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FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

"Jesus veio para todos, não só para alguns". A "geração do vai ou racha" acha que Francisco é o homem certo para abrir a Igreja

Preocupam-se com o clima, o aborto, a inclusão da comunidade LGBT e os abusos sexuais. Querem conversar, até com os amigos não-crentes. E reveem-se na mensagem de um Papa que quer "todos" com ele.

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A primeira vez que Yanqui Salastuz discutiu o tema do aborto, perdeu um amigo. Este norte-americano, nascido numa família de origens mexicanas, é católico desde sempre: “Fui batizado quando tinha um mês, sou acólito desde os quatros anos”, conta ao Observador o adolescente de 17 anos.

Estamos numa das encostas do Parque Eduardo VII, e ao fundo ouve-se o cantor Buba Espinho, num dos números musicais da cerimónia de acolhimento aos jovens desta Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Yanqui tem vontade de falar. Conta como desde cedo se assumiu como “pro-life“, o nome comum nos Estados Unidos para os opositores da despenalização do aborto — muito embora essa não seja uma posição consensual entre a sua comunidade de jovens católicos, numa igreja no estado da Florida.

Multidão no Parque Eduardo VII, em Lisboa

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Mas quando se chateou com um amigo por causa disso, Yanqui tomou uma decisão: “Decidi que tinha de parar de ter discussões tão violentas. Precisamente por ser católico, tenho de saber viver em comunidade, saber viver com os outros“, admite. Desde então, diz, adota sempre a mesma posição: diz o que pensa de forma calma, apenas uma vez. Seja sobre o aborto, seja quando os amigos defendem a legalização de algumas drogas (com que também não concorda). “Depois, o resto pertence ao livre arbítrio de cada um”, explica. “Ser católico é isto, é anunciar a fé. As pessoas pensam na Igreja Católica como uma religião que dita o que as pessoas devem ou não fazer, mas não. Cristo apenas partilha a mensagem de algo que pode trazer alegria.”

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O adolescente — que veio para Portugal com um grupo de outros 13 jovens da sua paróquia — não sabia, mas a organização da JMJ tinha definido precisamente a palavra “Alegrai-vos” como mote do dia. É o lema que acompanha este dia de acolhimento com o Papa Francisco, que chega à Colina do Encontro e é recebido de forma apoteótica.

Chegada do Papa Francisco ao Parque Eduardo VII

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

“Esta es la juventud del Papa” é a frase que os jovens insistem em gritar a plenos pulmões à medida que Francisco passa no papamóvel, a rasgar pelo meio do Parque Eduardo VII, ladeado por bandeiras de todo o mundo. Dali a pouco, falará precisamente para os milhares de jovens, que se calarão num silêncio atento.

Antes disso, porém, alguns como Florencia Peña partilham a tal alegria com os jornalistas. “Sou argentina, da terra do Papa!”, comenta a jovem de 24 anos com o Observador. Questionada sobre o que espera da mensagem que Francisco partilhará dali a pouco, Florencia é taxativa: “O Papa Francisco está a refundar toda a estrutura da Igreja, quer uma Igreja de portas abertas, para todos. Essa é a mensagem de Jesus: Ele veio para todos, não só para alguns.”

Separar o lixo e ensinar inglês a crianças. A equatoriana Janis e o seu sentido de missão

A jovem argentina parecia que adivinhava. Uma hora depois, o Pontífice usaria precisamente essa expressão na sua mensagem: “Na Igreja há espaço para todos. Para todos. Ninguém fica de fora, ninguém está a mais. Isto di-lo Jesus claramente quando manda os apóstolos”, diz. Depois, foge ao texto preparado e pede insistentemente aos jovens que repitam com ele: “Todos, todos, todos!” A multidão acede.

Francisco individualiza a multidão, relembrando aos que ali estão que todos têm um papel. “Tu és chamado pelo teu nome — tu, tu, tu, nós, todos vós”, afirma. “Ninguém é cristão por casualidade.”

Um discurso que foi um recado a quem quer uma Igreja fechada à diferença. As entrelinhas do Papa na cerimónia de acolhimento

Janis e Claudia não podiam concordar mais. As duas jovens equatorianas, que trazem com orgulho uma pequena bandeira do seu país, partilham o sentido de urgência que o Papa tanto defende e acham que é preciso por mãos à obra. Por isso, vieram para Portugal algumas semanas antes do início da JMJ, inseridas num programa promovido pelos Jesuítas do Equador, em que tiveram de fazer aquilo a que chamam “trabalho social”.

"Surpreendeu-me muito que aqui em Portugal haja contentores para os diferentes tipos de lixo, é daquelas coisas que nos fazem falta na América Latina, por exemplo. É importante aprender estas soluções para o futuro e transmitir estas ideias. Somos a casa que construímos."
Janis, jovem equatoriana de 21 anos

“Cada um tem uma experiência diferente. A mim calhou-me Ecologia e Meio Ambiente, tivemos um projeto muito bonito com reformados. E também dei aulas em inglês para crianças migrantes, que têm contextos complicados”, conta Janis, de 21 anos. A jovem de Quito, preocupada com as alterações climáticas, abraçou o tema que lhe calhou: “Surpreendeu-me muito que aqui em Portugal haja contentores para os diferentes tipos de lixo, é daquelas coisas que nos fazem falta na América Latina, por exemplo”, diz ao Observador. “É importante aprender estas soluções para o futuro e transmitir estas ideias. Somos a casa que construímos.”

A amiga Claudia, de 25 anos, concorda. E tem muita esperança na sua geração, que diz abraçar particularmente este Papa por ele “acreditar muito na juventude” — “É por isso que está aqui esta gente toda”, declara, olhando para o relvado do Parque, onde quase não se vê um centímetro de relva que não esteja a ser pisada por um peregrino. “Este Papa foca-se muito em fazer de Deus Homem. Alguém que se parece com cada um de nós.”

“Quando há perseguições, a cristandade floresce”. As dificuldades de ser um jovem católico

A equatoriana admite, porém, que no dia-a-dia nem sempre é tão fácil expressar essa fé como aqui na JMJ. “Ser católico às vezes é complicado, pelo menos na América Latina, que está muito polarizada”, confessa. “Mas acho que se baseia tudo no respeito. Tens de praticar a tua religião e a tua espiritualidade sem a impor aos outros. Ser tolerante.”

Eram muitas as bandeiras (e de vários países) que se viam no recinto

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Uma ideia semelhante à que já tinha defendido o norte-americano Yanqui, da Florida, que admitiu que, por vezes, se sente “julgado” por alguns amigos. “É difícil, mas quero muito compreendê-los”, garante. “O padre Bill, que considero uma espécie de mentor, costuma dizer-me: ‘Aprende, aprende’. A fé católica pede-nos que estejamos continuamente a aprender.”

Os desafios de um jovem católico americano são, porém, muito diferentes daqueles que enfrentam outros, como o indiano Blaise Lobo. Natural de Goa, este jovem padre de 35 anos está com um pequeno grupo do seu país pronto para “ver o Papa e conhecer jovens de todo o mundo”. Oriundos de um país onde os cristãos são por vezes alvo de ataques violentos, Blaise admite que nem sempre é fácil ser católico na Índia. “Mas a cristandade sobrevive. Quando há dificuldades, quando há perseguições, até floresce”, diz, com um sorriso.

"O padre Bill, que considero uma espécie de mentor, costuma dizer-me: 'Aprende, aprende'. A fé católica pede-nos que estejamos continuamente a aprender."
Yanqui Salastuz, norte-americano de 17 anos

As origens de cada um determinam experiências diferentes do catolicismo, mas há pontos em comum a unir os vários jovens com que o Observador se cruzou em vários pontos do Parque Eduardo VII. E um deles é a admiração profunda pelo Papa Francisco, que consideram ser o líder de uma Igreja mais aberta e inclusiva. “Foi o que Cristo fez e é isso que Francisco está a fazer: unir todos”, sentencia o padre Blaise.

Comunidade LGBT e abusos sexuais. A portuguesa Maria quer uma Igreja aberta como defende o Papa Francisco

Maria Cunha é uma dessas jovens que se sente profundamente inspirada por este Papa. Já depois de Francisco ter abandonado o palco do topo do Parque Eduardo VII, ouve-se o hino desta JMJ, “Há Pressa no Ar”, ao som do qual vai dançando a jovem de 26 anos, nascida no Porto e a viver em Lisboa, enquanto conversa com o Observador. “Nesta visita do Papa tem-me tocado muito o discurso que ele tem tido, de uma Igreja que sai e que abraça quem tem pontos de vista diferentes”, confessa. “Gostava muito de o ver a tocar ainda mais a fundo em alguns destes temas.”

"Quero que a Igreja faça as pessoas da comunidade LGBTQ+ se sentirem acolhidas à partida. E quero mais transparência [em relação aos abusos sexuais]."
Maria Cunha, 26 anos

Católica desde pequena — “sou aquele clássico de quem ia à missa e à catequese obrigada pelos pais” —, Maria aprofundou a sua fé na adolescência e hoje assume-a sem pudores. Mas ela veio acompanhada de um desejo de mudança que Maria crê ser transversal a todas as pessoas da sua idade: “A nossa geração está a viver uma fase de ‘vai ou racha’. Em relação ao clima, aos abusos sexuais, às questões da inclusão… São temas universais, quer se seja católico ou não.”

E a jovem concretiza como gostava de ver a Igreja a responder a esses problemas: “Quero que a Igreja faça as pessoas da comunidade LGBTQ+ se sentirem acolhidas à partida”, enumera. “E mais transparência”, acrescenta, referindo-se à questão dos abusos sexuais dentro da instituição. “Acho que demos um salto com a Comissão Independente e os relatórios, e os Jesuítas também têm o gabinete de escuta para ouvir as vítimas. São passos muitos pequenos, mas importantes e acho que tem de se ir por aí.”

Papa Francisco no palco do Parque Eduardo VII

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Ao lado de Maria, um homem faz com o seu grupo um balanço do discurso de Francisco nesta quinta-feira: “Simples na forma, rico no conteúdo. É assim que se comunica”, sentencia. A jovem portuense concorda: “O Papa Francisco tem dado um grande passo como impulsionador disto”. E o que é ‘isto’? “Quebrar o estigma de que a Igreja está fechada sobre si mesma”, afirma.

“Não digo que não esteja nalguns aspetos mais institucionais”, apressa-se a acrescentar a jovem. “Mas acho que o que se está a viver aqui…”, diz Maria, enquanto estende os braços e abre as mãos para mostrar toda a largura do relvado do Parque Eduardo VII. Agora que o Papa Francisco já partiu, a multidão a pouco e pouco vai esvaziando o recinto, mas muitos grupos ainda cantam e batem palmas. “Isto é a prova de que nós, os jovens, pensamos de maneira diferente. E estamos abertos a outros pontos de vista.”

 
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