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Bloco de notas de reportagem na CDU. Dia 3. O cozido do camarada Quim Zé numa campanha focada no "essencial"

O almoço foi dos pontos altos do dia e serviu de pretexto ao discurso contra a desertificação. Em Évora, João Ferreira entregou panfletos e atacou a campanha de "questões acessórias" de PS, PSD e CDS.

Numa altura em que a campanha eleitoral aquecia com trocas de declarações entre PS, PSD e CDS, João Ferreira dedicou o seu primeiro dia fora da Grande Lisboa a tentar não entrar no esquema. A caravana da CDU chegou esta quarta-feira ao Alentejo para almoçar num café de um militante comunista e discutir problemas da desertificação do interior e para, ao fim da tarde, descer o centro histórico de Évora. Primeiro aos jornalistas, e depois nas ruas aos militantes, João Ferreira disse querer focar-se apenas no essencial — e acusou os outros três de terem necessidade de “encenar” discórdias com “assuntos acessórios” para distraírem as pessoas do facto de, no Parlamento Europeu, votarem sempre alinhados.

Assim, esteve em Bencatel a falar, durante o almoço, da falta que faz um cais de embarque de passageiros e de mercadorias na linha Sines-Caia naquela região, onde abundam as pedreiras, e do que os eurodeputados da CDU poderão fazer nesse sentido. Depois, foi encontrar-se com reformados na mesma localidade e falou-lhes do aumento das reformas e dos salários. Dali seguiu para Évora, para finalmente, desenvolver o discurso: “Se quiserem embaraçar os candidatos do PS, do PSD e do CDS, façam-lhes uma pergunta: perguntem-lhes em que decisões fundamentais tomadas no Parlamento Europeu nos últimos anos eles votaram de forma diferente uns dos outros”.

João Ferreira não se envolve em “questões acessórias” e critica campanha “fulanizada” de PS, PSD e CDS

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Pelas ruas, o aparelho comunista local ainda vai tentando mobilizar apoiantes. Esta tarde, em frente à Sé de Évora, por volta das 17h50, começavam a juntar-se os primeiros apoiantes da CDU, discretos — um observador desatento poderia quase pensar que ali estavam à espera do toque do sino para uma celebração religiosa. Mas a procissão era outra, e só quando começaram a chegar as carrinhas do aparelho — com os molhos de bandeiras e os autocolantes — é que a arruada ganhou dimensão. Por ali, ainda foi possível ouvir uma mãe dizer ao filho: “Põe um autocolante da CDU imediatamente, se faz favor!” A criança obedeceu, e assim se compôs a procissão, com o candidato à frente a ser guiado por dirigentes do partido locais e a entrar nas lojas e cafés que aqueles lhe indicavam.

“Só faltou levar os cemitérios e não o fizeram porque não conseguiam”

Durante o almoço em Bencatel, João Ferreira acusou PS, PSD e CDS de andarem a “carpir mágoas” pela desertificação do interior, para logo depois colocar nos mesmos partidos a responsabilidade dos “anos acumulados de desinvestimento” que tiraram do interior muitos serviços. “Levaram escolas, juntas de freguesias, postos de correio”, lamentou o candidato da CDU — e logo a sala do Café Central irrompeu num misto de aplausos e gritos. “Só faltou levar os cemitérios e não o fizeram porque não conseguiam”, acrescentou.

O tema da desertificação do interior marcou a passagem de João Ferreira pelo distrito de Évora, mas o candidato assegurou que isto tem mesmo tudo a ver com as eleições europeias — e lembrou o exemplo da ferrovia: passa ali mesmo a linha que une Sines a Caia, construída com financiamento europeu e que “esqueceu” a região. Tudo porque, assegura João Ferreira, o PS, o PSD e o CDS estão mais empenhados em votar favoravelmente as ligações transnacionais “que importam à Alemanha” antes de resolverem os problemas regionais no interior português.

Alto. O “essencial”. Com efeito, ao preferir evitar as trocas de acusações entre candidaturas sobre assuntos que pouco têm a ver com o trabalho dos eurodeputados, João Ferreira vai passando mensagens concretas às pessoas. Nos dois momentos desta quarta-feira em que contactou diretamente com os eleitores, o candidato da CDU falou-lhes daquilo que os eurodeputados podem levar a cabo e que pode ter efeitos nos assuntos que lhes interessavam (as reformas e o cais de embarque na ligação ferroviária, por exemplo). Resta saber se ficaram convencidos.

Baixo. Há pouco entusiasmo nas ruas. Tirando os elementos do partido e da juventude comunista, que são muito competentes no erguer da bandeira em frente às câmaras de televisão, parece haver alguma dificuldade em chegar àqueles que ainda precisam de ser convencidos a votar neste ou naquele. As conversas com os eleitores duram pouco — “é apenas para deixar aqui um panfleto, dar mais força à CDU” — e em muitos casos é possível ver um ar de quem ficou pouco impressionado com o que quer que seja.

Quim , ou melhor, o camarada Quim Zé, é o dono do Café Central de Bencatel, no concelho de Vila Viçosa, distrito de Évora. Foram para ele as primeiras palavras da primeira intervenção do dia do candidato João Ferreira — para “saudar o camarada Quim Zé, que nos serviu este cozido primoroso”. O cozido de grão com enchidos e carne de porco que serviu de repasto ao almoço de quase meia centena de apoiantes da CDU na pequena aldeia foi, sem dúvida, uma das estrelas do dia, e João Ferreira não se cansou de o elogiar, até mesmo depois, nas conversas com a comitiva e os jornalistas.

O "camarada Quim Zé", orgulhoso de ter oferecido o almoço ao partido de que é militante há 41 anos (JOÃO FRANCISCO GOMES/OBSERVADOR)

JOÃO FRANCISCO GOMES/OBSERVADOR

O camarada Quim Zé, 56 anos, não cabe em si de orgulho. Apresenta-se ao Observador: “Estou estabelecido aqui há 38 anos, desde 1981”. E “é claro que gosto de receber as festas da CDU!” Militante do PCP há 41 anos, desde os 16, o dono do Café Central já tem experiência nestas andanças eleitorais comunistas — embora esta tenha sido a primeira vez que recebeu “uma festa tão grande”. “Já tenho feito campanhas, por exemplo, para as autarquias, mas sempre com menos gente”, explica.

“Isto ultrapassou muito as expectativas”, assume — tanto que o café teve de fechar especialmente para o almoço da campanha. Mas “é uma grande honra ter servido este almoço ao meu partido”, garante. A devoção ao PCP notou-se durante toda a refeição. Embora os funcionários assegurassem o serviço, não foi possível vislumbrar Quim Zé sem uma travessa de enchidos, uma terrina de cozido ou um prato de doçaria alentejana nas mãos — enquanto perguntava se “está tudo bem por aqui”.

Ao longo da arruada por Évora, último momento da campanha do dia, João Ferreira entrou e saiu (rapidamente) de várias lojas e cafés. Não se demorou muito em nenhuma. Levava os panfletos e a missão de distribuir o máximo que conseguisse no caminho entre a Sé de Évora e o pequeno palco em que discursou perante os apoiantes ao cair do dia.

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Apesar de ser o terceiro dia de campanha e de as caravanas de PS, PSD, CDS e Bloco de Esquerda já terem todas ultrapassado o milhar de quilómetros percorridos, a da CDU ainda não tinha saído da região da Grande Lisboa. Foi esta quarta-feira. João Ferreira foi de Lisboa a Bencatel (189 quilómetros), e dali para Évora (52 quilómetros). Na quinta-feira, o conta-quilómetros da CDU voltará a disparar, com uma deslocação ao Algarve — e depois será sempre a acumular, com passagens por localidades de norte a sul do país.

Total percorrido desde segunda-feira: 386 quilómetros.

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