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O diretor da Altice, Armando Pereira, participa num pequeno almoço de trabalho entre o Presidente da República de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, com empresários e investidores franceses em Paris, França, 17 de março de 2015. A deslocação do Presidente da República a Paris tem como objetivo o estreitamento de relações entre Portugal e França, e tem na agenda uma visita à OCDE, um encontro com o presidente francês François Hollande, reuniões com empresários e investidores franceses e também com a comunidade portuguesa. MÁRIO CRUZ/LUSA
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Armando Pereira está em prisão domiciliária

MÁRIO CRUZ/LUSA

Armando Pereira está em prisão domiciliária

MÁRIO CRUZ/LUSA

Armando Pereira, que tudo resolve na Altice, terá posto Hernâni Vaz Antunes no coração do grupo mas negou ser seu amigo

Armando Pereira negou ter uma relação de amizade com Hernâni Vaz Antunes. Mas, segundo a Operação Picoas, abriu-lhe as portas da Altice e juntos fizeram negócios.

Armando Pereira era o “amigo” que tudo resolvia no grupo Altice. Hernâni Vaz Antunes é o exemplo típico “de quem nada detém mas tudo controla”. Álvaro Gil Loureiro tentou ocultar provas e Jéssica Antunes prometeu fornecer extratos das contas a que ainda tem acesso. Hernâni Vaz Antunes avisou Gil Loureiro e Armando Pereira que vinha aí uma inspeção fiscal dos serviços de Braga. Revelações que foram obtidas nos interrogatórios aos quatro arguidos no âmbito da Operação Picoas, apurou o Observador.

O juiz Carlos Alexandre ouviu os quatro arguidos no decurso das últimas semanas, tendo decretado prisão domiciliária para Armando Pereira e Hernâni Vaz Antunes. Jéssica Antunes e Álvaro Gil Loureiro saíram em liberdade, mediante caução de 500 e 250 mil euros, respetivamente. Nenhum dos arguidos pode falar com os outros, estendendo-se a proibição de contactos a outras pessoas não arguidas e ao contacto com empresas. Ficam proibidos de contactos com o Grupo Altice.

Ao que o Observador apurou, o juiz Carlos Alexandre assumiu no final dos interrogatórios que a indiciação dos factos imputados pelo Ministério Público aos quatro arguidos detidos é válida e declarou que a alegada prática do rol de alegados crimes que vão desde a corrupção privada ativa e passiva, até à fraude fiscal qualificada, branqueamento de capitais, dissimulação de residência fiscal e falsificação de documento — apenas Armando Pereira não está indiciado por fraude fiscal, como aliás o seu advogado já tinha dado conta — é objetiva. Este é um caso que passa por jurisdições tão diferentes como a República Dominicana, EUA, Emirados Árabes Unidos, França, Luxemburgo e, claro, Portugal, como o Observador já tinha relatado.

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Se neste momento existem quatro arguidos, a lista deverá, em breve, aumentar, estendendo-se a outras pessoas e sociedades. Ainda que a investigação acredite que tenha sido destruída prova, até pelos alertas que os arguidos terão confessado terem recebido.

Avisos de que ia haver fiscalização fiscal

Foi ao Luxemburgo e à Madeira tratar de assuntos. Assim descreveu Álvaro Gil Loureiro os motivos das suas viagens a essas duas localidades onde estão sediadas várias das empresas da teia da Operação Picoas. Viagens que aconteceram depois de um telefonema de Hernâni Vaz Antunes (a 5 de julho) informando-o de que deveria acontecer, em breve, uma fiscalização das Finanças de Braga, tal como o Correio da Manhã já tinha avançado.

Depois desta primeira resposta no interrogatório, o arguido decidiu concretizar um pouco, assumindo ter ido “limpar” os escritórios, admitindo os autos que nessa limpeza foram destruídas provas. E ocultou outras. Guardou vários dossiers (130) e informação num escritório próximo do sítio que foi alvo de buscas. Tendo aceitado buscas a esse anexo onde foram encontradas mais de uma centena de pastas de arquivo. Gil Loureiro aceitou, ainda, no âmbito deste interrogatório ceder acessos a computadores. Mas o Ministério Público não descarta que possa haver mais documentação ocultada em outros locais.

E como soube Hernâni Vaz Antunes das diligências? Por pessoa das suas relações, não identificada. Soube-o no final de junho, princípio de julho, e avisou não apenas Álvaro Gil Loureiro como também terá falado disso com Armando Pereira. Este também indicou que um familiar o alertou de ter visto um carro de uma estação de televisão (TVI) perto da sua casa em Guilhofrei, Vieira do Minho, mas assumiu não ter dado relevância por ser habitual no verão irem “cuscar”. O jornal Nascer do Sol noticiara que Armando Pereira teria sido contactado pela TVI para um comentário anterior às diligências que aconteceram a 12 e 13 de julho, mas a estação de Queluz desmentiu ter sido a fonte, apontando para uma professora universitária do norte bem relacionada com os meios judiciais, segundo avançou a TVI.

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A operação decorreu a 12 e 13 de julho, mas Hernâni Vaz Antunes não foi localizado, apesar de terem sido enviadas mensagens, tendo mesmo sido pedida intermediação a Melissa Antunes. Mas só à noite de dia 14 de julho o arguido se apresentou às autoridades. E, segundo o Ministério Público, há colaboradores de Hernâni Vaz Antunes que continuam ausentes de locais de residência.

Alexandre não acredita na visão angelical de Jéssica

Para já, o Ministério Público considera que os arguidos têm papéis distintos no que apelida de circuitos de contratação, faturação, operações financeiras e contabilização. Jéssica Antunes e Álvaro Gil Loureiro têm funções de colaboração necessária e essencial mas segmentada quer em termos geográficos quer ao nível de temas, considerando-se, nesta fase, que estes dois elementos não tinham conhecimento integral desses circuitos. Ainda assim tentaram, nos interrogatórios, notar que o seu papel era instrumental e de executantes. Mas Carlos Alexandre levanta dúvidas.

No caso de Jéssica Antunes, recorda que a arguida tem 37 anos, é licenciada em análises clínicas e tem um mestrado em gestão, que tem de valer para alguma coisa, nomeadamente para saber que tipo de ordens o pai [Hernâni Vaz Antunes] lhe dava e ao que conduziriam. Jéssica terá tentado o argumento do desconhecimento já que alguns processos eram acompanhados, segundo terá declarado, por Álvaro Loureiro, referido como o especialista. Noutros casos atirou, mesmo, para a irmã Melissa Antunes (não é arguida neste caso) por serem empresas da sua esfera.

Só que as escutas mostrarão outra Jéssica, na ótica de Carlos Alexandre: uma pessoa com conhecimento profundo dos termos técnicos dos negócios e com um tom perentório. Terá, mesmo, em sede de interrogatório, mostrado domínio sobre as estruturas montadas nos Emirados Árabes Unidos, tendo revelado intervenção e conhecimento dos fundos de empresas em Portugal para as contas abertas junto de bancos nos Emirados Árabes. Também se considera ser relevante o seu papel nos circuitos com os Estados Unidos, segundo o Ministério Público.

O juiz de instrução não acredita, pois, na visão angelical e um pouco displicente que tinha sido apresentada sobre Jéssica Antunes, pelo que considerou adequado ter medidas de coação que, além da caução e limitação de contactos, passam por apresentações duas vezes por semana na polícia e apreensão do passaporte com proibição de sair de Portugal (até porque já teve domicílios noutros países). Jéssica Antunes terá prometido fornecer extratos das contas a que ainda tem acesso.

Álvaro Gil Loureiro, em tribunal, apresentou-se como um funcionário obediente de Hernâni Vaz Antunes, levando o Ministério Público a considerar mesmo que demonstra um temor reverencial ao empresário de Braga, considerado pelo economista como um pai. Muitas das empresas onde Álvaro Gil Loureiro tem presença acionista, nomeadamente a Smartdev, uma das empresas compradoras de imóveis da ex-PT, é como fiduciário de Hernâni Vaz Antunes, o que lhe deverá render bónus e comissões (que se suspeitam muito superiores ao declarado fiscalmente) e, como tal, dependendo economicamente de Vaz Antunes.

Há uma teia de empresas com negócios com a Altice que está sob investigação

Ao que o Observador apurou, é imputada a este arguido a execução, por exemplo, da estratégia de deslocação de algumas sociedades de Hernâni Antunes para a Zona Franca da Madeira, com o objetivo de poupança fiscal, sugerindo-se mesmo em alguns telefonemas intercetados que na Madeira existiam apenas folhas de papel em branco.

Se o seu papel é auto-promovido como secundário e de mero executor — tendo até várias vezes considerado algumas das condutas legais –, o juiz de Instrução acabou por lhe aplicar uma caução de 250 mil euros, mas a mesma obrigação de se apresentar duas vezes por semana na polícia e proibição de sair de Portugal, entregando o passaporte, além de limitar os seus contactos.

Mas foi do seu interrogatório que foi revelado que os arguidos tinham recebido alertas sobre a investigação.

Logotipo da Altice no edificio da Altice em Lisboa. 20 de julho de 2023. MIGUEL A. LOPES/LUSA

O grupo Altice está no centro da Operação Picoas por ter sido utilizada em alegados esquemas

Miguel A. Lopes/LUSA

Armando Pereira negou três vezes amizade com Hernâni Vaz Antunes

Armando Pereira e Hernâni Vaz Antunes serão, segundo acredita o Ministério Público, os conhecedores do circuito de negócios que está a ser investigado, quer em termos geográficos quer em termos de identificação de pessoas a comprometer, as atribuições, negócios a conquistar, etc.

Um e outro, pelas suspeitas que estão a ser investigadas, são os verdadeiros beneficiários de várias empresas que têm terceiros na montra. E, por isso, foi com surpresa que Ministério Público e juiz de instrução ouviram Armando Pereira negar, por três vezes, relação próxima com Hernâni Vaz Antunes. Negou amizade dizendo que o conhecimento com Vaz Antunes era comercial.

Surpreendeu até o advogado de Vaz Antunes que terá, mesmo, indicado que o seu cliente terá feito tudo o que Armando Pereira necessitou, disponibilizando casas, cozinheiras, cartões, forjar faturas (alegadamente em benefício de Yossi Benchetrit, genro de Armando Pereira, e do seu pai, David Benchtrit), e até para comprar um carro para uma terceira pessoa para que Armando Pereira não se expusesse. Armando Pereira não apenas negou a amizade com Hernâni como terá recusado relação próxima com o genro, com quem disse estar apenas duas ou três vezes no ano. No entanto, nas escutas estarão indicações de várias reuniões entre Armando Pereira e Yossi, que estaria mesmo em Guilhofrei na véspera das buscas. Hernâni terá acabado por dizer que Yossi terá sido um dos beneficiários desta teia, mas o Ministério Público suspeita que terá sido Vaz Antunes a ajudá-los a não estarem em Portugal no dia das buscas. Yossi, que era diretor de compras da Altice USA, está suspenso de funções.

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Também com o compadre nega relacionamento, tentando, segundo o Ministério Público, passar a ideia de que David Benchtrit é uma pessoa néscia e distante. Mas Carlos Alexandre recorda que o pai de Yossi é médico nutricionista com várias clínicas. E terá alegadamente sido beneficiário formal de sociedades nos Emirados Árabes Unidos onde foram recebidos fundos com origem em negócios garantidos com o grupo Altice.

Apesar de se tentar distanciar dos Benchtrits, o Ministério Público diz ser de difícil aceitação que Armando Pereira, acionista de referência da Altice, tenha passado ao lado de pagamentos do grupo para familiares.

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A negação por parte de Armando Pereira de que é amigo de Vaz Antunes não convence nem investigadores nem juiz. Até porque nas escutas Armando fala de Hernâni como um irmão. Para Carlos Alexandre os dois estão intimamente ligados e ajudam-se mutuamente, com benefícios dos próprios e de terceiros. Aliás, admite-se mesmo nesta investigação que Armando Pereira é que colocou Hernâni no coração da Altice.

Até porque como acionista de referência e como administrador (que chegou a ser), Armando Pereira surge referido como o “amigo” que resolve tudo dentro do grupo Altice, quer seja na prestação de serviços, quer seja na venda de imóveis, e até na atribuição da exploração de uma loja. Influência que se estendeu aos Estados Unidos da América. Armando Pereira é caracterizado pela investigação como tendo capacidade de intervenção e influência nas decisões da empresa. O grupo Altice, em várias geografias, já avançou com investigações internas.

Armando Pereira é suspeito de ter recebido imóveis (Paris, Leça, Lisboa), cartões de crédito e até lhe terão sido pagas obras na sua casa em Portugal por ter ajudado Hernâni Vaz Antunes dentro da Altice, nomeadamente em contratos com fornecedores. Acabaria, no decurso do interrogatório, por reconhecer que sabia que determinadas empresas eram de Vaz Antunes quando a Altice as contratou, assumindo que pretendia ajudar.

Este arguido está em prisão domiciliária, impedido de contactos. Foi-lhe retirado o helicóptero. A investigação assume desconhecer se além do passaporte português Armando Pereira terá outro, até porque a residência é na Suíça e tem casas nas Caraíbas. Tal como o Observador escreveu, o Ministério Público sugeriu que a medida de prisão domiciliária pudesse ser substituída por uma caução de 10 milhões de euros — o montante de dividendos que diz obter anualmente — mas Carlos Alexandre não aceitou, aplicando a medida de prisão domiciliária sem possibilidade de caução.

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Hernâni Vaz Antunes fala da Altice como “nós”

Hernâni Vaz Antunes é um dos principais arguidos da Operação Picoas. Segundo o Ministério Público é o exemplo típico de quem nada detém mas tudo controla, não aceitando que a alegada ocultação de participações em empresas se deva ao gosto pela descrição, já que ao fazê-lo oculta, também, rendimentos, contas bancárias, negócios, verificação de partes relacionadas e conflitos de interesse. Terá confessado, no interrogatório, que será o real beneficiário de muitas das empresas. A teia de sociedades é complexa e, por isso, indiciador, segundo os investigadores, de que será um instrumento para práticas ilícitas.

O empresário de Braga, que em jovem emigrou para o Canadá, terá, segundo a investigação, capacidade de condicionar os seus colaboradores que vivem na sua dependência económica, mas também trabalhadores do grupo Altice. O Ministério Público até aponta o facto de várias vezes Hernâni Vaz Antunes se ter referido à Altice usando a expressão “nós”.

Este arguido é caracterizado pela investigação como tendo uma natureza imperativa, manipuladora, calculista, egocêntrica e impulsiva, acrescentando Carlos Alexandre que é uma pessoa com facilidade em estabelecer contactos e obter simpatias.

O Correio da Manhã noticiou que Hernâni Vaz Antunes, quando compareceu a interrogatório, até ofereceu ao juiz Carlos Alexandre emprego no privado.

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