Pedro Nuno Santos e Rui Rocha foram os primeiros a trocarem os argumentos de campanha frente às câmaras no primeiro dos 28 frente a frente até às legislativas (que incluem ainda dois debates alargados). Na noite desta segunda-feira, às 21h00, na SIC, o secretário-geral do PS e o líder da Iniciativa Liberal falaram de contas certas, impostos e políticas sociais. Uma hora depois, na RTP3, foi a vez de André Ventura, do Chega, e Inês Sousa Real, do PAN, discutirem alianças nas ilhas (e não só), polícias e outras forças de segurança, combustíveis e quem avança com mais medidas no Parlamento e quem votou mais ao lado de quem nesta legislatura.
Quem ganhou cada um dos debates? Ao longo destes dias — o último debate é dia 23, pode ver aqui o calendário completo —, um painel de avaliadores do Observador vai dar nota a cada um dos candidatos por cada um dos frentes a frente. E explicar porquê. A soma vai surgindo a cada dia, no gráfico inicial.
Pedro Nuno Santos (PS)-Rui Rocha (IL)
Alexandra Machado — Pedro Nuno Santos partia com uma vantagem. O programa da IL já é conhecido, o do PS não. E por isso pôde seguir o seu guião de que a IL provocaria um rombo na economia e fez as contas ao programa da IL — custaria 9 mil milhões. A inexperiência de Rui Rocha tramou-o (em particular no início do debate) e não foi bem sucedido em contestar esta crítica – falou, sem explicar bem, num programa de 4 a 5 mil milhões, esperando que o milagre económico faça o resto. Um debate sem surpresas em termos de ideias e debates, com o Dr. Rui Rocha (assim o tratou Pedro Nuno) a defender menos estado, mas Pedro Nuno Santos (assim foi tratado por Rui Rocha) a apresentar-se sem dogmas (disse-o várias vezes) mas não conseguindo ganhar na defesa das decisões do governo, em particular das suas.
Helena Matos — Rui Rocha começou mal, não respondeu à declaração/acusação de PNS sobre as notícias”insidiosas” corroboradas pela IL sobre o quanto ele PNS paga de IMI e recebeu subsídio de deslocação. O que sobressaiu foi PNS a dizer “sou um homem sério”. Rocha também não conseguiu afirmar como credíveis as contas da IL sobre redução da carga fiscal. PNS 2024 apostou em fazer da IL os radicais que até podem trazer outra vez a austeridade. Na segunda parte do debate quando se começou a debater a realidade Rui Rocha foi ganhando volume e embalo. PNS fica literalmente aos papéis nesta fase. Resultado: Rui Rocha ganhou o debate porque o melhor momento de Pedro Nuno Santos já tinha acontecido há largo tempo.
Miguel Pinheiro — O socialista entrou no debate com um número: 9 mil milhões, o suposto “rombo” que seria provocado nas contas públicas pelas medidas da IL. E entrou no debate com uma palavra: “magia”. Acusou Rui Rocha de prometer fazer “magia fiscal” e denunciou, como se estivesse perante um Harry Houdini político, que “a magia não existe”. Mas, quando o líder da IL lhe recordou a sua “incompetência” na habitação, engasgou-se como se estivesse a tentar engolir uma côdea de pão seco. O líder da Iniciativa Liberal demorou a arrancar, como se fosse um carro comprado em terceira mão. Foi preciso esperar nove longos minutos até encontrar o tom: foi só depois de ouvir Pedro Nuno Santos acusá-lo de pretender introduzir na pátria políticas “aventureiras” que Rui Rocha decidiu lembrar que “em metade dos países europeus há governos com partidos liberais e políticas liberais”. Insistiu: “São soluções testadas”. É o melhor argumento que a IL pode utilizar no debate público: o partido só quer que nós apliquemos políticas que são rotineiras e bocejantes na Europa.
Pedro Jorge Castro — Cadê o Cotrim e como é que isto aconteceu à Iniciativa Liberal? Não havia alternativa: ou Rui Rocha arrasava Pedro Nuno Santos e começava a disfarçar o facto de não ser o anterior líder da IL; ou deixava o candidato socialista safar-se, adensando as nuvens sobre os resultados dos liberais nas próximas eleições. Correu ainda um bocadinho pior: Rui Rocha precisou de falar 12 minutos até apontar a incompetência e o falhanço do ex-ministro de Costa. Antes, perdeu-se em números, disparou demasiados tiros ao lado e deixou golpes sem resposta. Grande azar ter começado por aqui. Pedro Nuno Santos sobreviveu, para já.
Sara Antunes de Oliveira — Sem grandes surpresas, Pedro Nuno Santos entrou com mais confiança e foi particularmente eficaz no que menos se esperava: no número do impacto do choque fiscal. Rui Rocha não conseguiu responder com firmeza e, mais do que isso, cometeu o erro de não apresentar um número claro. Sempre a olhar para os monitores do estúdio, provavelmente a controlar o relógio, o líder da IL pareceu sempre mais nervoso, mas recuperou no tema da Saúde. Foi claro e incisivo e conseguiu deixar o secretário-geral do PS sem uma resposta credível. Se isto não é como começa, é como acaba, então Rui Rocha fica um ponto à frente, apesar de, no geral, ter sido um debate equilibrado.
André Ventura (Chega)-Inês Sousa Real (PAN)
Alexandra Machado — Entre os dois são sempre debates acesos. Seja na televisão seja no Parlamento. E este não fugiu, com André Ventura (afinal igual ao passado) a fazer tudo (conseguindo algumas vezes) para conduzir o debate para os temas que lhe permitiam atacar o PAN que colou sempre ao PS. Inês Sousa Real defendeu-se (algumas vezes bem), batendo insistentemente na tecla: o PAN, com deputada única, conseguiu aprovar medidas importantes; já o Chega não aprovou qualquer proposta (o PS tem votado sempre contra as propostas deste partido). Em alguns temas até mostraram concordância – embora pelo confronto nem sempre se percebesse isso – com André Ventura no final a atirar a Inês Sousa Real: “Não gosta mais dos animais do que eu”. E outra novidade: Ventura foi assertivo ainda na garantia de que os polícias não vão travar as eleições…
Helena Matos — Foi mais um episódio da saga “Debate entre Inês de Sousa Real e André Ventura” sempre num televisor perto de si se for um eleitor português. Um “Debate entre Inês de Sousa Real e André Ventura” é um acontecimento de características únicas em que os dois protagonistas se interrompem constantemente sem outro objectivo que não seja debitar acusações mútuas. Além da claque de cada um quem assiste a isto? O único momento relevante deste “faz de conta que isto é um debate” sucedeu logo no início quando André Ventura afirmou que estão a acontecer conversações nos Açores que envolvem o Chega. Ou talvez seja mais exacto dizer que o Chega está a procurar conversar. Mas logo a gritaria se instalou. Acredito que ambos se sintam felizes e realizados mas a mim dá-me vontade de desligar o som.
Filomena Martins — Dois líderes debilitados à entrada do frente a frente que, por norma, já é de gritos. Ele, depois do número dos Açores. Ela, depois do artigo demolidor de André Silva no Público, que lhe bateu com a porta (do partido) na cara. Quando se esperava um confronto ideológico de dois dos partidos mais diferentes do Parlamento, estiveram a medir quem apoiou mais o Governo. André Ventura tentou colar o PAN ao PS no continente e ao poder na Madeira; Inês Sousa Real lembrou que só com uma deputada aprovou mais propostas que o Chega com 12. E depois de 15 minutos nisto, Ventura lá chegou ao que queria, falar de polícias e de agricultura. Por isso, no meio dos guinchos dele, ela conseguiu aguentar os ataques constantes e foi a jogo. Inesperadamente, saiu-se melhor.
Miguel Pinheiro — André Ventura deixou-se encurralar numa armadilha que se revelou intransponível. Passo 1: Inês Sousa Real enumera as propostas que o PAN conseguiu aprovar no Parlamento tendo apenas uma deputada, em contraposição com as “zero” do Chega. Passo 2: André Ventura acusa o PAN de estar sempre ao lado do PS. Passo 3: Inês Sousa Real afirma que o Chega votou mais vezes ao lado do PS do que o PAN. Passo 4 (e final): André Ventura fica, inexplicavelmente, sem resposta. Já com o debate a terminar, sentindo que não estava a conseguir impor o seu tom, o seu ritmo e a sua agenda, André Ventura levantou a voz: “E os jovens agricultores?” Já era tarde demais.
Miguel Santos Carrapatoso — Está aberta a temporada da gritaria. Dois líderes atrapalhados com o que se passa nas ilhas (o PAN sem conseguir justificar o apoio ao PSD na Madeira; o Chega embrulhado com o bluff mal-sucedido nos Açores), a discutir quem é mais amigo dos socialistas e dos animais. Se há frase que resume a profundidade deste duelo é esta: “A Inês não gosta mais de animais do que eu, no máximo gosta o mesmo”. Inês Sousa Real foi arrastada para um terreno que não é o seu, Ventura, que diz que será primeiro-ministro depois das próximas legislativas, passou três quartos do tempo a berrar com um partido que tem apenas um deputado, usando uma força completamente desproporcional. Ninguém ganhou votos e todos perdemos tempo.