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Parlamento: Debate na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. Intervenção de António Costa. Lisboa, 26 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR
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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Debate em versão de bolso. Costa e partidos já ensaiam estratégias de campanha

Dentro do hemiciclo, o primeiro-ministro garantia ainda ter esperança, mas jogo do empurra do ónus da crise não teve conclusão. Lá fora, Ferro ouviu partidos sobre pós-chumbo e já cheira a eleições.

Nunca um país avançou diretamente do chumbo de um Orçamento para eleições antecipadas, mas esse dia pode mesmo ter chegado — o próprio primeiro-ministro aceita a posição do Presidente que já disse que, sem OE, convoca eleições. Esta quarta-feira, a proposta do Governo para 2022 vai a votos no Parlamento e António Costa não tem apoio para além das abstenções do PAN e das deputadas não-inscritas (alguns até admitiram já votar a favor, mas não chega).

Os 108 deputados do PS são insuficientes e Costa chegou ao Parlamento sem mais nada para dar à esquerda, que também não pediu mais. Só mais do mesmo. A estrada abriu-se em vários trilhos e o PS segue, agora sozinho, e incapaz de manter a estabilidade política necessária.

Assim, o primeiro dia de debate parlamentar já mais não foi do que uma antecipação de vários argumentos eleitorais e ainda de uma série de indicações para os dias que se seguem. Quem vai a votos? Quando? Como governa Costa até lá? Quem fica com a responsabilidade da crise política que aí está? Lá dentro, Costa ainda queria dar a ideia de acreditar, mas fora do hemiciclo, os sinais iam todos noutro sentido.

Parlamento: Debate na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. Intervenção de António Costa, primeiro-ministro. Lisboa, 26 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Desafio a viabilização sem dar nada de novo em troca

“Pedem-nos um passe de mágica. Mas não há passe de mágica que nos permita ultrapassar o sentido de responsabilidade, equilíbrio e defesa do interesse nacional”. Sem nada na manga (apenas o elencar das várias medidas cedidas à esquerda dentro e fora da proposta de Orçamento), restou a António Costa passar ao apelo direto a que PCP e BE deixem chegar o Orçamento ao debate na especialidade, que é “o momento adequado para a discussão em detalhe nas propostas e das redações”.

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Um apelo final, que António Costa repetiu no debate, mas sem ter nada mais para dar do que já tinha colocado em cima da mesa das negociações para apresentar aos — até aqui — parceiros do Governo no Parlamento. “Ainda há estrada para andar”, garantia ao PCP e BE num estender de mão que já era só pura retórica porque Costa já sabia — e no debate continuou a saber — que nem PCP nem BE tinham qualquer fresta negocial aberta, quanto mais uma porta.

PCP e BE com portas fechadas

Um a deixar, à vigésima quinta hora, desafios para entendimentos. Outro a romper a corda sem mais. Mas, no fundo, nem Bloco de Esquerda nem PCP mostraram, neste debate, qualquer tipo de esperança em que ainda fosse possível chegar a acordo — e concentraram-se no passo seguinte: a contenção de danos, já com as eleições na cabeça.

As trocas de argumentos de António Costa com Catarina Martins e Jerónimo de Sousa foram, de resto, bem ilustrativos disso mesmo: a líder do Bloco acusou o Governo de “substituir a negociação pelo ultimato” e de “esquecer o trabalho” que fez ao lado do Bloco; Jerónimo acusou Costa de só ter aceitado medidas “isoladas” e de não ter dado passos de aproximação na questão do salário mínimo.

Parlamento: Debate na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. Mariana Mortágua. Lisboa, 26 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Joana Mortágua no fim da sua intervenção no primeiro dia do debate do Orçamento do Estado

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Se no Bloco ainda foram vários os derradeiros apelos ao entendimento (“o PS vai provocar uma crise política que ninguém quer”, foram repetindo os deputados bloquistas), também não se perdeu de vista o próximo passo: o ensaio do argumento para eleições eleitorais. Por um lado, passando o ónus da crise para as mãos do PS (“Qual destas medidas vale uma crise?”, perguntava Mariana Mortágua, depois de enumerar as propostas do Bloco). Por outro, lançando-se ao ataque à direita, com Jorge Costa a encarregar-se de puxar pelo fantasma do crescimento do Chega e a acusar os partidos da direita de não terem programa. E Mortágua a completar: “Os filhos da direita do empobrecimento têm saudades do poder”.

No PCP, igual esforço para evitar carregar o peso da crise às costas: os deputados comunistas foram, um por um, enumerar os avanços insuficientes do Governo e detalhar as negociações a um nível que não é habitual, entrando nos pormenores do que propuseram dentro de portas. Ainda o debate decorria e, apesar de (ainda) não haver campanha eleitoral em curso, o PCP já lançava um tempo de antena na RTP e nas suas redes.

Com ambos os lados, Costa mostrou-se “frustrado”. E acabaram sem margem para se entenderem e um aviso futuro deixado por Mortágua: “Lamento que o Governo não veja que, ao atacar a esquerda por não desistir das suas propostas na Saúde ou no Trabalho, está a exibir a sua incapacidade para compromissos viáveis”. Um alerta a ter em conta caso se confirme o cenário de eleições antecipadas e a esquerda possa voltar a enfrentar a perspetiva de ter de se entender.

Parlamento: Debate na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. João Leão, ministro das finanças, fala ao telemóvel. Lisboa, 26 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

João Leão, ministro das Finanças, ao telemóvel em pleno debate do Orçamento do Estado

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As pistas deixadas para o day after

Foi logo na resposta a Rui Rio que António Costa — mesmo sem o líder do PSD lhe ter perguntado diretamente — fez questão de dizer que não vira as costas “num momento de dificuldade”.“Eu não me demito”. Mas esta foi só a primeira indicação sobre o futuro que se avizinha, porque mais adiante no debate esclareceu que será ele mesmo que vai liderar o partido se as eleições se anteciparem mesmo e também falou no eventual desafio que pode vir a enfrentar: governar em duodécimos. Aqui dramatizou, ao dizer que também já governou numa crise pandémica.

Mas no resumo de tudo o que disse já a pensar no day after, ou seja, na quarta-feira que vem, ficam já várias pistas. Se o Orçamento chumbar a ideia de Costa é continuar no lugar em que está e sem poderes de primeiro-ministro diminuídos — precisamente porque se não se demite continua em plenas funções — exceto num: não terá um Orçamento. E é aqui que entram os duodécimos.

Mais pistas para o day after

Se no debate ainda se iam ouvindo os apelos, ainda que tímidos, a prosseguir o caminho à esquerda, fora de portas a discussão já tinha dado vários passos em frente e praticamente entrado no campo da campanha eleitoral. Desde logo, assim que se soube que Ferro Rodrigues tinha decidido já ouvir os partidos durante a tarde, à margem do debate, sobre a condução dos trabalhos no Parlamento, a propósito da cada vez mais provável hipótese de chumbo do Orçamento. Assim, enquanto os partidos falavam da negociação sobre um OE ainda a ser discutido, lá dentro, os líderes parlamentares iam-se reunindo com Ferro, lá fora, em reuniões privadas, em pleno ambiente de crise.

Como foi entretanto noticiado pelo Público, Ferro combinou a iniciativa com Marcelo Rebelo de Sousa, tendo garantido que informaria o Presidente da República sobre a situação no Parlamento. À saída das reuniões, o Bloco ainda tentou, através de uma nota enviada aos jornalistas, insistir na sua disponibilidade para negociar até ao último minuto e garantir que não vê a convocação de eleições como consequência automática do chumbo — mas Marcelo já disse que optará por essa via.

De resto, o PEV disse desejar eleições, caso se confirme que é essa a vontade do PR, o mais rápido possível; Telmo Correia falou em eleições em finais de janeiro ou inícios de fevereiro, mas foi imediatamente contrariado pela direção do CDS, que as quer o mais cedo possível; e o PAN surpreendeu ao revelar a sua disponibilidade para ainda votar, in extremis, a favor do Orçamento — voto que, sozinho, não bastaria para a viabilização— e colar ao BE e PCP a responsabilidade por “escancarar a porta ao tempo da outra senhora” (leia-se ao crescimento do Chega em eleições antecipadas). O Governo saudou a disponibilidade, mas o vento já tinha mudado — e já ninguém conseguia tirar o cenário de eleições, cada vez mais presente, da equação. Nem mesmo António Costa que já avisara Moçambique que não iria estar na cimeira bilateral no país, a 4 e 5 de novembro, na próxima semana.

Parlamento: Debate na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. Pedro Siza Vieira, Mariana Vieira da Silva, Ana Mendes Godinho, conversam durante o debate. Lisboa, 26 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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O after do day after

Pedro Nuno Santos, o mais evidente candidato à sucessão de Costa no PS e antigo pivot da geringonça, chegou ao debate antes da hora. Entrou pelo hemiciclo antes do primeiro-ministro e foi distribuir charme político à esquerda. Mal se dirigiu às bancadas do PCP e do BE, Catarina Martins, Jerónimo de Sousa, Pedro Filipe Soares e João Oliveira levantaram-se num salto para o cumprimentarem.

Pedro Nuno não ficou por ali, distribuiu abraços pelo plenário, chegou até a sentar-se na última fila da bancada socialista numa meteórica amena cavaqueira. Uma ronda estratégica. Pedro Nuno vai assegurando aos seus que não é o seu tempo, que não tem pressa, que sabe esperar e que tem de manter-se sossegado, sem entrar em despiques. Mas o seu estado de espírito habitual é difícil de domar e o que foi feito, feito estava.

Acabou com António Costa a comparar o tamanho do sapato com ele, antes de sair do plenário.

Armas apontadas à direita

Na argumentação contra eleições antecipadas, o PS usou de tudo. Mas Costa apostou as fichas mais fortes no discurso anti-extrema direita. Aproveitou a intervenção de André Ventura só para isso mesmo — aliás, houve muitas intervenções neste debate em que o líder socialista aproveitou mais para o confronto político, já em estilo eleitoral, do que propriamente para o ataque ao conteúdo. No caso do Chega, Costa virou-se para Ventura para atirar: “A sua alegria mostra tudo e como será erro enorme chumbar este Orçamento”.

Aliás, neste capítulo atira a dois coelhos de uma vez. E isto porque aproveita o exemplo dos Açores (e o acordo de governação do PSD que inclui o Chega) para dizer que é isso que Ventura quer no continente. E, pelo caminho, atinge o PSD que se entendeu com o Chega para chegar ao governo. Eis um argumento eleitoral a que Costa não vai deixar de recorrer a cada esquina, sempre que o intuito for atingir a direita, mais moderada ou mais extrema.

Parlamento: Debate na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. Intervenção de António Costa, primeiro-ministro. Lisboa, 26 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Os sinais de Marcelo e a hipótese PSD-M

Apesar de todos os sinais terem caminhado, durante a tarde, no mesmo sentido — o do chumbo orçamental — houve uma nuance que lançou a confusão durante as horas de debate. A meio da tarde, nas televisões ligadas no Parlamento constatava-se com espanto que Marcelo acabava de atirar um dado novo: “Até ao momento do começo do debate ainda fiz diligências complementares para ver se chegava a um entendimento”, dizia aos jornalistas.

Marcelo não esclareceu quais foram as tais diligências. Nem quis dizer se tentou um derradeiro contacto com o PSD/Madeira para tentar assegurar votos que garantissem uma viabilização tardia — e instável — do Orçamento, possivelmente a juntar à vontade do PAN de chegar à fase de especialidade e a uma eventual negociação com as deputadas não inscritas. Somando todos, seria possível aprovar o OE — ainda que de forma, no mínimo, precária. Com o presidente do Governo regional da Madeira, Miguel Albuquerque, a vir dizer a meio da tarde que estaria disponível para “conversar” com Costa “se fosse para defender os interesses da região”, a tese começou a espalhar-se (pelo menos, nos Whatsapps de políticos e deputados).

Parlamento: Debate na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. Duarte Cordeiro e António Costa. Lisboa, 26 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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As contas de cabeça eram rápidas de fazer: pela mesma altura, sabia-se que Marcelo tinha recebido Paulo Rangel em Belém. Estaria a direita a mexer-se para forçar um calendário eleitoral mais favorável ao challenger?

Nas bancadas da esquerda, os rumores iam-se intensificado; na direita, Rio seria surpreendido, à porta do grupo parlamentar do PSD, pelos jornalistas com a informação de que Rangel passara por Belém, admitindo não saber qual a razão do encontro. O desencontro pareceu acabar com Albuquerque a dizer não ter sido contactado pelo Governo, Rio a garantir que a Madeira “não está à venda” e Marcelo a acrescentar ter recebido também Fernando Medina e Carlos Moedas em Belém. Mas a dúvida instalou-se e confundiu tanto esquerda como direita por longas horas.

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