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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Carpool Autárquicas com Manuel Pizarro: "Se ganhar, estou disponível para me coligar com quem for necessário"

Manuel Pizarro entrou no carro do Observador e falou de tudo: da relação cada vez mais tensa com Rui Moreira, da herança como vereador e da sua ideia para a cidade. Só não cantou "Amar Pelos Dois".

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“Adoro esta sua parafernália tecnológica”, diz Manuel Pizarro, enquanto se ajeita descontraidamente no pequeno Smart, equipado com quatro câmaras e dois microfones. São 16h30 e o os termómetros da cidade do Porto marcam mais de 25 graus. O candidato socialista à Câmara Municipal do Porto — ainda a encontrar o tom certo depois da rutura com Rui Moreira –, chegou cedo à estação de Campanhã, ponto de encontro combinado com o Observador. Ainda teve tempo de tomar café, beber água e reforçar a maquilhagem. Está calor dentro do carro e todos os detalhes contam. O percurso está traçado: Campanhã, Bairro do Cerco, Ilha da Bela Vista, Aleixo, Bairro D. Rainha Leonor e, por fim, Foz. Mais de uma hora de viagem, da zona oriental à zona ocidental da cidade. “Espero sobreviver a esta viagem“, antecipa Pizarro. Sobreviveria, é certo. Mas, no final do percurso, deixaria votos de uma reedição “mais relaxada”.

Manuel Pizarro avança para estas eleições numa situação delicada: foi oficiosamente o número dois de Rui Moreira na Câmara do Porto, está vinculado à herança do atual presidente e partilha com ele os méritos e os falhanços dos quatro anos de mandato. Bateu-se contra alguns setores do próprio partido e abdicou de uma candidatura própria à autarquia para dar continuidade ao casamento com Rui Moreira. Em maio, deu-se o divórcio e o socialista foi obrigado a improvisar uma candidatura alternativa a um projeto a que estava orgulhosamente vinculado. Criticar as medidas de Rui Moreira é criticar o papel do PS; renegar o programa político comum é incoerente, como o próprio assume.

“Não fujo das responsabilidades que tive, mas não escondo os problemas que a cidade tem”, vai ensaiando. Parece ter sido esta a solução encontrada por Pizarro: fazer valer a sua herança como vereador com o pelouro da habitação social e apresentar-se aos portuenses como o único candidato que conhece verdadeiramente os problemas sociais da cidades. Isto, por contraposição a Rui Moreira, o candidato “incumbente” que tudo que tem feito nesta pré-campanha eleitoral é “atacar as posições do PS”.

Amar pelos dois? “Se ganhar, estou disponível para me coligar com quem for necessário”

Os outdoors da candidatura de Manuel Pizarro estão espalhados por toda a cidade do Porto. O slogan da campanha está inscrito a letras garrafais: “Fazer pelos dois”. A referência à música com que Salvador Sobral venceu o Festival da Eurovisão é óbvia, embora o socialista não o admita. Consumado o fim da relação, Pizarro quer agora provar aos eleitores que é capaz de cumprir o mandato sem estar na sombra de Rui Moreira. Não assume outro cenário que não a vitória e por isso afasta qualquer hipótese de reeditar a coligação numa posição minoritária. Se vencer será diferente: o socialista não descarta qualquer união de facto. E é por aí que começa a entrevista com o Observador.

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Já pediu desculpas a Salvador Sobral pelo uso indevido da música que venceu a Eurovisão?
Sabe que não tinha nenhuma intenção de plagiar a canção do Salvador Sobral, ainda que indiretamente. Devo-lhe dizer que até é uma coincidência feliz…

Uma coincidência feliz? É só isso?
…Verdadeiramente, o que queria chamar atenção é para o esforço que fiz nestes anos e que quero fazer nos próximos anos para trabalhar pela cidade e pelas pessoas da cidade.

Mas se o desafiar a cantar a música, certamente conseguirá…
Não, não sou capaz. Gosto muito de música, mas sou o chamado ouvido duro. É muito difícil para mim reproduzir as músicas que ouço. Desta vez acompanhei o festival da Eurovisão porque é, de facto, uma canção extraordinária, muito bonita.

Mas tem medo de perder votos se testar aqui a sua voz?
Ai, vou perder de certeza. É um risco que não pode fazer um candidato correr.

Este lema não é uma forma de responder a Rui Moreira? Terminada a coligação, agora propõe-se a fazer pelos dois?
É uma forma de chamar atenção para o enorme papel que o PS teve nesta gestão autárquica dos últimos quatro anos, para a forma como nós colocámos a cidade à frente de tudo e como tencionamos continuar a fazer no próximo mandato. Para nós, os portuenses e a cidade do Porto estão à frente de quaisquer outras considerações. E acho que é esse o balanço que nós queremos tirar deste mandato.

Não respondeu à pergunta. É impossível amar a dois novamente? Perdão, é impossível fazer a dois novamente?
É sempre possível colocar o Porto e os portuenses à frente de tudo.

Mas ainda não esclareceu, nas várias entrevistas que deu entretanto, se está ou não disposto a reeditar uma futura coligação?
A minha expectativa é ganhar as eleições. As condições de governabilidade da câmara avaliá-las-ei em função dos eleitores. Este é o momento em que quem tem de falar sobre a governação do Porto são os cidadãos do Porto. Depois cá estaremos nós para nos pronunciarmos em função desse resultado. O Porto é uma cidade com pessoas muito generosas e, ao mesmo tempo, muito sagazes do ponto de vista político. Elas compreenderam bem tudo o que aconteceu.

Não excluiu, e registo que não excluiu, a hipótese de uma eventual coligação com Rui Moreira…
Sim, sim, enquanto presidente da câmara estou disponível para me coligar com quem for necessário, com os vereadores que tiver necessidade para governar a cidade.

"Enquanto presidente da Câmara estou disponível para me coligar com o que for necessário, com os vereadores que tiver necessidade para governar a cidade"

A campanha eleitoral arranca oficialmente a 19 de setembro, mas a disputa pelos destinos da cidade do Porto já vai subindo de tom. Apesar de Manuel Pizarro e Rui Moreira trocarem juras de lealdade pessoal e institucional, a cada oportunidade que têm vão desferindo estocadas um no outro. O tema dos orçamentos de campanha entrou em força na contenda eleitoral, depois de o movimento de Rui Moreira ter colocado a nu as contas do PS, sugerindo que os socialistas estão a gastar mais do que 2013 para conseguirem um resultado pior.

De acordo com a documentação entregue junto do Tribunal Constitucional, apenas parte desta informação é verdadeira: o PS tem o maior orçamento nesta corrida eleitoral, mas “vai gastar menos 12%” do que gastou há quatro anos, defende-se o socialista. Isto, se as contas não derraparem como derraparam em 2013. Quanto ao resultado, Rui Moreira tem um ponto válido: Pizarro prevê receber uma subvenção estatal de 103 mil euros, um valor indexado aos resultados eleitorais e que remete para um resultado de cerca de 15%, meta inferior à atingida na última corrida às urnas.

Toda a gente conhece a situação financeira difícil do PS, que resultou de erros que foram cometidos noutros tempos, esses já não é possível resolver, mas é possível fazer uma coisa: é não cometer o mesmo erro duas vezes e fazer uma campanha com boas contas. É o que farei”, garante o socialista.

"Rui Moreira tem feito um esforço para não participar em nenhum debate. Ao mesmo tempo, tudo que faz na sua campanha é para atacar as posições do Partido Socialista. Eu acho isso estranhíssimo"

O episódio dos autocolantes espalhados pela cidade com “Morto.” no lugar de “Porto.” (uma marca publicitária da câmara), motivou uma queixa da Câmara Municipal contra desconhecidos e fez aumentar a tensão política. Manuel Pizarro questionou a tolerância do autarca e Rui Moreira sugeriu que o candidato do PS se tinha juntado aos radicais (suspeita-se que os autores dos autocolantes sejam de extrema-esquerda radical). O socialista não teve dúvidas em sentenciar: “Rui Moreira detesta mesmo o PS“.

O presidente da Câmara do Porto vê inimigos em todo o lado, como disse?
Sabe que estes dias também me têm chamado a atenção para isso: de facto, eu tenho que me convencer mesmo que o PS faz muita falta à governação autárquica do Porto…

Aliás, escreveu que Rui Moreira detesta o PS…
Rui Moreira tem feito um esforço para não participar em nenhum debate. Ao mesmo tempo, tudo que faz na sua campanha é para atacar as posições do Partido Socialista. Acho isso estranhíssimo.

Refere-se à questão dos orçamentos de campanha, certo?
Sim, os orçamentos de campanha, aquela campanha, do meu ponto de vista descabida, contra uns autocolantes do “Morto.”, que nunca ninguém tinha visto se não fosse a campanha do Rui Moreira a chamar atenção para eles… Tudo isso são não assuntos. Rui Moreira é assim uma espécie de candidato incumbente. Tem desiludido um pouco, porque se tem comportado revelando pouco esforço em explicar o seu projeto para a cidade.

Está em condições de dizer o que é que o distingue de Rui Moreira ou ainda é um programa demasiado comum?
Há muitas coisas que são comuns. Não vou mudar nada do meu discurso sobre a natureza essencialmente positiva desta última governação municipal. Mas acho que é manifesto para as pessoas que sou mais próximo das pessoas, mais próximo das instituições, que faço um maior esforço para que as decisões sejam participadas e sejam assumidas por todos, Sobretudo, não faço uma coisa: não procuro que o sucesso da cidade faça esquecer que também há dificuldades e problemas.

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Habitação: “As responsabilidades também devem ser assacadas a mim”

Por esta altura, já Manuel Pizarro e o Observador estavam no coração do Bairro do Cerco, plantado na freguesia de Campanhã, a zona oriental e esquecida da cidade, como provam os terrenos deixados ao abandono e os edifícios em mau estado de conservação. Uma das críticas que mais tem sido apontada ao executivo de Rui Moreira é, precisamente, a falta de investimento na regeneração urbana das zonas mais afastadas do centro histórico do Porto.

O candidato socialista assume que “ainda há muito por fazer” nesta matéria e admite que também tem responsabilidades pelo estado atual das coisas. Mas vira rapidamente a agulha para o plano político: sem ele, garante, os projetos de reabilitação que estão preparados não vão sair do papel. E coloca Rui Moreira novamente debaixo de fogo.

Existe um problema de exclusão social no Porto?
Existe um problema dramático de exclusão social. Há muitas pessoas que estão fora deste ciclo de progresso da cidade. Fizemos muito para atenuar isso nestes últimos quatro anos.

Foi o suficiente?
Não é o suficiente. Há ainda muito mais a fazer. Continua a fazer falta uma ação decisiva a favor da coesão social e do desenvolvimento económico equilibrado da cidade.

Tendo sido vereador com o pelouro da Habitação Social, essas responsabilidades também não lhe devem ser assacadas?
Devem também ser assacadas a mim. Fiz um enorme trabalho e deixei pronto muito esforço para o futuro que precisa de ter continuidade e maior intensidade. E por isso é que é tão importante, que seja eu o próximo presidente da Câmara do Porto para que esses projetos sejam concluídos e levados até ao final.

Com Rui Moreira como presidente da Câmara acha que essa questão vai ficar por resolver?
O que se verifica desde maio para cá é que coisas que estavam prontas para avançar já não têm o mesmo ritmo. Alguns desses projetos exigem um grande esforço de negociação com as pessoas. É preciso negociar, ouvir as pessoas, ir lá falar. Isso era o meu papel na Câmara do Porto. O que vejo é paralisia de tudo isso.

O Bairro do Cerco, assume Pizarro, vai sofrer uma grande transformação. O programa do “Cerco ao Centro” prevê um investimento de cerca de 20 milhões de euros durante quatro, mais de metade financiados por fundos comunitários. Muitas das infraestruturas vão ser demolidas para serem “substituídas por habitação pública”. Os moradores, no entanto, não vão ser desenraizados, garante o socialista. “As pessoas não podem ser excluídas de morar num sítio quando ele é recuperado. Acho que isso é completamente inaceitável.”

O projeto para esta zona, ainda assim, deve ir para lá da regeneração urbana, aponta Pizarro. “Precisamos devolver dignidade e condições de vida às pessoas e promover a empregabilidade, resolver problemas que afastam muitas destas pessoas do emprego. Por exemplo, a sua saúde oral. Algumas destas pessoas quando abrem a boca têm falta de dentes, têm dentes pretos. Estão afastadas daquilo que é a empregabilidade”, explica o socialista.

"Hoje é impossível uma família da classe média, a um jovem, encontrar uma casa para arrendar no Porto a preços aceitáveis"

Manuel Pizarro sente-se confortável. Afinal, fez da habitação (e da habitação social, sobretudo) o seu próprio projeto político durante quatro anos. E é essa a principal bandeira que vai levar para a campanha eleitoral. Quando atravessa a zona de Campanhã, o socialista serve-se de uma piada para ilustrar aquilo que imagina para a cidade. E conta:

“Alguns moradores do bairro Engenheiro Machado Vaz foram ter com o padre de Campanhã e disseram-lhe:

— Oh senhor padre, a câmara vai vender as nossas casas?
— Mas vai vender as casas porquê?
— O senhor padre acha que aquele investimento que estão a fazer, com painéis solares e tudo, são casas para pobres?”

“Este é o meu modelo. Reabilitar para o conforto das pessoas, mas ao mesmo tempo com uma intenção de modernidade”, remata Manuel Pizarro.

Mas os planos do ex-vereador para a habitação estendem-se para lá do Bairro do Cerco e da freguesia de Campanhã. Se vencer as eleições, o socialista promete enfrentar a “enorme especulação imobiliária” que atingiu a cidade do Porto e utilizar os terrenos “que já são da Câmara Municipal ou que a Câmara pode adquirir a preços razoáveis” para construir cerca de “3 mil fogos de renda acessível” em quatro anos.

Um programa desta natureza, explica o socialista, vai implicar um investimento da autarquia na ordem dos “30 a 40 milhões de euros“, essencialmente para adquirir os terrenos em causa. Tudo o resto — 200 a 250 milhões de euros — serão suportados por investimento privado. Pizarro reconhece que o plano é “audacioso, mas exequível”. Mas é a única forma de responder ao desaparecimento do mercado de arrendamento. “Hoje é impossível uma família da classe média, a um jovem, encontrar uma casa para arrendar no Porto a preços aceitáveis”, analisa, antes de explicar o que pretende:

“Remunero o investidor privado de duas formas: 30% da capacidade construtiva, será da posse do privado, que fará o que entender; os outros 70%, durante 30 anos, serão alugados com custos controlados — um T0 a 225 euros, um T4 a 400 euros, por exemplo. Durante 30 anos, o privado receberá essas rendas, terá as funções de manutenção que estarão previstas no caderno de encargos. Ao fim de 30 anos, essas casas revertem para a Câmara. Vão ficar numa pool significativa de aluguer de renda acessível para que as pessoas mais jovens, as pessoas das diferentes classes médias, possam aspirar a morar no Porto”, explica Pizarro. É este o plano do socialista e há quem o considere irrisório. Quem? Rui Moreira.

Parece-lhe um plano exequível? Rui Moreira sugeriu que era um plano impossível de implementar…
Isso significa apenas que Rui Moreira não tem uma equipa para estudar essas soluções para a cidade. O meu plano foi apresentado ao lado um conjunto de professores da Faculdade de Arquitetura, de outros arquitetos, de gente da Faculdade de Engenharia, e com uma lista dos terrenos. Com um pequeno investimento da Câmara — entre 30 a 40 milhões de euros — e um investimento dos privados entre 200 e 250 milhões de euros, seremos capazes de montar este programa de três mil casas com renda acessível na cidade do Porto.

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As promessas para as ilhas do Porto: “Um gajo podia perfeitamente morar aqui”

Rui Moreira é figura omnipresente em toda a entrevista com o Observador. A caminho da ilha da Bela Vista, uma das 900 ilhas que ainda subsistem na cidade do Porto, Manuel Pizarro fala do seu mérito na reabilitação destas infraestruturas. O “seu” mérito, porque foi ele que pensou e executou este projeto, orgulha-se. Rui Moreira desempenhou apenas um papel secundário, sugere o socialista, vincando as diferenças: sem ele, nada ou quase nada teria sido feito.

A rua Dom João IV, bem no centro da cidade do Porto, era o local combinado para a paragem técnica. É tempo de verificar câmaras e microfones e garantir que tudo estava a funcionar corretamente. Manuel Pizarro aproveita a pausa para beber água e esticar as pernas. A paragem seria curta, mas desta vez foi o candidato que fez questão de conduzir o Observador a uma visita pela ilha da Bela Vista. Onde antes existia um conjunto labiríntico de edifícios, praticamente inacessível, hoje há blocos novos, geometricamente dispostos, com ruas largas a separarem as paredes pintadas de fresco.

Pizarro entra pela ilha adentro, enquanto cumprimenta os moradores um a um. Alguns vivem ali há mais de 70 anos. Nasceram e cresceram entre aqueles corredores, mesmo quando tudo era pouco mais do que miserável. Pede a quem o conhece — e todos o conhecem — para visitar algumas casas. Os moradores aceitam, mesmo pedindo desculpa pela desarrumação. Pizarro entra, sobe escadas, desce escadas, aponta para os detalhes de construção, fala nos méritos do arquiteto, explica como coordenou todo o projeto sem obrigar os moradores a saírem da ilha. Não perde o folêgo. “Um gajo podia perfeitamente morar aqui“, vai repetindo.

De regresso à estrada, Pizarro fala das suas promessas para a recuperação das ilhas do Porto. “Ainda temos 937 ilhas habitadas. 12 mil cidadãos do Porto, uma em cada 20 pessoas que mora no Porto, mora numa ilha. Nem todas são recuperáveis. Mas precisamos de criar condições que estimulem um proprietário privado a fazer a reabilitação dessa ilha. Vou apresentar esse programa: isenção de impostos, oferta de projetos por parte da Câmara Municipal do Porto, inexistência de taxas de urbanização. No fundo, a criação de condições para que as ilhas sejam recuperadas com vantagens económica para os privados que os interesse por este programa”.

"Os eleitores sabem que sou capaz de reconstruir as ilhas. Demonstrei que afinal não precisam de ser erradicadas"

Apresenta-se aos eleitores com essa intenção, mas não há o risco de se ficar, precisamente, pela intenção?
Os eleitores sabem que sou capaz de o fazer. Já me viram fazê-lo. Isto segue-se a um período de mais de um século em que todos os programas públicos tinham um objetivo: erradicar as ilhas. Demonstrei que afinal as ilhas não precisam de ser erradicadas.

Foi mérito seu ou de Rui Moreira?
Não, este é mesmo meu. Claro, com o apoio do presidente da Câmara Municipal do Porto. Também não o vou negar. Mas este é mesmo mérito meu, porque estive muito atento a estes temas mais ligados àquilo que são as necessidades populares da cidade.

E se não for eleito este tipo de projetos para a cidade correm o risco de nunca saírem do papel?
Temo que não saiam do papel, porque exigem uma ambição pela cidade interclassista, cidade que é de todos. Tenho um enorme orgulho no sucesso económico de muitos dos concidadãos do Porto, mas temos que olhar para a cidade no seu todo. Temos de olhar para as pessoas com menos recursos económicos e para esse equilíbrio do qual sou o porta-voz, o que melhor representa o conjunto destes interesses da cidade.

De uma ou de outra forma tem feito essa crítica sucessivamente a Rui Moreira, dizendo que ele está menos próximo das pessoas. É assim que se vai apresentar aos eleitores? “Eu preocupo-me mais com vocês do que Rui Moreira”?
Acho que esse é um julgamento para as pessoas fazerem…

Mas que o faz ou pelo menos leva a fazer…
As pessoas sabem que quando precisam de falar comigo que eu estou sempre disponível para as ouvir…

E Rui Moreira não está?
Tenho uma profunda convicção sobre o papel de um líder autárquico num mundo moderno, que é em grande parte de servir de mediador do conjunto dos interesses que estão presentes na sociedades.

Mas não respondeu à pergunta: é assim por contraposição a Rui Moreira?
Com franqueza, acho que esse é um julgamento que têm de ser os cidadãos a fazer. Não vou ser eu a dizê-lo.

O inevitável caso Selminho: “Compete a Rui Moreira falar sobre esse assunto”

Falar de Rui Moreira sem falar do caso que opõe a Câmara do Porto à empresa Selminho, que pertence à família de Rui Moreira, é inevitável. Os adversários têm tecido duras críticas à forma como Moreira geriu todo o processo e o caso será, seguramente, um dos temas da campanha eleitoral.

Manuel Pizarro, que durante a aliança com Rui Moreira pôs-se sempre ao lado do presidente da Câmara, escolhe bem as palavras. Garante que não vai fazer política de casos, mas sugere, entre linhas, que o autarca deve prestar mais esclarecimentos. Só mantém uma convicção profunda: os terrenos devem ser revertidos a favor da Câmara.

Os adversários de Rui Moreira têm levado o Caso Selminho para o debate político…
Comigo não falaremos mesmo do “Caso Selminho”, porque tomei sempre a mesma posição sobre assunto: acho que há um enorme espaço no Porto para se discutirem ideias, projetos para futuro, ideias convergentes ou divergentes para cidade e acho que o debate eleitoral não ganha em ser concentrado em casos particulares por mais delicados que eles possam ser para um dos meus adversários.

Ainda assim, considera que os terrenos devem ser convertidos a favor da Câmara?
Sim. A partir do momento em que os terrenos, demonstradamente, pertenciam à Câmara Municipal do Porto, entendo que a Câmara tem de fazer tudo que estiver ao seu alcance para recuperar a posse desses terrenos.

Rui Moreira deve prestar mais esclarecimentos sobre o caso?
Acho que compete a Rui Moreira falar sobre esse assunto. Se ele não o quer fazer, também não serei eu que o trarei para a campanha eleitoral.

Nem mais uma palavra.

"Acho que compete a Rui Moreira falar sobre o caso Selminho. Se ele não o quer fazer, também não serei eu que o trarei para a campanha eleitoral"

Aleixo e salas de chuto: “Não tenho nenhum preconceito contra essa solução”

Chegamos finalmente ao Aleixo. É impossível ignorar o cenário grotesco. Tudo parece ruína. À medida que o carro do Observador cruza as ruas do bairro, todas as atenções se voltam para nós, corpo estranho num território abandonando à degradação humana e ao tráfico de droga. Há gente a consumir a céu aberto, em plena luz do dia.

Um Porto que se quer afirmar como um destino turístico de eleição não se deve envergonhar por ter um bairro assim, nestas condições?
A situação do Aleixo deixa muito a desejar. Devo dizer-lhe que a situação que encontrámos no Fundo do Aleixo [com participação da RioForte, do universo BES], que estava organizado para transformar tudo isto num empreendimento privado, nos tolheu muito as nossas medidas. Estou absolutamente convencido de que não há nenhuma hipótese de continuar com esta situação. Temos de liquidar esse fundo, sem prejuízo dos investidores privados — dois deles entraram de absoluta boa-fé e não podem ser penalizados. Mas temos de liquidar este fundo, realojar as 90 famílias que aqui continuam a morar.

Pode implicar novas demolições?
Implica a demolição do que resta do bairro. É absolutamente irrecuperável. É preciso colocar aqui, logo em novembro, uma equipa de rua de apoio social e médico para procurar encaminhar para tratamento todas estas pessoas realojar as famílias e utilizar este terreno para o programa de arrendamento acessível: 30% do empreendimento será privado; os outros 70% garantirão cerca 150 casas a renda acessível.

Tem ideia do esforço a que isso obriga?
O esforço da câmara na liquidação do fundo estará algures entre os 5 a 6 milhões de euros. O investimento privado será feito por concurso com um parceiro privado.

"O que resta do bairro do Aleixo tem de ser demolido. É absolutamente irrecuperável"

No coração do Bairro do Aleixo, que começou a ser demolido durante a era de Rui Rio, o tema da toxicodependência é inevitável. O Bloco de Esquerda tem acusado o atual executivo autárquico de perseguir os toxicodependentes que povoam este e outros bairros sociais da cidade do Porto com uso a força bruta das autoridades ao serviço da câmara e de outras forças policiais, com o objetivo de varrer e esconder um problema bem real da zona mais periférica da cidade do Porto. Manuel Pizarro rebate essas acusações.

O Bloco de Esquerda chegou a acusar o atual executivo, de que fazia parte, de perseguição aos toxicodependentes…
Isso não existe, de todo em todo. Isso é uma acusação completamente descabida…

As situações que relatavam era de uso de força excessiva por parte da polícia…
Não podem estar a referir-se ao nosso mandato. Talvez se estivessem a referir a mandatos anteriores ao nosso. No nosso mandato, nada disso aconteceu, nem aceitaria nunca que acontecesse. Repito: há problemas de segurança ligados com a toxicodependência, mas os problemas mais dramáticos são problemas de saúde. As pessoas precisam mais de apoio médico, de apoio de saúde, de apoio social, do que qualquer tipo de repressão ou perseguição.

Enquanto vereador, Manuel Pizarro encomendou um estudo sobre a criação de salas de consumo assistido, vulgarmente conhecidas como salas de chuto, na cidade do Porto. O estudo terá sido entregue à Câmara Municipal do Porto já depois de ter abdicado dos pelouros que detinha na autarquia, admite o socialista, dizendo desconhecer os resultados desse relatório.

Os bloquistas, no entanto, têm acusado o atual executivo de esconder o relatório sobre o consumo de droga na gaveta, com o objetivo de ocultar as possíveis vantagens das salas de consumo assistido. E Pizarro tem sido um dos principais visados: para o Bloco, o socialista cedeu perante a intransigência de Rui Moreira.

O Bloco de Esquerda defende que recuou em relação aos seu planos iniciais face a Rui Moreira…
Isso não é verdade. Não tenho nenhum preconceito contra essa solução. Acho que é uma solução humana e tecnicamente aceitável, mas temos de ver se é a melhor forma de utilizar os recurso. Nesta zona, estou muito mais convencido de que é mais urgente e mais importante ter uma equipa de rua, com uma componente social e uma componente sanitária, que encaminhe as pessoas para tratamento e para soluções de vida mais dignas.

Mas se o relatório que diz desconhecer defender a criação dessas salas, admite cumprir essa recomendação?
Sem dúvida.

"Não tenho nenhum preconceito contra as salas de chuto"

O tema da insegurança do Porto tem sido levado para esta pré-campanha eleitoral sobretudo por Álvaro Almeida, candidato do PSD, que já admitiu a instalação de câmaras de videovigilância e o reforço do contingente da Polícia Municipal. Manuel Pizarro rebate o cenário traçado pelo social-democrata, mas admite que a cidade pode enfrentar problemas se nada for feito em matéria de segurança. E não descarta nenhuma hipótese.

Estes bairros estão infelizmente associados à criminalidade. Acredita que há um problema de segurança na cidade do Porto?
Se avaliar os números objetivos, o problema não é significativo. A verdade é essa. Mas temos consciência de que a cidade é cada vez mais utilizada. E sendo cada vez mais utilizada, é muito importante que estejamos capazes de garantir que há garantias efetivas de segurança.

Mas como é que se faz isso em termos concretos?
Faz-se com participação social, não tenho dúvida nenhuma. Mas faz-se também pensando em meios mais modernos de segurança. Por exemplo, a videovigilância. Não tenho nenhum preconceito. Há muitas zonas do Porto que precisam de videovigilância, desde que seja adequadamente regulada. Temos de encarar isso sem complexos.

Defende, por exemplo, o reforço do contingente da Polícia Municipal?
Defendo, mas a verdade é que a Polícia Municipal está mais atenta a outros problemas não tão centrais. Precisamos de uma Polícia Municipal que esteja mais atenta às questões de segurança.

"Há muitas zonas do Porto que precisam de videovigilância, desde que seja adequadamente regulada. Temos de encarar isso sem complexos"

A liderança da federação em causa: “O objetivo político do PS é recuperar a liderança da Área Metropolitana”

Enquanto o carro do Observador voa pela irregular calçada do Porto, é tempo de colocar o candidato mais uma vez na corda bamba. O teste é difícil: três palavras para caracterizar os restantes adversários. Manuel Pizarro falha redondamente a regra das três palavras, mas cumpre o essencial. E ainda deixa no ar a hipótese de recriar uma “geringonça” à moda do Porto.

Álvaro Almeida?
Um candidato esforçado.

Esforçado? Isso é bom ou é mau?
Acho que ser esforçado é bom, acho que o conhecimento que mostra da cidade é muito insuficiente. Mas, enfim, tenho todo o respeito por aquilo que é o percurso académico e civil do professor Álvaro Almeida.

João Teixeira Lopes?
João Teixeira Lopes é um professor de sociologia com méritos firmados na sua disciplina académica e é uma pessoa com quem eu tenho uma relação de amizade pessoal e cuja participação encaro de forma muito positiva.

Excedeu um bocadinho as três palavras. João Teixeira Lopes disse que o único partido que representava a esquerda verdadeiramente era o Bloco de Esquerda…
São proclamações que temos de encarar com tolerância em fase de campanha eleitoral. Não tenho nenhuma dúvida que a governação que exerci na Câmara do Porto nestes últimos quatro anos foi uma governação de esquerda.

Ilda Figueiredo?
É difícil responder em três palavras, sobretudo sem ter preparado a escolha certa das palavras… Ilda Figueiredo é uma candidata respeitável e previsível.

Previsível? Isso é bom ou é mau?
É bom e é mau. Por um lado, significa que são candidaturas muito confiáveis do ponto de vista do seu projeto político. Mas também significa que são candidaturas pouco inovadoras e pouco dadas a encontrar novas respostas para novos problemas.

No caso de ser o vencedor das eleições mas sem maioria absoluta, admite coligar-se com Bloco de Esquerda e CDU? Uma geringonça à moda do Porto?
Sim. Não faço nenhuma exclusão em relação à governação autárquica. Porque considero que, sobretudo nos temas da governação local, é possível encontrar plataformas de entendimento que não respeitam as fronteiras ideológicas mais convencionais. Veja que no seu primeiro mandato Rui Rio governou coligado com a CDU.

A viagem pela ruas da cidade do Porto já está perto do fim. A zona da Foz do Douro projeta-se à nossa frente, mas ainda há tempo para uma pergunta final. “Achei que isto estava a correr muito bem“, desabafa Pizarro, meio a sério, meio a brincar. “Vamos lá a isso”.

"Vamos deixar mais oportunidades para que Rui Moreira esteja mais tempo em casa"

Sabemos que Rui Moreira vive nesta zona da cidade. A pergunta que lhe faço é se a partir de 1 de outubro espera que Rui Moreira passe mais tempo em casa?
Ele é que tem de escolher o sítio onde quer passar…

Mas percebeu a pergunta…
Percebi, percebi. Tenho muita expectativa naquilo que é a inteligência dos cidadãos do Porto. Tenho sido o candidato que mais esforço fez para apresentar propostas e uma equipa credível para as executar. Isso vai acabar por ser reconhecido pelos eleitores. Portanto, nesse sentido, vamos deixar mais oportunidades para que o Dr. Rui Moreira esteja mais tempo em casa.

Isto, se vencer as eleições. Cenário que, atendendo às sondagens e ao favoritismo histórico de um autarca que se recandidata a novo mandato — como é o caso de Rui Moreira –, parece pouco provável, para dizer o mínimo. Se perder a corrida para Rui Moreira, Manuel Pizarro, que é também líder da Federação do PS/Porto, poderá ter de prestar contas ao próprio partido. Um mau resultado significa a demissão? O socialista não descarta essa hipótese — nem podia, na verdade –, mas sugere a continuidade. E traça o grande objetivo: o domínio da Área Metropolitana do Porto.

Se perder as eleições admite demitir-se da liderança da Federação?
O que será a minha vida na política, isso logo se verá. Até porque o que está em jogo nas eleições autárquicas, do ponto de vista de um dirigente da maior Federação do PS, é muito mais do que o resultado desta eleição.

A sua resposta deixa entender que não está disposto a deixar a liderança do PS/Porto?
Não. Deixa entender que estou muito confiante que o PS vai ter um grande resultado na cidade e no distrito do Porto. O grande objetivo político do PS é recuperar a liderança da Área Metropolitana do Porto, que há mais de 20 anos que não é dirigida pelo PS. Se isso for alcançado, é diferente de não ser alcançado.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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