Na primeira fila da sala do Centro Cultural de Belém onde apresentou o manifesto eleitoral da AD às Europeias, Sebastião Bugalho teve o seu último patrão e o primeiro chefe como candidato político. Francisco Pinto Balsemão (chairman da Impresa, dona da SIC onde foi comentador) e Luís Montenegro ouviram o cabeça de lista mas também Carlos Moedas, que veio dar um cunho de experiência europeia e tentar afastar o eleitorado da direita dos extremos. Bugalho tentou o mesmo, através de um programa centrado na habitação, imigração e nos mais velhos.
A um mês das eleições para o Parlamento Europeu, a disputa eleitoral já vai tensa. Afinal, as últimas legislativas ditaram uma proximidade grande entre PSD e PS, pelo que as contas se fazem ao voto. Na AD a preocupação com o Chega, que disparou nas últimas eleições, salta à vista nos discursos. O de Bugalho, por exemplo, entrou pelo tema da imigração para tentar diferenciar-se de uma linha mais musculada à sua direita e para tentar colocar a tónica na necessidade de “reforço dos mecanismos de imigração legal, para ter a certeza que a imigração ilegal diminui e que não fica entregue a redes de tráfico humano”.”É impossível combater a imigração ilegal sem uma imigração legal que seja levada a sério”, argumentou a este propósito.
Nesta mesma linha de diferenciação com o Chega — e clara disputa do eleitorado que fugiu para aí — o candidato da AD também falou da responsabilidade do exercício de cargos políticos, rejeitando o medo pela “palavra política”. Não falou no Chega (não o fez nunca), mas ouviu-se nas entrelinhas a crítica à lógica populista anti-sistema — que na Europa vem ganhando terreno ainda antes de o ter feito em Portugal.
Já o mandatário nacional Carlos Moedas foi menos discreto nas referências e na tentativa de recuperar votos perdidos para os extremos. O autarca de Lisboa e antigo comissário europeu apareceu no CCB para, em primeiro lugar, usar essa experiência europeia e decretar que há dez anos, quando conheceu Bugalho, o agora candidato “já sabia muito de Europa” — um auxilio contra a crítica de impreparação que o candidato da AD tem enfrentado. Mas também apareceu para dizer muito diretamente aos eleitores da direita (e não só) que quem vota nos extremos acaba a “votar para destruir o sistema” — antes dele a mandatária da juventude, Ana Gabriela Cabilhas, já tinha dito que “os que nunca acreditaram no sonho europeu não podem vir aqui ditar o rumo da Europa”.
O argumento de Moedas vem com conhecimento da causa:”Podem escolher entre a extrema-direita e extrema-esquerda, com uma garantia: vão votar todos da mesma maneira. Os portugueses que votam no Chega, no BE, no PCP, sabem que, na maioria das vezes, o voto no Parlamento Europeu é conjunto e votam em destruir o sistema, todos juntos”. Mas não ficou por aqui e acabou também por dirigir ataques ao PS que “no fundo, já não tem sonho europeu. É mais do mesmo na Europa porque se deixou comprar pela extrema-esquerda e isso diluiu o sonho do PS que nós conhecíamos do passado. Esse sonho já não existe”, acusou o social-democrata.
Mais velhos, habitação e outro “muro mais recente e perigoso”
Para cavar a distância para este lado, o lado socialista, a estratégia social-democrata tem outras armas. Uma delas é a tentativa de entrar pelo eleitorado mais velho, que tem pendido para os socialistas nos últimos anos. E as medidas para este grupo da população ganharam especial peso na intervenção do candidato que que defendeu a criação de um cartão único europeu, Plus 65, “com acesso rápido e privilegiado em serviços públicos e transportes” aos cidadãos com mais de 65 anos.
Isto além da criação de uma rede apoio de financiamento europeu a lares e populações envelhecidas: “Nunca mais um cidadão europeu terá vergonha de ver lares na televisão ou teremos medo de colocar os nossos pais nos lares se assim tiver de ser”. “Faremos tudo para devolver em cuidado o que tivemos em carinho”, prometeu o candidato.
Ainda na disputa com o PS, entra um tema de alta sensibilidade nacional, o da habitação. E foi aí que o candidato aplicou a maior crítica (e mais direta) aos socialista, para dizer que a habitação “é uma competência nacional dos estados. Mas também sabemos quem é que falhou a executar o PRR a tempo de dar resposta a essa crise ao ritmo que deveria”, atirou arrancando aplausos da audiência onde estavam todos os candidatos da lista que lidera, as mais altas figuras do PSD, como Paulo Rangel, Hugo Soares ou Pedro Duarte, do CDS (Nuno Melo) e desta vez até do PPM (Gonçalo da Câmara Pereira).
Neste tema, Sebastião Bugalho comprometeu-se a procurar na Europa “regras a flexibilizar” para responder à crise habitacional, exemplificando com projetos-piloto ou mecanismos para “animar o mercado”. E disse que “simbolicamente” a AD defenderá “a elevação do direito à habitação na Carta dos Direitos Fundamentais da UE. Vamos universalizar este direito”, defendeu.
Outro tema na agenda é o das “transições”, com a Europa a apostar forte nos últimos anos da “transição digital” e na “transição energética” e a viver, mais recentemente, uma onda de protestos por causa das consequências dessa agenda, nomeadamente na atividade agrícola.
Bugalho também quis entrar neste público, ao falar na existência de “um muro mais recente e perigoso que divide os que querem a mudança apenas para a proclamarem e os que pensam a mudança porque a querem colocar ao serviço das pessoas”. E explica: “A nossa candidatura compromete-se com transições para o futuro mas não deixará a Europa desprotegida, nem mais pobre, nem mais isolada em nome de nenhum ideal”.
“A verdadeira transição no digital e energia só é sustentável se for concebida e mantida no espaço Europeu”, defendeu o candidato. “Queremos fazer a transição verde em Portugal e proteger a atividade económica e os portugueses ao lado da transição, apesar da transição e não contra a transição”, argumentou sobre este assunto.
Também não passou ao lado de um tema que ganhou relevância neste último mandato europeu, por causa da guerra na Ucrânia, a defesa. Bugalho surge a liderar uma lista que diz estar comprometida com o aumento das capacidades de financiamento do orçamento europeu nesta área, mas também “o alargamento da força operacional rápida europeia para um novo mecanismo que também inclua médicos, enfermeiros e militares”.
A parte programática acabou por embalar um discurso que começou num emaranhado de agradecimentos sem fim e histórias da vida pessoal de Bugalho. E também pela justificação da famosa gafe das “sete quinas” que disse estarem na bandeira nacional, no seu discurso inaugural na apresentação de candidatura: “Vamos lá ver se hoje não confundo os castelos com as quinas”.