878kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

PORTUGAL-HEALTH-VIRUS-HOSPITAL
i

Proximidade temporal com a toma da primeira dose é o único aspeto que suporta hipótese de reação adversa fatal no caso da criança que morreu no Santa Maria

AFP via Getty Images

Proximidade temporal com a toma da primeira dose é o único aspeto que suporta hipótese de reação adversa fatal no caso da criança que morreu no Santa Maria

AFP via Getty Images

Especialistas têm sérias dúvidas de que morte de criança no Santa Maria tenha sido causada pela vacina. Engasgamento é uma das hipóteses

Médicos não acreditam que paragem cardiorrespiratória da criança no Santa Maria tenha sido causada pela vacina e sugerem tese de engasgamento. DGS e Governo esperam por investigação do Infarmed.

A informação de que a criança de seis anos que morreu no domingo no Hospital de Santa Maria tinha sido vacinada com uma dose é importante para que nada fique por averiguar, mas várias fontes médicas ouvidas pelo Observador consideram “estranho” que a paragem cardiorrespiratória tenha sido originada por uma reação adversa grave à vacina contra a Covid-19. Há situações, esclarecem, que podem explicar melhor esses quadros clínicos, a começar pelo engasgamento ou a obstrução das vias respiratórias por um objeto. A hipótese de um efeito secundário fatal à vacina pediátrica da Pfizer/BioNTech é possível, mas improvável.

O menor começou a registar febres altas (na ordem dos 38ºC) no sábado, 15 de janeiro, dia em que testou positivo para a deteção do coronavírus. Nesse mesmo dia entrou em paragem cardiorrespiratória no Santa Maria, foi reanimado na urgência e depois reencaminhado para o serviço de cuidados intensivos pediátricos dedicado à Covid-19 — em que entram todas as pessoas positivas, mesmo que a doença que obrigue ao internamento não seja a infeção por SARS-CoV-2.

Um cardiologista contactado pelo Observador disse mesmo que considera “estranho” que a vacina esteja na origem da paragem cardiorrespiratória: “Não é comum este tipo de efeitos colaterais com as vacinas”, disse o clínico, “e há outras circunstâncias que podem explicar melhor uma paragem cardiorrespiratória, como a presença de um corpo estranho que tapou as vias respiratórias”.

Mas a reanimação não bastava para salvar a vida do menino. Durante uma paragem cardiorrespiratória, o coração simplesmente para de funcionar e compromete também o funcionamento dos pulmões. A corrente sanguínea prossegue por alguns instantes, mas sem que o dióxido de carbono seja desperdiçado e substituído pelo oxigénio, e a seguir estagna porque o coração já não o está a bombear. Foi o que aconteceu a esta criança: mesmo após a reanimação, a criança entrou em morte cerebral por causa dos danos irreversíveis que a paragem cardiorrespiratória causou no cérebro. Morreu este domingo à tarde.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Não é conhecida ainda qualquer causa da morte

A causa da morte, uma semana depois de ter sido vacinado com a primeira dose contra a Covid-19, não foi atribuída nem à vacinação, nem à infeção pelo SARS-CoV-2. Nem a nada, por enquanto. Um cardiologista contactado pelo Observador — e que preferiu não ser identificado — disse mesmo considerar “estranho” que a vacina esteja na origem da paragem cardiorrespiratória: “Não é comum este tipo de efeitos colaterais com as vacinas”, disse o clínico, adiantando: “Há outras circunstâncias que podem explicar melhor uma paragem cardiorrespiratória, como a presença de um corpo estranho que tapou as vias respiratórias”.

Esta ideia foi levantada também por algumas fontes ao jornal Expresso, que noticia que uma análise preliminar à criança mostram sinais de a mesma se ter engasgado, provavelmente com comida, quando foi entubada nas manobras de reanimação. O Hospital de Santa Maria não quer comentar esta hipótese e apelou ao respeito pela vida privada e pela perda da família enlutada.

Outro imunologista também afirmou ao Observador que “é uma situação que é estranha em termos de associação em vacinas” e tendo em conta as informações que são conhecidas sobre a criança em causa. Mesmo supondo que a paragem cardiorrespiratória teve origem numa miocardite (algo que seria inédito), elas são “extremamente raras, mais raras do que as causadas pela Covid-19”. Embora sejam mais comuns entre os rapazes, a frequência “vai decrescendo com a idade” — pelo que seria mais provável que um caso destes surgisse em crianças mais velhas — e “acontecem quase sempre com a segunda dose”.

É essa o panorama que tem sido descoberto noutros países europeus que estão a vacinar crianças, mas também nos Estados Unidos: nas primeiras oito milhões de pessoas entre os cinco e os 11 anos vacinadas em território norte-americano, foram detetados menos de 15 casos de miocardite. Destes, só nove foram efetivamente associados à toma da vacina. Há cinco casos ainda em investigação. Nenhum morreu.

Mas no campo teórico, a associação não seria impossível. Os efeitos adversos mais graves desta vacina costumam acontecer uma semana depois da vacinação e são, de facto, mais comuns em pessoas do sexo masculino do que em pessoas do sexo feminino, explicou ao Observador um virologista que também pediu o anonimato. É o caso das miocardites e das microtromboses, que resultam de uma reação exacerbada do sistema imunitário: “Há pessoas com predisposição para criar mais anticorpos contra os vírus, mas esses anticorpos podem reconhecer também outras proteínas nas células do nosso organismo. E atacam-nas e destroem-nas”.

Por enquanto, a proximidade temporal entre o momento da vacinação contra a Covid-19 e o surgimento do quadro clínico de paragem cardiorrespiratória é o único detalhe que suporta a hipótese de a morte do rapaz ser o resultado de uma reação adversa grave e fatal à vacina da Pfizer/BioNTech, mas ela era a suficiente para o caso ser reportado ao Infarmed para investigação

Não foi necessariamente o que aconteceu neste caso. Não há qualquer caso confirmado de miocardite fatal comprovadamente associada a uma reação adversa à vacina, nem nenhuma descrição internacional de uma inflamação cardíaca desta natureza ter evoluído para uma paragem cardiorrespiratória. Só que o menor também estaria infetado com o coronavírus. Se tiver desenvolvido uma resposta imunitária muito grande à vacina, e se já tiver predisposição genética para também ter uma resposta exacerbada perante uma infeção, a morte pode ter resultado de uma junção de fatores. Mas a proximidade temporal à vacina e o surgimento da Covid-19 poucos dias antes do óbito também pode não passar de uma trágica coincidência.

Coincidência temporal é a única ligação à vacina

O Observador sabe que, por enquanto, a proximidade temporal entre o momento da vacinação contra a Covid-19 e o surgimento do quadro clínico de paragem cardiorrespiratória é o único detalhe que suporta a hipótese de a morte do menino ser o resultado de uma reação adversa grave e fatal à vacina da Pfizer/BioNTech — o suficiente para o caso ser reportado ao Infarmed para investigação. Mas, no fim de contas, a causa da morte pode ser completamente alheia à Covid-19 e à vacina contra a doença.

Cabe ao Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses chegar a conclusões através da autópsia, que foi solicitada com urgência pelo próprio hospital; e depois ao Infarmed cruzar as informações da autópsia com as informações clínicas da criança. A Procuradora-Geral da República, a partir do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa vai abrir um inquérito.

PGR abre inquérito à morte de criança de seis anos no Hospital de Santa Maria

As conclusões podem demorar várias semanas a serem descobertas. A primeira fase da autópsia é também a mais rápida: a análise anatómica, que tem por objetivo detetar quaisquer alterações visíveis na morfologia dos órgãos do corpo humano. Depois vem a análise de tecidos, que estuda as células ao nível microscópico em busca de algum indício de uma doença que tenha afetado o funcionamento dos órgãos.

Isso envolve saber que medicamentos tomava habitualmente ou tinha tomado recentemente, que problemas de saúde já lhe tinham sido diagnosticados, quais eram desconhecidos no momento da morte, se tinha algum tipo de alergia ou intolerância, se possuía alguma anomalia congénita e até o historial clínico da família mais próxima, sobretudo dos pais, irmãos que pudesse ter e dos avós.

Conclusões da autópsia podem demorar semanas

As conclusões podem demorar várias semanas a serem descobertas. A primeira fase da autópsia é a mais rápida: a análise anatómica, que tem por objetivo detetar quaisquer alterações visíveis na morfologia dos órgãos do corpo humano. Depois vem a análise de tecidos, que estuda as células ao nível microscópico em busca de algum indício de uma doença que tenha afetado o funcionamento dos órgãos. Além disso, a autópsia procurará descobrir se houve um episódio de miocardite anterior à paragem cardiorrespiratória, se havia algum problema cardíaco por diagnosticar, alguma predisposição genética para quadros anafiláticos, por exemplo. Por ser altamente complexa e específica, a análise de tecidos pode demorar muito tempo e é ela que impede o relatório da autópsia de ser emitido já nos próximos dias.

O Ministério da Saúde, por sua vez, disse ao Observador que vai esperar pela investigação do Infarmed antes de tomar decisões sobre o rumo da vacinação de crianças entre os cinco e os 11 anos. Fonte oficial confirmou que o Governo está “a acompanhar o caso e aguarda conclusões das averiguações, sendo prematura qualquer ilação antes das mesmas”.

A Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19, responsável pelo parecer técnico que aconselhou a Direção-Geral da Saúde a avançar para a vacinação de crianças, também ainda não se vai debruçar sobre este caso já: vai esperar pelos resultados da investigação do Infarmed para saber se a morte da criança foi mesmo associada à vacinação. Só nesse caso vai explorar se há ou não necessidade de rever os conselhos relativos à vacinação de crianças. Por enquanto, ela avança tal como tem estado a decorrer: os benefícios continuam a superar os riscos.

Mesmo que a morte da criança esteja de facto associada à vacinação, essa relação pode não bastar para colocar um travão no processo vacinal em crianças. À semelhança do que aconteceu com as reações adversas que limitaram a utilização das vacinas da AstraZeneca e da Janssen, só se for encontrado um padrão de problemas de saúde associados à vacina pediátrica da Pfizer/BioNTech é que o processo pode ser alterado ou mesmo suspenso.

Infarmed tinha sempre de ser notificado

O Infarmed teve de ser formalmente notificado para avaliar a suspeita de uma reação adversa grave — não porque esta é a teoria mais fiável em cima da mesa, mas por simplesmente ser uma delas, já que havia passado tão pouco tempo (apenas sete dias) desde a toma da primeira dose.

Mesmo que a morte da criança esteja de facto associada à vacinação — que é apenas uma de várias teorias que podem explicar o caso —, essa relação pode não bastar para colocar um travão no processo vacinal em crianças. À semelhança do que aconteceu com as reações adversas que limitaram a utilização das vacinas da AstraZeneca e da Janssen a determinados grupos populacionais, em função do sexo e da idade, só se fosse encontrado um padrão de problemas de saúde associados à vacina pediátrica da Pfizer/BioNTech é que o processo poderia ser alterado ou mesmo suspenso. E, por enquanto, não há qualquer padrão dessa natureza, nem é expectável que venha a verificar-se.

Este é o primeiro caso fatal em que não se afasta para já uma associação à vacinação em idade pediátrica em Portugal, mas não necessariamente na generalidade da população: o último relatório de farmacovigilância do Infarmed, que monitoriza a segurança das vacinas contra a Covid-19, aponta para 116 mortes possivelmente resultantes de uma reação adversa às vacinas: “Os casos de morte ocorreram num grupo de indivíduos com uma mediana de idades de 77 anos e não pressupõem necessariamente a existência de uma relação causal entre cada óbito e a vacina administrada, decorrendo também dentro dos padrões normais de morbilidade e mortalidade da população portuguesa”.

Esses casos de morte correspondem a 0,5% de todos os casos suspeitos de reação adversa à vacina classificados como graves. De resto, entre as quase 301 mil doses administradas em idade pediátrica, as autoridades de saúde registam apenas uma reação adversa por cada 10 mil doses administradas; e só uma em cada 33.333 foi considerada grave. Durante os ensaios clínicos da Pfizer/BioNTech entre as crianças com cinco a 11 anos, nenhuma reação adversa grave relacionada com a vacinação foi reportada: não se registou nenhum caso de MIS-C, miocardite, pericardite ou morte.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.