica e financeira, bem como a recessão que atacou em força o setor imobiliário espanhol, são as razões apontadas para a queda da empresa que chegou a ter uma presença importante em Portugal.

A crise no mercado imobiliário espanhol deixou um rasto de grandes falências com perdas avultadas para a banca

O maior credor é a Sareb, o veículo público espanhol que ficou com os créditos tóxicos das caixas regionais. Seguia-se o Santander, que ficou a arder em 500 milhões de euros, um fundo privado e o fisco espanhol. A exposição da CGD surge por via do banco em Espanha, a Caixa Geral, e estava integrada num sindicato bancário que envolve ainda a FMS e o EuroHypo. Em 2013, o valor total deste financiamento era de 300 milhões de euros, segundo a imprensa espanhola.

Este crédito terá resultado da estratégia comercial agressiva que o banco português assumiu em Espanha e que levou ao envolvimento do grupo Caixa em projetos de infraestruturas, imobiliário e parcerias público-privadas que acabaram por provocar perdas. Informação não confirmada sinaliza que a Caixa poderá ter vendido o seu crédito, que em 2015 estava contabilizado em 167 milhões de euros, a terceiros. Ainda que o tenha feito, terá sido sempre com um desconto muito significativo face ao valor inicial.

Finpro

Esta sociedade criada no final do século passado tem uma história singular, contada aqui pelo Jornal de Negócios. A Finpro foi uma sociedade de investimentos que nasceu com um leque de acionistas de luxo, pelo menos para padrões do final de século. Américo Amorim, Horácio Roque e o Banif, vários fundos de pensões de entidades públicas (cujas participações foram parar à Caixa) e o Fundo de Capitalização da Segurança Social que colocou esta participação na sua reserva estratégica, ao lado de ações da Portugal Telecom.

Amorim foi um dos acionistas da Finpro

ANTONIO SILVA/LUSA

A empresa fez várias aquisições internacionais, sobretudo na área das infraestruturas, desde as águas ao lixo, passando por portos, aeroportos e autoestradas, negócios alavancados em dívida. E aqui a história repete-se. A crise financeira, o fim do crédito barato e a desvalorização dos ativos, levaram a Finpro ao fundo. E nem acionistas poderosos, como o homem mais rico de Portugal e o Estado português, conseguiram impedir o pior desfecho, a liquidação, decretada em 2015. A Caixa foi um dos maiores perdedores, como acionista e financiadora.

Os credores ainda aprovaram um primeiro plano de recuperação em 2014 que apostava na venda dos ativos mais valiosos (as participações em concessionárias internacionais), mas a empresa não conseguiu realizar as alienações previstas e voltou ao PER (Processo Especial de Revitalização).

No último PER, os credores escolheram a falência depois de um primeiro plano aprovado ter entrado em incumprimento. Em causa estavam créditos de 260 milhões de euros. A Caixa era dona de mais de metade, mais de 130 milhões de euros.

Brisal, a concessionária da A17

A concessão Litoral Centro foi decidida em 2004, com António Mexia nas Obras Públicas e Bagão Félix nas Finanças. O projeto de 600 milhões de euros foi adjudicado a um consórcio liderado pela Brisa, que incluía o Grupo Lena, a Somague, MSF e Novopca, e envolveu a construção de uma autoestrada com 117 quilómetros, quase paralela à A1, que ligava a A8 a partir de Leiria/Marinha Grande a Aveiro.

A concessionária da A17 falhou reembolsos aos bancos e BEI executou garantias bancárias

Tony Dias/Global Imagens

Era uma obra feita em projet finance, um modelo em que os acionistas colocam muito pouco capital e contam com as receitas futuras para reembolsar os empréstimos de longo prazo. O BEI entrou com 263,8 milhões de euros e outros 262,7 milhões de euros foram avançados por um sindicato bancário, onde está a Caixa. A Brisal entrou em incumprimento e em dezembro de 2013 o BEI acionou junto dos bancos comerciais as garantias bancárias associadas, no valor de 290 milhões de euros.

No final do ano passado, de acordo com o relatório e contas de 2016, estavam vencidas parcelas do reembolso correspondentes a 320 milhões de euros, acrescidas de juros e comissões de 82,4 milhões de euros. A Brisal ainda devia dinheiro ao BEI, mas o grosso da dívida por pagar era à banca comercial. Este ano estavam a ser finalizadas com os bancos as “condições de financiamento que permitirão a reestruturação financeira da concessionária, com vista à sua sustentabilidade e à continuidade das operações”.

A introdução de portagens nas vias Scut, que alimentavam de tráfego a A17, foi um dos argumentos para apresentar um pedido de reequilíbrio ao Estado de mil milhões de euros. A decisão, conhecida em 2015, determinou uma indemnização muito mais baixa, cerca de 150 milhões de euros.

Foi demasiado pouco e demasiado tarde para fazer a diferença. A perda de tráfego por causa da cobrança das Scut é apenas parte de um problema maior que envolve projeções de procura demasiado otimistas, a crise económica e um tráfego muito abaixo do previsto. O último troço da A17 abriu ao tráfego em 2008 e até 2016 a concessionária acumulou prejuízos de 751 milhões de euros e

Pescanova/Fábrica de Mira

Pescanova perdeu o controlo da fábrica de Mira para os bancos que a financiaram. Unidade portuguesa em liquidação

AFP/Getty Images

A construção de uma fábrica para criar rodovalho em Mira foi um dos investimentos estrangeiros emblemáticos do Governo de José Sócrates. A Acuinova foi um projeto PIN (potencial interesse nacional) e teve direito a incentivos fiscais. O contrato assinado entre a empresa espanhola líder do mercado de congelados, e o Governo português, em 2007, previa um investimento de 135 milhões de euros e a criação de 200 postos de trabalho. O projeto foi financiado por um sindicato bancário com a Caixa Geral de Depósitos, Novo Banco, BCP e BPI.

Em 2013 é descoberta dívida oculta nas contas da Pescanova, obrigando a empresa espanhola a negociar a reestruturação da dívida. Durante este processo ficou a saber-se que nem todos os investimentos internacionais, como o projeto de Mira, tinham viabilidade. Falou-se da venda da fábrica em Portugal, mas a transação teria de ser viabilizada pelos bancos financiadores da Acuinova que tinham um penhor sobre as ações da empresa portuguesa.

Este ano, três desses bancos — Caixa, BCP e Novo Banco — executaram o penhor e venderam a sua posição na empresa ao fundo Oxycapital, especializado em recuperação de empresas. A Acuinova, ainda detida pela Nueva Pescanova, tinha já recorrido ao Processo Especial de Revitalização (PER) para reestruturar dívidas de 166 milhões de euros, mas o juiz recusou homologar o plano e no final do de julho a empresa foi declarada insolvente.

O grupo Caixa reclamou 31 milhões de euros, um valor aproximado ao dos outros bancos. Esse crédito terá sido vendido entretanto ao tal fundo, mas com um grande desconto.

Não estava na lista, mas é problemático. O caso Berardo

O conjunto de devedores divulgado em junho de 2016 não contemplava todos os créditos problemáticos do banco. É notória a ausência de um caso público, que foi notícia recentemente, e que se refere aos empréstimos concedidos a Joe Berardo para comprar ações do BCP. A Caixa é um dos principais credores num financiamento que hoje rondará os 500 milhões de euros — já foram mil milhões de euros. E é um dos bancos que está a tentar executar a penhora sobre a fundação proprietária da coleção Joe Berardo, um processo que está a enfrentar dificuldades, conforme noticiou o jornal Público.

CGD, BCP e Novo Banco deram ordem para executar penhora à coleção Berardo

Joe Berardo já tinha feito um acordo de reestruturação da dívida com o BCP, Caixa e Novo Banco em 2009, do qual resultou o reforço de garantias com a entrega dos direitos sobre 75% da fundação que detinha a coleção de arte moderna que está no Centro Cultural de Belém.

Perante novo incumprimento do empresário, os bancos terão tentando executar, mas o processo não é juridicamente claro por causa do acordo feito entre Joe Berardo e o Estado para a exibição das obras no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Neste acordo, válido por dez anos, foi garantido ao Estado que não existia nenhuma penhora sobre as obras, o que dificulta a execução por parte dos bancos. A Caixa terá 40% deste crédito.

Nem só de nomes conhecidos e de grandes empresas é feita a história dos buracos na carteira de créditos da Caixa Geral de Depósitos. Há pouco tempo, o Jornal de Negócios noticiava a insolvência de uma imobiliária, responsável por um empreendimento na Quinta do Lago. O banco público reclamava a quase totalidade dos créditos que foram conhecidos no PER, no valor de 278 milhões de euros.

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