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E se o PIB não for a forma mais correta de medir a riqueza dos países? A questão não é uma novidade, já em 2013 Joseph Stiglitz — prémio Nobel da economia — era um dos que vinha a público com a dúvida, mas agora é Assunção Cristas, a líder dos democratas-cristãos, quem a retoma. No seu primeiro livro, Assunção Cristas afirma que quer que se fale em “crescimento sustentável ou desenvolvimento” e que falar-se em “crescimento negativo” é uma coisa que a irrita.
O papel das mulheres na sociedade e o papel das mulheres na política
Esta é apenas uma das propostas que a líder do CDS coloca a debate num livro que se debruça sobretudo na sua experiência pessoal como política e como mulher. Sem pudor em revelar alguns episódios da sua vida privada (o livro tem, aliás, prefácio do marido), Cristas explica que, por exemplo, os mais jovens preocupam-se mais com quem ela é do que com as propostas que apresenta.
Recorda vários momentos do seu passado político, incluindo a experiência enquanto Ministra do Mar, onde aproveita para destacar a diferença da política quando é feita por homens e quando é feita por mulheres. Cristas diz que houve momentos onde os consensos foram alcançados de forma muito mais fácil e rápida quando os temas eram tratados em reuniões onde, por algum motivo, estavam apenas mulheres. Na política, diz, “não há espaços vazios” porque os homens não deixam”.
Para a líder do CDS, as mulheres ficam para “segundo plano”, ou estão ao lado dos homens, mas sem concorrerem com eles, unicamente por questões históricas relacionadas com o papel que sempre esteve reservado às mulheres. Cristas, admite, chegou já a fazer um exercício de registar as inscrições para uso da palavra nas reuniões: “Ao fim de 14 nomes masculinos aparecia a primeira mulher…”
Estará Assunção Cristas a instar as mulheres a ser mais participativas? E a conciliação com a família e filhos? A líder dos democratas-cristãos usa a sua experiência para dizer que tudo é possível e essa é uma das mensagens que quer passar com a publicação deste livro. É preciso, diz, que as políticas sejam mais amigas das famílias, que os programas de apoio à habitação para a classe média passem a dar prioridade a casas de tipologia T3 e T4 em detrimento de T0 e T1 — conforme as propostas apresentadas na Câmara Municipal de Lisboa.
Durante a vida ativa, retoma a proposta do smart working no código do trabalho para que possa ser criado um acordo entre empregador e trabalhador para que possa existir trabalho à distância. No caso de trabalhadores com filhos pequenos ou ascendentes a cargo a líder do CDS defende que o smart working se deve transformar num “verdadeiro direito”.
“Qualquer reunião de condomínio mais agitada faz uma reunião partidária parecer celestial”
A afirmação é da líder do CDS que, conta, era também ela uma crítica do tom usado no debate político. Aponta também para a cobertura feita pela comunicação social ao debate com o primeiro-ministro no Parlamento, por exemplo, e para a falta de intervenções das mulheres em público que, afirma, é notória desde os bancos da escola. A questão da falta de representatividade das mulheres na sociedade em geral e na política em particular é, aliás, um dos pontos centrais do livro de Assunção Cristas.
A líder dos democratas-cristãos mostra também que o livro não está desgarrado da nova estratégia do CDS para as próximas legislativas e escreve também sobre a necessidade de voltar a colocar “as pessoas no centro da política”. Um dos exemplos é o acesso à saúde, usado para explicar a necessidade de “um verdadeiro Estado Social de Parceria” onde ninguém é excluído: “(…) o Estado ganha em ter o setor social e o setor privado como aliados, assegurando complementaridade, proximidade, liberdade de escolha, igualdade de oportunidades, racionalidade financeira”.
Para Cristas “só há dois caminhos” para defender as mesmas oportunidades para todos. Um “é abrir o acesso a todas as vias a todas as pessoas” e o outro é “concentrar tudo no Estado”, impedindo os setores sociais e privado de prestar serviços. A líder do CDS fala inclusivamente naquela que é a terceira medida do programa eleitoral do partido para as legislativas, alargar a ADSE “a todos os que dela queiram ser contribuintes e beneficiários”.
Assunção Cristas considera que o “meio da vida” e os 10 anos de vida política seriam o momento ideal para uma reflexão aprofundada sobre o “passado e o presente, sempre com os olhos no futuro”. A agora líder do CDS teve, desde sempre, o objetivo de constituir uma família alargada e, a nível profissional, sonhava com a carreira de professora universitária. Classificada, pelos amigos, como “pessoa independente”, assume-se uma apaixonada pelo que faz apesar de nunca ter sido uma prioridade fazer vida na política.
No livro, Cristas escreve que aceitou o desafio de entrar para o CDS enquanto cristã. “Decidi-me pelo sim porque senti que tinha esse dever enquanto cristã, porque o dever de um cristão é desacomodar-se e dizer sim ao serviço aos outros, é estar permanentemente disponível para se dar aos outros”. O ‘sim’ era a Paulo Portas, que a convidou a fazer-se militante do CDS e a entrar para a Comissão Política Nacional.
A primeira coisa que fez no CDS foi “coordenar o trabalho de um grupo sobre políticas de natalidade” e, no livro, dedica várias páginas a este tema.
A líder dos democratas-cristãos assume que a experiência pessoal de ter crescido numa família grande, de cinco irmãos, e ainda a presença de duas avós viúvas, a marcou “muito”. “Moldada por esta vivência, é muito natural que hoje a minha família seja constituída por seis e que eu continue a achar sempre que me falta um quarto para familiares ou hóspedes”.
“Triste e desconcertada” com a natalidade em Portugal. A líder política que chegou a querer ter um loja
O contraste para a realidade da maioria das famílias em Portugal — onde o índice sintético de fecundidade está nos 1,4 filhos por mulher, de acordo com os dados da Pordata — deixa Assunção Cristas “triste e desconcertada”. A líder do CDS expõe no livro várias medidas que o partido tem apresentado no Parlamento para incentivar a natalidade e, ao mesmo tempo, faz a ponte para a hipótese da reforma antecipada, do trabalho em part-time para avós ou do teletrabalho — de que é , assumidamente, defensora — que podiam facilitar a logística às famílias e funcionar como fatores de incentivo à natalidade em Portugal.
Da natalidade, para as políticas de trabalho e o envelhecimento ativo. A facilitação do mundo digital, da tecnologia ao serviço do trabalho, e das possibilidades que essa flexibilidade pode abrir a quem está integrado no mundo do trabalho, remetem Assunção Cristas novamente para a sua história pessoal.
De volta à fase da vida, entre os 25 e os 27 anos, em que escrevia a tese de doutoramento, Assunção Cristas confessa que nos momentos mais difíceis aquilo que a “acalentava” era a ideia de que, depois de terminar, poderia dedicar-se ao comércio e abrir uma loja.
Ser feliz. A liberdade de cada um e o “motor português”
Para Assunção Cristas, a centralidade da pessoa é válida “da educação à saúde, do ambiente à economia” e, no que diz respeito à economia, esta “só vale por estar ao serviço das pessoas”, para lhes melhorar a vida. E na melhoria da vida está aquilo que a líder do CDS “mais deseja em política e na organização da vida social”: liberdade.
Para muitos, o mar é também sinónimo de liberdade e é ao mar que Cristas reserva várias páginas do seu livro. Um mar que quer transformar num “grande motor da nossa economia”. Em 2011 integra o governo e, assume, “abraçou apaixonadamente a agricultura, o mar, o ambiente e o ordenamento do território”.
Numa viagem desde o tempo dos descobrimentos até aos projetos de energia eólica off-shore (em mar profundo), passando pelo reconhecimento de Portugal como um dos países cuja Dieta Mediterrânica é reconhecida como património imaterial da Humanidade pela Unesco, Assunção Cristas publica nas últimas páginas uma carta vinda do futuro. Um futuro, daqui a 20 anos, onde Portugal foi, entre muitas outras coisas, capaz de “estender os limites da plataforma continental” e é líder da agenda internacional do desenvolvimento azul.
A Europa e a previsão de como vai ser Portugal em 20 anos
Para Cristas é “pouco realista” pensar-se Portugal sem estar inserido no contexto europeu: “Sermos europeístas, na minha perspetiva, significa sermos exigentes na Europa”. E esta exigência reflete-se, desde logo, nos “limites” que é necessário estabelecer para que todos os países, sem exceção, “tenham uma voz que conte”. Aponta como o grande desafio da Europa o “equilíbrio constante entre a diversidade respeitada” e o “pôr em comum debatido e acordado”. Afirma, claramente, que querer diminuir ou limitar a diversidade contra a vontade de cada um dos povos é “um erro que tem consequências negativas, mais cedo ou mais tarde”.
Cristas gosta da Europa da livre circulação de pessoas, da livre concorrência, do património, da cultura e do multilinguismo, da segurança, da solidariedade e do bem-estar e diz que é nessa Europa que “Portugal deve ser uma voz ativa”.
Nas últimas páginas do livro, Assunção Cristas faz uma antevisão de Portugal em 20 anos. Uma visão otimista onde o país será líder em praticamente todas áreas. Um “parceiro atento e ativo na cena internacional” que evoluirá numa política assente nos pilares europeu, atlântico e lusófono. Nas alterações climáticas, uma das preocupações que Cristas quer fazer sua, Portugal será ainda capaz de se apresentar como “líder na adaptação” necessária. E pede um país “start-up nation”, atrativo para as empresas, com modelos de trabalho opcionais e pessoas motivadas.