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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Medina ganha sem maioria. Lisboa à beira de uma "geringonça"

O PS ficou a um mandato da maioria na Câmara. O CDS ultrapassou o PSD, mas juntos têm mais lugares do que tiveram coligados. A CDU manteve e o BE conquistou um lugar. A noite e as contas em Lisboa.

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O PS perdeu a maioria absoluta que tinha desde 2009 em Lisboa. Ainda que festeje uma espécie de tetra na Câmara — porque elege um presidente na capital do país pela quarta vez –, a taça que os socialistas ergueram ficou meio vazia. Fernando Medina acabou a noite sem a maioria, mas na declaração de vitória (ainda antes de saber os resultados finais) já tinha feito saber que, desse por onde desse, desejava dialogar com a esquerda na CML e até distribuir pelouros. Agora, para conseguir fazer passar o seu plano para a cidade vai ter de passar desse desejo à obrigação. Uma coisa o socialista deixou já certa, o diálogo não se fará à direita.

Nesse quadrante político, houve dados históricos em Lisboa. O positivo foi para o CDS de Assunção Cristas, que ganhou uma relevância nunca tida até aqui (o CDS teve 20,6%). O negativo foi para o PSD que, com Teresa Leal Coelho à cabeça, caiu numa irrelevância nunca tida até aqui (11,2%). O curioso é que quando concorreram em coligação, em 2013, as duas forças conseguiram eleger quatro vereadores. Agora, se somarmos o número de mandatos que cada um dos partidos conseguiu isoladamente na CML, chega-se aos seis vereadores. Acontece que Medina se mostrou logo à partida pouco sensível ao que a direita pudesse vir a conseguir e é à esquerda que irá procurar uma solução. E aí o que tem?

Uma CDU que conseguiu manter os dois mandatos que tinha — e foi com esta força que o PS acabou a disputar o último lugar, acabando por perder — e um Bloco de Esquerda que conseguiu eleger (pela primeira vez, se não contarmos com a candidatura independente de Sá Fernandes, apoiada pelo BE em 2007) Ricardo Robles. Com Medina a ficar a apenas um lugar da maioria, nem precisa de ir além do Bloco — que durante a campanha deixou a porta aberta a isto mesmo –, no que seria uma semi-geringonça.

Medina esperou até às três da manhã pela maioria que não chegou

Medina enquanto esperava pelos resultados finais, numa sala do 13º piso do Hotel Altis

Às 20 horas, Duarte Cordeiro descia para fazer a primeira declaração da noite, baseada nas primeiras projeções. Todas davam a vitória como garantida para Fernando Medina em Lisboa, mas não a maioria absoluta. Ainda assim, o número dois da lista dizia que a candidatura estava “confiante na maioria absoluta”. Mas o nervosismo não demorou a instalar-se e foi-se agravando à medida que a noite avançava e o apuramento final das freguesias tardava. Só já perto das três da manhã é que a candidatura de Fernando Medina soube que não teria maioria. À cautela, o socialista já tinha deixado a promessa de procurar a esquerda para governar na Câmara, distribuindo ate pelouros. O Bloco, que elegeu Robles, é um alvo provável.

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Resultados finais: oito vereadores para o PS, quatro para o CDS, dois para o PSD, dois para o PCP e um para o Bloco de Esquerda. É este o quadro que Medina terá na Câmara para governar. Ficou a apenas um vereador da maioria absoluta que nunca pediu, mas que sempre desejou — no discurso de vitória admitiu isso mesmo, que tinha “expectativa e desejo” de ainda alcançar a maioria até ao fecho dos resultados. Não aconteceu.

Durante a noite eleitoral foram aparecendo, nas vozes dos poucos socialistas que foram falando, todo o tipo de leituras otimistas do resultado em Lisboa. “Um dos maiores de sempre na cidade” e “a primeira vez que o PS elege o presidente da Câmara de Lisboa pela quarta vez consecutiva”, dizia Duarte Cordeiro. Um tetra para os socialistas a que a secretária-geral adjunta do partido, Ana Catarina Mendes, juntou ainda mais um dado: “É o maior resultado do PS numa primeira candidatura” em Lisboa.

Leituras que tentavam ir valorizando a vitória já garantida, protegendo Medina de uma comparação inevitável com António Costa — o dado que Ana Catarina Mendes referiu era o único em que o atual candidato batia o seu antecessor que, na primeira vez que se candidatou em Lisboa, em 2007, ganhou com apenas 29,4%. Mas há quatro anos, o atual líder do PS foi eleito com 50,9% dos votos, o que significou 11 mandatos na Câmara, uma maioria absoluta que não se repetiu.

Quando fez o discurso de vitória, o socialista que venceu em Lisboa ainda não sabia que não chegaria à maioria. Medina foi questionado sobre como governará a cidade e puxou dos dados que foi sempre usando nesta campanha: “Mesmo com uma ampla maioria, 95% das propostas aprovadas em câmara não tiveram oposição”. Mas lá acabou por dizer mais do que até aqui: “Se o Partido Socialista tiver maioria absoluta é minha intenção abrir um processo de diálogo com as várias forças políticas, em particular à nossa esquerda, disponibilizando-me para pactos alargados para a governação da cidade que podem chegar à atribuição de pelouros”.

Por que razão só falou na esquerda? “Os níveis de convergência com os partidos à esquerda são bem superiores aos da convergência com os partidos à nossa direita”. Nas respostas às perguntas dos jornalistas, Medina ainda deixou uma provocação ao CDS de Assunção Cristas, quando foi questionado sobre que relacionamento manterá com a líder democrata-cristã na Câmara: “O relacionamento institucional normal entre forças que ganharam eleições e forças que perderam as eleições”.

A declaração do vencedor da Câmara de Lisboa já surgiu muito tarde, passava da meia-noite, com Medina a querer ter mais segurança no resultado final quando se dirigisse ao púlpito instalado no piso -1 do Hotel Altis. Entretanto chegou António Costa, que veio a pé da sede nacional do PS, no Largo do Rato, para comemorar com o seu sucessor na Câmara. O líder socialista deu-lhe um abraço à entrada do hotel, onde Medina já o esperava, e falou aos jornalistas numa “grande vitória a nível nacional, uma grande vitória em Lisboa, uma grande vitória em vários concelhos, muitos deles eram bastiões do PSD. É uma grande vitória do PS não só nos centros urbanos, mas em todo o território nacional”.

Àquela hora, a Fernando Medina restou fazer um discurso aberto, apenas fechado numa única perspetiva: mesmo com maioria, procuraria acordos, mas não com a direita. Depois subiu de volta ao 13º piso do Hotel Altis, onde ficou noite dentro à espera do que não viria. Longe ficava a declaração das 20 horas, do número dois da sua lista, Duarte Cordeiro, e da “confiança na maioria”. E justificados ficaram os murmúrios hesitantes na sala do Altis entre os poucos apoiantes que ali estavam a ver as projeções nessa altura: “Tem ou não tem maioria?”. A resposta negativa ainda tardaria seis horas a chegar.

Cristas foi mesmo “a única” mulher. Seis dedos e um CDS em bicos de pés

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Há quatro anos, Paulo Portas entrava na sala do largo da Caldas com a mão direita aberta, em jeito de “cinco já cá cantam”. O CDS conquistava o “penta”, com cinco câmaras ganhas em todo o país. Quatro anos depois, a sucessora de Paulo Portas levou a melhor acrescentando um dedo da outra mão: o CDS ganha mais uma câmara, Oliveira do Bairro. Assunção Cristas até foi à janela anunciar. Era o “hexa”.

A euforia era muita, e não era para menos. “É melhor resultado para o CDS em Lisboa desde 1976”. O CDS não só “superou os objetivos”, como provou que a estratégia que seguiu, e que foi arriscada, estava certa. Certa no Porto ao apoiar Rui Moreira (que garantiu a maioria absoluta), e sobretudo certa em Lisboa, onde Cristas decidiu não esperar pelo PSD, que estava preso a um putativo candidato e preso ao “diabo” das legislativas que viriam e não vieram. Assunção Cristas cantou vitória muito cedo, antes das 22h, e a noite foi de festa no Largo do Caldas. No final, era vê-los a deitar os últimos foguetes. “São três ou são quatro [em Lisboa]?”, “ganhamos as Avenidas Novas?”, comentava um grupo pouco conhecido do partido, agarrado aos telemóveis mas mais a receber mensagens de felicitações do que outra coisa. Como barulho de fundo, Pedro Passos Coelho falava em direto nas televisões e admitia não vir a recandidatar-se nas diretas do partido. Pouco importava, a festa era do CDS.

Assunção Cristas e o seu núcleo duro, contudo, viu a declaração do líder do PSD numa sala resguardada e acompanhou com atenção. A derrota de um pode ter sido a vitória de outro, e é tempo de capitalizar esse ganho. O resto, logo se vê. Ao início da noite, quando as sondagens começaram a dar a candidata do PSD em Lisboa atrás do candidato da CDU, o sentimento até era de “consternação”. Assunção Cristas sabe que, no que toca a legislativas e a soluções de governo, o CDS não vale sozinho e é preciso contar com a soma das partes. Mas isso não quer dizer que o CDS não possa ser cada vez mais forte e repetir no país o que fez na noite autárquica em Lisboa.

“Em Lisboa somos certamente os líderes da oposição, no país trabalharemos para ser também”, disse Assunção Cristas em cima de um palco montado na rua, no largo Adelino Amaro da Costa. O importante é o CDS “conquistar lugares e crescer para reforçar o centro-direita em Portugal, para o centro-direita ser uma alternativa às esquerdas unidas”, disse ainda quando questionada sobre como ficava a relação de forças entre os dois partidos do centro-direita em Portugal.

Mas Assunção Cristas estava radiante. Com a filha mais nova pela mão, e um núcleo de “jotas” a repetir os cânticos ensaiados até à exaustão, sublinhava que o CDS era agora a “segunda força política em quase todas as freguesias de Lisboa”, tal como se tornou a segunda força política no concelho de Lisboa, triplicando o número de vereadores eleitos. O número quatro da lista, Miguel Moreira da Silva, que por sinal é irmão do ex-ministro do PSD Jorge Moreira da Silva, estava ainda em vias de saber se era eleito ou não, mas não deixava de dizer que o sabor da vitória era “doce”. Nem um bocadinho agridoce pelo cenário de catástrofe que à mesma hora se estaria a viver na São Caetano? “Só doce, cheio de calorias”, diria ao Observador.

Paulo Portas, claro, não foi festejar com a líder do CDS o resultado “histórico” em Lisboa e no país. Mas nem por isso se deixou de falar nele. É que esta noite eleitoral também teve um dedo do ex-líder. “Ele soube sair na altura certa. Bem dizia que era o melhor para ele e para nós, e ele é que tinha razão”, ouviu o Observador nos corredores do Caldas. Agora, o CDS está dois anos à frente do PSD na curva ascendente. E “esta postura só agora está a começar”, vaticinou Assunção Cristas.

Teresa Leal Coelho: uma senhora derrota

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O silêncio foi de velório e durou a noite toda. Os rostos também eram de tragédia. Durante toda a noite, até ao último discurso, as 25 cadeiras em frente ao púlpito estiveram sempre vazias, numa sala em que os jornalistas foram sempre mais do que os apoiantes. Esses ficaram com Teresa Leal Coelho, num espaço reservado, onde a candidata esteve com o marido e alguns candidatos à câmara municipal e à junta de freguesia.

Os apoiantes que se aventuravam pelos corredores do hotel-sede, preferiram olhar para a televisão da sala ao lado — onde viram dois jogos de futebol ao longo da noite — do que para as três televisões da sala onde esteve o púlpito. Logo às oito da noite, as projeções para Lisboa diziam que o PSD já não estaria nos três grandes no concelho: podia ficar em quarto atrás de PS, CDS e até da CDU (o que nem as malditas sondagens apontavam, nem viria a acontecer).

Só uma figura nacional se aventurou deslocar até Belém, ao hotel Palácio do Governador, o local escolhido por Teresa Leal Coelho para a noite eleitoral: Paula Teixeira da Cruz, que é sua amiga (são inseparáveis no Parlamento).

Numa noite em que figuras como a ex-líder do PSD Manuela Ferreira Leite atiraram ao atual presidente social-democrata, José Eduardo Martins — muitas vezes apontado como crítico da atual direção, mas completamente comprometido com esta candidatura autárquica — recusou-se a entrar no coro de críticas a Passos: “Por amor de Deus, a responsabilidade é minha que tinha a cara nos cartazes.”

Quanto à candidata, entrou na sala de fugida e com a voz trémula. Falou menos de dois minutos, ladeada por José Eduardo Martins e o número dois da lista, João Pedro Costa. Apesar de um discurso curto, Teresa Leal Coelho teve tempo para repetir duas vezes que a culpa era “exclusivamente” sua e dos candidatos. Sempre leal a Passos Coelho, a vice-presidente do PSD afirmou que “o resultado é exclusivamente da responsabilidade da equipa que apresentou o programa”. Pelo quartel-general improvisado, alguns dos membros do staff de Leal Coelho não conseguiam esconder o azedume para com Assunção Cristas: “Está a falar como se tivesse ganho. E ficou em segundo. Agora vai para a varanda. Deve achar que é a Evita Perón do Caldas”, comentava um deles.

A própria Teresa Leal Coelho mandou uma indireta a Assunção Cristas, dizendo que saudava “Fernando Medina” porque ele era “efetivamente o vencedor”. Confessou ainda que falou com o reeleito presidente de câmara pelo telefone. “Só posso saudá-lo pelo resultado que conseguiu atingir.”

A sala esteve quase sempre em silêncio, mas já Teresa seguia de carro — com José Eduardo Martins — em direção à São Caetano à Lapa, quando Paula Teixeira da Cruz subiu o tom de voz para defender Passos Coelho. A ex-ministra da Justiça diria aos jornalistas em Belém — antes de Passos falar na Lapa e admitir que pode não ser recandidato à liderança — que “não há alternativa a uma pessoa séria, a alguém que lutou pelo país e que o pôs a crescer depois de uma bancarrota”. Paula Teixeira da Cruz lembrou Churchill — até ele perdeu as eleições depois de derrotar Hitler — e afirmou que “pode-se sair derrotado em muitas batalhas, mas a guerra é outra coisa.”

A candidata acabou de falar às 22h15 e meia hora depois já a sala estava limpa, sem um único sinal de que tinha ali existido um evento do PSD. Ficaram para trás duas militantes que se abraçaram muito quando uma delas trouxe uma informação do piso debaixo: “Ganhámos a Estrela”.

Teresa Leal Coelho já estava na sede do PSD, onde se encontrou com Passos Coelho. José Eduardo Martins também, mas acabaria por sair 15 minutos depois, após falar com o líder e dar um abraço prolongado a Leal Coelho. Tinham sido verdadeiros compagnons de route nesta campanha. Mas não conseguiram a tal senhora Lisboa. A noite em Belém foi antes o espelho, triste, de uma senhora derrota: o pior resultado de sempre do PSD em Lisboa.

João Ferreira: podia ter sido a boa notícia da noite

Ao centro de trabalho Vitória, na Avenida da Liberdade, foram chegando ao longo da noite as más notícias para o PCP

Parecia que adivinhavam. Na sede do PCP em Lisboa, no mítico edifício Vitória, os aplausos dos militantes comunistas ouviram-se muito de tempos a tempos, e por não mais que meia dúzia de vezes ao longo da noite. Nas eleições autárquicas em que o PCP perdeu dez câmaras para o PS, João Ferreira foi uma espécie de réstia da esperança comunista que durou algumas horas – estava em terceiro lugar na capital, à frente do PSD, quando passavam dez minutos da uma da manhã.

Agarrado ao telemóvel, a fazer atualizações constantes dos resultados oficiais, um dos militantes comunistas desabafava. “Isto foi muito mau”. Sentados às mesas, com os olhos postos nos três ecrãs montados junto ao bar do edifício, na Avenida da Liberdade, a maioria seguia os resultados por ali. As perspetivas em Lisboa davam alguma alento, mas não escondiam a derrocada eleitoral.

As minis hidratavam as gargantas secas. As sandes de carne assada competiam com o arroz doce, com a foice e martelo desenhados a canela. Era preciso forrar o estômago para notícias duras que se faziam anunciar.

Quando entrou no salão do centro de trabalho Vitória, com o palanque ao fundo, João Ferreira deu de frente com a faixa branca e a inscrição a vermelho “A força necessária – CDU”. Se a questão era de força, foi ela, para o PCP, a ausência mais notada neste primeiro dia de outubro. Na sala, o eurodeputado que se voltou a lançar numa corrida à capital já tinha à sua espera um grupo de quarenta jovens militantes. Só nesse momento, minutos depois das dez da noite, as bandeiras se agitaram pela primeira vez. Parecia que adivinhavam a hecatombe nacional.

Sozinho, frente a frente com as câmaras, o cabeça de lista da CDU vinha com um alvo em mente: a comunicação social. Foi a comunicação social a responsável, acusou Ferreira, por “silenciamentos ostensivos da campanha da CDU” e pela “desproporcionada promoção de alguns” que também disputavam um lugar na câmara da capital.

E, ainda assim, com esse “quadro político consideravelmente mais difícil que há quatro anos”, àquela hora ainda se admitia a “possibilidade de um cenário muito provável de reforço da CDU em Lisboa”. João Ferreira agarrava-se à “possibilidade” de o partido fechar o pódio na capital. Até às primeiras horas da madrugada, tudo apontava nesse sentido. Com um terço das freguesias apuradas, o comunista seguia em terceiro lugar, à frente de Teresa Leal Coelho.

Esse alento levou, aliás, o candidato comunista a prometer “pesar” nos destinos do governo da cidade nos próximos quatro anos. Os campos de debate com Medina eram lançados ali mesmo para cima da mesa: habitação, mobilidade, transportes públicos, serviços municipais, apoio à juventude e aos idosos, aposta na educação. Percebia-se o discurso do PCP. O entendimento com o PS está em aberto – basta recordar a disponibilidade assumida pelo candidato, já no fecho da campanha eleitoral, quando disse estar pronto para “assumir todas as responsabilidades” no governo da cidade.

Mas a esperança de um terceiro lugar morreria passadas algumas horas. E não só o PSD alcançava o terceiro lugar (ainda com dados provisórios) como o BE colhia os frutos da campanha de Ricardo Robles: mais 2300 votos que os alcançados na eleição de há quatro anos, uma distância de cerca de 2000 boletins para o PCP.

Não sendo sequer a exceção que confirma a regra, Lisboa foi, ainda assim, um dos pontos em que a CDU saiu reforçada. A coligação tinha, ao início da madrugada, mais 400 votos do que os conquistados nas autárquicas de 2013.

A noite (e o banho de champanhe) de Ricardo “Xeca” Robles

Depois de um início de noite auspicioso, com uma primeira explosão de alegria logo às 20h00, quando as televisões começaram a dar como mais do que provável a eleição do homem que todos tratam por “Xeca”, que é como quem diz Ricardo Robles, como vereador em Lisboa, a noite amornou na sede improvisada para a noite eleitoral do Bloco de Esquerda.

Foram longas as horas a aguardar resultados concretos. Tão longas que nem a hecatombe de PSD conseguiu animar a espera — nem uma vaia, nem um apupo, nem um comentário trocista quando o ex-primeiro ministro surgiu num dos três ecrãs montados na sala José Saramago do Palácio Galveias, em Lisboa. Seria preciso Catarina Martins subir ao palco, por volta das 23h45 da noite, para se ouvir alguma coisa a esse respeito: “O PSD há-de fazer a sua própria análise, a direita, no seu conjunto, perdeu”, disse a coordenadora e exultaram os bloquistas.

Valeu a escolha do edifício, sede de uma das bibliotecas municipais da cidade, para garantir uma passagem mais agradável do tempo: enquanto Catarina Martins e Ricardo Robles se mantinham refugiados numa sala à parte, os bloquistas (e respetivos filhos: a do BE foi seguramente a noite eleitoral mais kid friendly destas autárquicas, tantas eram as crianças e bebés presentes) foram vendo o clássico Sporting-Porto e despachando imperiais (a certa altura acabou o barril e passaram às minis), tostas e tremoços no jardim exterior, como que numa das esplanadas do Largo do Intendente — mas sem preços para turista.

Ao longo da noite, chegou a falar-se na possibilidade de uma segunda vereadora para Lisboa, Rita Silva, da associação Habita, apoiada pelo Bloco. E nas hipóteses de eleição de vereadores para Porto, Sintra, Odivelas, Coimbra, Funchal e Borba, mais dois ambicionados primeiros lugares nas autarquias de Torres Novas e de Salvaterra de Magos — Ana Cristina Ribeiro foi presidente de Câmara desta última entre 2001 e 2013, perdendo então a única autarquia bloquista do país para o PS, e este ano voltou a candidatar-se.

Ricardo Robles foi eleito vereador pelo Bloco de Esquerda para a Câmara de Lisboa

Inácio Rosa/LUSA

Quando finalmente, ainda com resultados por apurar, Catarina Martins se aproximou dos microfones, soube-se que parte desses objetivos não tinham sido cumpridos. “Não ganhámos nenhuma Câmara, não ganhámos Torres Novas e não conseguimos impedir as maiorias absolutas”, reconheceu, depois de festejar o crescimento do partido em “número de votos e de eleitos”, sob uma efusiva chuva de aplausos.

Assumindo uma “presença modesta nas autarquias”, a coordenadora nacional do Bloco de Esquerda — que, ao contrário do que chegou a ser anunciado aos jornalistas, não esperou que Pedro Passos Coelho acabasse de falar para subir ao palco — congratulou-se com a eleição de um vereador — que não nomeou — em Abrantes e com a de Ricardo Robles, em Lisboa. “É a garantia de um vereador de esquerda a tempo inteiro na Câmara Municipal de Lisboa”, afirmou.

Não enumerou, mas minutos antes fonte oficial do Bloco já tinha garantido que, a juntar a “Xeca” e a Armindo Silveira (assim se chama o candidato à Câmara de Abrantes), o partido tinha conseguido eleger mais quatro vereadores. Dois em Salvaterra de Magos, outro em Torres Novas e um último no Entroncamento — eram os resultados apurados às 23h30. Em 2013 o partido conseguiu eleger 8 vereadores.

É a primeira vez, desde a eleição de Ricardo Sá Fernandes, independente apoiado pelo Bloco, em 2007, que o partido alcança um lugar no executivo camarário de Lisboa. Ricardo “Xeca” Robles, de 39 anos, assumiu a vitória pouco depois das 23h00: “Há uma grande novidade na cidade de Lisboa, o Bloco de Esquerda está na Câmara Municipal”. Repetindo as grandes bandeiras da campanha — habitação e transportes –, o engenheiro civil, pai de um rapaz de 4 anos e de uma rapariga de 2, garantiu que ia “assumir o mandato por inteiro”: “Nos próximos quatro anos, Lisboa vai ser a minha prioridade”.

Se as sondagens já deixavam antever o resultado, no Bloco ninguém cantou vitória antes da contagem dos votos, ou não estivesse a lembrança das autárquicas de 2013, em que o coordenador nacional João Semedo ficou a umas meras 52 cruzes da eleição, ainda na fresca na memória.

Quando, depois da meia-noite, a eleição se mostrou garantida, apareceram as garrafas de champanhe, com as fotografias do candidato coladas: “É a esquerda caviar”, gracejou Ricardo Robles, segundos antes de lhe despejarem uma delas pela cabeça abaixo. “Vou ficar doente. Vereador a tempo inteiro… estou a ver os jornalistas a ligarem para lá amanhã: ‘Ah, não está’”.

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