É um longo olhar sobre o passado, com um orgulho evidente misturado com algum ressentimento, mágoa e a confissão de uma sensação de que o partido nunca esteve lá para ele, como ele esteve para o partido. A carta de Pedro Santana Lopes aos militantes do PSD, que o Observador revelou em primeira mão esta sexta-feira, tem muito da história como ele a tem contado ao longo dos anos.
Leia na íntegra a carta em que Santana se despede dos militantes do PSD
É uma longa missiva de despedida onde faz uma revisão elogiosa do seu próprio percurso e dedicação num PSD que chegou a liderar mas, admite agora, nunca aderiu verdadeiramente às ideias que considera mais emblemáticas: “O PSD gostava muito de ouvir os meus discursos mas ligava pouco às minhas ideias pois, nos momentos decisivos, acabou quase sempre por acolher outras propostas”, escreve Santana.
Escreve também sobre as vezes em que se sentiu maltratado, sobre decisões erradas, faz elogios a Pedro Passos Coelho e críticas a Rui Rio. E assim, em pouco mais de seis meses, Pedro Santana Lopes passa de candidato à liderança do PSD a provável adversário do partido onde militou durante 40 anos. Na carta, não há referências diretas a nenhum novo partido, mas o próprio confirmou ao Observador que essa é mesmo a sua intenção.
Os excertos da carta de Santana Lopes estão a itálico e a interpretação e o comentário estão a amarelo:
Este é um texto difícil. Falo de uma relação de 40 anos com o PSD, de alegrias e abnegações várias, momentos únicos de realização em que procurei contribuir para consolidar a Democracia, servir os Portugueses e Portugal.
Quero sublinhar quatro áreas sobre as quais, ao longo dos anos, muito tenho dito, escrito e, quando é possível, feito: A questão Europeia; O sistema político; O equilíbrio do território e o combate à desertificação; O crescimento económico e a criação de riqueza; A Inovação, a Investigação e a Cultura.
Talvez devesse ter tomado esta decisão há mais tempo. Em 2004, quando destacadíssimos militantes do Partido tudo fizeram para que Jorge Sampaio abolisse a maioria parlamentar legítima e estável por motivos que se «absteve de enunciar». Ou, no ano seguinte, quando o PSD impediu a recandidatura à Câmara Municipal de Lisboa que conquistáramos, a pulso, à maioria de esquerda, quatro anos antes.
Apesar de tudo, não desisti de lutar pelo partido, pelo País. Em 2008, candidatei-me à liderança do PSD. Em entrevista, Manuela Ferreira Leite disse então que não esclarecia qual tinha sido o seu voto nas Legislativas de 2005, comigo na liderança do PSD. Apesar disso, foi eleita. Passado pouco tempo, pediu-me para voltar a disputar a Câmara de Lisboa de que me afastaram três anos antes.
Com a sua saída [a de Passos Coelho da liderança do PSD], o quadro passou a ser outro. Tinha de lutar pelo que preconizo há décadas. Por isso, decidi candidatar-me à liderança do PPD/PSD e deixar funções na Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Foi uma opção difícil. Se não pudesse estar em questão tudo o que aqui enuncio, teria continuado como Provedor da SCML. Entendi que tinha de ser feita a clarificação. Vinha aí uma estratégia de condescendência para com o PS, para mim, um erro grave.
Quero intervir politicamente num espaço em que não se dê liberdade de voto quando se é confrontado com a agenda moral da extrema – esquerda. Em que se defendam os princípios, os valores e tradições da identidade Portuguesa.
Não apago estes 40 anos no PPD-PSD a quem desejo sucesso, a bem da Democracia. Quero contribuir para dar força à alternativa de que Portugal precisa para substituir a maioria de esquerda. Desde 2015, no sistema político português, mal ou bem, não interessa tanto quem é o Partido mais votado, mas antes quem consegue metade mais um voto na Assembleia da República.