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MICHAEL M. MATIAS / OBSERVADOR

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"Acredito que a profissão de taxista já não exista daqui a 10 anos"

Foi primeiro-ministro aos 34 anos, o mais jovem da União Europeia. E liderou o país mais digital do mundo, a Estónia - o primeiro a sofrer um 'hacking' russo. Taavi Rõivas em entrevista ao Observador.

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Foi o primeiro-ministro mais jovem da União Europeia: tinha 34 anos quando começou a liderar o governo da Estónia, em 2014, depois de ter encabeçado o Ministério dos Assuntos Sociais durante dois anos. Taavi Rõivas era um dos oradores convidados da Web Summit, onde deveria ter falado daquele que é o país mais digitalizado do mundo, a Estónia, mas “foi despedido“, na véspera, pelos parceiros de coligação: os sociais-democratas do SDE e os conservadores do IRL.

Em entrevista exclusiva ao Observador, explica como se constrói o país que quer ser o mais pró-tecnológico da Europa — casa-mãe de empresas como o Skype ou a TransferWise –, como deve a Europa lidar com os desafios de regulação inerentes à inovação tecnológica, como Portugal devia também liderar este caminho, e como os ciberataques se tornaram numa nova forma de guerra, com a Rússia na linha da frente.

A Estónia (ou a e-Estonia, como é conhecida) é um país que se assume como “uma startup” e que fez do seu governo uma incubadora das ideias dos cidadãos, merecendo elogios públicos de Barack Obama e uma entrevista no programa de televisão norte-americano The Daily Show. Conhecido por ser um dos rostos mais ligados às iniciativas tecnológicas, Taavi Rõivas é um dos responsáveis pela implementação do Startup Visa (para facilitar a entrada de empreendedores estrangeiros no país) ou dos projetos com carros autónomos (tendo já convidado a Uber e a Tesla a utilizar a Estónia como mercado teste para os seus veículos). De passagem por Portugal a propósito de um seminário da organização não governamental Young European Leadership, Taavis Rõivas explica porque é que o poder está sempre nas mãos do eleitorado: “Não há tecnologia política que combata a vontade das pessoas”.

MICHAEL M. MATIAS / OBSERVADOR

Foi o primeiro-ministro europeu mais jovem da União Europeia. Tinha 34 anos e formação em Economia e Marketing. Sempre foi isto que quis?
Comecei a interessar-me por política quando era muito novo, ainda antes de ir para a Universidade. Tem sido a minha ocupação principal, apesar de ter saltado para o setor tecnológico no início deste século. Mas regressei quando tive oportunidade e tenho-a aproveitado desde então. Nunca fiz disto uma espécie de necessidade — tornar-me ministro ou primeiro-ministro –, mas sempre quis ser bom no que fazia. Tornar-me num grande membro do governo ou primeiro-ministro foram passos lógicos desse caminho. Mas é verdade. Fui o primeiro-ministro mais jovem da Europa durante três anos e foi uma viragem positiva. A minha juventude foi, sem dúvida, uma coisa positiva.

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Precisamos de mais líderes jovens na Europa?
Acho que temos líderes muito bons, independentemente da idade. Mas sim, claro que é bom que as pessoas mais jovens tenham esta responsabilidade. Eu, por exemplo, estou na faixa etária dos trinta e tal e sinto que já não faço parte da geração mais jovem. Acho que as pessoas que são dez anos mais novas do que eu devem desempenhar papéis com responsabilidade não só na economia, mas na política. Porque isso só pode gerar coisas positivas. Por isso, sim. No geral, sou a favor de termos pessoas jovens.

A Estónia é o país mais digital do mundo, tornou-se inclusive num caso de estudo. Como é que isto começou e porquê?
Começou no início do século, quando introduzimos a identidade digital. Fomos um dos primeiros países a fazê-lo e sei que, em Portugal, também existe algo parecido. Mas o que nos distinguiu? Na Estónia, fizemo-lo de forma obrigatória para todos os cidadãos. Tornou-se numa espécie de bilhete de identidade por defeito. O documento padrão já não era o passaporte, mas a identidade digital. E toda a gente na Estónia a tem. Há 17 anos.

A segunda coisa que mudou o paradigma ocorreu há 12 anos, quando os bancos começaram a usar a identidade digital como a principal medida de identificação dos clientes. Se quisesses transferir mais de 200 euros, por exemplo, tinhas de usar esta identidade digital. E as pessoas queriam transferir mais de 200 euros muitas vezes. Por isso, aprenderam a utilizá-la e agora utilizam-na para tudo: para aceder a serviços privados, mudar moradas, pedir táxis ou votar. Para muitas pessoas, esta é a opção lógica por defeito. Acho que os bancos terem começado a utilizá-la foi um empurrão muito, muito importante.

"Calculámos que, ao tornarmos as coisas mais digitais, pouparíamos cerca de 2% do PIB, todos os anos. E isso é muito"

A crise económica e social que a Estónia viveu teve impacto nisto? A tecnologia foi uma forma de reinventar a economia?
Não acho que estejam muito relacionadas, porque começámos o nosso governo digital muito antes de haver uma crise económica global. Mas a verdade é que, em termos de desenvolvimento económico, a digitalização ajudou muito e não foi por causa da poupança de papel ou de dinheiro, foi por causa da poupança de tempo. Mas também podes converter a eficiência do tempo em dinheiro. Calculámos que, ao tornarmos as coisas mais digitais, pouparíamos cerca de 2% do PIB, todos os anos. E isso é muito — 2% do PIB é quase aquilo que gastamos anualmente na defesa.

“Os obstáculos à Europa Digital não são tecnológicos, são a legislação”

No The Daily Show, ouvi-o explicar que preencheu a sua declaração de IRS enquanto esperava por um voo, no aeroporto de Bruxelas. O que é preciso para que um país seja tecnologicamente tão avançado? Em Portugal, também estamos a tentar trilhar esse caminho.
Acho que Portugal está muito avançado, em comparação a muitos países europeus. Acho que a mentalidade das pessoas é a chave e vejo que a portuguesa está muito direcionada para terem um ecossistema de startups muito vibrante, por exemplo. O que a nossa experiência nos diz é que há dois marcos importantes: ter uma identidade digital e uma espinha dorsal de todos os sistemas de informação, que ajudem diferentes sistemas a comunicarem entre si. É uma espécie de camada base do nosso e-governo.

A terceira coisa que acho importante não é de todo digital, é uma questão de legislação. No início deste século, avançámos com a assinatura digital e isso, à data, foi muito inovador. Mas quando falamos de desenvolvimento digital, percebemos que muito desse desenvolvimento não é sequer digital. É legislação, é liderança, é assegurarmos que as condições físicas para que isso aconteça estão lá. É como a questão da Uber: na sua essência, é um serviço digital, mas tem de haver legislação para que possa atuar.

O poder está sempre nas pessoas.
Exato. O digital é só um canal, não é uma coisa por si. É o canal que utilizamos para chegar aos serviços públicos, aos privados. Tu não queres usar o computador, queres mudar a morada, por exemplo, ou assegurar que tudo está reportado corretamente. Queres transferir dinheiro, mas queres fazê-lo da forma que te é mais conveniente e, em muitos casos, o digital é a forma mais conveniente de o fazer. E isso também se aplica aos serviços do setor privado. A maioria das pessoas, quando pensa em reservar um hotel em Lisboa, recorre à aplicação do Booking ou da Airbnb. Isto é um bom exemplo de que, no setor privado, há muitos casos que nos lembram que a Europa Digital pode tornar-se uma realidade. E os obstáculos não necessariamente tecnológicos, são os legisladores.

O que devia ser feito para ultrapassar estes obstáculos? Como é que a Europa devia agir?
Acho que os líderes europeus deviam concordar em ter serviços públicos que funcionam em todo o lado, que atravessam fronteiras, como a Uber está a fazer. A Uber consegue ser funcional aqui ou na Estónia, tal como o Airbnb ou o Booking. Se calhar, nem todos os serviços públicos em Portugal são relevantes para os cidadãos da Estónia, mas há alguns que são, como a prescrição médica digital. Imagine o quão agradável seria se eu estivesse em Portugal, precisasse de uma receita médica e me bastasse ligar ao meu médico na Estónia. Ele entrava num software que funcionava como base de dados e quando eu chegasse à farmácia portuguesa, eles já saberiam o que me tinha sido prescrito pelo médico.

Se alguém da Estónia estiver a passar férias em Portugal e precisar de ir a um hospital, o hospital não sabe nada sobre ele. No pior cenário possível, os médicos vão ter de fazer todos os testes possíveis e imaginários, verificar o tipo de sangue, etc. Se houvesse este tipo de troca digital, estas coisas já estariam identificadas. Esta plataforma é tecnologicamente muito fazível, mas faltam-nos os incentivos políticos e legislativos para avançar. Estou muito contente que a Comissão Europeia nos esteja a conduzir nesta direção, mas, claro, não é algo que aconteça muito rapidamente e acho que países como a Estónia e Portugal deviam liderar este caminho.

"Acho que países como a Estónia, Portugal ou a Finlândia estão muito ávidos por lidar com este tipo de desafios"

Porquê?
Acho que nós, países relativamente pequenos, temos menos medo do progresso. Há preocupações legítimas em muitos países como, por exemplo, perceber como devemos lidar com a privacidade, com a segurança. Acho que países como a Estónia, Portugal ou a Finlândia estão muito ávidos para lidar com este tipo de desafios. Acho que estamos mais ansiosos por saber como lidar e resolver esses desafios e temos a mentalidade que é precisa e que é visível na vossa startup scene. Hoje estive a visitar os escritórios da Pipedrive, que é uma empresa da Estónia que resolveu vir para Lisboa. Perguntei-lhes o porquê de terem escolhido Portugal. Não é assim tão perto da Estónia, nem é o maior mercado. Disseram-me que era a atmosfera progressista e o facto de os portugueses falarem bem inglês, o clima económico, etc.

Está familiarizado com o ecossistema de startups português?
Acho que seria demais dizer que estou familiarizado.

Ouvi dizer que Tallinn e Lisboa são parecidas.
Sim, acho que há semelhanças. A Estónia tem uma startup scene muito vibrante, não tão grande como a de Londres ou Silicon Valley, mas muito vibrante, com milhares de pessoas, o que para a Estónia é muito. Acho que a diversidade que existe nessas empresas também é muito parecida. Percebo que em Portugal há pessoas de muitas nacionalidades a trabalhar na mesma empresa. Na Second Home vi isso, por exemplo. Na Estónia, se fores a alguma startup, podes encontrar facilmente pessoas de várias nacionalidades: portugueses, brasileiros, ucranianos.

Hoje, estive com o comissário europeu Carlos Moedas e ele disse uma coisa muito acertada: que a diversidade pode tornar o entendimento comum mais difícil, mas, no final, o resultado desse entendimento será muito melhor. Acho que é uma coisa muito, muito acertada de se dizer, porque se te rodeares de pessoas que pensam de uma forma muito semelhante à tua, nunca vais mudar o mundo. Precisas de ser diferente, de discutir, de ser apaixonado pelas coisas, de vê-las de ângulos diferentes, o que significa que tens de ter diferentes contextos — nacionalidades, experiências de vida. E é por isso que as melhores equipas são as internacionais e diversificadas. As duas maiores empresas do mundo — Apple e Google — são fundadas por pessoas que eram migrantes, que tinham um contexto diferente.

"Há pessoas muito talentosas, mas que vivem fora da União Europeia e é preciso que o processo para recrutá-las seja tão simples e fácil quanto possível"

“Não há tecnologia política que combata a vontade das pessoas”

Li que na Estónia, só a partir do Skype, já saíram 40 startups, fundadas por ex-trabalhadores. E têm outros casos de sucesso, como a Transferwise. O que é preciso para construir um ecossistema desses?
O Skype foi fundado há 16 anos por quatro engenheiros de software da Estónia e investidores da Dinamarca e Suécia — uma pequena equipa de seis pessoas. Se vires que um pequeno grupo de pessoas começa estas empresas em países como a Estónia ou Portugal e depois, mais tarde, vendem-nas à Microsoft por 8,5 mil milhões, se calhar, começas a pensar “Ok, então eu também devia tentar”. Com a aquisição pela Microsoft, muitas das pessoas que lá trabalhavam acharam que aquilo estava a tornar-se demasiado empresarial. E saíram do Skype, o que, provavelmente, foi a melhor coisa que poderiam ter feito. Tornaram-se empreendedores. Uma das empresas que saiu do Skype foi a Transferwise e há muitas mais pessoas que estão a ser inspiradas pela história do Skype. Compreendem que é possível começar uma empresa global apenas com seis pessoas, na Estónia.

Foi um dos responsáveis pelo Startup Visa na Estónia. Saber acolher as pessoas de outros países é crucial para o desenvolvimento de um país?
Sem dúvida. Enquanto fui primeiro-ministro, convidei com regularidade líderes de startups para virem ao meu gabinete fazer pitch de ideias e explicarem-me o que achavam que devia ser feito. O Startup Visa foi uma das coisas que saiu desses encontros. Este tipo de coisas são essenciais para atrair mais talento. Há pessoas muito talentosas, mas que vivem fora da União Europeia e é preciso que o processo para recrutá-las seja tão simples e fácil quanto possível. Claro que é preciso haver um processo, mas vamos tornar esse processo, entre países, o mais parecido possível. Acho que isso é uma das coisas que mais está a ajudar as startups.

"A pior coisa seria negar a mudança tecnológica e tentar legislar à sua margem"

Qual seria o seu maior conselho para o nosso Governo?
Acho que o Governo português vai saber o que fazer se olhar à sua volta e procurar as melhores práticas. Acho que a mentalidade está claramente cá, em Portugal, e no governo português também. Na Estónia, também temos de aprender com a experiência portuguesa. Quanto mais mudamos as práticas, mais abertos estamos a novas ideias. A startup scene e a própria tecnologia, numa perspetiva mais abrangente, é algo que não combina bem com um posicionamento mais conservador. É preciso haver mudanças. É verdade que nenhuma sociedade é rápida o suficiente para cooperar em pleno com as mudanças tecnológicas, mas podemos fazer o nosso melhor.

A pior coisa seria negar a mudança e tentar legislar à sua margem. Os desafios vão continuar lá, tal como já aconteceu com o desenvolvimento dos computadores ou da eletricidade. Não é possível reverter. Estas coisas revolucionaram o mundo e foi difícil cooperar com elas, mas foi muito recompensador. Por isso, nós, enquanto governos, enquanto nações, enquanto União Europeia temos de fazer o nosso melhor para nos adaptarmos à mudança, que é inevitável. Não se trata de saber se vamos ver esta mudança acontecer com a inteligência artificial. Trata-se de saber quando e o quão adaptáveis somos a ela.

MICHAEL M. MATIAS / OBSERVADOR

Era suposto ter vindo à Web Summit.
Sim, mas fui despedido (risos).

Pois foi.
E deixe-me que fique claro: não fui despedido pelas pessoas, foi o meu partido que venceu as eleições. Fui despedido pelos meus parceiros de coligação. Aqui, em Portugal, também sabem o que é ter um governo de coligação e que, às vezes, as coisas são complicadas.

O que aprendeu com a queda do seu governo?
Precisamos de assegurar que todos os nosso parceiros estão felizes. A toda a hora. O que aconteceu na Estónia foi que o meu partido teve demasiado sucesso. Ganhou as eleições ao Parlamento três vezes seguidas, o que nunca tinha acontecido e os parceiros de coligação sofreram uma série de derrotas. Sentiram que nos deviam culpar. Agora, a ironia é que, depois de nos terem expulsado do Governo, aliaram-se a outro parceiro que também não ganhou as eleições e, depois disso, a sua popularidade caiu ainda mais. Acho que esta é uma lição muito boa — precisas de ouvir o que as pessoas dizem nas eleições e o partido que ganha tem de ter a oportunidade de governar. Porque não existe tecnologia política que consiga combater com sucesso a vontade das pessoas.

"Podes perder dinheiro quando investes no digital, se o fizeres de forma errada, mas é apenas isso. Vale a pena correr o risco"

Lições que também se podem aplicar aos fundadores de startups?
Liderar um governo é diferente, porque não podes arriscar tanto. Tens responsabilidades enormes. Não apenas para a tua geração, mas para a geração dos teus filhos. É preciso evitar erros ao máximo, precisas de ter princípios. Mas, dito isto, a verdade é que, às vezes, nalgumas situações, podes ter a mesma mentalidade que têm os líderes de startups e introduzir coisas novas, em áreas onde isso não seja prejudicial. Podes perder dinheiro quando investes no digital, se o fizeres de forma errada, mas é apenas isso. Vale a pena correr o risco. Mas não arriscas em coisas que podem pôr em causa a tua soberania, segurança ou o bem-estar das pessoas. A experiência do meu país diz-me que vale a pena correr riscos em áreas onde se espera que haja inovação.

“Acredito que a profissão de taxista já não exista daqui a 10 anos”

Convidou cinco marcas, inclusive a Tesla e a Uber, para testarem carros autónomos na Estónia. E é uma área que ainda carece de tanta tecnologia e regulação. Porque fez isso?
Alguém tem de fazer com que se sintam bem-vindos. Estão a testar a tecnologia que vai mudar a forma como todos nós vivemos. Acredito que a nossa tarefa enquanto país e Governo é permitir isso, ajudá-los. Foi por isso que os convidámos. Acredito que a profissão de taxista já não exista daqui a 10, 20 anos.

Já daqui a 10 anos?
É difícil dizer o quão rápido vai ser. Regra geral, a mudança acontece mais depressa do que o que achamos. Pode demorar décadas, como pode demorar menos. Não sei, mas sei, com toda a certeza, que isto vai acontecer. E que vai haver cada vez menos carros nas mãos das pessoas. Se viveres numa cidade, a verdade é que não precisas de ter um carro. Precisas de um serviço que te leve de um sítio para outro e de um carro que pode estar a ser conduzido por si próprio. Este é o tipo de mundo que imagino a acontecer muito facilmente durante o tempo em que vivemos. E isso significa que precisamos de começar a pensar em quais serão os novos trabalhos para as pessoas que, neste momento, ganham a vida a conduzir. Espero, sinceramente, que continue a haver pilotos de Fórmula 1, de rally, a fazerem disto vida. E também espero que continuem a existir carros que possamos guiar para nos divertirmos e enquanto hobby.

"Temos de aceitar na sociedade que há cada vez menos profissões que te acompanham desde o momento em que acabas os estudos até que reformas"

Como se prepara uma sociedade, as pessoas, para uma mudança desta ordem?
Imagina o aumento da qualidade de vida que vais ter se puderes ter um carro que te leva a um sítio sem teres de o conduzir. Isto era algo que estava reservado a um grupo muito restrito de pessoas, que podiam ter o seu motorista. De certa forma, torna-se num serviço muito luxuoso, ao qual podes aceder. Concordo totalmente que a mudança nunca é fácil, traz preocupações legítimas às pessoas. Mas a minha função enquanto político é explicar o que vai acontecer, como vai acontecer e como podemos cooperar com isso.

Nós temos tido sucesso em explicar a necessidade de mudança. Aplicámos os serviços digitais na Estónia a todo o tipo de pessoas, apesar da idade. Todas as pessoas usam o voto eletrónico, desde que o introduzimos, há dez anos. Estou certo de que, com a motivação certa, somos capazes de explicar às pessoas que o conceito do carro vai mudar. E que essa é a grande mudança que vamos ter, na verdade. É a coisa que podemos afirmar com mais certeza. Acho que muitos serviços vão mudar ao longo do tempo.

Sobretudo por causa da inteligência artificial?
Não, acho que numa perspetiva mais alargada da tecnologia. Em todos os setores. Normalmente, não associamos agricultura à inovação, por exemplo. Mas não foi assim há tanto tempo que as vacas eram ordenhadas com as mãos, de uma forma muito anti-tecnológica. E, agora, vês milhares de vacas que são ordenhadas com um sistema robótico, que calcula tudo em termos de quantidades. Parece ficção científica. As milhares de pessoas que costumavam ordenhar as vacas para ganhar a vida estão a fazer outra coisa agora. Por isso, temos de aceitar na sociedade que há cada vez menos profissões que te acompanham desde o momento em que acabas os estudos até que te reformas.

“O ‘hacking’ é uma nova forma de guerra, mas não nos deve desviar da digitalização”

E, agora, uma polémica atual: o alegado ciberataque da Rússia nas eleições norte-americanas. A Estónia, na verdade, foi o primeiro alvo da Rússia.
Sim, em 2007.

"Os russos podem sentir-se, no mínimo, tentados a utilizar a sua política interna nalguns países europeus para aumentar a sua influência. De certeza"

Este tipo de hacking é uma nova forma de guerra?
Sim. As ameaças cibernéticas são uma realidade. São uma realidade dos estados-nação, de hackers, de criminosos. É algo que temos de aceitar como real e que temos de resolver. Quanto mais digitais nos tornamos enquanto país, enquanto pessoas, mais temos de lidar com estas ameaças e temos de saber resolvê-las. Mas isso não nos deve desviar da digitalização. Isso deve ser uma ameaça que entendemos e que endereçamos.

Mas vamos ter eleições importantes na Europa.
Tivemos ainda agora as da Holanda.

Mas vamos ter mais, em França, na Alemanha. Acha que os russos podem ser uma ameaça?
O objetivo da Rússia é aumentar o papel que detém na política internacional. E podem sentir-se, no mínimo, tentados a utilizar a sua política interna nalguns países europeus para aumentar a sua influência. De certeza. E nem é porque precisam de ter partidos pró-russos no Parlamento. Para eles, pode bastar-lhes ajudar um partido que está a desafiar a unidade da União Europeia ou a cultura em curso, seja o que for. Acho que a Rússia é um daqueles poderes que não hesitaria em utilizar ferramentas não convencionais para alcançar os seus objetivos políticos. E os ciberataques são uma coisa, propaganda é outra, movimentos financeiros ou partidários são outra. O nosso desafio é manter os olhos abertos e assegurar que não somos enganados com estas coisas.

Para terminarmos: o que iria dizer na Web Summit que não chegou a dizer?
Tinha tudo preparado para fazer uma apresentação e fiquei muito, muito triste por não ter vindo. Mas espero ser convidado novamente para a deste ano. Acho que este tipo de conferências são muito importantes, não apenas para falares, mas para ouvires o que os outros têm a dizer. Precisamos de trocar as melhores práticas, se quisermos ter mesmo muito sucesso. E acho que Estónia e Portugal têm razões para aprender um com o outro. Isto nunca é uma estrada de sentido único. Nunca.

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