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Utentes aguardam o metro na Estação de Metro do Senhor Roubado, no dia em que a área Metropolitana de Lisboa (AML) vê reforçada a oferta de transportes públicos, sobretudo de autocarros, permitindo que a capacidade fique a 90% da que existia no mesmo período do ano passado, em Odivelas, 01 de julho de 2020. MIGUEL A. LOPES/LUSA
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MIGUEL A. LOPES/LUSA

MIGUEL A. LOPES/LUSA

JMJ. Transportes reforçados para 1,2 milhões de jovens, sensibilização para evitar greves e apelo a deslocações a pé

Grupo de projeto do Governo apresentou plano de mobilidade para a JMJ: inclui reforço da oferta para levar jovens de e para Lisboa, apelo a que andem a pé e sensibilização para que não haja greves.

“Vai haver constrangimentos.” Foi possivelmente a expressão mais repetida na tarde desta quarta-feira na conferência de imprensa em que José Sá Fernandes, o antigo vereador da câmara de Lisboa que agora está à frente do grupo de projeto do Governo para a organização da Jornada Mundial da Juventude, apresentou publicamente o plano de mobilidade e transportes do evento que acontece na capital portuguesa em agosto deste ano. O objetivo da organização é o de minimizar, na medida do possível, os mais que inevitáveis impactos que a presença de mais de um milhão de participantes (1,2 milhões, no cenário que está a ser usado pela organização) vai trazer à cidade de Lisboa.

A mensagem do grupo de projeto e da empresa que elaborou o plano de mobilidade é simples: um grande foco nas deslocações a pé dentro da cidade, uma rede de transportes públicos em capacidade máxima durante uma semana (está até a haver conversas com trabalhadores e sindicatos para precaver a possibilidade de greves), um reforço da oferta com autocarros alugados para garantir as ligações diárias de centenas de milhares de jovens entre as periferias e o centro de Lisboa — e muita paciência para os constrangimentos que, mesmo assim, não vai ser possível evitar.

O plano de mobilidade e transportes da JMJ foi elaborado pela consultora VTM, especializada em engenharia e planeamento, que o Governo contratou em dezembro do ano passado por 89 mil euros, de acordo com o contrato disponível no Portal Base. Trata-se de um documento crucial para o sucesso da Jornada Mundial da Juventude, unanimemente classificada por todos os envolvidos como o maior evento alguma vez organizado em Portugal. Aliás, já em fevereiro deste ano o Observador noticiava que o atraso na produção deste documento estava a causar dificuldades ao trabalho da organização da JMJ — cuja realização em Portugal foi definida há já quatro anos.

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Sem este documento minucioso — que não foi divulgado publicamente por questões de segurança, sendo apresentada apenas uma súmula com algumas informações de carácter geral —, era ainda impossível esquematizar os horários, os lugares para alguns eventos, a distribuição dos grupos de peregrinos, e por aí fora. A partir desta quarta-feira, salientou José Sá Fernandes, a Comité Organizador Local (COL, o organismo da Igreja que está a organizar a JMJ) vai ter “ferramentas essenciais” para levar a cabo a organização do evento, incluindo a complexa tarefa de “conjugar o transporte público com os sítios de acolhimento” em toda a área metropolitana de Lisboa.

Mas, afinal, o que consta do plano de mobilidade apresentado esta quarta-feira — e o que ele nos diz sobre o que é possível esperar que aconteça na região de Lisboa na primeira semana de agosto?

Um plano a três níveis

Ao contrário do que possa pensar-se, os cerca de 1,2 milhões de participantes que são esperados na Jornada Mundial da Juventude (e dos quais apenas um quarto ou um terço estarão realmente inscritos) não vão ficar todos alojados na cidade de Lisboa propriamente dita durante toda a semana: na verdade, a organização estima que apenas cerca de 200 mil fiquem alojados na cidade de Lisboa (incluindo participantes que já residem na cidade ou que vão ficar acolhidos em famílias ou paróquias da cidade, mas também turistas e outras pessoas que vão juntar-se ao evento), enquanto o restante milhão de participantes vai, na verdade, ficar alojado por toda a área metropolitana de Lisboa, num vasto território que chegará também às dioceses de Santarém e de Setúbal.

Em conjunto, as três dioceses (Lisboa, Santarém e Setúbal) vão ser as chamadas “dioceses de acolhimento“, nas quais os jovens que vão participar na JMJ vão ficar alojados durante aquela semana, deslocando-se todos os dias para a cidade de Lisboa para participar nos eventos da Jornada.

Foi a pensar nesta dinâmica que o plano de mobilidade e transportes foi elaborado, explicou Isabel Pimenta, a responsável da empresa VTM que esta quarta-feira apresentou o documento aos jornalistas em Lisboa. Segundo Isabel Pimenta, o que está pronto até agora é apenas a primeira fase do plano, que corresponde ao “conceito” de mobilidade a implementar. “Ele será densificado ao longo dos próximos meses, para poder ser concretizado durante a semana da JMJ”, sublinhou a responsável, destacando que “Lisboa está perante um desafio não menor do que todas as outras cidades por onde este evento já passou”.

Deverão circular cerca de 4 mil autocarros alugados em Lisboa na semana da JMJ.

O plano de mobilidade e transportes surge dividido em quatro subplanos, sobre os quais Isabel Pimenta explicou que ainda é impossível avançar detalhes concretos. O primeiro é o plano de transportes propriamente dito, que resulta da articulação entre todos os operadores de transportes que operam na Área Metropolitana de Lisboa para que todos coloquem no terreno a sua capacidade máxima durante aquela semana. Em segundo lugar, aparece o plano de estacionamento, que compreende a complexa gestão do estacionamento dos cerca de 4 mil autocarros adicionais que vão estar na cidade de Lisboa, entre viaturas alugadas pela organização e veículos alugados pelos próprios grupos (portugueses ou europeus) para chegar a Lisboa. Em terceiro, há o necessário plano de tráfego, que servirá para agilizar todos os transportes na cidade de Lisboa, não apenas os dedicados à JMJ, mas a totalidade da rede de transportes da capital, bem como os acessos, os estacionamentos e a circulação rodoviária. Por fim, é necessário um forte plano de comunicação para fazer chegar a todos os participantes a mensagem correta sobre qual a melhor forma de se deslocarem na cidade.

Segundo explicou Isabel Pimenta aos jornalistas, o plano de mobilidade e transportes está a ser pensado a três níveis:

  • No nível macro, para definir o modo como os peregrinos vão chegar ao local onde vão ficar a pernoitar durante a JMJ. Aqui, é necessário acautelar a chegada dos peregrinos nacionais e internacionais, incluindo as viagens de avião, que não vão ser apenas até ao aeroporto de Lisboa. José Sá Fernandes explicou que é expectável que haja peregrinos a aterrar não só em Lisboa, mas também no Porto, em Faro e em alguns aeroportos espanhóis. Importa também lembrar que na semana antes da JMJ se realizam os “dias nas dioceses”, durante os quais algumas centenas de milhares de jovens vão participar em atividades preparatórias em todas as dioceses do país. No que toca ao aeroporto de Beja, o coordenador do grupo de projeto disse que, para já, não está a ser equacionado o recurso àquela estrutura.
  • No nível médio, para definir como os participantes se vão deslocar todos os dias da JMJ entre o lugar onde estão a pernoitar e a cidade de Lisboa, onde decorrem os principais eventos. Esta será a operação mais complexa, uma vez que inclui a deslocação de largas centenas de milhares de pessoas, todos os dias, entre vários pontos das três dioceses de acolhimento e o centro da cidade, envolvendo grandes operações ferroviárias, rodoviárias e fluviais.
  • No nível micro, dentro da própria cidade de Lisboa. Neste nível, a mensagem da organização para os jovens é clara: andar a pé. É aqui que Isabel Pimenta destaca o “espírito de peregrinação” associado à JMJ, na qual os participantes são “maioritariamente jovens” e o historial das edições anteriores da Jornada dá conta de “grandes caminhadas a pé durante todos os dias do evento”, o que se revela “positivo” para o plano de mobilidade. Segundo Isabel Pimenta, a deslocação a pé é uma “peça-chave” de todo o plano. No caso dos participantes que já estiverem a pernoitar em Lisboa, a ideia é que possam andar a pé o mais possível; no caso dos outros participantes, que vão ser trazidos da mais vasta região de acolhimento, a ideia é que sejam deixados num hub já dentro da cidade, mas não mesmo no centro de Lisboa, a partir do qual se possam deslocar a pé para os diferentes eventos. A organização vai garantir “corredores específicos para os peões”, assegurou José Sá Fernandes. É possível que os jovens caminhem cerca de 10 quilómetros por dia — algo que, insistiram Isabel Pimenta e José Sá Fernandes — está em linha com edições anteriores da JMJ noutros países. A insistência na deslocação a pé tem como objetivo aliviar, na medida do possível, o esforço sobre a Carris e o Metro, cuja oferta vai estar na sua capacidade máxima. A organização também admite que haja uma grande utilização de trotinetas e bicicletas partilhadas (que terão de ficar fora de um conjunto de perímetros de segurança em torno de corredores e lugares dos principais eventos), bem como de TVDE e táxis.

As principais estruturas de transportes da cidade de Lisboa — e os recintos dos principais eventos da semana da JMJ

Deslocação diária de e para Lisboa

O principal desafio da organização em termos de deslocações será a mobilidade do plano médio, ou seja, o transporte diário dos jovens entre os locais onde estão a pernoitar e a cidade de Lisboa.

Jornada da Juventude espera 1,2 milhões de jovens em Lisboa. Vai exigir reforço de transportes públicos e dar prioridade a deslocações a pé

Um dos aspetos salientados por José Sá Fernandes é que este movimento vai decorrer, tendencialmente, fora das horas de ponta habituais: isto porque a organização da JMJ está a preparar o programa de modo a que cada grupo possa ter acesso às “catequeses Rise Up” (que ocupam as manhãs daquela semana) nas proximidades do lugar onde estão a pernoitar. Isto obriga a um esforço de organização para garantir que as catequeses em cada língua estão nas proximidades do lugar onde estão a pernoitar os jovens que falam essas línguas. Só por volta da hora do almoço é que é esperada a grande deslocação dos jovens para a cidade de Lisboa, para participarem nos vários programas da tarde, que incluem o Festival da Juventude (com diferentes palcos, incluindo a Alameda Dom Afonso Henriques, o Terreiro do Paço e o Parque da Bela Vista), a feira vocacional e o parque do perdão (em Belém) e as celebrações com o Papa Francisco (no Parque Eduardo VII). O regresso aos locais de pernoita deverá fazer-se já depois do jantar, muito depois da hora de ponta.

O cenário médio usado pela organização é o de 1,2 milhões de participantes (à razão de dois não inscritos por cada inscrito, o que dificulta ainda mais as contas e adiciona incerteza ao processo), dos quais apenas 200 mil deverão ficar dentro da cidade de Lisboa durante toda a semana. Ao mesmo tempo, a organização estima que o pico de participantes seja atingido apenas nos últimos dois dias (com as celebrações finais com o Papa no Parque Tejo-Trancão) — pelo que o número de participantes nas atividades durante a semana deverá oscilar entre os 400 mil e os 800 mil.

A empresa contratada para o plano de mobilidade elaborou um mapeamento detalhado de toda a área das três dioceses de acolhimento para identificar quais as ligações diretas que existem em termos de transporte público e qual a área de influência das estações onde é possível apanhar esses transportes (uma caminhada de 30 minutos a uma hora será considerada aceitável). A conclusão é a de que 500 mil participantes que ficarão nas dioceses de acolhimento vão poder usar os transportes públicos, devidamente reforçados, para chegar à cidade de Lisboa naqueles dias: destaca-se o comboio (linhas de Sintra, Azambuja, Cascais e ponte 25 de Abril) e o barco (ligações fluviais do Tejo), embora as ligações rodoviárias também estejam em cima da mesa.

Jornada Mundial da Juventude. Dentro da máquina que está a preparar um dos maiores eventos de sempre em Portugal

Durante aquela semana, todas as principais interfaces de transportes da cidade vão continuar em funcionamento para acolher esta oferta reforçada pelos operadores. A única exceção será o terminal do Marquês de Pombal, ao fundo do Parque Eduardo VII, que terá de ser deslocado devido ao palco que vai ser instalado naquela zona para os três eventos centrais da semana: a missa de abertura, o acolhimento do Papa e a Via Sacra.

Há ainda cerca de 200 mil participantes que ficarão alojados em regiões onde a oferta de transportes públicos não permite assegurar a sua deslocação eficaz para a cidade de Lisboa, pelo que, para esses, serão usados cerca de 4 mil autocarros especialmente alugados para o efeito. Estes autocarros terão, essencialmente, duas proveniências: alguns serão alugados diretamente pela organização; noutros casos serão os próprios autocarros alugados pelos grupos para chegarem a Lisboa no início da JMJ (por exemplo, vindos de múltiplos pontos de Portugal e da Europa) a garantir o seu transporte de e para Lisboa durante os dias do evento.

O mapeamento de todos os pontos das três dioceses de acolhimento (Lisboa, Setúbal e Santarém) em que há ligações diretas à cidade de Lisboa e a distância a pé dessas estações

Para que estes cerca de 4 mil autocarros possam deixar de modo eficaz os participantes para a cidade de Lisboa, deverão ser criadas várias zonas de tomada e largada de passageiros na capital. O objetivo, segundo explicaram os responsáveis, é evitar que estes autocarros usem outros terminais rodoviários da cidade, que estão dimensionados para os serviços regulares e que poderiam entrar em colapso se fossem adicionados também estas novas ligações. Em vez disso, serão criados vários pontos na cidade para que os jovens sejam deixados, ao mesmo tempo que será necessário também identificar um conjunto de zonas para que os autocarros fiquem estacionados durante o dia.

Essas zonas estão atualmente a ser estudadas em parceria com as autarquias de Lisboa, Loures e Oeiras, sendo que só deverão ser definidas e conhecidas na segunda fase do plano de mobilidade, até julho. Isabel Pimenta destacou que todos os participantes que estiverem a pernoitar longe da cidade de Lisboa, na tal região que vai de Setúbal a Santarém, vão ter um transporte até à capital, “mas não vão ficar à porta dos eventos“. É aqui que entra, mais uma vez, o tal apelo às deslocações a pé: a partir do momento em que chegam à cidade, a ideia é que os jovens se desloquem a pé entre os vários eventos que pretendem frequentar.

Por fim, a organização estima que cerca de 300 mil participantes optem pelo transporte individual para chegar a Lisboa, o que representará cerca de 120 mil automóveis adicionais a circular na cidade — e a ter de estacionar. Isabel Pimenta destacou que esta percentagem de 25% de utilização de transporte individual num evento de grandes dimensões é “baixa”, mas que se explica pela natureza do evento e dos participantes. Ainda assim, medidas como a eliminação das portagens nos principais acessos de autoestrada à cidade não vão ser estudadas, de modo a não promover o recurso ao carro individual.

Passe para peregrinos com desconto

A verdade é que o plano de mobilidade, que chega a poucos meses da Jornada Mundial da Juventude, ainda não é conhecido na íntegra — nem vai ser. Nesta primeira fase, foi delineado o “conceito” de mobilidade a aplicar na JMJ. Segue-se agora um período, até 15 de julho, no qual será feita a “implementação do modelo e mobilização dos parceiros“, ou seja, durante o qual as empresas de transporte e a organização da JMJ vão começar a dar corpo a este “conceito”. Só aí será possível ter dados concretos sobre rotas, horários e lugares.

Por outro lado, muito do plano de mobilidade e transportes também não será publicamente divulgado com antecedência, por questões de segurança: é o caso dos corredores que vão ser usados pelo Papa, mas também dos perímetros de segurança dos vários eventos.

Os perímetros de segurança, sobretudo em torno do Parque Eduardo VII (onde vai haver dois grandes eventos com o Papa Francisco), têm o potencial para afetar os acessos a habitações e empresas nas proximidades, mas os responsáveis salientaram que não será diferente do que sucede em eventos de grande dimensão naquele recinto.

Os recintos onde vão decorrer os principais eventos da semana da JMJ

O que é certo, garantiu que José Sá Fernandes, é que já está em curso um processo de articulação com todos os operadores de transportes da Grande Lisboa para chegar dois consensos importantes: o primeiro é o compromisso de que todos vão colocar no terreno a sua capacidade máxima e reforçada; o segundo é a criação de um passe especial para peregrinos, que abrange todos os transportes da área metropolitana em diferentes modalidades de dias, por um preço muito reduzido. José Sá Fernandes não anunciou esse preço que foi possível consensualizar entre os transportadores — até porque agora caberá à Igreja Católica adquirir esses bilhetes para os entregar aos peregrinos que se inscreverem nos pacotes de inscrição que incluem transporte assegurado.

“Conversações com trabalhadores e sindicatos” para evitar greves

Com os transportes públicos como “espinha dorsal” do plano de mobilidade da JMJ, há um fator que pode ameaçar o sucesso da operação: eventuais greves no setor dos transportes na altura do evento. Ao longo dos últimos meses, têm sido várias as greves nas várias empresas de transporte da região de Lisboa, dos comboios aos barcos, passando pelos autocarros. Questionado sobre se há o risco de este clima de insatisfação dos trabalhadores dos transportes se arrastar até à JMJ e se traduzir, eventualmente, em greves durante o evento, José Sá Fernandes garantiu que estão a ser feitos esforços no sentido de o evitar.

“Posso dizer que os operadores estão a conversar e a sensibilizar os seus trabalhadores”, garantiu José Sá Fernandes, salientando que o grupo de projeto do Governo já conversou com todos os operadores da região. “Eles estão a falar com trabalhadores e sindicatos”, assegurou, reiterando: “Trata-se de um evento excecional em que são precisos todos. Está a haver conversações com trabalhadores e sindicatos.

O coordenador do grupo de projeto do Governo para a organização da JMJ disse ainda que está a ser efetuado o plano de saúde, outro dos documentos que serão fundamentais para a organização do evento. Esta quarta-feira foi publicado em Diário da República o despacho que criou a Comissão de Gestão do Plano do Ministério da Saúde, liderada por António Marques da Silva.

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