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A história tem 17 meses, mas tudo desabou há sete dias. Na semana passada, no espaço de duas horas, o Presidente do Peru dissolveu o Congresso, os deputados destituíram-no a ele e, nas ruas, a instabilidade política culminou numa onda de manifestações violentas que nem o estado de emergência anunciado esta quarta-feira, nem a promessa de eleições dentro de um ano conseguiu amenizar.
No Peru, quase ninguém entra e quase ninguém sai. Quase, porque os aeroportos abrem e fecham portas à medida que os manifestantes procuram invadir as pistas de aterragem; e em que as estradas ficam cortadas por rochas colocadas no caminho. Há pelo menos 40 portugueses retidos no país à conta dos tumultos em todo o país. Mas o que está por trás deles?
O que está a acontecer no Peru?
Oito pessoas, cinco das quais adolescentes, morreram na última semana na sequência de protestos violentos que eclodiram inicialmente nas zonas mais pobres do sul do Peru, mas que mais tarde se espalharam por todo o território nacional.
As manifestações surgiram na quarta-feira, 7 de dezembro, depois de Pedro Castillo, Presidente do Peru, que estava a poucas horas de ser alvo de uma votação para impeachment, ter anunciado que iria dissolver o Congresso e implementar um “governo de exceção”, suspendendo todos os direitos democráticos da população — uma espécie de auto-golpe de Estado que só encontra paralelo na História peruana com o caso de Alberto Fujimori, que dissolveu o Congresso em abril de 1992. Pedro Castillo está agora na prisão de Barbadillo, onde Alberto Fujimori cumpre pena por crimes contra a humanidade.
Numa declaração oficial ao país na quarta-feira da semana passada, o então Presidente peruano emitiu ordens para “dissolver temporariamente o Congresso da República e instaurar um governo excecional de emergência; e convocar no prazo mais breve possível um novo Congresso com poderes constituintes para redigir uma nova Constituição num prazo não superior a nove meses.” Até que o novo Congresso seja instituído, “governaremos mediante decretos-lei”.
Pedro Castillo declarou ainda o recolhimento obrigatório em todo o país entre as 22h e as quatro da manhã. “Declaro em reorganização o sistema de Justiça, o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Junta Nacional de Justiça, o Tribunal Constitucional”, acrescentou. Foi então deposto e detido, mas os protestos intensificaram-se em todo o país.
Na manhã de quarta-feira, a Polícia Nacional do Peru tweetou: “Dando cumprimento às nossas faculdades e atribuições descritas no artigo 5º de D.L. nº1267 Lei da Polícia Nacional do Peru, o efetivo da PNP interveio com o ex-presidente Pedro Castillo”.
O tweet, acompanhado de uma fotografia que parece mostrar o chefe de Estado já detido, depois de a destituição ter sido aprovada, foi entretanto eliminado da página oficial das autoridades. Nesse mesmo dia à noite, o Ministério Público também confirmou a detenção de Pedro Castillo por suspeitas de “violar a ordem constitucional”, organizar um golpe de Estado e tentar escapar do Palácio presidencial. A mensagem, que tinha sido publicada no site do Governo, também foi apagada.
Presidente do Peru detido após ser destituído e acusado de golpe de Estado
Já esta quarta-feira, o novo governo provisório do Peru declarou estado de emergência nacional por 30 dias por causa dos protestos relacionados com o auto-golpe de Estado. Esta medida implica a limitação dos direitos de reunião e de livre circulação no país; e permite às forças de segurança que revistem a casa de pessoas sem necessidade de apresentar uma ordem judicial. Num tweet, Luis Otárola, ministro da Defesa, explica que, com esta medida, procura-se “garantir a ordem, a continuidade das atividades económicas e a proteção de milhões de famílias”.
Quem está a liderar o Peru agora?
Dina Boluarte, que era a vice-presidente do Peru e, portanto, número dois de Pedro Castillo, tornou-se a primeira mulher no cargo de chefe de Estado do país. No dia do impeachment, Dina Boluarte tweetou: “Rejeito a decisão de Pedro Castillo de perpetrar a quebra da ordem constitucional com o encerramento do Congresso. É um golpe que agrava a crise política e institucional que a sociedade peruana terá que superar com estrito cumprimento da lei.”
No primeiro discurso à nação na qualidade de Presidente do Peru, na quinta-feira passada a partir do Palácio do Governo, Dina Boluarte considerou que o novo cargo era “uma oportunidade para reorientar o que deve ser feito com o país”: “Sei que há algumas vozes que pedem eleições antecipadas e isso é respeitável democraticamente. Acredito que a assunção da Presidência, nesta ocasião, é reorientar o que deve ser feito com o país.” Perante as críticas de quem a acusa de ter tomado o poder ilegalmente, comentou: “O que peço é um espaço, um tempo para resgatar o país.”
Novo Governo do Peru impõe estado de emergência em todo o país por 30 dias
Como é que se chegou a este ponto?
Pedro Castillo foi eleito Presidente do Peru em julho de 2021, após uma segunda volta em que venceu a Keiko Fujimori, filha de Alberto Fujimori. Os 17 meses do seu governo estão a ser marcados por uma intensa instabilidade política: já teve cinco gabinetes e mais de 80 ministros, enfrentou seis investigações criminais e dois processos de impeachment que nunca foram concretizados.
Parte do problema é que muitos dos nomes apontados por Pedro Castillo para liderar pastas no Executivo nunca tinham tido experiência governativa e não eram qualificados para os cargos. Alguns chegaram a ser alvo de investigações criminais relacionadas com crimes de corrupção e foram acusados de violência doméstica e de envolvimento em casos de homicídio. O próprio Pedro Castillo também protagonizou escândalos de corrupção no último ano e meio; e chegou a ser acusado de obstrução à justiça e de liderar uma organização criminosa, alegadamente coordenada pela ex-primeira-dama Lilia Paredes, que lucraria com contratos realizados por meio do governo peruano.
À conta destas acusações, o Congresso tentou por duas vezes destituir Pedro Castillo por questões de “incapacidade moral”. A primeira foi em dezembro do ano passado, dois meses depois de três partidos da direita peruana terem questionado a legitimidade moral do Presidente. Em causa estava uma investigação a Bruno Pacheco, ex-secretário presidencial de Pedro Castillo, após terem sido descobertos o equivalente a cerca de 188,6 mil euros numa casa de banho do Palácio que supostamente era utilizada por ele. Mas não foi destituído: só 46 dos deputados votaram pela retirada do Presidente peruano, mas eram precisos 130 votos.
Em março deste ano, Pedro Castillo, acusado de “incapacidade moral permanente” — um termo que não tem definição na lei — sobreviveu a um novo processo de impeachment depois de apenas 55 deputados terem votado a favor da destituição quando, desta vez, eram precisos 87. Desta vez, o processo foi instituído por suspeitas de corrupção e de suborno: o Presidente era suspeito em três investigações preliminares, mas não podia enfrentar a lei enquanto estivesse na liderança.
Com dois processos de impeachment colocados (e posteriormente falhados), Pedro Castillo tinha poderes para dissolver o Congresso, tal como indica o artigo 134º da Constituição: “O Presidente da República tem poderes para dissolver o Congresso, se este tiver censurado ou negado a sua confiança em dois Conselhos de Ministros”. Na terça-feira, dia 6 de dezembro, Pedro Castillo acusou a oposição de “dinamitar a democracia e ignorar o direito de escolha” e de pretender “aproveitar e tomar o poder que o povo lhes retirou nas urnas”.
Horas antes de ser submetido a um terceiro impeachment, que estava agendado para as 15h15 de 7 de dezembro, Pedro Castillo decidiu utilizar essa lei a seu favor e anunciou ao país que governaria por decreto até que um novo Congresso fosse estabelecido. “Em resposta à reivindicação dos cidadãos em todo o país, tomamos a decisão de estabelecer um governo de emergência visando o estabelecimento do Estado de direito e da democracia”, disse ele.
E acusou: “Passámos mais de 16 meses numa campanha contínua e indulgente de ataque à instituição presidencial, situação nunca antes vista na história peruana. A única agenda do Congresso desde 29 de julho de 2021, em que tomei posse como presidente do República, foi e é a destituição presidencial.”
O congresso ignorou essas ordens e reuniu mais cedo, às 12h30 — altura em que vários ministros começaram a apresentar a demissão. Entre os ministros demissionários estavam os líderes das pastas do Trabalho, Relações Exteriores, Economia, Justiça e Defesa. Também as Forças Armadas e a Polícia Nacional comunicam que não seguirão as ordens de Pedro Castillo.
Entretanto, o processo de impeachment avançou mesmo — e, desta vez, venceu: dos 130 deputados, 101 votaram a favor da destituição do chefe de Estado. E os ministros de Pedro Castillo apresentaram a demissão em bloco, retirando-lhe a (pouca) robustez política que lhe restava. O chefe de Estado foi então destituído e depois detido pela polícia nacional em Lima, alegadamente enquanto tentava escapar do palácio presidencial. O Ministério Público emitiu um comunicado a confirmar a detenção que dizia: “O Ministério Público ordenou esta tarde a prisão de Pedro Castillo Terrones pelo suposto crime de rebelião, regulamentado no artigo 346º do Código Penal, por violação da ordem constitucional”.
O que está em causa nas diversas manifestações?
Há três posicionamentos em confronto: o de quem se manifesta contra Pedro Castillo, pela tentativa de auto-golpe de Estado; os que rejeitam a liderança da nova Presidente, Dina Boluarte, porque fazia parte do Executivo de Pedro Castillo; e os que exigem o regresso do ex-Presidente, porque acreditam que foi vítima de um golpe com o envolvimento de Boluarte. Todos saíram à rua na última semana, dando origem a confrontos.
No meio dos tumultos, oito pessoas morreram após serem baleadas. A Amnistia Internacional e vários grupos de direitos humanos peruanos acusam a polícia de violência contra os manifestantes. A Transparencia, uma organização não-governamental que batalha contra a corrupção, posicionou-se contra Pedro Castillo: num tweet, o líder, Iván Lanegra, afirmou que o presidente foi “ditador por duas horas”.
Confrontos entre polícia e manifestantes causam pelo menos 20 feridos no Peru
Por trás das manifestações estão também organizações sindicalistas, como a Confederação Geral de Trabalhadores do Peru, a Organização Indígena Nacional e a Central Única de Grupos Campestres do Peru. A maior parte dos protestos são a favor de Pedro Castillo: querem a sua libertação e a destituição de Dina Boluarte. Mas as primeiras manifestações surgiram contra ele, quando anunciou a dissolução do Congresso.
Aumentam protestos no Peru pela libertação do antigo Presidente
As origens do ex-chefe de Estado podem justificar esta onda de apoios: Pedro Castillo é natural de uma das zonas mais pobres do país, Cajamarca, e é filho de dois camponeses analfabetos. É professor, mas continuou a trabalhar na terra, ainda que desse aulas, para obter uma segunda fonte de rendimentos. Cajamarca, apesar de extremamente pobre, é onde fica a maior mina de ouro da América do Sul. Por isso é que, na campanha presidencial em que Pedro Castillo derrotou a elite política peruana, o slogan que utilizava era: “Pelo fim da pobreza num país rico”.
Na última segunda-feira, os manifestantes incendiaram carros nas ruas do Peru e 2.000 pessoas invadiram o aeroporto na cidade de Arequipa, obrigando a suspender os voos, que só foram retomados quando os manifestantes foram alvo de gás pimenta por parte das autoridades policiais. Em Cusco, há estradas bloqueadas pelos manifestantes, o abastecimento de minas de cobre e mercados locais de alimentos foi bloqueado e locais turísticos como Machu Picchu foram encerrados. Cerca de 3.000 turistas ficaram retidos nas redondezas da cidadela inca.
De acordo com a Polícia Nacional do Peru, 71 pessoas foram detidas entre os dias 7 e 13 de dezembro por terem “cometido crime contra a tranquilidade pública — sossego público — e tumultos em território peruano”. “O direito de viver em paz com os outros é tão legítimo quanto o seu direito de protestar pacificamente”, defendeu a força de segurança numa mensagem publicada no Twitter. Num extenso ponto de situação publicado na quarta-feira, as autoridades fizeram um levantamento de todas as vias obstruídas por causa das manifestações no Peru.
#PNPInforma ????| Esta es la situación de las vías a nivel nacional. Actualizado [13DIC2022/ 17:00 horas] pic.twitter.com/YDvYoZyfH2
— Policía Nacional del Perú (@PoliciaPeru) December 14, 2022
Já esta quinta-feira, os Aeroportos Andinos do Peru (AAP) anunciaram o encerramento temporário do Aeroporto Internacional Inca Manco Capac, na cidade de Juliaca, por motivos de segurança: haverá um grupo de manifestantes a tentar aceder ao aeroporto. Duzentos e cinquenta passageiros foram retirados, quatro voos foram suspensos — afetando 1.000 pessoas — e todos os funcionários estão abrigados. Até agora, cinco aeroportos chegaram a estar encerrados, embora nem sempre em simultâneo, por causa dos protestos.
Neste momento, o aeroporto de Lima (o maior do país) está em funcionamento, mas com atrasos significativos nos voos. Os aeroportos de Alejandro Velasco Astete, em Cusco, Alfredo Rodríguez Ballón, Arequipa, e Alfredo Mendívil Duarte, em Ayacucho, estão fechados.
Qual é a situação dos portugueses que estão no Peru?
De acordo com um comunicado enviado esta quinta-feira de manhã pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, há 40 cidadãos portugueses retidos nas regiões de Cusco, Arequipa e Águas Calientes (Machu Pichu) devido ao encerramento dos aeroportos e vias ferroviárias. Todos estão em segurança e em contacto com a embaixada de Portugal em Lima. O Governo, através da embaixada e do Gabinete de Emergência Consular, diz que “tem estado a acompanhar de perto a situação dos cidadãos portugueses que se encontram retidos no Peru, devido à instabilidade política e social que aí se verifica”.
Uma nota da Presidência da República portuguesa publicada já ao início da noite atualiza o número, referindo que são 60, não 40, os portugueses no Peru: “Estão todos bem e em segurança, aguardando que os aeroportos sejam abertos e possam partir”, assegurou.
Entre estes cidadãos estão sete jovens portugueses retidos em Arequipa, colegas de universidade e finalistas de Medicina na Universidade de Coimbra, que estavam na reta final de uma viagem de duas semanas entre Brasil e Peru para celebrar o fim do curso. A mãe de um deles, Paula Rodrigues, explicou que o grupo tinha ficado retido durante 50 horas num autocarro porque as estradas foram cortadas pelos manifestantes. A viagem de regresso estava inicialmente marcada para as 16h30 de quarta-feira, mas os jovens continuam retidos no país e estão abrigados num hotel a 1.200 quilómetros de Lima.
Um dos jovens, Francisco Rodrigues dos Santos, contou à Rádio Observador que Marcelo Rebelo de Sousa o contactou esta quinta-feira de manhã. O Presidente português terá estabelecido contactos com a Embaixada de Portugal no Peru e falou com várias entidades da União Europeia para que os cidadãos europeus possam voltar aos respetivos países.
Fonte oficial da Presidência da República confirmou à Rádio Observador que Marcelo Rebelo de Sousa contactou o jovem, que informou o grupo. Numa nota entretanto publicada no site da presidência, confirma-se oficialmente que o chefe de Estado português “contactou hoje um dos portugueses retidos no Peru, um jovem finalista de Medicina, cujos pais lhe tinham escrito“.
“O Presidente da República, na sequência de um contacto com o Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, informou o jovem que as autoridades diplomáticas portugueses estavam a envidar todos os esforços para ajudar todos os portugueses retidos no Peru a ultrapassar a presente situação, incluindo uma possível solução que envolva outros países da União Europeia, que tenham cidadãos na mesma situação”, diz a nota.
“A Embaixada de Portugal em Lima tem realizado todas as diligências possíveis junto das autoridades peruanas e mantido contactos com os portugueses e respetivas famílias, tendo em vista a sua saída, em segurança, do país”, assegurou o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Este é um esforço que está a ser concertado entre os representantes diplomáticos de todos os países da União Europeia que têm cidadãos no Peru através do Chefe da Delegação da União Europeia em Lima.
Um dos jovens portugueses retidos no Peru foi contactado pelo Presidente da República
Estou no Peru e preciso de ajuda. O que devo fazer?
Se é um cidadão português e está no Peru, deve contactar o Gabinete de Emergência Consular e sinalizar o seu caso, alertou o Governo. Há dois endereços de email para esse efeito — “gec@mne.pt” e “lima@mne.pt” — e os seguintes números de telefone: “+351 217 929 714” e “+351 961 706 472” (portugueses); “0051 1 6287164”, “0051 1 6287165” e “0051 1 6287166” (peruanos).
O segundo email (“lima@mne.pt”) é o preferencial no contacto com a Embaixada de Portugal em Lima. Esteja também atento à página de Facebook, a que pode aceder aqui, e aos avisos que estão a ser publicados no site oficial da embaixada.
Tenho uma viagem marcada para o Peru. Ainda posso ir?
Não convém. Numa nota enviada à comunicação social, o Ministério dos Negócios Estrangeiros desaconselhou as viagens não essenciais no Peru e para o país. O aviso foi repetido pela Embaixada de Portugal no Peru, que numa mensagem destacada no site oficial sublinha que “devem ser evitadas viagens não essenciais, em particular por via rodoviária”, até porque é frequente as estradas estarem bloqueadas.
“Caso se veja forçado a viajar, deve fazer-se acompanhar dos seus documentos e prever água e comida para eventuais distúrbios, como cortes de estrada ou manifestações, que podem bloquear a circulação por muitas horas”, aconselhou a embaixada, recordando que “o poder das autoridades centrais nas zonas mais remotas é frágil, pelo que a capacidade de intervenção é limitada”. “Mesmo em momentos normais, viajar no Peru não é isento de risco. A situação é fortemente agravada pela presente instabilidade política e social”, acrescentou.
Como estão a reagir os líderes políticos peruanos e de outros países?
César Landa, ministro das Relações Exteriores, anunciou a demissão da liderança daquela pasta por uma “estrita adesão” às “convicções e valores democráticos e constitucionais”. A gota de água, assumiu no Twitter, foi a decisão de Pedro Castillo para “fechar o Congresso da República, violando a Constituição”: “Condeno veementemente este autogolpe e apelo à comunidade internacional para que ajude a reincidência democrática no Peru. Castillo tomou esta decisão sem o meu conhecimento ou apoio.”
Foram os mesmos argumentos apresentados pelos restantes ministros demissionários, com exceção do líder da pasta da Defesa, que apontou “motivos pessoais” para o afastamento. Patricia Benavides, procuradora-geral da República, também sublinhou uma “rejeição enfática” a “qualquer violação da ordem constitucional” e apelou a Pedro Castillo para “respeitar a Constituição, o Estado de Direito e a democracia que tanto nos custou”.
A nível internacional, o Presidente do México saiu em defesa de Pedro Castillo. Numa série de tweets, considerou “lamentável” que, “por interesses das elites económicas e políticas, desde o início da presidência legítima de Pedro Castillo, manteve-se contra ele um clima de confronto e hostilidade até que o levou a tomar decisões que serviram aos seus adversários para consumar a sua destituição”. Andrés Manuel López Obrador classificou de “suis generis” a acusação de que Pedro Castillo governava sob uma “incapacidade moral”. E confessou um desejo: “Esperemos que os direitos humanos sejam respeitados e haja estabilidade democrática em benefício do povo”.
México confirma pedido de asilo de Pedro Castillo, presidente deposto do Peru
Também Marcelo Ebrard, ministro das Relações Externas mexicano, ofereceu guarida a Pedro Castillo. Em declarações aos jornalistas da quarta-feira da semana passada, questionado sobre se o México estava disponível para receber o Presidente peruano, respondeu: “Temos uma política favorável ao asilo. Se ele pedir, não devemos opor-nos a ele, mas ele não o fez”. No momento em que foi detido, Pedro Castillo estaria a tentar sair do Palácio presidencial para se dirigir à embaixada do México em Lima.
De resto, o país emitiu um comunicado conjunto com a Argentina, Bolívia e Colômbia em que “expressam a sua profunda preocupação com os recentes acontecimentos que resultaram na destituição e detenção de José Pedro Castillo Terrones, presidente da República do Peru” e pediram o “respeito pela vontade popular”
“Não é novidade para o mundo que o presidente Castillo Terrones, desde o dia da sua eleição, foi vítima de assédio antidemocrático, em violação ao artigo 23.º da Convenção Americana de Direitos Humanos, o ‘Pacto da Costa Rica’, aprovado em 22 de novembro de 1969, para posteriormente ser objeto de tratamento judicial da mesma forma, em violação ao artigo 25º da referida convenção”, diz a nota.
“Os nossos governos convocam todos os atores envolvidos no processo anterior a priorizar a vontade dos cidadãos, que se manifestou nas urnas. É a forma de interpretar o alcance e os significados da noção de democracia contida no Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Exortamos os que compõem as instituições a absterem-se de contrariar a vontade popular expressa com o sufrágio livre”, acrescenta.
Do outro lado do espectro, Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, anunciou o apoio a Dina Boluarte. Depois de um discurso no Conselho Permanente daquela instituição, reiterou no Twitter: “Hoje no Peru a ordem constitucional foi alterada. Transmito a Dina Boluarte o nosso apoio à democracia, paz e instituições no Peru e a necessidade urgente de reconstruir o caminho democrático no país.”
Lisa Kenna, embaixadora norte-americana no Peru, tweetou que “os Estados Unidos instam veementemente o presidente Castillo a reverter a sua tentativa de fechar o Congresso e permitir que as instituições democráticas do Peru funcionem de acordo com a Constituição”: “Encorajamos o público peruano a manter a calma durante este período de incerteza.”
O Ministério das Relações Exteriores brasileiro, também conhecido como Itamaraty, considerou que “as medidas adotadas” por Pedro Castillo são “incompatíveis com o arcabouço normativo constitucional daquele país, representavam violação à vigência da democracia e do Estado de Direito”: “O governo brasileiro manifesta a sua disposição de seguir mantendo as sólidas relações de amizade e cooperação que unem os dois países e deseja êxito à Presidente Dina Boluarte na sua missão como Chefe do Estado peruano.”
E as forças de segurança?
As Forças Armadas e a Polícia Nacional do Peru emitiram na quarta-feira, 7 de dezembro, dia da destituição de Pedro Castillo, um comunicado conjunto anunciando que eram “respeitosos da ordem constitucional estabelecido”: “Qualquer ato contrário à ordem constitucional estabelecida constitui uma violação da Constituição e gera incumprimento por parte das Forças Armadas e da Polícia Nacional do Peru”.
Quando haverá eleições no Peru?
Numa fase inicial, foi anunciado que as eleições presidenciais no Peru aconteceriam em abril de 2024, dois anos antes da data prevista para o fim do mandato de Pedro Castillo. Entretanto, numa tentativa de apaziguar as manifestações no Peru, o novo Executivo anunciou que as eleições podem acontecer já dentro de um ano, em dezembro de 2023. Os protestos, no entanto, perduram.
Presidente do Peru quer antecipar eleições gerais para abril de 2024