Para a próxima segunda-feira está marcada uma nova fase de desconfinamento e a reunião no Infarmed desta terça-feira consolidou dados para sustentar a fase seguinte, com novas propostas metodológicas, nomeadamente na avaliação de casos nos concelhos vizinhos aos de risco. No final das apresentações dos especialistas, o primeiro-ministro (que poucas vezes intervém nestas reuniões) quis saber mais sobre a questão dos concelhos, mas também já mostrou estar a olhar mais adiante ao perguntar como se deve agir em relação à população flutuante, sobretudo a do verão no Algarve.

Segundo apurou o Observador junto de várias fontes que assistiram ao encontro que juntou especialistas e decisores políticos (e também os conselheiros de Estado), António Costa perguntou especificamente a Óscar Felgueiras, da Administração Regional de Saúde do Norte e Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, como se deve tratar os casos de população flutuante, em alguns dos concelhos que têm mais casos, mas sobretudo se isso terá grande expressão no Algarve no verão.

A região já preocupa nesta altura por estar com “tendência crescente”, segundo o especialista Baltazar Nunes (do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge) que nesta reunião disse que o Algarve, a par de Açores e Madeira, já estão com mais de 120 casos por 100 mil habitantes — o limiar mínimo da matriz de risco, a partir daí este indicador começa a estar na zona amarela. A somar a este dado, no Algarve, a variante britânica (que tem maior capacidade de contágio) já representa 94% das infeções.

PM dá indicações de querer limitar restrições a surtos

O primeiro-ministro quis ainda que Óscar Felgueiras aprofundasse a sua exposição sobre os concelhos de risco. O especialista tinha acabado de apontar problemas ao “indicador único” agora usado da incidência de concelhos, já que “há pequenos concelhos onde o número de casos não muito grande é o suficiente para ter incidência muito alta”. Até exemplificou com o caso do Vimioso, que tem uma incidência de 249 casos para uma população de 4 mil habitantes, mas tendo em consideração a sua vizinhança (quatro concelhos), nesta região existem 36 casos para 67 mil habitantes. “Se considerássemos a região por inteiro a incidência seria de 53, significativamente abaixo da localizada em Vimioso”, afirmou o especialista defendendo que se defina “um indicador de incidência vizinha” dos concelhos para que os dados deem um retrato mais fidedigno da região.

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Também Carla Nunes, da Escola Nacional de Saúde Pública, apontou para a utilidade dos “clusters espaciais” e para a análise dos riscos até dentro do mesmo cluster, o que dará mais “precisão e segurança às decisões e intervenção”. Esta análise, a somar ao modelo apresentado por Felgueiras e ao elogio de Costa, reforçou a convicção de quem estava presente na reunião de que a intenção do Governo passará por olhar mais para regiões e focos específicos.

António Costa aproveitou para procurar o aval científico para aquilo que já tinha feito saber ser a sua leitura. O primeiro-ministro quis saber se nos concelhos com focos muito delimitados, como nos estaleiros da ferrovia no Alandroal, não deveriam existir medidas de saúde públicas focadas apenas nesses clusters em vez de medidas mais gerais aplicadas a todos os concelhos. Óscar Felgueiras terá respondido que os dados “devem ser sempre complementados por avaliação qualitativa”, disse ao Observador fonte que esteve na reunião.

Nos planos do Governo podem estar confinamentos locais sempre que a situação assim o obrigue — que podem abranger um único concelho ou vários concelhos vizinhos –, impondo também limitações de circulação entre autarquias.  António Costa ficou, de resto, quase sozinho nas perguntas: nem Marcelo Rebelo de Sousa nem Eduardo Ferro Rodrigues tiveram, desta vez, qualquer intervenção na reunião.

No início deste mês, depois de um encontro com autarcas dos concelhos de risco, o primeiro-ministro já tinha dito que o índice de casos por cem mil habitantes “é muitas vezes penalizador para os territórios de baixa densidade, é preciso ver se é uma situação generalizada na comunidade. No caso do Alandroal é centrada em dois estaleiros de obras no concelho. Se os casos estão muito focados no estaleiro, a testagem deve incidir ali e controlar aí a pandemia, onde se está a desenvolver”, defendeu então.

Nesta sessão no Infarmed, o primeiro-ministro elogiou ainda o slide em que Óscar Felgueiras apresentava precisamente a importância de avaliar a incidência de forma mais circunscrita, o que levanta a possibilidade de haver alterações a este nível já na próxima fase de desconfinamento.

DGS prepara plano para visitas aos lares

Da reunião desta terça-feira ficou ainda outra garantia: a Direção-Geral de Saúde (DGS) vai definir em breve novas orientações para visitas aos lares. Apesar de grande parte deste grupo estar já vacinado (pelo menos 90%), as visitas aos lares continuam fortemente condicionadas e com muitas restrições.

Mais: os idosos que deixam os lares por mais do que um dia estão obrigados a cumprir um isolamento de duas semanas, e como há lares que dizem não ter condições para garantir esse isolamento, muitos idosos estão a ser impedidos de deixarem as instalações.

Este nível de restrições está a motivar críticas ao Governo e às autoridades de saúde, que têm alertado para os riscos de medidas desta natureza para a saúde mental dos mais velhos.

“É evidente que esta é uma situação que tem contornos de desumanidade, mas sabemos que [os lares] são residências coletivas e é preciso continuar a garantir todos os cuidados”, sublinhou Lino Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), em declarações ao “Público”.

Esta terça-feira, no entanto, o Governo assegurou que em breve serão definidas novas orientações para permitir menos restrições nas visitas aos lares e regras menos apertadas para contactos com as respetivas famílias. Em resposta a uma representante da APRE — Aposentos, Pensionistas e Reformados, que a lógica passará por possibilitar que essas saídas aconteçam para todos e não apenas os que tenham motivos específicos, desde que o utente faça um teste rápido no regresso, se tiver estado fora por mais de 24 horas.

Quanto à hipótese de a testagem nas escolas ser alargada aos alunos, questão colocada pelo CDS, os especialistas defenderam não haver motivo para alterar a estratégia, frisando que a taxa de positividade nas escolas é baixa e que a capacidade de deteção de casos e quebra de contactos se tem mostrado relativamente forte.

Em atualização