Desde que começou a invasão russa que mais de 12 milhões de ucranianos foram obrigados a sair de casa, segundo dados das Nações Unidas, desses 5,6 milhões saíram mesmo do país e 6,5 milhões estão noutras regiões da Ucrânia. A Portugal, e de acordo com os dados do SEF, chegaram mais de 33 mil ucranianos ou estrangeiros residentes na Ucrânia que pediram proteção temporária. Segundo os dados dos contratos já publicados por cerca de uma dezena de autarquias no Portal Base, para apoiar os refugiados as autarquias já investiram mais de um milhão de euros. No Porto, até ao momento o único apoio diz respeito a transportes gratuitos.
Com a grande fatia dos contratos a fixar-se nos transportes — quer de carga, quer de pessoas — entre Portugal e a Polónia, tem sido também necessário remodelar instalações, adaptar espaços já existentes ou comprar coisas tão básicas como pão. Em Cascais, por exemplo, a autarquia já fechou contratos para “equipamento de cozinha” ou “pão e outros produtos de padaria/pastelaria” além do fornecimento de refeições ou também do transporte de refugiados.
Os contratos publicados no Portal Base pela autarquia já ultrapassam os 777 mil euros investidos, mas a autarquia explica ao Observador que aprovou em reunião do Executivo um milhão de euros destinado ao apoio aos refugiados. Cascais é, até ao momento e de acordo com os contratos já publicados, a autarquia que investiu a maior quantia destinada aos refugiados ucranianos.
De acordo com as contas do executivo já foram acolhidas “1.329 pessoas de 509 famílias”, tendo sido registadas no “SEF 2.088”.
Em alojamento temporário a autarquia gastou cerca de 400 mil euros. Ao Observador a autarquia explica que foi “operacionalizado um centro de alojamento temporário com capacidade para 228 camas” e ainda outros locais de alojamento temporário. No Centro de Reabilitação e Integração de Deficientes (CRID) foram criadas 40 camas em 10 quartos; no Lar Santa Casa da Misericórdia de Cascais foram criadas 120 camas em 40 quartos; no Estoril Seven criadas 72 camas em 24 quartos; nas Aldeia SOS disponibilizadas 10 camas em 4 quartos; nas Irmãs Hospitaleiras há 13 camas em 9 quartos; e na unidade de Alojamento da Av. De Sintra da Santa Casa da Misericórdia de Cascais há ainda 70 camas divididas por 20 quartos.
“Em todas estas respostas o município, em parceria com as várias IPSS, tem garantido alimentação, cuidados médicos em permanência, apoio psicológico, acesso a transporte rodoviário gratuito, aulas de português, educação, formação e emprego, cuidados veterinários e apoio jurídico, cartões de Vodafone, supermercado social, salvaguardando que todos os direitos destes cidadãos se encontram acautelados”, acrescenta ainda a autarquia cascalense ao Observador.
Depois de Cascais, a autarquia de Almada é a que reportou até ao momento investimentos mais elevados para o acolhimento de refugiados. Segundo o contrato publicado no Portal Base foram cerca de 195 mil euros para “aquisição de serviços para acolhimento de refugiados ucranianos” pagos à Arribatejo, a agência de desenvolvimento local, mas ao Observador a autarquia esclarece que o valor total já ultrapassou os 200 mil euros.
“A autarquia já investiu 207.000 euros, valores relativos a refeições, alojamento, transportes e alocação de Recursos Humanos (estes valores correspondem a recursos internos que o município está a alocar a este trabalho)”, explica a autarquia.
Feitas as contas, a autarquia diz ter assegurado “81 camas no Caparica Sun Center, para o acolhimento temporário de emergência”, das quais foram usadas já 50 “para acolhimento temporário de refugiados”. ”
“Até ao momento, Almada recebeu cerca de 700 cidadãos ucranianos que têm ficado alojados juntos de familiares ou amigos. Quando chegam ao nosso concelho, é-lhes assegurada alimentação, bens de primeira necessidade, e inclusivamente, o apoio de um psicólogo”, explica a autarquia ao Observador acrescentando que “todos os cidadãos são encaminhados e acompanhados para obterem os documentos necessários.”
“Foi criada uma equipa de intervenção multidisciplinar que tem vindo a realizar um acompanhamento rigoroso e eficaz na resposta a todas as situações sinalizadas, suprindo necessidades imediatas. Foi realizada uma operação de recolha de bens essenciais que contou com a colaboração de todas e todos os almadenses, mas, também, da população dos concelhos vizinhos. Esta operação contou com o apoio dos voluntários “Panteras” da Proteção Civil, tendo sido enviados mais de 30 toneladas de bens para a Polónia para apoio aos refugiados”, acrescenta ainda a autarquia.
Em Gondomar a autarquia tem firmados no Portal Base dois contratos, com um custo total de 29.250 euros para “transporte via autocarro de refugiados da Polónia para Gondomar”, mas a autarquia diz que tem assegurado outras respostas aos refugiados por via da “forte mobilização da comunidade” que tem permitido “responder às necessidades”.
“Se tivéssemos em linha de conta este apoio externo de particulares e empresas, esses valores ultrapassariam, certamente, 1 milhão de euros”, estima a autarquia gondomarense que fala também em “várias fases de acolhimento”.
No que diz respeito ao transporte dos refugiados, a autarquia explica que esse foi o “primeiro momento” e que permitiu trazer “da fronteira com a Polónia 78 refugiados”. “Posteriormente, foram chegando outros grupos e, mediante as necessidades, fomos organizando as respostas, desde o acolhimento imediato à sua integração na comunidade”, explica a autarquia que diz estar “a trabalhar em estreita colaboração com a Associação Amizade”.
Pelo Centro de Acolhimento de refugiados de Gondomar já “passaram 120 refugiados”, segundo a autarquia que até ao momento teve gastos “no equipamento do centro de refugiados, nos transportes, na recolha de donativos e em alguns bens de consumo”.
Olga Postolenko saiu de Kiev para Leiria. “Saímos do país, mas o país não sai de nós”
Leiria foi uma das autarquias que mais se destacou pela “originalidade” na solução encontrada para acolher os refugiados ucranianos. A autarquia aproveitou os camarotes do estádio municipal para acolher os refugiados que chegaram logo no início de março ao concelho no centro do país. O Observador contactou a autarquia para perceber que gastos teve até ao momento e quantos refugiados oriundos da Ucrânia já apoiou, mas até ao momento da publicação deste artigo não obteve qualquer resposta.
Através dos contratos publicados no Portal Base só é possível perceber que o município leiriense gastou cerca de 20 mil euros na “contratação de serviços de operacionalização de veículos, apoio na carga e descarga de bens e equipamentos de Leiria para a fronteira da Hungria, apoio no transporte de famílias de refugiados da Fronteira da Hungria para Portugal”.
O mesmo acontece com a autarquia de Olhão, que também não respondeu às questões enviadas pelo Observador. Do contrato publicado no Base sabe-se apenas que foram gastos 20.283 euros em dois contratos para o transporte de refugiados desde a Polónia até Olhão.
Em Barcelos, os gastos publicados até ao momento no Portal fixam-se em cerca de 9 mil euros para o “fornecimento de refeições para os refugiados provindos da Ucrânia”, mas a autarquia também não respondeu às questões do Observador sobre o número de pessoas abrangidas pelos apoios.
Loulé e Lagos, que também não responderam ao Observador, fizeram ambos um contrato para serviços de transporte. No caso de Loulé o objetivo, segundo a informação publicitada no portal Base foi transportar “bens de primeira necessidade para apoio aos refugiados da guerra na Ucrânia” (num contrato que custou 5.250 euros), enquanto a autarquia de Lagos fez um contrato (no valor de cerca de 14 mil euros) para alugar um autocarro para “transporte de refugiados” para os percursos Lagos-Polónia e o regresso entre Medyka (na fronteira entre a Polónia e a Ucrânia) e Lagos.
Na área de Lisboa, a autarquia de Odivelas pagou cerca de 16 mil euros pelo aluguer de um autocarro até Varsóvia para o transporte de refugiados. Ao Observador a autarquia esclarece que “tem vindo a realizar um conjunto de medidas de apoio aos refugiados ucranianos” e enumera: “criado o endereço de e-mail ajudaucrania@cm-odivelas.pt” para “centralizar os mais diversos pedidos de esclarecimento e ajuda”; disponibilizou uma “linha telefónica de apoio e encaminhamento psicossocial”; articulou respostas para apoiar as famílias de refugiados com juntas de freguesia, o Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes (CLAIM), o IEFP e a Segurança Social; promoveu um “Concerto Solidário da Banda Maior no dia 11 de março de 2022, com recolha de bens alimentares, médicos”.
Quanto a números mais concretos de apoio, a autarquia de Odivelas diz ao Observador que regista já o “atendimento/acompanhamento a 51 agregados familiares refugiados da Ucrânia”, já integrou “nos vários níveis de ensino nas escolas da rede pública do concelho 56 crianças e jovens deslocadas da Ucrânia” e está ainda a criar “o Projeto Esc@la_com” que consiste na constituição de duas turmas: uma turma com alunos do pré-escolar e 1.º ciclo e a segunda turma com alunos a partir do 2.º ciclo até ao ensino secundário que irá “funcionar três dias por semana” com o objetivo de dinamizar “português língua de acolhimento”.
O Observador contactou também as autarquias dos cinco concelhos com maior densidade populacional no país para perceber que tipo de apoio tem sido dado aos refugiados. A autarquia de Loures não respondeu às questões do Observador e não têm quaisquer contratos publicados no Portal Base. Já Lisboa, Vila Nova de Gaia, Porto e Sintra — também sem contratos publicados — detalham os investimentos feitos (ou previstos) até ao momento para acolher os refugiados da guerra na Ucrânia.
A autarquia de Lisboa diz ao Observador que ainda não é possível “quantificar com exatidão” os custos que teve até ao momento para criar condições para acolher refugiados, mas diz que se centram “maioritariamente em questões de funcionamento do centro de acolhimento temporário nas áreas de alimentação, transportes e recursos humanos”.
No que diz respeito à alimentação, a autarquia lisboeta diz que “foram já servidas mais de 9.400 refeições, das quais mil resultaram de doações” e as restantes 8.400 foram asseguradas pela câmara, na área dos transportes “mais de 270 transportes” foram assegurados “pelos seis corpos de bombeiros voluntários da cidade”.
À semelhança do que aconteceu noutros municípios, a autarquia de Lisboa refere que as “entidades públicas, privadas individuais e coletivas que se associaram à Missão de Apoio à Ucrânia” ajudaram a “assegurar as mais diversas valências de resposta aos refugiados desde a alimentação ao alojamento, saúde, veterinária, vestuário, produtos de higiene e outras necessidades básicas”.
Quanto a números, até 28 de abril em Lisboa “foram acolhidos no Centro de Acolhimento de Emergência do Município de Lisboa 1.896 pessoas, das quais 1.474 durante o mês de março e 422 em abril.”
Ainda na Área Metropolitana de Lisboa, o município de Sintra confirma ao Observador ter acolhido até ao momento “um total de 381 famílias”. São “1.144 pessoas das quais 205 são crianças (de bebés até aos 17 anos)” que estão “registadas junto do SEF e são acompanhadas no decorrer da ativação do Plano Municipal de Acolhimento e Integração de Refugiados”, que existe na autarquia desde 2015.
No que diz respeito aos montantes até ao momento envolvidos, a autarquia estima cerca de 30 mil euros incluindo a “preparação de habitação (com todo o equipamento e móveis), bens alimentares, despesas de eletricidade e água”.
Ainda no âmbito de um “acordo de cooperação com o Instituto São João de Deus – Casa de Saúde do Telhal para o acolhimento e integração de refugiados ucranianos” a autarquia pagou 10.500 euros ao à instituição para compensar os gastos com refeições e “outros consumíveis resultantes do acolhimento” dos refugiados ucranianos.
Na área da solidariedade a autarquia destaca ainda ao Observador a organização do Concerto Solidário pela Ucrânia que arrecadou 6.800 euros de bilheteira que reverteram para a Cruz Vermelha e realça “o esforço solidário dos munícipes” que têm reforçado o “Banco de Recursos da autarquia.”
Já a norte, na Área Metropolitana do Porto, o município de Vila Nova de Gaia confirma ter gastado até ao momento aproximadamente 20 mil euros, em “deslocações e refeições” para apoiar os refugiados ucranianos. “O Município de Gaia tem prestado apoio aos refugiados ucranianos que chegam ao nosso território de diferentes formas, nomeadamente: ao nível do alojamento (com a disponibilização do hostel do Parque Biológico para esse efeito), das refeições (pequeno-almoço, almoço e jantar) e deslocações necessárias (para idas ao médico, ao SEF e CNAIM, por exemplo)”, esclarece a autarquia.
Quanto ao número de refugiados diretamente apoiados no concelho, a autarquia de Gaia conta “cerca de 65 cidadãos, todos referenciados pelo Alto Comissariado para as Migrações” que passaram pelo hostel onde são acolhidos, tendo “45 encaminhados alguns para respostas habitacionais de longo prazo, outros regressaram à Ucrânia” e há ainda quem tenha estado “de passagem para os Estados Unidos da América”, sendo que de momento ainda se encontram “hospedados cerca de 20 cidadãos”.
No Porto, a autarquia responde ao Observador que até ao momento a única medida aprovada está relacionada com o “título de transporte gratuito para cidadãos ucranianos que cheguem à cidade ao abrigo do regime de proteção temporária”. Segundo os cálculos da autarquia “o investimento municipal pode ascender até aos 100 mil euros” sendo que a medida “estará em vigor durante seis meses.”