Deputado do PSD, um dos homens mais influentes do aparelho social-democrata, embora discreto, e, agora, diretor de campanha de Jorge Moreira da Silva. Em entrevista ao Observador, no programa “Vichyssoise”, Carlos Eduardo Reis não deixa nada por dizer: o antigo ministro do Ambiente é o “único que é capaz de recuperar o PSD”; Carlos Moedas não faz, nem fará sombra (“até são da mesma altura”); e “Paulo Portas seria melhor candidato presidencial do que Luís Marques Mendes”.
Mas quando o assunto é Luís Montenegro a ordem é para atirar a doer: o antigo líder parlamentar, acusa Carlos Eduardo Reis, “sabotou” Rui Rio, esteve “três anos a preparar esta candidatura”, “não está preparado para liderar o PSD e governar o país”, teve medo de debater com Jorge Moreira da Silva e tem sido um poço de “contradições”. E promete luta até ao fim: “A candidatura de Montenegro preparava-se para uma entronização, mas isto é uma eleição. O que o passado recente nos mostrou é que ninguém é de ninguém e não há eleições ganhas à partida”.
Mesmo a terminar, desafiado, como é tradição, a escolher uma música e a explicar porquê, o social-democrata não resiste a fazer mais uma tirada e dedica a “Call Me Irresponsible”, pela voz de Tony Bennett, a Luís Montenegro.
“Não posso deixar de ligar esta música à falta de debate no PSD, à recusa de Luís Montenegro de debater com Jorge Moreira da Silva, porque isso enfraquece o partido, enfraquece o debate, dá um sinal errado às pessoas lá fora. Tomar os votos que o partido já teve ou tem como garantidos é o maior erro em política. Em última análise, diminui o próprio candidato. É uma irresponsabilidade.”
“Montenegro está a tentar levar o partido adormecido”
Apresentei-o como diretor de campanha, mas ocorre-me perguntar… qual campanha? Não me refiro em concreto à de Jorge Moreira da Silva, mas acha mesmo que as pessoas perceberam que há eleições?
Essa é a grande questão. Tínhamos dois desafios nesta campanha: começámos mais tarde e o primeiro desafio era dar a conhecer Jorge Moreira da Silva. Depois, tentar retirar o PSD deste sonambulismo político que advém de um conjunto de eleições que temos tido no último ano e meio e tem deixado a militância muito cansada. O panorama internacional também não deixa muita margem para a discussão de eleições internas. Temos a guerra na Ucrânia, o processo orçamental e tem sido um desafio tentar colocar a campanha onde ela deve estar: no centro do debate político.
Mas vê aí responsabilidade dos dois candidatos ou só de uma parte?
Da nossa não é, com certeza. Temos aceitado, até porque precisamos desse espaço, todos os convites para estar na comunicação social e junto dos militantes. Tentamos maximizar a agenda.
Luís Montenegro está a tentar levar isto como um passeio no parque, sem grandes chatices?
Está a tentar levar o partido adormecido. Quem não aceita debates depois de três anos e meio a dizer que Rui Rio era meigo com o PS, que havia pouco debate, tentando sempre remeter para a questão dos debates quinzenais como se fossem o alfa e o ómega da política portuguesa… É um pouco estranho, adorando debates, que não queira debater com Jorge Moreira da Silva.
“Montenegro não está preparado para governar o país”
Apesar de tudo, nos últimos dias houve uma pequena faísca entre os dois candidatos. Na quinta-feira, tivemos aqui, no Observador, Luís Montenegro a afirmar que a adesão de Moreira da Silva ao rioísmo tinha sido a “maior surpresa” da vida política dele. O Carlos Eduardo Reis é um homem do rioísmo, esteve com Rio nas últimas disputas. Diga-nos: como é que uma personalidade como Jorge Moreira da Silva, que foi crítico frontal de Rio, acaba apoiado pelo rioísmo?
Tenho muitas dúvidas desse apoio do rioísmo. Das figuras que estiveram próximas de Rio, dirigentes, não vejo assim tanta gente.
Sabemos que Salvador Malheiro está a ajudar na campanha, o próprio Carlos Eduardo Reis está a fazê-lo.
Rui Rio é mais do que eu e Salvador Malheiro. Não vejo essa colagem ao ríoismo.
Mas então onde é que o rioísmo está? Não estará com Luís Montenegro, certamente.
Rio ganhou várias eleições com o chamado voto livre. Posso responder-lhe a essa questão no dia 28. Em relação a essa surpresa de Montenegro, acho que já tem idade e percurso político para não se surpreender em política. Não me parece que Moreira da Silva, ao afirmar as suas convicções políticas, que em alguns momentos foram diferentes das de Rio, possa de alguma forma diminuir o facto de ter dito que votou em Rio na última eleição direta — votou no melhor candidato.
Portanto, não vê aí nenhuma incoerência.
Nenhuma. Nós somos sempre mais do que aquilo que apoiamos e não podemos ficar agarrados a tudo o que as pessoas que apoiamos dizem ou fazem. Quando Moreira da Silva diz que votou em Rio também se está a referir a um conjunto de pessoas que lhe garantiam uma confiança e um programa político.
Luís Montenegro, para quem não ouviu ou leu a entrevista no Observador, disse isto: “A adesão do meu estimadíssimo amigo à liderança de Rui Rio foi a maior surpresa dos últimos tempos, quiçá da minha vida política. Nem queria acreditar”?
Não está preparado para governar o país. Vai ter muitas surpresas no partido e no país. A minha maior surpresa foi Montenegro não querer debater com Moreira da Silva. Para quem foi um excelente parlamentar, que defendeu muito bem o partido durante tantos anos, é uma surpresa.
“A sabotagem de Montenegro não ajudou o partido”
A campanha de Moreira da Silva tem insistido muito na ideia de que Montenegro passou os últimos meses em telefonemas, jantares e arranjinhos.
Só meses?
Mas não é normal que um candidato à liderança o faça?
É normal que um candidato com vontade de liderar o partido tenha até um ato de humildade e pergunte aos militantes o que acham de si e do seu programa político. No tempo certo. Não acho que seja isso que Montenegro tenha feito. Não quero fulanizar, mas é inegável que os mandatos de Rio foram muito turbulentos por força do que foi acontecendo internamente. A candidatura de Montenegro preparava-se para uma entronização, mas isto é uma eleição.
Moreira da Silva e o Carlos Eduardo Reis, enquanto apoiante e diretor de campanha, também andam, presumimos, a jantar e a ligar para apoiantes. Qual é a diferença?
Conheço Moreira da Silva há muitos anos, mas comecei a conversar com ele há relativamente pouco tempo. Até nisso tenho essa desvantagem. Não tive três anos para fazer campanha. Quando andavam a escrever e a dizer que tínhamos dificuldades para arranjar assinaturas é um pouco estranho, porque não andámos a arranjar assinaturas há três anos — só há três semanas.
Montenegro esteve três anos a preparar esta candidatura?
O nosso companheiro Luís Montenegro já mostrou várias vezes que queria liderar o partido e tem insistido nessa tónica desde 2019. Não acho que isso tenha nenhum problema, a não ser que em determinado momento isso prejudique o partido.
Isso quer dizer que noutras alturas Montenegro já prejudicou o partido?
Pôr em causa a liderança de Rio em janeiro de 2019, com aquilo que é apelidado como “golpe de Estado”, prejudicou o partido, sim. Prejudicou também estarmos em eleições internas quando há eleições no país à vista. Não podemos achar que o PS ganhou as eleições sozinho. Temos de fazer uma análise: dar a ideia para fora de que estamos sempre mais preocupados com o que se passa no partido, e com as nossas listas, do que com o que é importante para o país, tem penalização eleitoral.
Mas foi esse golpe de Estado que fragilizou Rui Rio?
Nessa altura fragilizou naturalmente Rui Rio. E ainda não percebi muito bem porquê. Parece que havia uma sondagem que nos dava menos de 20%, mas também ninguém a viu. Enfim, acho curto. É uma sabotagem que não ajuda o partido. E depois isso reflete-se: Rui Rio não ganhou o partido internamente tantas vezes por acaso.
“O único que é capaz de recuperar o PSD é Moreira da Silva”
A candidatura de Moreira da Silva tem também sugerido que Montenegro traiu Paulo Rangel nas últimas diretas. Montenegro disse na entrevista ao Observador que isso era uma “mentira”. Moreira da Silva está a mentir?
Não vou estar a dizer que um companheiro de partido, muito menos Luís Montenegro e Jorge Moreira da Silva, está a mentir. As últimas eleições tiveram os apoiantes de Montenegro de um lado e de outro. Não vou analisar se Montenegro apoiou Paulo Rangel, até porque não sei que tipo de compromisso tiveram ou eventualmente deixaram de ter. O que sei é que esse tipo de desconfianças nasce sempre de algum tipo de postura — se alguém tem uma postura dúbia no seu posicionamento em eleições, isso transparece. Mas até nem acho que tivesse de apoiar um outro candidato. Teve o seu resguardo e fez bem, preparando esta eleição.
Já a estava a preparar nessa altura?
Naturalmente.
Jorge Moreira da Silva não tem os apoios nas estruturas que Montenegro tem e será justo dizer que parte em desvantagem nesta corrida. Já está a preparar o discurso de derrota ou ainda há alguma esperança?
Não serei eu a fazer o discurso de vitória, será o candidato. E devemos aprender com o passado, temos essa obrigação: se há uma coisa que o passado recente nos mostrou é que ninguém é de ninguém e não há eleições ganhas à partida. Ninguém imaginaria que António Costa teria uma maioria absoluta nestas legislativas. Na última eleição direta do partido, Paulo Rangel tinha as estruturas todas e perdeu a eleição.
Ainda é possível Moreira da Silva ganhar esta eleição?
Claro que é possível. Então se houvesse debates ainda mais possível era porque colocaria o PSD no centro do debate político e os militantes sairiam desta anestesia provocada também por este cansaço.
Não havendo debates…
Temos de procurar formas alternativas de mostrar as nossas ideias e acho que os militantes do PSD são preparados e qualificados, percebem o que está em causa. E foi por isso que me envolvi nesta eleição. Estando também cansado de muitas disputas e eleições, percebi que este era o momento decisivo para o PSD.
Esta campanha não está a ser muito divisora, está até a existir um fenómeno raro: muitos apoiantes a dizerem ‘ganhe quem ganhar, o PSD fica bem servido’. Se Luís Montenegro vencer, o PSD vai recuperar?
É um bocado o retrato da eleição que temos neste momento. Os próprios dirigentes entendem que são ambos bons candidatos ao partido e isso também é importante para o passo da união que é preciso dar a seguir. Mas as pessoas não se querem, sobretudo, comprometer. Aprenderam com a última eleição direta. Mas olham e percebem que, embora Luís Montenegro esteja no terreno há muito tempo, Jorge Moreira da Silva é o melhor candidato. É aquele que pode reformar internamente o partido e depois apresentar o melhor programa.
A pergunta é se acredita que Luís Montenegro pode fazer essa recuperação.
Acredito em Jorge Moreira da Silva para fazer e refundação do partido.
Mas qualquer um deles é capaz de recuperar o PSD?
Não lhe vou dar esse título. O único que é capaz de recuperar o PSD para disputarmos eleições com o PS é Jorge Moreira da Silva. Se não estivesse preocupado com o futuro do partido e se entendesse que Luís Montenegro e a sua equipa seriam capazes de resgatar o PSD para dar um salto qualitativo e numérico, não apoiaria Jorge Moreira da Silva, com certeza. Mas isso não quer dizer que eu vá contribuir para o divisionismo interno depois das eleições.
As eleições europeias serão o grande teste da próxima liderança do PSD. Moreira da Silva sugeriu que retiraria consequências políticas se perdesse; Montenegro disse que um líder que perdesse essas eleições não tinha necessariamente de sair. Qual é a sua opinião? Depois de Rui Rio ter sido tão atacado por falta de resultados, o próximo líder está obrigado a ganhar as eleições?
Acho que todos os líderes, sobretudo os do PSD, estão sempre a ter de provar aquilo que é a sua mais valia para a liderança do partido. Se há uma derrota nas eleições europeias, depois de uma maioria absoluta do PS, há que retirar consequências políticas. Um dos graves problemas da política nos últimos anos tem sido a normalização da irresponsabilidade política — e aqui até falo da irresponsabilidade do Governo. A democracia não ganha com isso.
Consegue compreender que Luís Montenegro, que foi sempre tão vocal a exigir resultados eleitorais a Rui Rio, agora diga que não ganhar as eleições europeias não é nenhum desastre?
Não vou contribuir para adensar a ideia de que Luís Montenegro tem tido muitas contradições em várias matérias. Essa é só mais uma.
“Moedas não faz sombra a Moreira da Silva. Até são da mesma altura”
Deixe-me fazer uma provocação…
Mais uma?
Diz-se muito que o próximo líder estará sempre a prazo. É uma tese que corre no PSD. Depois de Pedro Passos Coelho, o PSD encontrou em Carlos Moedas o novo D. Sebastião?
Não. Jorge Moreira da Silva é alguém altamente preparado para fazer este ciclo e para ser primeiro-ministro. O problema do PSD, e é por isso que temos muito mais líderes que o PS — então em comparação com o PP espanhol é um desastre –, é que estamos sempre à espera do que vem a seguir. E mais: Carlos Moedas tem um grande desafio em Lisboa. Acho que ele vai querer mesmo ser um grande presidente em Lisboa e vai querer pôr em prática aquilo que prometeu. Lisboa é grande demais para se dividir com o partido, e o partido é grande demais para se dividir entre Lisboa e o país. Não acho que faça sentido estar agora a falar de Carlos Moedas. É um grande quadro do partido, tem condições para ser aquilo que entender ser. Mas, neste momento, aquilo que temos em cima da mesa é uma escolha entre Luís Montenegro e Jorge Moreira da Silva. E não há dúvidas nenhumas sobre qual é aquele que tem mais condições para liderar o partido.
Em síntese: a sombra de Carlos Moedas não o assusta?
Não. Eles até são os dois da mesma altura. Não há sombra nenhuma.
“Portas é melhor candidato a Presidente da República do que Marques Mendes”
Rui Rio está prestes a deixar a liderança do PSD. Daria um bom candidato presidencial em 2026?
Há várias pessoas do nosso espaço político que serão bons candidatos presidenciais. Isso é público e notório. Não sei se Rui Rio terá essa vontade. É natural que depois de quatro anos muito intensos, e de muitas eleições, ele tenha de fazer a sua reflexão. Mas seria uma pessoa que apoiaria sem condição.
Falou de várias personalidades desse espaço político poderiam protagonizar uma candidatura presidencial, o que nos serve de mote para avançar para a segunda fase da nossa refeição, o Carne ou Peixe, em que só pode escolher uma de duas opções. Preferia fazer uma campanha presidencial ao lado de Paulo Portas ou Luís Marques Mendes?
Acho que Paulo Portas é melhor candidato a Presidente da República.
Faz parte da Comissão de Defesa. Preferia passar uma hora a discutir o papel da NATO com o deputado comunista João Dias ou uma hora a discutir com os apoiantes de Paulo Cunha as qualidades dele como líder da distrital do PSD de Braga?
Tenho dedicado muito do meu tempo à Defesa e tenho boa relação com o João Dias. É natural que preferisse essa discussão parlamentar em torno da Defesa.
Quem levava a almoçar a Barcelos: Pedro Nuno Santos ou Fernando Medina?
Pedro Nuno Santos.
Com quem preferia tocar guitarra: Rui Rio ou Marcelo Rebelo de Sousa?
Rui Rio toca bateria. Eu tocaria guitarra e ele tocaria bateria.