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© Hugo Amaral

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Do grão à cápsula. Uma (breve) história do café

Estivemos na fábrica da Nespresso, na Suíça, para o levar numa viagem ainda maior. Dos trópicos de Câncer e Capricórnio até à nossa mesa, saiba quais são os passos por que passam os grãos de café.

Com ou sem açúcar, servido ou não numa chávena escaldada. Curto, cheio, abatanado, com uma pinga de leite ou em formato carioca. A seguir à água, o café é a segunda bebida mais ingerida no mundo. E só em Portugal são 80% os que a bebem, segundo dados da European Coffee Federation. Mas até chegar à nossa mesa ou ao balcão do estabelecimento da esquina, os grãos de café fazem uma viagem complexa e demorada, não só porque a sua origem é remota — considerando que os países produtores encontram-se entre os trópicos de Capricórnio e de Câncer — mas porque há dezenas de análises para garantir que, no final, haja qualidade e sabor. Com ou sem açúcar.

Que o diga a marca suíça Nespresso. A título de exemplo, fomos conhecer a sua fábrica principal, em Avenches, Suíça, para descobrir qual o processo de produção do café. E o que encontrámos — além de mantos de neve a forrar uma paisagem de inverno e um vocabulário inglês com sotaque afrancesado — foi um método enraizado que já leva 30 anos de experiência no mercado. Porque entre inserir a cápsula, premir o botão e esperar alguns segundos que a bebida jorre fumegante para dentro do copo e o preencha, há um trajeto invisível aos nossos olhos. E tudo começa com uma expressão que facilmente associamos ao universo vinícola: terroir.

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COLHEITA

Por partes, ou melhor, pelo início. Existem dois grandes tipos de café em todo o mundo, Arábica e Robusta — a última é a variedade mais amarga e contém o dobro da cafeína, e se a Arábica apresenta grãos mais alongados, os da Robusta mostram-se redondos. A primeira cresce entre 800 e 2000 metros de altitude e a segunda entre os 800 e os 1000 metros. Os números assinalados não são estanque, mas remetem para uma performance mais feliz dos grãos de café.

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No terreno, o café é colhido à mão (picking) ou com recurso a máquinas (striping). No caso da Nespresso, a marca opta pela primeira forma de colheita, uma vez que é possível encontrar cerejas em diferentes fases de maturação num mesmo cafeeiro (arbusto que pertence à família das Rubiáceas e que pode chegar até aos 10 metros de altura, é capaz de viver meio século e demora, em média, cinco anos até à primeira colheita, após a qual tem um tempo de vida útil/de produção compreendido entre os 10 e 15 anos). “Dependendo da zona de produção, há colheitas ao longo de todo o ano. Mas com maior incidência entre setembro e março”, lê-se ainda no site da Associação Industrial e Comercial do Café.

Do total de produção mundial, apenas 10 a 20% é considerado produção gourmet, explica Marta Mimoso. Uma categoria reconhecida mundialmente e que é adquirida por várias empresas ao redor do globo. 

Depois de colhidos, são aplicados um de dois métodos mais habituais: o húmido (despolpagem) e o seco. As diferenças são claras, mas o resultado final é o mesmo. No primeiro, os grãos são mergulhados em água entre 16 e 36 horas, o que leva à separação dos que estão bons dos que não o estão (os defeituosos vão boiar, como os ovos). Ocorre então a fermentação, e a polpa separa-se da semente. No método seco, como o nome deixa antever, as cerejas de café são colocadas ao sol entre três semanas a um mês e vão sendo viradas com recurso a uma espécie de arado para que haja uma secagem homogénea. “O método usado depende do país”, explica Marta Mimoso, Coffee Ambassador da Nespresso Portugal. E dá exemplos: se no Brasil se costuma secar o café ao sol, na Colômbia há o hábito de o lavar.

Do total de produção mundial, apenas 10 a 20% é considerado produção gourmet, assegura Marta Mimoso que noutra vida já foi enóloga. Trata-se de uma categoria reconhecida mundialmente e que é adquirida por várias empresas ao redor do globo. A Nespresso é uma delas: compra café em 12 países, do Nicarágua à Etiópia, e tem cerca de 62 mil agricultores a trabalhar diretamente para si (84% do café, garante a marca, resulta do programa AAA, que ajuda os produtores a ter uma maior consciência ambiental e social). Voltemos aos “10 a 20%”: dessa percentagem, a Nespresso diz utilizar apenas 1%.

AVALIAÇÃO

Antes de o café ser adquirido, ele vai passar por diferentes análises. Uma primeira é puramente visual e tem como objetivo detetar defeitos nos grãos de café, como pedras ou paus, mas também verificar o tamanho das cerejas — “Quanto maior é o grão, mais caro é. Só compramos acima de um determinado tamanho”, explica-nos Marta Mimoso, já no interior da fábrica de Avenches, que alberga cerca de 800 trabalhadores.

Segue-se o cupping, isto é, a análise ao café verde realizada pelos provadores, considerados um dos segredos (agora desvendados) da marca. Falamos de uma equipa de profissionais que diariamente testa diferentes cafés, sejam eles africanos, asiáticos ou sul-americanos. Para o efeito, o café é ligeiramente torrado, até porque é só na torrefação que os aromas varietais são libertados. Contam-se três sessões por dia, cada uma com um mínimo de quatro pessoas, sendo que numa semana são analisadas cerca de 20 chávenas de café.

Sobre uma mesa branca com duas placas giratórias e uma cuspideira, os provadores procuram analisar os diferentes tipos de café depositados em bules de porcelana branca, não identificados. O café varia consoante a sua origem: caso seja proveniente da Etiópia, as notas olfativas florais vão dominar o produto final; caso seja do Brasil, o café será mais cereal. A ideia aqui é encontrar defeitos, bem como o perfil desejado. Para isso os provadores têm em conta o cheiro, a consistência e o paladar. E, à semelhança do vinho, no final de cada prova cospe-se o café.

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Mas como se realiza uma prova? Tudo começa no cheiro, com o provador a debruçar-se sobre cada um dos bules cheios de café que estão diante de si. Depois, enche-os com água a ferver para criar uma infusão de café que não leva mais do que dois minutos a ficar pronta. O interior do bule é agitado com uma colher de prata e, criada a infusão, o provador levanta a tampa e cheira-a (só depois cheira o interior da cafeteira). Com a colher retira um trago e sorve-o — fazer barulho enquanto se sorve é obrigatório e um sinal de que o provador vai sentir o produto ao máximo.

Os provadores têm de criar uma biblioteca de aromas nas suas cabeças. Isto porque o café consegue ter cerca de 900 aromas; ao contrário dos alegados 600 aromas do chocolate e dos 300 do vinho.

FORMAÇÃO DOS PROVADORES

“Não é fácil provar o café, por isso é que o treino é tão importante”, diz-nos uma das guias que acompanha a visita à fábrica num inglês afrancesado. Virigine, com a farda a corresponder ao nome, esclarece-nos que uma pessoa só se torna provador oficial depois de um período de formação durante o qual a performance é constantemente avaliada. Se bem-sucedida, no final recebe uma colher de prata com o seu nome gravado e a oportunidade de dedicar a carreira à bebida.

Há duas formações a ter em conta: uma destina-se ao café verde (cupping) e outra ao produto final. Se a primeira leva 12 a 14 meses de treino, com três sessões por semana, a segunda é mais curta e demora apenas seis meses com uma formação semanal. A última diz respeito ao controlo do produto final, no qual são preparadas seis chávenas de café — a primeira é um produto standard enquanto as restantes cinco vão a testes. Nesta fase são controladas cerca de 300 chávenas por dia.

Mas desengane-se quem pensa que a tarefa pode ser fácil, até porque, no decorrer da visita à fábrica, garantem-nos que o café tem qualquer coisa como 900 aromas, uma quantia bastante elevada se se considerar os alegados 600 aromas do chocolate e os 300 do vinho. “Estas pessoas [os provadores] têm de criar uma biblioteca de aromas nas suas cabeças”, diz-nos outra guia cujo nome não chegamos a perceber.

COMPRA

Cupping feito e café aprovado, é realizada a compra. O produto chega em sacas de 60 quilos a um dos portos da Holanda e segue à boleia de um comboio até à fábrica de Avenches — uma de três da marca. Aí é feita mais uma análise para se perceber se o café adquiriu, ou não, cheiros durante a viagem, não fosse ele um produto bastante permeável — caso as condições de transporte não estejam garantidas, o café vai ser um reflexo exímio disso mesmo. Assim de repente parecem testes a mais, mas o certo é que cada um cumpre a sua função. Ao todo, no caso da marca em questão, contam-se cerca de 50 testes de qualidade, da origem ao resultado em chávena.

TORREFAÇÃO, BLENDS E MOAGEM

Cada Gran Cru (conceito emprestado do vinho e que significa grande colheita) tem a sua própria receita de torrefação. Tudo depende da temperatura e do tempo, que pode variar entre 5 e 15 minutos, a uma temperatura de 200 a 220 graus. “É o binómio tempo e temperatura que originam as receitas, apesar da influência da origem — são estes os ingredientes para cozinhar”, esclarece Marta Mimoso. Há duas formas de torrar os grãos: a torrefação pode ser feita tendo em conta o blend ou por variedades. A Nespresso prefere separar os grãos no momento de os torrar, de modo a conseguir identificar a origem que vai contribuir para o blend final.

“É um desafio conseguir o mesmo aroma e o mesmo sabor a cada torrefação”, acrescenta a guia. Se no início o café verde não tem qualquer aroma e sabor, o mesmo não se pode dizer depois de ser torrado a altas temperaturas. É nesta fase que os próprios cheiros vão evoluindo, além de o grão ficar com o dobro do tamanho. E quanto mais intensa for a torrefação, mais acidez o café vai perder e mais amargor vai ganhar. Uma vez torrado, o produto é selado a baixa temperatura.

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Durante a torrefação, o técnico tira uma amostra, mede a cor e controla os resultados. / DR

A mistura é considerada uma das partes mais importantes do processo, uma vez que tem a responsabilidade de garantir um conjunto harmonioso: “Para ser equilibrada, tem que conter cafés mais doces e outros mais fortes; com aroma de chocolate e frutados; e mais ácidos, sendo que uma destas características tem de prevalecer em superioridade, de modo a dar personalidade à mistura”, lê-se na página da Associação Industrial e Comercial do Café.

Já a moagem é feita em função do produto acabado que é pretendido. Um exemplo? Quanto mais finas forem as partículas de café, mais facilmente este vai ser extraído. Mas assim que o café é torrado e moído, começa de imediato a oxidação. E é aqui que entra a questão das embalagens.

ENCAPSULAMENTO E UM CAFÉ SERVIDO À MESA

Torrado e moído, o café viaja por uns tubos brancos até à unidade fabril, onde, no caso da Nespresso, é inserido em cápsulas de alumínio (material reciclável). O encapsulamento vai proteger o café do oxigénio, o inimigo número um do produto, que é capaz de oxidar os seus componentes. A ideia é não perder aromas.

Em Avenches é possível armazenar 22 mil paletes, sendo que é a partir desta fábrica que se faz a distribuição mundial. Aqui trabalha-se 24 horas por dia, durante três turnos. E, apesar de este centro ter mais do que uma linha de produção, apenas nos foi permitido ver uma.

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Quantos cafés por dia para uma dieta saudável?

Em outubro de 2014, o Observador escrevia sobre os mitos do café com a ajuda de duas nutricionistas — uma associada à marca Nestlé, Ana Leonor Perdigão, e a outra de cunho independente, Lillian Barros. Entre as ideias debatidas estavam, por exemplo, aquela que alegava que o consumo regular da bebida poderia prejudicar a saúde. A isso Ana Leonor Perdigão respondeu que o consumo regular e moderado de café em adultos saudáveis não traz quaisquer malefícios, recomendando uma ingestão máxima de cafeína de 300 mg, o equivalente a três chávenas de café expresso. Lilian Barros, por sua vez, falou no consumo diário de duas a três chávenas de café.

Mas há quem contradiga estes valores e eleve o número de bicas (ou cimbalinos, como lhe quiser chamar) por dia. É o caso de um estudo publicado esta semana no Observador: os membros do grupo The Dietary Guidelines Advisory Committee optaram por se debruçar sobre o potencial da bebida. E o que descobriram? Segundo o estudo publicado na revista Esquire, os cientistas dizem ter encontrado “fortes provas” de que três a cinco cafés por dia (qualquer coisa como 400 mg de cafeína) não fazem mal à saúde. Uma decisão que deixamos ao seu critério.

 

A equipa do Observador viajou até à Suíça a convite da marca Nespresso.

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