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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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A melhor versão de Von der Leyen puxa dos galões da reeleição para ganhar poder

Ursula von der Leyen vai voltar a pedir dois nomes para comissários nas cartas que mandar aos líderes europeus, incluindo Montenegro. Grande coligação europeísta (e Costa) respiram de alívio.

A Europa são 27, ou 720, a uma mesa e, no fim, ganha a Alemanha. A reeleição de Ursula von der Leyen esteve verdadeiramente tremida, mas a atual e futura presidente da Comissão Europeia não só conseguiu ser reeleita como passou a maioria absoluta por 41 votos, aumentando os escassos oito votos de vantagem que tinha conseguido cinco anos antes. A não-eleição teria sido um autêntico terramoto político que até podia colocar em risco, por exemplo, a já aparentemente fechada eleição de António Costa para a presidência do Conselho Europeu.  O resultado resume-se numa mensagem enviada ao Observador quando foi conhecida a votação por uma fonte do PPE: “Ufa”.

Ursula von der Leyen precisava de 361 e conseguiu 401 votos a favor, o que à partida podia criar a ilusão matemática de que os eurodeputados das três famílias políticas que assinaram o acordo dos top jobs (PPE, S&D e Renew) tinham votado todos de forma disciplinada nela. Embora o voto seja secreto, não é bem assim: terá havido nas três bancadas quem não tenha votado em Von der Leyen e alguns até o assumiram. Quem verdadeiramente salvou a eleição terão sido os 45 deputados do grupo dos Verdes.

Depois de tanto namoro com Georgia Meloni, os números mostram (e foi assumido pelos próprios conservadores) que o ECR não deu um contributo — caso contrário a votação seria ainda mais expressiva. Mas também mostram outra coisa: se Von der Leyen não tivesse o apoio dos Verdes (sobre o qual, logo na noite das Europeias, António Costa tinha falado) podia ter falhado a eleição. Contando que os Verdes contribuiram com 45 votos, sem estes a ex-ministra da Defesa alemã tinha ficado a quatro da maioria absoluta (que afinal não era o número mágico 361, mas sim nos 360 porque o deputado catalão Antoni Comín não tomou posse).

Os conservadores estão, no entanto, fora da cerca sanitária que Von der Leyen e a grande coligação europeísta definiu. Isolados dentro da cerca estão os Patriotas pela Europa — que são já o terceiro maior grupo e podem não ficar por aí — e o que resta do antigo ID, o Europa das Nações Soberanas. Só nestes dois grupos são fáceis de encontrar 109 dos 284 votos contra. No próprio PPE, os críticos do partido Republicanos terão votado a favor, mas nunca se saberá, precisamente, porque o voto é secreto.

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Um programa de prós: pró-Europa, pró-Estado de Direito e pró-Ucrânia

Ursula von der Leyen tinha feito um discurso em que defendeu o apoio incondicional à Europa. A presidente da Comissão Europeia diz que a UE “não pode controlar os populistas e ditadores à sua volta, mas pode escolher proteger a sua democracia” e que “não pode determinar o resultado das eleições em todo o mundo, mas pode escolher investir na Segurança e Defesa do Continente”.

Von der Leyen diz que a Europa “tem de investir mais em Segurança e Defesa” e que o regime de Putin está “à espera que a Europa perca força”, lamentando que alguém de dentro esteja a contribuir para isso. “Há duas semanas um primeiro-ministro da UE foi a Moscovo numa chamada missão de paz, que é uma missão apenas de apaziguamento”. Dois dias depois, lembra, “Putin atacou um hospital pediátrico” e “esse ataque não foi um erro, foi uma mensagem”. Von der Leyen diz que “ninguém quer mais a paz que a Ucrânia” e garante “dar todo o apoio à Ucrânia pelo tempo que for necessário. Na sequência da defesa do investimento em Defesa, Von der Leyen defendeu criação de “escudo aéreo europeu” e apelou a que os países invistam “por mercado único de Defesa”.

A antiga ministra da Defesa alemã deixa ainda um sinal claro sobre a cerca sanitária à direita radical e extrema-direita, ao dizer que só está disponível para negociar com as “forças democráticas do Parlamento Europeu”. Num claro novo aviso a Orbán (agora que a Polónia já é da sua família política), Von der Leyen disse que “o respeito pelo Estado de Direito será uma obrigação para a obtenção os fundos da UE. Neste orçamento e no futuro haverá o mecanismo de condicionalidade. Não é negociável.”

Num claro piscar de olho aos socialistas, Von der Leyen elevou a habitação a problema europeu, ao dizer que “a Europa enfrenta uma crise imobiliária, que afeta pessoas de todas as idades” Para responder ao problema, a candidata a presidente da Comissão Europeia promete que “pela primeira vez” vai “nomear um Comissário com responsabilidade direta pela habitação.” Sabendo que enfrentará resistência no próprio PPE, presidente da comissão diz que “normalmente, a habitação não é vista como uma questão europeia” e que “alguns poderão dizer que não se deve envolver”, mas é preciso “apoiar pessoas onde é mais importante.”

E se voltou a comprometer-se com o Pacto Ecológico para a aproximação aos Verdes, Von der Leyen também se aproximou de uma das prioridades da esquerda (The Left) ao dizer que “a Europa tem uma responsabilidade relativamente à sua segurança, particularmente no Médio Oriente”. A candidata a presidente da Comissão Europeia diz mesmo: “Quero ser muito clara: o derramamento de sangue em Gaza tem de parar agora”. “Demasiadas crianças, mulheres e civis perderam as suas vidas como resultado da resposta de Israel ao brutal terror do Hamas”, afirmou. Destacando que “o povo de Gaza não pode suportar mais” a guerra, Von der Leyen apelou a uma “resposta imediata” que inclua a “libertação dos reféns israelitas” e a preparação do “dia seguinte” na Faixa de Gaza.

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Ursula von der Leyen já começou a trabalhar (e enviará carta a Montenegro)

Von der Leyen comunicou também que vai já começar a trabalhar na nova equipa de comissários. E revelou que vai “escrever uma carta aos países para que indiquem um homem e de uma mulher como candidatos”, medida que irritou alguns Estados-membros em 2019 e que agora promete voltar a não ser pacífica. A exceção à política de dois nomes, avisa já, são os comissário que vão ser reconduzidos e já estavam na primeira Comissão Von der Leyen.

O colégio tem 27 comissários (uma espécie de ministros da UE) e cada país tem um. O da Alemanha é Ursula von der Leyen, o da Estónia será Kaja Kallas (a Alta Representante para a Política Externa é, no fundo, o comissário com a pasta dos Negócios Estrangeiros). Os outros supostamente estão em aberto. No entanto países como Eslováquia, Eslovénia, Filândia, Irlanda e Letónia já indicaram os candidatos. Itália, através de Georgia Meloni, já avisou que quer uma pasta forte, falando-se de uma pasta económica. Caso avance com a ideia de criar um comissário para a Defesa, o Leste é incontornável e o ministro dos Negócios Estrangeiros polaco está bem posicionado.

Von der Leyen vai querer ter uma comissão paritária e tem de fazer um equilíbrio geográfico e político. Os socialistas querem ter mais comissários do que têm chefes de Governo, o que será um problema, já que nenhum país PPE abdicará de indicar um dos seus para um dos cargos europeus mais apetecíveis. A indicação é dos Estados-membros, mas Ursula von der Leyen reforça os seus poderes ao exigir dois nomes. E ao sair reforçada da eleição não quererá perder influência.

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Portugal estará, aparentemente, na expectativa de não ter uma grande pasta — uma vez que António Costa ficou com a presidência do Conselho Europeu. Tudo está relacioA relação entre Ursula e Montenegro é boa, mas isso conta pouco. Os nomes que vão circulando em Bruxelas são os importados dos bastidores do PSD em Portugal: Maria Luís Albuquerque (muito ativa em conversas paralelas no último Conselho Nacional), Miguel Poiares Maduro (que tem a desvantagem de não ser próximo de Montenegro) e até há quem fale no ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, que adquiriu muita experiência europeia nos anos como eurodeputado.

O que é certo é que Von der Leyen, que disse, no discurso, que a Europa é a “Europa é a melhor versão da História”, tem também aqui a melhor versão da sua liderança à frente dos destinos de Bruxelas. Nunca esteve tão legitimidada (em termos de votação, porque há casos, como o das vacinas, que continuam a pairar como fantasmas) e está mais livre porque já não tem de agradar a ninguém a pensar na reeleição.

O Observador viajou a Estrasburgo convite do Parlamento Europeu.

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