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RODRIGO MENDES/OBSERVADOR

RODRIGO MENDES/OBSERVADOR

Grupo Aldi pede indemnização de 930 mil euros a ex-juiz devido a 'toupeira' imobiliária

'Toupeira' passou informação privilegiada a ex-juiz e alegados cúmplices sobre os valores máximos que Grupo Aldi estava disposto a pagar por terrenos para supermercados.

Um empresa imobiliária do Grupo Aldi pede uma indemnização civil de 930 mil euros ao antigo magistrado Hélder Claro e a mais três arguidos que foram acusados em junho do crime de associação criminosa e outros ilícitos criminais. Está em causa o acesso a informação privilegiada cedida por um funcionário do Grupo Aldi que permitiu ao ex-juíz de primeira instância e ao seus alegados cúmplices terem mais-valias precisamente no valor da indemnização civil requerida, tal como o Observador noticiou em agosto.

Esses factos indiciários levaram o Ministério Público (MP) a acusar em junho Hélder Claro e o empresário Carlos Moura Guedes de terem alegadamente corrompido José Ribeiro Pires, a alegada ‘toupeira’ no Grupo Aldi, para terem acesso a informação que lhes permitiu saber o valor máximo que o retalhista alemão estava disponível a pagar por terrenos nos concelhos em Valongo e em Matosinhos.

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Pormenor relevante: só depois de terem os negócios fechados com o Grupo Aldi é que o grupo de Hélder Claro e Carlos Moura Guedes compraram os terrenos que venderam ao retalhista alemão.

O processo que envolve Hélder Claro, expulso da magistratura judicial em maio deste ano, está na fase de instrução criminal, sendo que a decisão instrutória será conhecida a 16 de dezembro. O ex-magistrado judicial foi acusado pelo MP de crimes tão diversos como associação criminosa, aquisição de cartões bancários mediante crime informático, corrupção ativa no setor privado, angariação de mão de obra ilegal e auxílio à imigração ilegal com intenção lucrativa.

O ex-juiz nega veementemente todos os factos que o MP lhe imputa na acusação e, por isso mesmo, requereu a abertura de instrução para contestar a acusação.

O juiz que também era mediador imobiliário — e que nega tudo

Hélder Claro foi juiz de direito entre 13 de setembro de 1997 e 22 de maio de 2024, quase 27 anos. O MP não tem dúvidas de que a partir de determinada a altura — numa data concreta não apurada —, o juiz de direito terá alegadamente quebrado a exclusividade da sua função e dedicado o seu tempo a “atividades de mediação imobiliária e a prestação de serviços para terceiros nas áreas do imobiliário e de investimentos financeiros”, lê-se na acusação.

A Imopartner SA, com sede social em Braga, e o seu administrador único, Carlos Moura Guedes, é o principal parceiro do magistrado nos negócios imobiliários. Diz o MP que Moura Guedes partilhava com Hélder Claro “atos de gestão e administração da empresa, em particular a prospeção de mercado, algumas negociações e agilização de procedimentos administrativos e contratuais, sendo também o arguido Hélder Claro seu assessor jurídico.”

Por outro lado, Carlos Moura Guedes “pagava comissões a Hélder Claro nos negócios em que este tinha intervenção ou repartia com ele as mais-valias obtidas”.

Nesta história da relação de Carlos Moura Guedes e Hélder Claro aparece ainda José Ribeiro Pires, funcionário da sociedade Real Estate Manaldi Lda — uma empresa do Grupo Aldi que pesquisava os melhores terrenos em termos de relação preço/qualidade nos mercados classificados como prioritários pela rede de supermercados para a sua própria expansão.

Hélder Claro foi juiz de direito entre 13 de setembro de 1997 e 22 de maio de 2024, quase 27 anos. O MP não tem dúvidas de que a partir de determinada a altura — numa data concreta não apurada —, o juiz de direito terá alegadamente quebrado a exclusividade da sua função e dedicado o seu tempo a “atividades de mediação imobiliária e a prestação de serviços para terceiros nas áreas do imobiliário e de investimentos financeiros”, lê-se na acusação.

Na prática, Ribeiro Pires era um prospetor de mercado ao serviço do Grupo Aldi para procurar os melhores negócios possíveis para a compra de espaços para novas lojas. Era amigo de Paulo Neves, funcionário bancário que, por sua vez, conhecia bem Hélder Claro. É precisamente Neves que vai fazer a ponte entre o prospetor do Aldi e o juiz de direito especialista em mercado imobiliário, marcando entre ambos um encontro numa estação de serviço da Circunvalação, a circular interna da cidade do Porto, para estudo de possíveis negócios entre o Grupo Aldi e a Imopartner.

Essa era uma hipótese de ouro pois a Imopartner “precisava de alguém de dentro do Aldi que defendesse os interesses da Imopartner”.  Segundo o MP, naquele encontro e nas reuniões seguintes Hélder Claro e Carlos Moura Guedes terão prometido a quantia de 50 mil euros a José Ribeiro Pires por cada negócio imobiliário que a Imopartner conseguisse concluir com o Aldi.

Ribeiro Pires vai assumir, segundo o MP, uma função equiparada à de uma ‘toupeira’, cedendo informação privilegiada sobre as zonas de expansão do Grupo Aldi, os terrenos concretos o retalhista alemão estava a ponderar, o valor desses terrenos e os respetivos orçamentos financeiros.

Mais tarde, os arguidos acordaram mesmo, de acordo com o MP, que José Ribeiro Pires iria apresentar ao Aldi um terreno que a Imopartner tinha em vista em Valongo, cidade do distrito do Porto. Pires passaria a fornecer “informações relevantes para a Imopartner sobre negociações em curso e estratégias negociais na sua área geográfica”, ao mesmo tempo que apresentaria “ao Aldi as propostas da Imopartner” como “preferenciais relativamente a outras propostas”.

Num requerimento apresentado nos autos em setembro, a Real Estate Manaldi, a empresa do Grupo Aldi, diz que Ribeiro Pires estava “vinculado a uma obrigação de sigilo e, bem assim, a um pacto de exclusividade, sendo-lhe vedado, no quadro das suas funções, aceitar de terceiros quaisquer tipos de benefícios ou vantagens económicas”, lê-se no requerimento a que o Observador teve acesso.

Em declarações prestadas ao Observador em agosto, Hélder Claro contestou veementemente todos os factos indiciários que o MP lhe imputa. Ao longo da conversa com o Observador, o ex-juiz garantiu várias vezes que não recebeu qualquer quantia por intermediação de negócios imobiliários. “Ao contrário do que a acusação diz, nunca representei a Imopartner, não tive qualquer intervenção no negócio e não recebi qualquer quantia por conta de qualquer suposto negócio. Desconheço e desconhecia a gestão concreta da Imopartner”, diz.

“Imputam-me um crime de corrupção ativa no setor privado em regime de co-autoria mas não existe nenhum crime de corrupção”, assegura.

A promessa de 50 mil euros para a ‘toupeira’

O primeiro negócio entre o Grupo Aldi e a Imopartner concretizou-se em Valongo — cidade para a qual o Aldi queria expandir-se. José Ribeiro Pires apresentou a Imopartner como uma empresa que costumava trabalhar com marcas como o Pingo Doce, Lidl e McDonald’s.

Em Valongo, o Aldi estava indeciso entre dois terrenos, sendo que um deles foi apresentado pela Imopartner. Contudo, a empresa não era proprietária do terreno. Numa jogada de quem tem acesso a informação privilegiada, evidencia o MP na acusação, a Imopartner começou por garantir que conseguia o negócio com o Aldi através da influência da José Ribeiro Pires.

A 31 de janeiro de 2020 fechou o negócio com 0 Aldi para a venda de um terreno na rua Rainha Santa Isabel em Valongo por 1.950.000 euros, sendo que apenas assinou o contrato-promessa de compra e venda com os legítimos proprietários do terreno a 17 de fevereiro de 2020 e pelo valor de 1.750.000 euros. Isto é, a Imopartner primeiro garantiu que conseguia o negócio de venda ao Aldi e só quinze dias depois prometeu comprar o mesmo imóvel.

A 31 de janeiro de 2020 fechou o negócio com 0 Aldi para a venda de um terreno na rua Rainha Santa Isabel em Valongo por 1.950.000 euros, sendo que apenas assinou o contrato-promessa de compra e venda com os legítimos proprietários do terreno a 17 de fevereiro de 2020 e pelo valor de 1.750.000 euros. Isto é, a Imopartner primeiro garantiu que conseguia o negócio de venda ao Aldi e só quinze dias depois prometeu comprar o mesmo imóvel.

A Real Estate Manaldi diz, no requerimento em que pede a indemnização de 930 mil euros, que foi o então juiz Hélder Claro quem cedeu a 2 de janeiro de 2020 o email de José Ribeiro Pires a Carlos Moura Guedes, tendo este enviado a proposta da Imopartner, fazendo questão de dizer expressamente que o fazia a “pedido do Meretíssimo Juiz Dr. Hélder Claro”, enviando o “layout da implantação do Aldi e do McD [McDonald’s] para Valongo”.

O negócio fez-se e a Imopartner teve uma mais-valia de 200 mil euros. O MP não explica na sua acusação qual foi o valor exato da comissão recebida por Hélder Claro.

A empresa do Grupo Aldi defende no seu requerimento que a “intervenção cirúrgica do arguido José Pires” permitiu à Imopartner obter uma “mais-valia garantida correspondente a 200 mil euros”. E tudo porque foi prometido a Ribeiro Pires a “atribuição de uma quantia indevida de 50 mil euros” por parte da Imorpatner por cada negócio que esta empresa fechasse com a Aldi.

Nunca a Imopartner tinha conseguido concretizar qualquer negócio com o Grupo Aldi e só o fez nesta ocasião porque, tal como Hélder Claro e Carlos Moura Guedes defendiam, tinham “alguém dentro” do retalhista alemão que defendia os seus interesses, lê-se no requerimento da Real Estate Manaldi.

Matosinhos e a importância da ‘toupeira’ para assegurar o negócio

Outros negócios se seguiram com os mesmos contornos. Em Matosinhos, por exemplo, a Imopartner apresentou um terreno na zona de Guifães para uma nova loja pelo valor de 2,3 milhões de euros. A proposta é datada de fevereiro mas, uma vez mais, a Imopartner não era proprietária de nenhum terreno.

Só após a garantia dada por José Ribeiro Pires é que a Imopartner avançou com o negócio de compra do terreno, tendo acordado um contrato-promessa de 1,1 milhões de euros aos anteriores proprietários. O valor final da venda ao Aldi baixou de 2.300.000 euros para 1.830.000 euros, sendo que a mais-valia da Imopartner foi de cerca de 730 mil euros.

Antes disso, o papel valioso de Ribeiro Pires terá vindo ao de cima, uma vez mais. Além dos terreno que a Imopartner apresentou como opção, existia uma segunda hipótese em análise no Departamento de Expansão da Aldi: um terreno situado junto a uma bomba de gasolina da Repsol, na Senhora da Hora.

Só após a garantia dada por José Ribeiro Pires, é que a Imopartner avançou o negócio de compra do terreno, tendo acordado um contrato-promessa de 1,1 milhões de euros aos anteriores proprietários. O valor final da venda ao Aldi conseguiu baixar do preço de 2.300.000 milhões euros para 1.830.000 euros, sendo que a mais-valia da Imopartner foi de cerca de 730 mil euros.

“Contudo, tal alternativa viria a tornar-se inviável, pelo que, na prática, o terreno pertencente à Imopartner passou a ser o único sob análise. Tal vicissitude, segundo se acreditava, era apenas do conhecimento da estrutura interna da Real Estate Manaldi, importante por isso que a mesma se mantivesse em sigilo” para o sucesso das negociações, lê-se no requerimento da empresa do Grupo Aldi.

Terá sido José Ribeiro Pires a transmitir essa informação ao grupo de Hélder Claro e Carlos Moura Guedes e a garantir que a empresa do Grupo Aldi iria mesmo comprar o terreno da Imopartner. E só após essa garantia é que a empresa de Moura Guedes comprou o terreno por 1,1 milhões aos anteriores proprietários.

Esse valor, enfatiza o Grupo Aldi, era “desconhecido do Departamento de Expansão da Real Estate Manaldi (com exceção do arguido José Pires), que estavam convencidos que o terrenos valeria mais do dobro”.

Houve ainda a hipótese de um terceiro negócio em Penafiel, mas que não avançou. José Ribeiro Pires, entretanto, já tinha saído do Grupo Aldi.

Grupo Aldi alega “prejuízo patrimonial” de 930 mil euros

Devido a estes factos, o MP acusou Hélder Claro do crime de corrupção ativa de funcionário privado em regime de co-autoria com Carlos Moura Guedes e Paulo Neves. Já José Ribeiro Pires foi acusado de um crime de corrupção passiva.

A Real Estate Manaldi assegura que teve um “prejuízo patrimonial” de 930 mil euros — que corresponde à soma das mais-valias de 200 mil euros do terreno de Valongo com os 730 mil euros — “resultante da prática dos ilícitos criminais pelos arguidos (…) Hélder Claro, Carlos Guedes, Paulo Neves, José Pires e Imopartner”. Logo, “encontram-se preenchidos todos os pressupostos para a imputação aos mesmos da responsabilidade civil por facto ilícito”, lê-se no requerimento da empresa do Grupo Aldi.

Além da indemnização de 930 mil euros, a empresa do Aldi pede igualmente ao tribunal de julgamento que condene os arguidos ao pagamento de “juros de mora até efetivo e integral pagamento”.

O ex-juiz Hélder Claro foi ainda acusado, devido a outros factos, dos crimes de associação criminosa, aquisição de cartões bancários mediante crime informático, angariação de mão de obra ilegal e auxílio à imigração ilegal com intenção lucrativa num caso rocambolesco que tem sido muito comentado no mundo judiciário do distrito do Porto desde que foi mediatizado pela comunicação social.

O bizarro caso do ex-juiz Hélder Claro

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