No final da Vichyssoise, o programa de política da Rádio Observador (que pode subscrever aqui, aqui ou aqui), a sobremesa fica sempre a cargo do convidado, que escolhe a música com que fechamos o programa. E esta semana Elisa Ferreira escolheu a Valsinha, de Chico Buarque, por ser de renascimento, por ser “de ir para a praça e dançar”. A Comissária portuguesa quis, assim, passar uma mensagem de “força e esperança”, já que a conversa foi sobre os tempos difíceis que aí vêm e sobre como a Europa está e ao mesmo não está a dar a resposta que é preciso.
“É claro que é preciso mais”, diz, sobretudo ao nível dos governos que têm “de dar o salto”. Elisa Ferreira sabe de cor todos os instrumentos postos ao serviço dos cidadãos, e fala com entusiasmo do anúncio feito por Von der Leyen para o combate ao desemprego, mas admite que com orçamentos curtos para o projeto europeu “não há milagres”. Para já, a preocupação parece ser a de que o projeto europeu não deslace – e nisso mostra-se otimista -, mas admite que “se for cada um por si”, esse risco existe.
Quanto à polémica norte/sul, não quer comentar nem as frases de Costa nem as do ministro holandês, mas reconhece “que há limites para aquilo que se pode dizer”. E se percebe a reação do primeiro-ministro português, e reconhece a importância das eurobonds, também admite que a questão da dívida abriu “muitas feridas que ainda não foram curadas”. A aposta é na coesão, “mais importante que alguma vez foi”, diz Elisa Ferreira. Ou não fosse essa, precisamente, a sua pasta.
Sendo uma uma mulher dos números, começamos por aí: de zero a dez quão preocupada está que o projeto europeu não resista à crise do coronavírus?
Eu não acredito que o projeto europeu vá falhar por causa do coronavírus, não acredito de todo. Se o zero era nenhum risco e o dez uma grande valorização do risco, escolho zero. Mas estou preocupada, claro. Não podemos desguarnecer a necessidade de dar respostas aos cidadãos, mas prefiro pensar na base daquilo que tem sido a história da Europa, que é a ideia de que quando há uma crise nós somos capazes de a superar. E temos vindo a superar reforçando o projeto europeu, e não o contrário. Os cidadãos olham para a Europa à espera exatamente que isto aconteça. São exigentes, é bom que o sejam, é bom também que percebam o que é a Europa e os saltos que temos de dar para termos uma orientação para esta nova fase.
E que tipo de orientação tem de ser essa?
A orientação passa necessariamente por mais coordenação. A todos os níveis, desde as infeções até à necessidade de permitir que os produtos agrícolas continuem a circular até à necessidade de organizarmos voos comuns para o repatriamento dos cidadãos que ficam retidos aqui ou além. Cada país sozinho não pode fazer nada. Os países fecharam instintivamente as fronteiras num primeiro momento, instintivamente cada um olhou por si, mas depois percebemos que se não tivéssemos aqui uma política minimamente coordenada ninguém ia resistir. Portanto, rapidamente a Comissão Europeia começou a funcionar, a coordenar os países, a fazer reuniões com os ministros de Saúde, neste momento é notícia o facto de haver cidadãos europeus do norte de Itália a ser tratados na Alemanha, franceses a ser tratados no Luxemburgo e as fronteiras funcionam para a circulação de produtos, funcionam para medicamente, há uma compra conjunta a nível europeu de ventiladores e máscaras, os países põem em conjunto aquilo que precisam e o que podem trazer ao pote comum. Portanto, decididamente só em conjunto é que vamos ser capazes de gerir isto.
É possível essa coordenação quando há tantas diferenças de opiniões entre estados-membros em diferentes matérias?
Em conjunto significa estarmos coordenados, não significa estarmos totalmente ingénuos e abertos a tudo o que surge, mas temos de ter uma coordenação…
António Costa disse recentemente que a União Europeia “ou faz o que tem a fazer ou acabará”. Acha que Bruxelas está a fazer o que tem de ser feito ou podia estar a fazer mais para conseguir essa tal coordenação?
O que é Bruxelas? O BCE agiu e, com a sua independência, deu a chamada bazuca à economia em cima de outras bazucas que já foi utilizando. A seguir, foi a vez da Comissão. Mas a Comissão tem um orçamento — que é a discussão eterna — de 1%, e depois andamos a discutir meses a fio com os governos dos estados-membros se de facto a Comissão deve ter um orçamento de 1,07%, 1,3% como pede o Parlamento Europeu, ou 1,11%. Estamos a dizer o quê com isto? Os cidadãos olham para a Europa como se fosse um estado federal. Perante um problema, olham e dizem que, agora, o poder central tem de dar respostas. Mas não somos um estado federal, e ao mesmo tempo que os cidadãos pensam isso, os estados-membros, que são quem paga as quotas do clube, dizem: “Bem, mas nós não passamos de 1%”. Isto é, cada um só dá ao projeto 1% da riqueza que tem. E quando falamos de estados federais falamos de 30%, 20 e tal por cento. O que seria a Espanha se o nível do poder central não tivesse capacidade de intervenção?
Para que não fiquem dúvidas, acha claramente insuficiente o Orçamento da Comissão Europeia?
Acho. Para o nível de integração que nós temos e para o número de países que fomos incorporando, para as nossas responsabilidades em relação ao resto do mundo, para as nossas intenções de termos uma cooperação reforçada ou até uma futura integração com os países nossos vizinhos, claramente o orçamento de 1% é insuficiente. Quando a Comissão propõe 1,11%, já é o mínimo dos mínimos. O Parlamento Europeu pede 1,3%, mas nós precisamos de mais. Ou então, os cidadãos não podem esperar que a Comissão faça milagres com um orçamento deste tamanho.
Dentro do que a Comissão pode fazer, está a fazer o possível?
Dentro daquilo que eram as margens de flexibilidade que nós poderíamos utilizar, nós estamos a utilizá-las ao limite. Um grande ator neste processo é a política de coesão. Tivemos dois momentos sucessivos: a política de coesão é aquela que financia a convergência entre países e a convergência entre as regiões dentro do mesmo país, porque estamos sujeitos a uma concorrência reforçada e isso gera desequilíbrios. Para isso há esta política que vale mais ou menos um terço do tal 1%, ou seja, vale 0,333% de um orçamento que é mínimo. Mas esta política, neste momento, está com toda a flexibilidade possível para que os estados-membros possam atacar os problemas prementes que estão a enfrentar.
Em que é que essa flexibilidade se traduz, na prática?
No dia 13 de março fizemos uma proposta de flexibilização: podem-se agora fasear obras públicas que estavam em curso, pode-se suspender alguns projetos que possam ser suspensos… A questão é que estamos no último ano dos sete anos em que se divide a programação dos orçamentos, ou seja, neste momento estamos só com o dinheiro que sobra e estávamos antes disto tudo a discutir intensamente o que iria ser o novo período de programação. Perante isto, o que fizemos foi dizer aos estados-membros ‘vocês têm flexibilidade’. E neste momento está proposta uma flexibilidade praticamente total, para que o dinheiro que existe seja canalizado para as despesas de saúde — financiar máscaras, ventiladores, instalações provisórias que são criadas para apoiar doentes infetados, horas extraordinárias aos profissionais de saúde, apoios aos lares — e ao mesmo tempo para dar todo o apoio às pequenas e médias empresas que ficam prejudicadas com esta emergência.
Os estados-membros podem apoiar as suas pequenas empresas com dinheiros europeus, é isso?
Os estados-membros quando criam estes sistemas de apoio à economia podem refinanciar-se usando os fundos estruturais tradicionais. E também o apoio aos salários a tempo parcial, para tentar evitar que haja uma hecatombe ao nível do emprego porque muitas empresas tiveram de fechar. Acabou de ser anunciada uma resposta de outro nível, pouco usual: o chamado SURE, um sistema para apoio ao emprego, aos salários de emprego temporário, que é um dos sistemas que na crise anterior funcionou bem, e em países como a Alemanha. As pessoas não podem trabalhar mas mantêm o contrato, mantêm o vínculo e a União Europeia ajuda os países a pagarem esses salários. Estas são as três dimensões: economia, saúde e emprego, para as quais os países podem reprogramar os fundos e inclusive obter o financiamento da UE a 100%. O que é que isto quer dizer? Que da totalidade das despesas que têm, podem ir lá buscar 100%. É evidente que o envelope que têm é o envelope que têm: não se pode gerar mais dinheiro.
Mas quando Úrsula Von der Leyen tem de pedir desculpa a Itália, fá-lo em nome do Conselho e não da Comissão? Ou seja, só os estados-membros é que erraram, não houve um erro de falta de solidariedade por parte da Comissão Europeia durante este período?
Penso que não houve. Mas, de facto, estamos todos numa situação de emergência. A Comissão Europeia agiu logo no imediato, no dia 13 de março, e o Parlamento Europeu reuniu logo de imediato, pela primeira vez por via digital, para poder aprovar estas mudanças. O Conselho também foi super rápido. Portanto, para estas medidas de emergência fizemos o que podíamos, não podíamos fazer mais nada.
Foi essa a perceção dos cidadãos?
Libertámos as ajudas de Estado e começámos a fazer as coordenações com os ministros da Saúde, e da Administração Interna para evitar este fechamento. Houve também uma movimentação por parte do colega que trata da Indústria para consultar todas as empresas europeias e tentar que se fizesse um sistema de compras comuns e que as fábricas europeias pudessem reorganizar-se. Houve contactos com os centros de investigação para que a investigação sobre vacinas e mecanismos de controle da doença fosse coordenada, e não descontrolada. Portanto, dentro da margem que a Comissão tem, acho que se fez imediatamente o que era possível fazer dentro do clima de emergência.
E não é preciso mais?
Mas não se ficou por aí, porque neste momento já houve uma segunda leva depois de ouvir os estados-membros, os parlamentares, depois de se ter ouvido sugestões, e alargou-se ao máximo as flexibilidades entre regiões, entre programas operacionais e estipulou-se financiamentos até 100%. Ou seja, de repente pusemos tudo em jogo. Ou melhor, abrimos o jogo de maneira a que tudo pudesse ser feito.
A Europa não precisa de mais?
Claro que a Europa precisa de mais. Mas é sobretudo ao nível dos governos que é preciso dar o salto. A Comissão não está ausente, aliás, a proposta que fez agora relativamente ao apoio ao trabalho temporário já vai obrigar a um endividamento coletivo com base no orçamento da União Europeu, logo, já vai haver uma emissão de dívida. Mas é evidente que o orçamento, com estes limites que tem, pode dar apenas um pouco de robustez à emissão, mas os estados-membros ainda têm de dizer se concordam em dar algumas garantias que permitam à União aparecer no mercado com um endividamento para efetivamente fazer o apoio a esta sustentação dos postos de trabalho.
Houve alguns países que sentiram o ‘cada um por si’ e outros que sentiram que a Europa lhes estava a voltar as costas. A culpa aí foi de alguns governos nacionais que não souberam reagir a tempo e de forma coordenada?
Sim, não é possível entrar numa nova fase de eurobonds ou coronabonds assim de repente. Esse é um assunto que já vem sendo discutido há alguns anos, e de facto a União Europeia tem de aparecer no mercado internacional como a grande potência que é e ancorando todas as capacidades na sua moeda. Agora surgiu a crise e este assunto tornou-se mais premente, mas há perceções muito diferentes sobre este assunto que são muito nacionais. A Comissão Europeia está ativa, está a fazer propostas, fez agora esta proposta do SURE, que é algo extraordinariamente positivo embora não resolva todos os problemas, precisamente para evitar que ‘quem pode muito faz muito, quem pode pouco faz pouco’.
Ainda esta sexta-feira ouvíamos António Costa dizer numa entrevista que não temos de nos agarrar ao fetiche mágico dos coronabonds. A Elisa Ferreira considera esta a solução ideal para que a Europa consiga ultrapassar esta fase?
Quando estamos a falar de bonds, coronabonds e de dívida, misturam-se muitos conceitos. E estes detalhes são importantes. Quando dizemos que vamos pegar na dívida que os países têm e pô-la em conjunto, estamos a misturar um assunto do passado, o que levanta muitos problemas sobretudo aos países nórdicos. Lembram-se com certeza das discussões e das propostas de think tanks como o Bruegel, com as blue bonds e red bonds.
Mas não é disso também que se faz a solideriedade na Europa?
É um assunto que está na agenda.
Portanto, não está descartado.
Nada está fora da mesa, está tudo em cima da mesa. Neste momento está em curso a discussão que estão a ver entre os estados membros. A Comissão está a observar, está a acompanhar e a fazer propostas. A estratégia que a Comissão seguiu foi de localizar um problema virado para o futuro e não para o passado. É isto exatamente este programa SURE. Ou seja, com base no orçamento europeu, pedindo a solidariedades dos estados-membros, através de garantias, lançar já algo virado para o futuro.
Mas ao avançar com outros instrumentos não está ao mesmo tempo a ignorar aquilo que está a ser o debate entre os estados-membros?
Penso que não. Enquanto os estados-membros não conseguirem encontrar um espaço minimamente comum para pensarem o futuro, não a vale a pena a Comissão Europeia estar a fazer propostas e a entrar numa discussão a favor do lado A ou do lado B. Vamos resolvendo os problemas que temos para resolver.
Quais são os mais urgentes?
Neste momento temos um, que é o desemprego maciço. Vamos atacá-lo. Temos outro: como é que vamos pagar as despesas de saúde? Vamos tentar resolvê-lo. A questão da dívida ou a questão das bonds é um tema mais mediático, mas não dá respostas já.
A questão da rapidez foi, aliás, levantada aqui em Portugal pelo Presidente da República que dizia que a Europa não pode demorar a dar respostas aos países num momento em que há uma crise sanitária, haverá uma crise económica. A Comissão Europeia não tem também de apresentar soluções a curto prazo?
A Comissão já está a fazê-lo. Mas vamos fazer uma coisa que acho muito importante para o debate nacional: vamos distinguir o que temos de fazer já. E isso significa agora, sobretudo para as pessoas que tinham negócios, pequenas empresas ligadas ao turismo, empresas agrícolas que não conseguem exportar, pescadores que não têm a quem vender o peixe porque os restaurantes estão fechados, pequenas empresas que estão a despedir os trabalhadores porque não têm maneira de os aguentar. Para isso há que coordenar as estratégias nacionais, impedir que sejam autofágicas e isso está a ser feito. Estamos a utilizar as margens que temos até ao limite e é isso que está a dar as respostas. Lançámos um produto novo, o endividamento partilhado e coletivo para atacar o problema do desemprego.
E portanto, as questões da dívida que têm ocupado o espaço mediático não são para já?
Essa discussão está a ser feita, é latente, mas não podemos ficar bloqueados no curto prazo a discutir um assunto que já foi discutido no passado. Continua a ser importante e relevante, mas tem de ser amadurecido.
Acha que António Costa teve razão quando considerou repugnantes as palavras do ministro das Finanças da Holanda, no final daquele famoso Conselho Europeu?
Nas minhas funções atuais, enquanto membro de um colégio que é a Comissão, não vou pronunciar-me sobre isso.
Mas percebe que ele o tenha feito?
Percebo perfeitamente. Já tive funções anteriores em que me pronunciei sobre questões dessa natureza. Mas neste momento, enquanto membro de um colégio, não posso estar a pronunciar-me e a dizer que o Governo A fez bem e o Governo B fez mal. Aquilo que o primeiro-ministro português, o italiano, o francês, o espanhol têm vindo a dizer é muitíssimo importante. Mas não posso ignorar o que têm dito, entretanto, os primeiro-ministros dos países nórdicos. Acho que há limites para aquilo que se pode dizer, também tenho de reconhecer isso. No passado foram abertas muitas feridas que ainda não foram curadas. Neste momento, o papel da Comissão tem de ser o de encontrar, dentro das divergências, um espaço que permita à União Europeia progredir. É nesse espaço que estamos a trabalhar, com cuidado, com cautela, evitando palavras que às vezes não refletem o conceito. O que interessa é que sejamos capazes de fazer um relançamento articulado, que não seja cada um com os seus meios.
Até porque os meios são muito diferentes.
São muito diferentes. Temos de nos relançar todos juntos, valorizar o mercado interno e ter a preocupação de que todos ganhem nesta estratégia. Caso contrário, se for cada um por si, fechando as fronteiras, apoiando as suas próprias empresas, impedindo as importações e as exportações, entraremos numa fase de rotura e, aí sim, o projeto europeu fica em risco.
Portanto, estamos numa fase de escolhas decisivas
Nas ações de emergência, para agora, estamos a fazer o que podemos com os meios que temos e isso está a ser sentido pelos estados-membros e começa a ser sentido pela população. Mas depois há um segundo ponto que nos obriga a tirar as lições, saber que temos de ter um orçamento mais forte, mais capaz de dar respostas.
E essas lições são para ser aprendidas por quem?
Os primeiros-ministros respondem à percepção dos seus próprios cidadãos sobre qual é a situação da Europa. Os cidadãos dão a sua opinião, são ativos. Se querem mais Europa, têm de dizer que querem mais Europa, têm de combater aqueles que dizem “vamos fechar e é cada um por si”. Esta lição foi absolutamente magistral. Dentro da Europa, estamos já tão ligados uns aos outros que, cada um por si, matamos a Europa. É o momento dos cidadãos dizerem “queremos mais Europa” e para isso queremos que os nossos primeiros-ministros, os nossos ministros das Finanças, percebam o que os cidadãos querem.
Vamos terminar a entrevista com uma série de perguntas de resposta rápida. A quem teria mais gosto em oferecer um prato de tripas à moda do Porto? Ao atual ministro das Finanças da Holanda, Wopke Hoekstra, ou ao ex-ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis?
Preferia comê-las eu, porque gosto muito desse prato.
E acha que algum deles iria saber apreciá-lo?
Acho que é um prato muito mediterrânico. Às tantas, o ministro grego era capaz de o apreciar mais que o ministro nórdico.
Qual é o momento da sua carreira política de que mais se orgulha? Ser a primeira mulher Comissária numa Comissão Europeia também dirigida por uma mulher, ou ter sido ministra nos governos do atual secretário-geral das Nações Unidas?
Orgulho-me mais daquilo que consegui fazer, com todo o apoio e sempre dentro de equipas, para resolver problemas concretos dos cidadãos. Quando o consegui fazer, acho que valeu a pena o meu empenho. Fazer parte dessas equipas foi um orgulho. Enquanto mulher sinto uma responsabilidade maior e espero trazer um pouco mais de proximidade, de humanidade, pelo meu lado feminino, a negócios que às vezes são só números. A vida não são números, a vida são pessoas.
E qual é o momento de que menos se orgulha? De ter tido José Sócrates como secretário de Estado, ou de ter perdido a Câmara do Porto para Rui Rio?
Tenho de lhe dizer que quando trabalhei com José Sócrates fizemos uma equipa tecnicamente interessante. Às vezes as pessoas não se lembram, mas introduzimos a separação de resíduos, a reciclagem, abrimos a água de qualidade para uma série de zonas do país que não a tinham. Estou apenas a citar dois ou três exemplos daquilo que se fez. Portanto, como equipa técnica funcionámos bastante bem.
E a Câmara do Porto?
Fiquei triste. Foi uma grande derrota para mim porque tinha esperança em servir a minha cidade. Já passou. Aprende-se sempre com aquilo que não nos mata. E outras portas se abriram quando uma porta se fechou. Eu gosto muito de fazer serviço público e de trabalhar a bem dos cidadãos, continuo a fazê-lo. E portanto, agradeço ao meu país e a quem confiou em mim.
Mas se o tempo voltasse atrás, preferia substituir Rui Moreira na Câmara do Porto, ou voltar a ser eurodeputada?Prefiro trabalhar em sítios onde possa ser útil. A Câmara do Porto foi um período que já passou, estou a fazer outras coisas e prefiro, antes de mais nada, fazer bem o que estou a fazer. Conseguir, sobretudo, fazer com que saiamos desta crise.
O que já é uma tarefa ambiciosa.
Porque temos um problema simétrico, a nível europeu, mas com uma capacidade de relançamento muito assimétrica. Isto torna a política de coesão mais importante do que alguma vez foi. Não podemos sair daqui muito mais desequilibrados e esse é o risco que estamos a correr. Ninguém pode ficar para trás. É muito importante que se renove esta ideia de que num mercado aberto e concorrencial, nem todos têm os mesmos meios, nem todos têm as mesmas capacidades. Vamos apoiar aqueles que se podem ajudar menos a si próprios, para que também eles possam participar num relançamento, que leve todos, em conjunto, para uma nova fase ambientalmente sustentável (espero eu), mais digital, necessariamente. Temos de seguir para esta nova fase com coesão, solidariedade e não deixando ninguém para trás.