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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Do século XVIII ao grande fogo. A pequena biografia da estrada a que chamam "da morte"

A N236-1 tem vários séculos de história, mas o incêndio de Pedrógão Grande, no ano passado, transformou-a na "estrada da morte". Como surgiu e mudou aquele pedaço de terra onde morreram 47 pessoas.

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Já teve muitos nomes: “Estrada Real 69”, “Estrada Districtal 69”, “Estrada Districtal 121” e, finalmente, “EN 236-1”. Mas hoje toda a gente a conhece como “Estrada da Morte”.

Mesmo os que preferiam que não fosse assim. “Já basta o que aconteceu, quanto mais ainda estarem sempre a lembrar, a chamar àquilo estrada da morte. É a estrada 236! É a estrada dois três seis!” A insistência é de Maria Helena Tomás, 56 anos, dona do bar Chicote, mesmo no centro de Castanheira de Pera, que há um ano serviu de enfermaria de crianças durante o incêndio mais mortífero da história recente de Portugal. Mas todos os que ali vivem sentem o mesmo. “Para quê agravar ainda mais? Já não chega o que se passou, que todos vivemos? Porquê estrada da morte?”, pergunta Cecília Tomé, 47 anos, mulher e mãe de dois bombeiros que no ano passado estiveram entre a vida e a morte precisamente naquela estrada, que hoje percorre diariamente.

[Veja no vídeo: Era para ser estrada da esperança. Ou salvação. Mas foi caminho para a morte de 47 pessoas.] 

No ano passado, só naquela estrada, em poucos metros morreram 47 pessoas. Famílias inteiras ficaram ali. Pais e filhos foram encontrados sem vida, abraçados, numa última tentativa de evitar o inevitável. Uns dentro dos carros, carbonizados. Outros fora dos carros, queimados por dentro depois de respirarem demasiado fumo e fogo. Outros ainda atropelados por quem fugia sem conseguir ver o que se passava à sua frente. Naquele dia 17 de junho de 2017, a estrada foi rebatizada: Estrada da morte. Quem passe hoje pela nacional 236-1 sem saber o que lá se passou vê apenas umas centenas de metros cobertas com alcatrão novo, que esconde as marcas da destruição. Mas quem ali vive não esquece o que aconteceu na estrada onde os caminhos de todos se cruzam diariamente. “É uma memória que fica para o resto da vida”, assegura Cecília Tomé.

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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Mas a estrada não tem culpa, diz quem por ali vive. Há quem acuse as autoridades de não terem cortado o acesso a tempo, mas há também quem se conforme e diga que a morte foi resultado do estado de pânico que se instalou naquelas aldeias, para as quais a estrada é a única ligação. Mas antes do incêndio a Estrada Nacional 236-1, histórica ligação entre as vilas de Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera, já levava uma longa história. O seu trajeto foi sofrendo alterações significativas, e o percurso sinuoso pelo meio da serra que demorava 45 minutos a completar deu lugar a uma via moderna que se percorre em 10 minutos. Aquela discreta, mas antiga, ligação rodoviária, que nunca assumiu um papel mais do que secundário na rede nacional, acabaria por ficar na história pela pior das razões. Esta é a biografia da estrada que se transformou num símbolo da tragédia.

Séc. XVIII. A Districtal 69 e a ligação a Castanheira de Pera

A origem da ligação rodoviária entre Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera remonta a vários séculos atrás. Um mapa do Reino de Portugal datado de 1780, disponível na coleção de mapas históricos David Rumsey, já mostrava uma conexão entre as duas vilas, mas sem grande detalhe — apenas uma linha reta e a certeza de que as duas povoações já nessa altura estavam ligadas por estrada.

É preciso avançar um século, até 1884, para encontrar a primeira referência formal àquela estrada. Trata-se de um dossiê, disponível no arquivo histórico do Ministério das Obras Públicas, que se refere aos “Estudos de Reconhecimento entre Castanheira de Pêra e Figueiró dos Vinhos” na Estrada Districtal n.º 69. À época, a estrada — que já estava estudada, identificada e requalificada — ligava a Batalha a Figueiró dos Vinhos, passando por Alvaiázere. O estudo em questão destinava-se precisamente a analisar as condições da extensão até Castanheira de Pera — quase 17 quilómetros adicionais a norte, seguindo os caminhos e estradas antigas já existentes naquele trajeto — de forma a facilitar a vida a quem vivia e trabalhava nas povoações entre as duas vilas.

[Veja na fotogaleria o relatório e a memória descritiva da Estrada Districtal 69]

Na carta que abre a pasta, o engenheiro diretor da Direção das Obras Públicas do distrito de Leiria remete vários documentos à Junta Conselheira responsável por avaliar novas obras de engenharia: a memória descritiva da estrada, um mapa e um parecer positivo ao projeto para requalificar o caminho e de classificar o percurso entre Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera como parte integrante da então chamada Estrada Districtal 69 — que antes tinha sido a Estrada Real 69. O motivo? “O traçado segue, como indica o esboço corográfico, muito aproximadamente a linha reta, o que dá em resultado uma planta em condições muito aceitáveis”, as inclinações são reduzidas e as obras necessárias são apenas um conjunto de aquedutos.

Segundo se lê na memória descritiva anexa à carta, assinada por Barnabé da Costa Roxo, o traçado estudado começa “400 metros ao sul de Castanheira de Pera” — na altura parte integrante do concelho de Pedrógão Grande –, segue pela serra da Castanheira passando por um conjunto de povoações, como o Troviscal, o Carregal Cimeiro ou os Pobrais, e vai terminar em Figueiró dos Vinhos, “no largo da Praça pela junção com a estrada Districtal construída até ali”.

[Veja na fotogaleria os mapas da estrada]

O documento é essencialmente técnico, mas evidencia também uma preocupação com quem ali vivia e trabalhava. “Além das povoações já mencionadas outras há ainda que ficam próximas do traçado e que utilizavam com a construção da estrada, entre elas o Carregal Fundeiro, a Moita, Sarzedas de S. Pedro, Varges [hoje Várzeas] e S.ta Catarina e muito especialmente as importantes fábricas de lanifícios da Ribeira de Pera, que hoje lutam com grandes dificuldades nos transportes das mercadorias até Figueiró onde tomam a estrada que os leva à estação do caminho de ferro em Pombal”, lê-se no documento, onde se argumenta que a região só teria a ganhar com a requalificação do percurso entre Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera e com a sua inclusão na Estrada Districtal 69.

Assim foi. A antiga Estrada Real 69, que passaria depois a Estrada Districtal 69 e que seria renumerada mais tarde para Estrada Districtal 121, passou a incluir também o percurso entre Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera. Durante mais um século, a estrada serviu aquelas populações de forma eficaz. Mas em 100 anos muita coisa muda. Os carros, as necessidades, as perspetivas e, sobretudo, o ritmo de vida da sociedade. Isso nota-se até na forma como olhamos para uma estrada. Em 100 anos, a estrada que em 1884 era entendida como “aproximadamente a linha reta” passou a ser vista como uma “estrada muito sinuosa”, com “curvas muito apertadas” — demasiado perigosa para os carros modernos.

Trajetos antigos da estrada sobrepostos ao mapa atual, retirado do Google Maps

Quem o diz é Filipe Lopo, funcionário da Câmara Municipal de Castanheira de Pera e autoridade incontestável no que toca aos arquivos históricos da região — a própria autarquia sugere que se fale com ele para esclarecer qualquer dúvida sobre dados históricos do concelho. Filipe lembra-se bem da estrada dos anos 80. “Fazer o trajeto entre Castanheira e Figueiró dos Vinhos demorava entre 40 e 45 minutos”, recorda, acrescentando logo que “também é verdade que os carros não eram iguais”. “De qualquer forma, era uma estrada bastante mais perigosa”, que “atravessava algumas aldeias”.

1994. Uma remodelação “do dia para a noite”

A necessidade de modernizar a ligação rodoviária entre as duas vilas levou a que os presidentes das câmaras da região — Castanheira de Pera, no qual está a maioria da estrada, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande — unissem esforços para remodelar a estrada. “Aquilo já era uma ambição antiga dos presidentes das câmaras daqui da comarca. Havia uma ambição de que aquilo fosse arranjo. Mas creio que não seria para fazer a remodelação que foi feita”, lembra Filipe Lopo. Em 1994, o projeto avançou e a estrada foi modernizada — e um novo acesso a Castanheira de Pera, mais direto, foi construído, acabando com a necessidade de chegar à vila através da serra.

"[A remodelação da estrada] mudou completamente a vida das pessoas. Hoje, vamos a Figueiró e dizemos 'estou aí daqui a 10 minutos'. Coisa que não diríamos naquela altura porque a estrada não permitiria que isso acontecesse"
Filipe Lopo, funcionário da Câmara Municipal de Castanheira de Pera

“Foi uma remodelação, como se diz na gíria, do dia para a noite”, assegura o funcionário da autarquia. “Mudou completamente a vida das pessoas. Hoje, vamos a Figueiró e dizemos ‘estou aí daqui a 10 minutos’. Coisa que não diríamos naquela altura porque a estrada não permitiria que isso acontecesse”.

O percurso que antes de 1994 se fazia em 45 minutos passou a fazer-se em menos de um quarto de hora. Sobretudo porque a estrada foi modernizada, mas também porque a ligação foi encurtada. Com a construção da alternativa de aproximação a Castanheira de Pera, que permitiu evitar a subida da serra, a estrada passou a ter cerca de 14 quilómetros em vez de 17. Tinha de se fazer “uma curva enorme” para chegar à vila, lembra Filipe Lopo. “Quando aquilo vai a direito é completamente diferente.”

A câmara de Figueiró dos Vinhos aproveitou a obra de retificação da estrada para Castanheira de Pera em 1994 para remodelar os acessos à vila (Boletim Municipal de Figueiró dos Vinhos, janeiro 1995)

José Roberto Alves, 54 anos, também se lembra bem da estrada “acidentada” que ligava as duas vilas antes de 1994. “Era uma estrada muito mais estreita e passava lá por cima, pela serra”, recorda. “Aqui não havia nada disto, tinha de se ir lá por cima”, diz José Roberto, apontando para o topo da serra às portas de Castanheira de Pera. O troço de aproximação à vila é o tal novo, construído no mesmo ano da remodelação — foi nesse pedaço que as 47 pessoas viriam a morrer no incêndio de 2017.

Filipe Lopo, funcionário da câmara de Castanheira de Pera, recorda-se da nacional 236-1 antes da remodelação (JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR)

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Há 24 anos, José Roberto, que trabalhava numa empresa de construção civil, andou nas obras de remodelação. Mais propriamente na equipa que construiu as valetas, as cristas, as banquetas, as bordaduras, as caixas, os aquedutos. Enfim, todos os acessórios que tornam uma estrada transitável além do alcatrão. “Eles iam abrindo a estrada e nós íamos atrás a fazer isso”, lembra José Roberto, acedendo a explicar o que significa tudo aquilo. “Se você tiver um talude mais alto na estrada, tem de ter meias canas em cima para apanhar as águas, para não virem cá para baixo”, explica, enquanto aponta para as calhas que ladeiam a estrada. “Tanto que andaram agora a substituir as meias-canas, que partiram com o calor no incêndio.”

À medida que se percorre a nacional 236-1 na companhia de José Roberto, vai-se tendo uma noção da complexa rede de estradas secundárias que antecederam a via moderna. “Isto praticamente é um labirinto”, comenta, enquanto vai apontando para alguns acessos às povoações por onde a estrada já passou: “Aquilo ali é um bocado da estrada antiga”. Das obras, já pouco recorda. “Éramos uns quatro ou cinco” e “desde que viesse massa, era sempre a andar”, explica. Mas uma coisa é certa: “Antes, dava-se uma volta muito maior, agora é muito mais rápido. Facilitou a vida às pessoas”. Mesmo que a estrada moderna tenha trazido um problema: “As pessoas agora abusam, andam muito rápido aqui”.

2017. “O alcatrão estava a mover-se, os rails estavam incandescentes”

Mais de 20 anos depois, a estrada que tanto tinha facilitado a vida a quem ali vivia acabou por se tornar no palco da maior tragédia na história da região. O incêndio começou a meio da tarde de sábado, 17 de junho de 2017. Pelas 20h desse dia, já a história daquela estrada tinha mudado para sempre — só ainda não se sabia bem a dimensão do que ali tinha acontecido. A nacional 236-1 é a única forma de sair de inúmeras aldeias e povoações entre Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera. Nodeirinho, Pobrais, Vila Facaia, Moita, Sarzedas de São Pedro, Várzeas e tantas outras povoações que até há um ano eram praticamente desconhecidas da maioria do país e que hoje todos reconhecem.

José Roberto, que 24 anos antes tinha trabalhado nas obras que fizeram da nacional 236-1 a estrada que é hoje, estava na churrasqueira “Albino”, em Castanheira de Pera, quando começou a ver o incêndio ao fundo, vindo da zona da Pedrógão Grande. “Só tive tempo de telefonar para a minha mulher, perguntar onde é que ela estava, dizer para trazer a mãe e a minha cunhada, ver se trazia o meu sogro para baixo, para a minha casa. O meu sogro não queria vir e fui lá buscá-lo. Ainda não tínhamos chegado a minha casa e já aquilo tinha ardido tudo. Foi galinhas, coelhos, foi tudo. A casa também foi apanhada, mas não muito.”

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Quando soube do que tinha acontecido na estrada que duas décadas e meia antes ajudou a construir, diz que não pensou na estrada. “Uma pessoa nessa altura não pensa nisso, pensa é no pessoal que estava aí. Estava aí um rapaz que eu conhecia bem, que ficou aí morto numa valeta” — precisamente numa das muitas que José Roberto construíra em 1994.

Habitantes de todas aquelas aldeias tentaram fugir quando se aperceberam de que o incêndio estava a chegar perto. “Aquela era a estrada que nos ligava ao IC8 e à possível salvação, mas foi o contrário”, lembra Filipe Lopo. Hoje, muito se comenta naquela região que, se não tivessem fugido de casa, as pessoas que morreram na estrada teriam sobrevivido. De facto, a maioria das casas dos que ali morreram ficaram intactas — em algumas aldeias, o fogo não chegou a entrar. Mas, para o funcionário da câmara de Castanheira de Pera, a discussão nem se põe. “As pessoas tentaram fugir para a via mais rápida. É compreensível. Nós não podemos, nem eu nem ninguém, culpar as pessoas por terem fugido para ali. Quando se entra em pânico, e só quem passa por isso é que pode saber, nunca se sabe qual é a atitude que vamos tomar.”

Maria Helena Tomás transformou o seu bar numa enfermaria para bebés durante os incêndios de junho de 2017 (JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR)

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Em Castanheira de Pera, na casa de Cecília Tomé, nada podia preparar aquela família para o que aconteceria naquele dia. Mulher e mãe de bombeiros — “e tenho mais um filho que acabou de fazer agora a escola, mais um bombeiro em casa”, acrescenta –, Cecília lembra bem o dia 17 de junho do ano passado. Marido e filho tinham sido chamados para um outro incêndio, longe dali, e haviam sido desmobilizados para vir ajudar no fogo que se aproximava da sua terra. Quando vinham do lado de Figueiró dos Vinhos, pela nacional 236-1, com o autotanque, sofreram um acidente. Um carro fugia descontrolado das chamas em direção ao IC8, para o lado de Figueiró, e acabou por se enfiar debaixo do camião dos bombeiros.

Os bombeiros saíram do camião para tentar ajudar os ocupantes daquele carro, mas sem sucesso — os cinco acabariam por morrer, aumentando a conta das vítimas da estrada. Os bombeiros acabaram por ficar queimados. “Não com a chama, só com o calor, tal era a a temperatura ambiente. O alcatrão estava a mover-se, os rails estavam incandescentes”, conta Cecília, que nesse dia temeu pela vida da sua família. O seu marido, Fernando Tomé, esteve dois meses e meio em coma. O filho, também chamado Fernando Tomé, ficou um mês e meio. Dois dias depois, Gonçalo Correia, um dos bombeiros que seguiam no carro com os dois, viria a morrer. O funeral contou com a presença de Marcelo Rebelo de Sousa, Ferro Rodrigues e António Costa.

O adeus a Gonçalo: o bombeiro que era sempre “prá frente!”

Por isso, passar naquela estrada hoje é “uma mistura de emoções” para Cecília: “Não há vez nenhuma que nós não passemos lá e não nos lembremos do que se passou. Isso fica para o resto da vida. Além das marcas que estão visíveis na estrada — o alcatrão foi coberto nas zonas onde estiveram os carros a arder — é uma memória que fica para o resto da vida”.

2018. Estrada da esperança

Um sentimento é partilhado por todos ali: ficou mais difícil passar na nacional 236-1. Há duas semanas, Maria Helena Tomás, a orgulhosa proprietária da “casa comercial mais antiga da cá da vila”, teve de ir ao dentista a Figueiró dos Vinhos com o filho. Durante todo o caminho, para lá e para cá, foi a chorar. “Não disse nada ao meu filho, mas elas caíam”, diz, apontando para os olhos. “Embora já não se note. Havia pessoas que diziam que na altura se notava o alcatrão, que não foi arranjado. Agora já não achei que se notasse. Mas lembra… Tantos amigos que lá ficaram.”

A vila é pequena e ali não há ninguém que não tenha perdido alguém. Gonçalo, o bombeiro que morreu na nacional 236-1, tinha estado no bar de Maria Helena “até às duas e tal da manhã” na noite anterior. “E uma senhora que me deu aulas… Só dessa família morreram oito pessoas. Morreu ela, morreu um filho que era engenheiro aqui na câmara, morreu o filhito dele. Passe um ano, passem dois, passem três, isto não passa”, conta Maria Helena, lembrando que é prima do bombeiro Fernando Tomé, que “esteve mais para o lado de lá do que para o lado de cá”.

Maria Helena sai pouco de Castanheira de Pera — “estou aqui, de manhã à noite, no café” –, mas sempre que o tem de fazer é inevitável passar pela nacional 236-1. Mas há quem não consiga evitar passar lá quase todos os dias. Filipe assume que conduz “muito depressa”, mas quando passa naquele pedaço de estrada, cinco quilómetros depois de sair de Castanheira de Pera, abranda e pensa em quem ali morreu. “Houve uma altura em que eu passava e via aqueles bocados de alcatrão meio destruídos e aí sim, vinham-me sempre as lágrimas aos olhos. Entretanto, fizeram aquela recuperação, aquele alcatroamento da estrada. Aquilo lembra-nos sempre que alguma coisa aconteceu.”

Depois do incêndio, a estrada foi gradualmente recuperada. Os sinais de trânsito, todos destruídos, foram substituídos por novas placas, cujo brilho de metal novo contrasta com o negro da floresta queimada. O piso, naquelas poucas centenas de metros onde se deu a tragédia, foi substituído por um tapete de alcatrão novo. A estrada parece outra. Mas é a mesma onde morreram 47 pessoas — e quem ali vive não o esquece. O termo “estrada da morte”, que a comunicação social imortalizou, é que preferiam que fosse esquecido. E há até quem sugira alternativas para o futuro, como Filipe Lopo: “A estrada devia ser apelidada de estrada da esperança, porque nos leva das aldeias para os outros lados, e traz quem nos visita dos outros lados para as aldeias. Ou estrada da vida. Passa ali tanta gente com vida”.

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