A Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP) ainda não recebeu nenhum pedido do Ministério da Saúde para a abertura do concurso para substituir Graça Freitas na liderança da Direção-Geral da Saúde. O mandato de cinco anos da diretora-geral da saúde terminou a 31 de dezembro e Graça Freitas comunicou a Manuel Pizarro que não pretendia continuar no cargo, embora estivesse disponível para permanecer à frente da DGS enquanto o Ministério não nomeasse um novo dirigente.
Dez dias depois, o concurso continua por abrir. Em resposta ao Observador, fonte oficial da CReSAP avançou que “ainda não foi rececionado qualquer pedido de abertura de procedimento concursal para o cargo de Diretor-Geral da Saúde”. A informação confirma os dados publicados no site da CReSAP, responsável por receber e avaliar as candidaturas ao cargo para chegar a uma lista restrita a partir da qual o Governo nomeia um novo administrador. Não há nenhuma referência a um concurso para o cargo de diretor-geral da Direção-Geral da Saúde entre os procedimentos “a abrir em breve”, “abertos”, “em avaliação”, “com proposta de designação” ou “concluídos”.
Os concursos só podem ser abertos pela CReSAP depois de serem solicitados pelo membro do Governo que tutela o órgão em causa. Neste caso, Manuel Pizarro tem de identificar “as competências do cargo de direção a prover”, definir a carta de missão, indicar o mandato de gestão; e apontar as principais responsabilidades e funções de quem vier a ocupar o cargo. São necessários três documentos: um modelo preenchido para pedido de abertura de procedimento concursal (disponível no site da CReSAP), um formulário para descrição das características do cargo e a carta de missão — que inclui uma especificação dos serviços prestados, orientações estratégicas, objetivos a atingir, recursos necessários e a missão do órgão.
Depois de validado, o concurso é anunciado no site da CReSAP e, mais tarde, colocado no ativo. No fim, os candidatos são avaliados por um júri, que chegará a uma “proposta de designação” com três nomes ordenados alfabeticamente e acompanhados da fundamentação para que cada um deles tenha chegado aos finalistas. A lista é depois entregue ao membro do Governo que solicitou o concurso, que a partir desse momento tem um prazo máximo de 45 dias para designar um candidato. No fim do processo, a CReSAP publica as sínteses das propostas de designação apresentadas pelos júris dos procedimentos concursais e os respetivos despachos de nomeação em Diário da República.
O Observador contactou o Ministério da Saúde para obter mais informações sobre a abertura do concurso, mas ainda não obteve respostas.
Os critérios que a CReSAP avalia em busca do novo diretor-geral da saúde
Na avaliação que desenvolve sobre todos os candidatos a cargos de administradores públicos, incluindo ao do novo diretor-geral da saúde que virá a render a Graça Freitas, a CReSAP observa duas características: as “competências de gestão” e as “competências comportamentais”. Todas elas estão discriminadas no separador do site da comissão dedicado ao “pedido de abertura de procedimento concursal”, onde o Governo encontra também a documentação necessária para solicitar a implementação do concurso à CReSAP.
Como são avaliadas as competências de gestão e comportamentais?
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Quanto às competências de gestão, a CReSAP avalia o candidato em 12 pontos nesta avaliação: liderança, colaboração, motivação, orientação estratégica, orientação para resultados, orientação para o cidadão e serviço de interesse público, gestão da mudança e inovação, sensibilidade social, experiência profissional, formação académica, formação profissional e aptidão para o cargo. É preciso preencher 25 requisitos nestes tópicos:
- Influenciar o comportamento e atitudes de outras pessoas em contexto organizacional.
- Liderar projetos, programas e organizações de grande dimensão e com elevado grau de complexidade e responsabilidade.
- Lidar com situações de pressão, encarando-as de forma positiva e levando a equipa a aderir às suas orientações.
- Criar sinergias com os elementos das equipas com que interage, comunicando de forma cordial e afável.
- Estabelecer acordos e consensos com pessoas e grupos, atingindo objetivos que visam o aumento da eficácia e eficiência da organização.
- Valorizar o trabalho pela satisfação que o mesmo lhe confere, mostrando-se entusiasmado e transmitindo esse entusiasmo às equipas que lidera.
- Mostrar-se resiliente na execução de atividades que exigem esforço acrescido.
- Planear de forma estratégica as atividades que estão sob a sua responsabilidade.
- Atentar à influência das suas decisões no futuro da organização, antecipando resultados e prevendo efeitos adversos.
- Demonstrar coerência e linha de continuidade no pensamento estratégico.
- Definir resultados, metas e objetivos de forma determinada e mensurável.
- Desafiar os outros e a si próprio, demonstrando-se enérgico na tomada de decisão.
- Prestar serviço de qualidade aos utentes/clientes, promovendo na sociedade o aumento da confiança nas organizações onde colabora.
- Orientar a sua atividade respeitando os valores éticos e deontológicos do serviço público.
- Adaptar-se a novas situações, ultrapassando condicionalismos e resistências, aderindo a novos processos de gestão.
- Diagnosticar necessidades de mudança e apoiar ativamente a sua implementação.
- Mostrar-se empreendedor com visão compreensiva dos diversos contextos para induzir novas soluções.
- Participar em organizações ou atividades de cariz e intervenção social.
- Ser orientado para atender às necessidades dos outros, tendo em consideração o bem comum.
- Possuir experiência profissional em cargos de gestão, direção, coordenação ou chefia.
- Ter exercido funções em diversas áreas de atividade profissional, demonstrando abrangência de conhecimento técnico e de gestão.
- Possuir habilitação académica no mínimo equivalente ao grau de licenciatura, relevante para o cargo a ocupar.
- Ter formação profissional em áreas diversificadas, nomeadamente de gestão de pessoas e de gestão pública.
- Possuir formação profissional específica relacionada com o cargo a ocupar.
- Mostrar conhecimento da organização em causa, verificável através da pertinência e razoabilidade das ações principais que pensa poder vir a desenvolver.
Quanto às comportamentais, a CReSAP divide 10 pontos em cinco áreas: determinação, empatia, capacidade para antecipar consequências, capacidade para lidar com a ambiguidade e adaptabilidade. São os seguintes:
- Capacidade para gerir situações que impliquem a obtenção de resultados tangíveis e mensuráveis.
- Capacidade para lidar com situações inesperadas, sendo capaz de tomar decisões assertivas mesmo que as mesmas não sejam consensuais.
- Capacidade para gerir situações que impliquem influenciar e motivar o comportamento de outros.
- Capacidade para estabelecer relações de confiança, criando um ambiente favorável ao bem-estar das equipas.
- Capacidade para prever situações que possam ter influencia na qualidade do trabalho, conseguindo efetuar uma análise precisa dos factos conhecidos ou os que possam vir a ocorrer e que são fatores críticos de sucesso.
- Capacidade para coletar informação relevante, de forma individual ou grupal, analisando os dados disponíveis para conseguir estabelecer prioridade de atuação estratégica lidando com a imprevisibilidade das situações a ocorrer.
- Capacidade para motivar e influenciar as outras pessoas em contextos pouco estruturados ou aqueles que foram sujeitos a mudanças acentuadas na sua organização.
- Capacidade para lidar com opiniões estratégicas ambivalentes, conseguindo congregar consensos de forma a tomar decisões sustentadas e refletidas.
- Capacidade para lidar com diversos contextos nacionais e/ou internacionais em que a interação socio cultural implique uma compreensão de divergências e de concordâncias de pontos de vista no seio das equipas.
- Capacidade para flexibilizar o seu comportamento, respeitando as opiniões de outros levando-as em linha de conta na suas tomadas de decisão.
Em dezembro de 2017, a proposta de designação da CReSAP no recrutamento que acabaria por promover Graça Freitas oficialmente a diretora-geral da saúde — já o era, mas em regime de substituição, depois da retirada de Francisco George; e antes também já tinha sido subdiretora-geral —, também designava outros dois candidatos: Raquel de Almeida Ferreira Duarte Bessa Melo e Rui Gentil de Portugal e Vasconcelos Fernandes. Outros sete candidatos foram desconsiderados. No júri esteve a então presidente da CReSAP, Maria Júlia Ladeira; a vogal permanente Maria da Conceição; Rui Ivo, na qualidade de vogal não permanente da CReSAP e vice-presidente do Conselho Diretivo do Infarmed; e, como perito, Paula Alexandre, vogal do Conselho Diretivo do Instituto Nacional de Emergência Médica.
Raquel Duarte e Rui Portugal voltam a ser apontados como tendo perfil para DGS
Cinco anos depois, Raquel Duarte e Rui Portugal são dois dos nomes que voltam a ser apontados para o cargo de diretor-geral da saúde, substituindo Graça Freitas. A primeira foi secretária de Estado da Saúde de Marta Temido entre outubro de 2018 e outubro de 2019, é professora no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto e principal consultora para as medidas de confinamento e desconfinamento que foram sendo adotadas pelo Governo de António Costa ao longo da pandemia de Covid-19. Rui Portugal é atualmente o subdiretor-geral da saúde e coordenador do Gabinete Regional de Intervenção para a Supressão da Covid-19 em Lisboa e Vale do Tejo, tendo sido presidente da Administração Regional de Saúde (ARS) dessa mesma zona.
Graça Freitas comunicou ao ministro da Saúde que pretendia abandonar a liderança da Direção-Geral da Saúde (DGS) em vez de renovar o mandato até 2027. A intenção da atual diretora-geral da Saúde era sair efetivamente do cargo já no dia 31 de dezembro, último dia do mandato de cinco anos que está a concluir neste momento, mas chegou a um acordo com Manuel Pizarro: ficará na liderança da DGS até ser oficialmente substituída, cumprindo as regras da administração pública que não a deixam sair do cargo sem ser substituída.
Graça Freitas sai da liderança da DGS. Decisão já foi comunicada ao ministro da Saúde
A notícia foi avançada pelo Observador a 29 de dezembro, quando o Governo confirmou que Graça Freitas já tinha “formalizado junto da tutela a sua vontade de não renovar a nomeação” e que “está assegurada a permanência no cargo até à sua substituição, agradecendo o Ministério da Saúde a disponibilidade demonstrada pela diretora-geral da Saúde no término do seu mandato e todo o empenho e dedicação na liderança da Direção-Geral da Saúde ao longo dos últimos anos, de um modo especial na resposta à pandemia, a maior crise global de saúde pública do último século”.
Até à substituição de Graça Freitas, podem acontecer dois cenários: o Ministério da Saúde pode apontar alguém que entrará em regime de substituição, rendendo-a enquanto se espera pelo nome definitivo; ou manter a atual diretora de forma interina enquanto se espera pelo resultado do concurso da CReSAP. No caso de ser colocada outra pessoa em regime de substituição, essa pessoa não fica excluída, podendo vir a ocupar o cargo de forma definitiva, depois de passar por todas as fases do concurso — foi, de resto, o caso de Graça Freitas.
O Ministério da Saúde não esclareceu ao Observador qual dos caminhos será adotado, mas sublinha que “a designação do futuro titular do cargo de Diretor-Geral da Saúde seguirá a tramitação legal, em obediência às regras de recrutamento, seleção e provimento dos cargos de direção superior da Administração Pública”. Adianta apenas que “a escolha será naturalmente efetuada dentro de um perfil que se enquadre no quadro das competências da DGS, onde sempre estiveram presentes as responsabilidades da Autoridade de Saúde Nacional na resposta a emergências sanitárias e de saúde pública”.