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O Governo tem estado a trabalhar com as comunidades científica e tecnológica portuguesas para avaliar as várias aplicações de rastreio de contactos que visam evitar a propagação da Covid-19 e que podem ser úteis numa fase de retoma da vida económica e social, afirmou o o secretário de Estado para a Transição Digital, André de Aragão Azevedo, em entrevista ao Observador. Segundo o governante, os trabalhos estão “muito adiantados” e haverá novidades sobre este assunto “muito em breve”. Duas coisas estão já garantidas: seja qual for o sistema de monitorização encontrado, a sua utilização será sempre voluntária e “nunca será imposta” pelo Estado; e seguirá todas as recomendações europeias em matéria de proteção de dados e dos direitos individuais.
“Vamos ter novidades muito em breve, com a certeza de que serão muito relevantes nesta fase em que vamos entrar, de abertura da nossa economia outra vez à sua fase de normalidade e para a qual é essencial, mesmo do ponto de vista de confiança — quer dos cidadãos quer dos outros países, quando se começar a pensar em abrir fronteiras —, que haja de facto alguma capacidade de monitorização da doença ao nível nacional”, afirmou o secretário de Estado que, antes de ingressar o Governo liderado por António Costa, foi diretor executivo de Tecnologia na Microsoft Portugal.
Numa entrevista em videochamada, no rescaldo da apresentação do pacote de medidas de apoio às startups, André de Aragão Azevedo garante que só vai poder recorrer ao pacote de 25,3 milhões de euros as empresas que não tiverem despedido colaboradores em 2020: “O critério para apoiarmos [as startups] é exatamente não ter acontecido uma redução nos recursos humanos”. Apesar de ainda não haver dados sobre como a pandemia de Covid-19 impactou estes negócios, que são, por natureza, “mais frágeis”, o Governo quer garantir que as empresas têm mecanismos para responder à pressão dos custos, evitando que despeçam colaboradores. Além disso, lançou dois novos instrumentos de investimento no valor de 13 milhões de euros: três milhões estão alocados a uma call da Portugal Ventures e outros 10 milhões ao “Mezzanine funding for Startups”, empréstimos convertíveis em capital social após 12 meses.
“Ainda não temos noção de qual será o saldo negativo em termos de empresas no pós-crise”
O Governo anunciou um plano de 25 milhões de euros para apoiar startups nesta fase de pandemia… Mas, antes de o detalharmos, que consequências é que esta crise está a ter no emprego e na viabilidade destes negócios?
As startups estão integradas naquilo que é um sistema, uma economia, e estamos todos a sofrer o impacto desta situação de exceção inesperada, para a qual nenhum país estava verdadeiramente preparado. Estamos a fazer todos os esforços npara mitigar o impacto e garantirmos que, uma vez ultrapassada esta fase mais crítica do ponto de vista de saúde pública, estejamos com capacidade produtiva e económica para podermos retomar a nossa economia e alguma normalidade, sempre numa lógica de transição gradual e de alguns cuidados.
As startups em particular pertencem a um sub-ecossistema dentro daquilo que é o nosso tecido económico e são de facto responsáveis por trazer à nossa economia uma vitalidade, uma energia e uma inovação que são muito relevantes na transformação do nosso modelo económico. Mas, simultaneamente, por serem empresas mais jovens e recentes e em muitos casos inovadoras e disruptivas também estão de alguma forma mais frágeis naquilo que pode ser a capacidade de reação e almofada económica que possam já ter para responder à situação que enfrentamos. Desse ponto de vista, precisámos de encontrar um pacote de medidas um bocadinho mais direcionado que, sem prejuízo daquilo que são os apoios mais genéricos à economia e ao tecido empresarial, nos garantam que temos respostas direcionadas para a especificidade das startups.
São empresas que têm um ADN e modelos de negócios diferentes dos tradicionais, mas conseguem saber, por esta altura, se já houve muitas empresas a fechar? Se já houve muitos despedimentos? Têm números?
Não, não temos esses dados especificamente para o sub-segmento das startups. É preciso termos noção que o próprio conceito de startup não é propriamente universal, não temos uma definição inequívoca de startup. Temos uma plataforma que é o Startup Hub, onde está, de facto, registada uma percentagem que é muito significativa daquilo que é o nosso universo de startups, mas não temos ainda um mecanismo que nos permita ter essa ponte de contacto permanente e essa auscultação de mercado. Sabemos que, desde há cerca de 15 dias, o INE e o Banco de Portugal estão a fazer uma auscultação àquilo que é a dinâmica do mercado e quais são os impactos que estão a acontecer. Portanto, temos dados económicos agregados de alguma retração económica em resultado da pandemia, mas não temos dados específicos só para o ecossistema de startups.
Nem dados específicos para a Portugal Ventures, que é o organismo de investimento público de capital de risco. Já fizeram o levantamento das empresas participadas da PV?
Temos estado em articulação constante quer com a Startup Portugal, quer com a Rede Nacional de Incubadoras, quer com a Portugal Ventures, quer com representantes um bocadinho mais inorgânicos daquilo que é o ecossistema… E também com a parte dos investidores, com as associações, no sentido de auscultarmos como estão a olhar para a situação. Julgo que, neste momento, passou ainda relativamente pouco tempo para já haver dados definitivos sobre o que vai efetivamente encerrar ou suscetível de, com alguns apoios, poder retomar alguma normalidade no pós-crise. q informação que temos é a de que não há dados absolutos sobre a parte deste ecossistema que vai de facto definitivamente impactada e encerrar portas. Não temos esses dados.
A informação que temos quer da Portugal Ventures, quer da Startup Portugal é que, de facto, há uma expectativa e alguma ansiedade em relação à evolução e à forma como estas medidas restritivas vão ou não prolongar-se no tempo. E, mesmo do ponto de vista internacional, como é que a Europa e o mundo vão de forma mais ou menos consertada evoluir em termos de medidas de restrição à liberdade e à liberdade da atividade económica e comércio. Desse ponto de vista, há alguma incerteza que importa o mais depressa possível clarificar, para que possam ser tomadas decisões objetivas em relação àquilo que é o diagnóstico da situação. Não temos, à data de hoje, ainda noção de qual será, no pós-crise, o saldo negativo em termos de empresas.
O que sabemos é que todos os anos são criadas cerca de 15% de novas empresas em Portugal, o que dá também uma ideia do nível de dinamismo que o nosso tecido empresarial tem em condições normais. Sabemos que tipicamente 11% fecham. Há aqui já uma taxa de substituição bastante significativa e, portanto, é natural que estas percentagens, neste ano, conheçam uma oscilação, uma variação em relação àqueles que são os dados habituais anuais, as médias.
O que é certo é que o Governo sentiu esta necessidade de estabelecer um pacote de medidas concretas para apoiar estes negócios. Nestas novas medidas, existem duas que são reforços de outras duas anteriores: o 200M foi adaptado à realidade da Covid-19 e o fundo de inovação social. Em relação ao 200M, como é que readaptaram o fundo?
Temos de facto medidas específicas e exclusivas para startups, o pacote de mais de 25 milhões de euros que se materializa naquelas cinco iniciativas e que têm por objetivo responder à pressão diária que estas empresas têm ao nível da sua estrutura de custos, como os recursos humanos, que tipicamente representam uma grande fatia. Procurámos injetar alguns apoios que, na prática, garantam a manutenção da atividade e dos postos de trabalho para que possam, no momento da retoma, estar plenamente capacitadas para responder àquilo que for a normalidade económica.
Criámos uma medida específica para apoiar estas empresas naquilo que são os seus custos correntes operacionais e daí a prorrogação do vale de incubação por mais três meses, no valor de 1.500 euros, no contexto específico da Covid-19. O objetivo é garantirmos que do ponto de vista operacional não sofrem nenhuma interrupção nem entram em default. Depois, temos medidas mais vocacionadas para o apoio a calls de investimento, para investimento mais de fundo. E são duas linhas específicas, o fundo que chamámos Mezzanine e o fundo da Portugal Ventures, que, na prática, pretendem funcionar como ferramentas de apoio a projetos que de alguma forma já tinha visto o seu potencial reconhecido. E em relação às quais podemos ter um reforço do investimento, que garanta sua sustentabilidade mas que, simultaneamente, assegure a sua continuidade e que tudo o que foi investimento já feito não é perdido por causa deste período de exceção.
Depois, temos de facto essas duas medidas, que não são efetivamente novas, já estavam disponíveis. O que quisemos foi salientá-las, não integrando o pacote. Considerámos que o pacote específico vale 25,3 milhões de euros — isto são os apoios diretos às startups. E há este pacote adicional de mais 242 milhões de euros, que corresponde a linhas que estão já em vigor e em relação às quais quisemos apenas reiterar a sua relevância e a sua disponibilidade em termos de fundos disponíveis porque, na prática, estão aquém, muito, muito longe de estarem esgotadas. Portanto, este pode ser também o momento de sermos mais intencionais na utilização destas linhas.
Em relação às cinco medidas que o Governo lançou de 25,3 milhões, que características vão ter as novas calls da Portugal Ventures? Qualquer empresa vai poder candidatar-se a este apoio? Quanto dinheiro é que a PV vai ter disponível para ajudar startups?
Em relação à Mezzanie Funding for startups, o objetivo é ser um reforço de capital destas startups de maior potencial, assegurando ao mesmo tempo aquilo que é a proteção do capital que também já foi investido anteriormente. Dirige-see às startups em que já houve investimento. E pomos aqui algumas condições de elegibilidade, que têm a ver com o objetivo de não haver despedimento de trabalhadores durante este ano de 2020. O que queremos garantir é que elas continuam a sua atividade e que não perdem capacidade produtiva. Quisemos garantir que há uma obrigatoriedade de financiamentos prévios por parte de business angels ou de parceiros estratégicos que, de alguma forma, já validaram a sua relevância e o seu potencial e, portanto, os tickets [tranches de investimento] médios que estamos a apontar oscilam entre os 50 mil e os 100 mil euros de investimento a promover pela PV. A dotação global deste fundo será de cerca de 10 milhões de euros, dividido em duas tranches. Neste momento, já estão os primeiros 5 milhões disponíveis. Agora, em função da adesão e da procura reforçaremos com os outros 5 milhões que também estão identificados como disponíveis.
Os prazos para as startups concorrerem a estas novas linhas de financiamento serão divulgados em breve? Já estão abertas as candidaturas?
A call será divulgada ou publicada num curtíssimo prazo, diria que ainda esta semana.
Em relação ao StartupHR, o apoio financeiro equivalente a um salário mínimo por colaborador. Isto na prática é o quê e quem é que pode recorrer a este incentivo?
Qualquer startup que assuma o compromisso de não reduzir os seus postos de trabalho pode recorrer a esta medida, basta estar registada no Startup Hub, o nosso portal, e optar por esta solução em detrimento do layoff. O objetivo é promover um apoio financeiro, uma injeção de liquidez nestas startups, através de um incentivo que tem por base de cálculo os postos de trabalho, a componente da sua estrutura de custos mais relevante, que são os recursos humanos. A ideia foi apoiar por posto de trabalho, com um salário mínimo, até um máximo de 10 colaboradores para, na prática, garantir que não há aqui uma quebra de liquidez imediata por parte destas startups.
Cada startup poderá recorrer a este incentivo, independentemente do número de colaboradores que tenha, mas poderá receber este salário mínimo vezes 10?
Sim, são 6.350 euros.
Será uma injeção desse valor que a empresa receberá. Pelo que estou a perceber, empresas que já tenham despedido colaboradores no decorrer desta pandemia não poderão aceder a este tipo de apoios. Certo?
Certo. Porque o objetivo é contrariar essa tendência de emagrecimento e de redução de capacidade produtiva das startups e, portanto, o critério para apoiarmos é exatamente não ter acontecido essa redução de recursos humanos.
E isto é transversal às cinco medidas?
Deixe-me ver aqui o vale de incubação, mas sim, o vale de incubação também. Sim, [é transversal]. Está certo.
Só para o Mezzanine Funding têm reservado quanto investimento?
10 milhões de euros.
Então, serão 10 milhões para este e 10 milhões para a call da Portugal Ventures?
Não, são 3 milhões para a call da Portugal Ventures e 10 milhões para o Mezzanine Funding. No agregado, serão 13 milhões.
Os critérios para a elegibilidade do Mezzanine Funding quais são?
Têm de ser empresas consideradas inovadoras e inscritas no Startup Hub ou numa incubadora, ou que já tenham sido alvo de investimento por parte de business angels ou investidores em capital de risco acreditados pelo IAPMEI ou pelo IFD, ou que também possam ser reconhecidas pela ANI. Tudo isto são requisitos alternativos. Depois, têm de estar fundadas há mais de um ano e que não tenham dívidas às Finanças ou à Segurança Social.
“O desemprego vai criar maior pressão para acelerar processo de requalificação das pessoas”
Além destas medidas para as startups, foi também publicado recentemente em Diário da República o plano do Governo para a Tansição Digital, com uma série de medidas. Uma delas é o UpSkill, que pretender reconverter 3 mil ativos empregados e desempregados em profissionais das atividades tecnológicas. Isto vai começar quando? É algo que pode ter especial relevância na crise económica que vem aí.
Este plano surge como uma iniciativa estratégica na forma como queríamos planear o trabalho para esta legislatura, sendo que a transição digital é assumida no programa de governo como um dos quatro desafios estratégicos. Temos em Portugal muitos bons exemplos e somos apontados internacionalmente em muitas áreas como inovadores nas áreas de digitalização, mas faltava aqui uma marca que nos pudesse distinguir e posicionarmo-nos internacionalmente e apresentar como um país que aposta no digital de forma mais intensiva e mais intencional. E definimos três principais pilares da nossa estratégia, naquilo que são as múltiplas dimensões do digital.
Primeiro, pessoas. O tema das competências como um desafio estratégico que o país enfrenta. E quando pensamos em competência falamos naquilo que é a dinâmica do ciclo de vida do cidadão. A escola digital, estamos agora a lançar as bases dessa abordagem a uma escola mais digital, que esta pandemia só veio tornar mais premente e mais urgente, mas que na realidade já constava do nosso plano como um dos objetivos estratégicos e prioritários.
A segunda dimensão na parte das competências tem a ver com a requalificação profissional e com a capacidade de reajustar a nossa força de trabalho e os nossos recursos humanos àquilo que o mercado de trabalho está à procura. E é aí que se insere esta medida. E depois também uma preocupação muito grande com a inclusão digital e as faixas da população que, de algum forma, ficaram à margem deste processo. Não queremos que essa infoexlcusão se traduza em exclusão social. Também temos uma abordagem, um foco específico nesse segmento populacional.
Depois, temos um pilar dirigido às empresas, onde também seguimos a lógica do ciclo de vida da empresa, que tem uma primeira parte e foco nas startups e no ecossistema de empreendedorismo como o alimentador de uma transformação económica e empresarial, com um novo modelo e mais inovação, criatividade e digitalização. Depois, temos aquilo que é a transformação do nosso tecido empresarial mais estável e no qual o desafio é conseguirmos que eles se adaptem e se ajustem, seja do ponto de vista do comércio ou da indústria, àquilo que é uma nova forma de pensar os modelos de negócio, com a indústria 4.0. E depois temos a componente de associação àquilo que é o ecossistema científico e em relação ao qual queremos uma aproximação muito mais estreita.
O terceiro pilar tem a ver com o papel do Estado, que precisa de ser amigo das empresas e de cidadãos e que tenha um conjunto de instrumentos que nos ajudem nessa atividade diária.
Essa medida em concreto que referiu tem a ver com aquilo que é a abordagem daquilo que acreditamos ser uma requalificação de uma parte da nossa força de trabalho, que em muitos casos pode estar ou desempregada ou subempregada (empregos que estão aquém das suas competências). Queremos garantir que aceleramos esse processo de reconversão. Convidámos as empresas através da APDC (Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações), que tem associadas que são tipicamente empresas tecnológicas, de telecomunicações ou de relativa dimensão e que são grandes recrutadores, e com as quais queríamos fazer um planeamento e uma estruturação daquele que é o processo do recrutamento de novos colaboradores para a área do digital.
Com base nesse levantamento, então, sim, pudemos estruturar uma abordagem que fosse consistente, que fosse coerente e que nos permitisse, em articulação com a capacidade instalada de formação, fazer um planeamento atempado e plurianual. As empresas fizeram um levantamento das suas necessidades de recrutamento e chegámos às três mil pessoas no prazo de três anos, com a expectativa de que podemos antecipar este horizonte temporal de formação. Mas queremos ser mais ambiciosos. Este protocolo de colaboração já foi assinado quer com a APDC quer com as empresas associadas e outras que se juntaram.
Convidámos as empresas a envolverem-se na definição dos currículos e das ofertas formativas para garantir que estão alinhadas com as necessidades efetivas das empresas. Não queremos só formar e requalificar em abstrato, queremos qualificar alinhados com aquilo que é a procura do próprio mercado de trabalho e depois também tirar partido da nossa rede de politécnicos, que mostrou grande flexibilidade para incorporar na sua oferta formativa e fazer a ponte com estas empresas para ter de facto uma oferta direcionada para a necessidade de mercado.
Tudo isto foi pensado na era pré-Covid-19, mas tendo em conta a situação atual, há estimativas de quando é que isto poderá de facto avançar? Pode ser atrasado?
A nossa expectativa é de que o contexto atual não faz perder importância, antes pelo contrário. Esta necessidade e a estimativa daquilo que vai ser o impacto em termos de desemprego vai provavelmente criar ainda maior pressão para termos capacidade de acelerar este processo de requalificação. Mas também não escondo a indefinição e incerteza das empresas. Estas empresas assumiram o compromisso de recrutar e contratar com contratos de trabalho estes recursos qualificados. Esse é um dos compromissos, têm de contratar estas pessoas. É justo que o Estado na medida em que cofinancia o processo de reconversão e formativo também exija às empresas o compromisso de as contratar. Estamos agora numa fase negocial para perceber se temos de aligeirar um bocadinho estes números ou se as empresas estão disponíveis para ainda assim dar sequência ao processo.
E a tarifa social de serviços de internet? Isto na prática como é que poderá funcionar? É em parceria com as operadoras? Como é que se traduz?
Num mundo cada vez mais digital e onde os serviços são cada vez mais fornecidos por via digital, não podemos deixar franjas de população excluídas desse acesso. E, portanto, a inexistência de condições económicas por parte de alguma população para subscrever este tipo de serviços cria condições indesejadas. E essa população pode ficar à margem daquilo que é um processo de transformação e até de participação na cidadania e vida económica do país. Quisemos criar as condições e iniciámos uma negociação com os operadores, que são empresas privadas, e também em articulação com o regulador, para termos uma oferta de serviços de internet com um custo reduzido e que cumpra, de facto, com essa missão social de universalização do acesso à internet. O objetivo é que as pessoas com carências económicas possam ter acesso a um serviço de internet, que hoje é mais ou menos consensual que é um serviço básico para todos nós.
Com as circunstâncias atuais ainda se torna mais urgente e por isso lhe pergunto quando é que isto poderá arrancar ou se não será tão cedo.
Fomos todos surpreendidos pela pandemia, isto já tinha sido iniciado, já tínhamos sinalizado conversas com os operadores nesse sentido. O regulador, a Anacom, também está a colaborar ativamente com o Governo naquele que poderá ser o desenho específico do modelo de disponibilização. Porque há aqui várias opções em cima da mesa, desde haver uma parte de cofinanciamento público para baixar o custo final ao utilizador ou ser apenas numa lógica de responsabilidade social das empresas, que demonstrem essa vontade de baixar os custos para franjas mais carenciadas da população. Há aqui um grande cardápio de opções. em relação às quais não há ainda nada fechado, porque entretanto fomos surpreendidos por esta crise. As operadoras têm feito um esforço muito grande e isso tem sido apontado mesmo internacionalmente como um exemplo também. Apesar da procura crescente que se verificou do ponto de vista do teletrabalho e do ensino à distância, e que colocou em cima das redes uma enorme pressão, a verdade é que o ecossistema conseguiu responder e não houve aqui nenhuma espécie de rutura ou colapso do ponto de vista de resposta e isso também tem sido muito bom.
Também temos de falar das zonas livres tecnológicas. Onde serão? Sei que são zonas para testar novas tecnologias, inclusive o 5G, haverá alguma para testar só o 5G? Há alguma novidade em relação a este assunto?
Este diploma surge de um objetivo que é nós encontrarmos um quadro regulatório que seja ainda mais amigo da inovação e da experimentação. O que verificamos é que em áreas particularmente reguladas o nível de exigência muitas vezes é incompatível com uma experimentação forte e um nível de atratividade de novos investimentos, porque essa regulamentação, de alguma forma, constitui um fator de inibição de captação de novos investimentos. O objetivo é olhar para estas áreas em que já há tecnologias emergentes e criarmos um framework que queremos que funcione como uma base comum de criação de condições para um regime regulatório mais favorável e mais simplificado, que depois seja objeto de regulamentação específica em função de cada setor ou cada indústria nas quais queremos apostar mais intencionalmente.
Estão já identificados alguns setores, como potenciais candidatos a zonas livres tecnológicas. Estas zonas têm uma delimitação geográfica específica, não abrange o país inteiro, a ideia é que apostemos em determinadas regiões ou cidades como monstras e espaços privilegiados para essa tal experimentação, à semelhança do que outros países já fizeram. Mas queremos ser inovadores e criar esta framework comum e que permite a quem quer que seja que queira inovar tenha ali uma base que cria as condições mais favoráveis para uma exploração mais intencional e forte. Vamos pôr em consulta pública a base desta framework comum, que esperamos ter fechada ainda durante o primeiro semestre de 2020.
“É essencial que haja alguma capacidade de monitorização da doença a nível nacional”
Têm estado a surgir aplicações, um pouco por todo o mundo, de rastreamento de contactos, algumas por Bluetooth, outras por geolocalização, e que preveem evitar a propagação do contágio por Covid-19. O Governo já recebeu algum contacto de empresas portuguesas ou estrangeiras que tivessem este tipo de solução e que pudessem ser integradas nos nossos sistemas?
Essa discussão está a ser feita quer ao nível nacional quer ao nível europeu sobre qual é o modelo que queremos adotar em termos de ferramentas que nos podem ajudar num período de normalização e de retoma da nossa vida económica e social, de alguma normalidade. Que ferramentas digitais e aplicações podem ser úteis na monitorização da fase de normalização da pandemia. Essa discussão, a nível europeu, tem sido pautada por alguma cautela, que nos tem impedido, de alguma forma, de adotar modelos que noutras geografias foram mais facilmente implementáveis, uma vez que a sensibilidade ao tema da privacidade e dos direitos individuais é nessas geografias um bocadinho menos relevante do que na Europa. A Europa é por tradição um espaço de grande respeito por aquilo que são os direitos individuais dos cidadãos, do ponto de vista de privacidade e da sua própria segurança e, portanto, a abertura a soluções que podem ser consideradas mais invasivas é menor na Europa.
Estamos sempre a jogar no equilíbrio entre a capacidade de monitorizar de forma muito eficaz e apertada aquilo que pode ser o comportamento da doença e, por outro lado, o respeito pelos direitos individuais. Há algumas orientações, recomendações a nível europeu, no sentido de garantir que há, de facto, alguma ferramenta de apoio, mas que terá de ter sempre uma base voluntária — ela nunca será imposta, terá de ser sempre o cidadão a ter a última palavra sobre a disponibilidade do acesso a este serviço e a colocar no fundo a sua informação de movimentação ao serviço da comunidade. Essa é uma opção que será sempre tomada pelo próprio cidadão, nunca será imposta.
Portanto, terá de ser sempre uma opção voluntária.
Sim, voluntária e não mandatória. Essa é uma opção que já está tomada a nível europeu e que, embora o Governo português ainda não tenha formalmente expressado a sua posição, alinhará com certeza também com esse princípio, de voluntariado. E depois estamos a trabalhar com aquilo que é o ecossistema, garantindo que estamos alinhados do ponto de vista de requisitos com estas orientações europeias e nacionais, porque já há uma toolbox europeia sobre quais devem ser os princípios e recomendações a adotar em qualquer app que venha a ser desenvolvida. E estamos a trabalhar com o Ministério da Ciência, com a comunidade de programadores nacionais no sentido de avaliar as várias aplicações que já estão disponíveis, muitas delas inspiradas em modelos externos com adaptações àquilo que é o quadro europeu e nacional. E diria que vamos ter novidades muito em breve, com a certeza de que serão muito relevantes nesta fase em que vamos entrar, de abertura da nossa economia outra vez à sua fase de normalidade e para a qual é essencial, mesmo do ponto de vista de confiança — quer dos cidadãos quer dos outros países, quando se começar a pensar em abrir fronteiras —, que haja de facto alguma capacidade de monitorização da doença ao nível nacional.
Então, é uma discussão que já está a acontecer entre o Estado, a comunidade científica e a tecnológica do país.
Sim e já estamos muito adiantados quer naquilo que são os princípios comuns quer naquilo que pode vir a ser o desenho e a solução em si mesma, o desenvolvimento das próprias aplicações, em concreto. Muito brevemente, teremos novidades.