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"Emergirão novas perspetivas, determinadas por outro tipo de fatores que não aqueles que determinam a geopolítica europeia", diz o autor
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"Emergirão novas perspetivas, determinadas por outro tipo de fatores que não aqueles que determinam a geopolítica europeia", diz o autor

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

"Emergirão novas perspetivas, determinadas por outro tipo de fatores que não aqueles que determinam a geopolítica europeia", diz o autor

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Miguel Morgado: "O mundo euro-americano vai deixar de ser hegemónico"

Num novo livro, Miguel Morgado analisa e a história e a evolução da geopolítica como produto europeu. Em entrevista, fala sobre uma forma política imposta pelo mundo e que agora perde o seu poder.

Guerra, Império e Democracia — A ascensão da geopolítica europeia. É este o nome do novo livro de Miguel Morgado, ex-deputado do PSD e assessor político de Passos Coelho, que mostra bem ao que vem. Depois de livros sobre a autoridade ou a soberania, Miguel Morgado volta-se, das formas da ordem política interna, para os modelos políticos de relação entre os países.

Trata-se de um problema complicado, visto que o livro procura traçar a genealogia de uma ideia aparentemente contraditória: como é que a Europa procurou impor ao mundo uma forma política cuja principal fonte de legitimidade vem do facto de não ser imposta? Como é que se forma um “império” a partir da ideia de Democracia, e como é que este império nasce, filho de ideias tão distintas como o proselitismo religioso ou a vontade de assegurar a defesa das fronteiras?

Miguel Morgado parte da situação atual, em que a China e a Índia procuram recuperar a hegemonia geostratégica que tiveram até ao advento da modernidade e recua até à democracia grega para tentar perceber a riqueza deste património especificamente europeu que é a sua geoestratégia.

O livro trata claramente – aliás, está logo no título – das relações entre democracia e geopolítica. No entanto, estas parecem ser duas coisas contraditórias. A democracia, na ideia de que o homem é o único objeto da política, não recusa a ideia de geopolítica?
Tento demonstrar no livro que uma aceção ampla de geopolítica inclui não só aquilo que normalmente interpretamos como geopolítica – a interação fáctica entre vários fatores que, nesse caso, transcenderiam a vontade humana, como a geografia, a demografia, grandes oscilações e movimentos históricos – mas também mais do que isso. A geopolítica é também uma perspetiva, porque há várias, sobre o modo como o homem se situa numa política mais vasta do que a da sua pequena comunidade local. Nesse sentido, quis contar a história desta relação a partir de um ponto de vista que nasce na Europa. Daí eu dizer que este é um livro que tenta explicar a ascensão da geopolítica europeia. Uma perspetiva que é fundada há 2500 anos e que, contra todas as expectativas, não só cresce, desenvolve e forma as suas estruturas espirituais, culturais e políticas, como se torna dominante no mundo. Esse é um desenlace histórico que se consuma no século XIX – contra todas as expectativas, dado que há 2500 anos aquilo a que mais tarde se chamou Europa era um canto pobre do mundo civilizado.

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Isso traduziu-se numa perspetiva que é diferente de todas as outras perspetivas geopolíticas.
Mais, as diferenças entre a perspetiva europeia e as outras foram decisivas para contribuir para a sua hegemonia nos séculos XIX e XX. E uma dessas diferenças é de facto a invenção de um regime político. Não o império, com o qual a geopolítica também estará sempre a namorar, mas que não é uma forma política inventada na Europa – é até uma forma importada da experiência de resistência ao império Persa – mas a forma democrática. A Europa inventa um regime novo, que terá muitas derrotas ao longo da história, mas que nunca deixou de estar presente na sua consciência. E há outro ponto ainda mais interessante: é que, mal a democracia é inventada, é de imediato associada à forma imperial. A preponderância, na geopolítica europeia, da questão do regime político – nesta modalidade tão particular – vai perdurar até aos nossos dias, na medida em que se Atenas se funda como democracia e imediatamente como um império também (um império talassocrático, que constitui uma espécie de esfera de influência sobre muitas cidades-estado), também a democracia reinterpretada pelos modernos, particularmente no que diz respeito à fundação de uma república nova na América, se torna imediatamente uma democracia imperial.

Nessa ideia de uma república ou de uma democracia imperial, parece que há uma contradição entre a perspetiva interna – a democracia serve para dentro, para os cidadãos de certo país – e a perspetiva externa, que já impõe um tipo de regime. Como é que isso não gera conflitos?
Conflitos gera sempre. Tensões, muitas. Algumas foram e são fonte de sofrimento e crueldades, outras são fonte de enriquecimento. Tento contar uma parte dessa história, que é muito complexa, na realidade americana. Para se ver como as autointerrogações que os regimes políticos fazem, dentro desta realidade europeia e proto-europeia hegemónica, têm um impacto direto no modo como se interpreta o mundo e a geopolítica, tento contar a história da invenção da ideia – geopolítica, de organização do espaço mundial – de um hemisfério ocidental e de um hemisfério oriental. Os Estados Unidos, com o propósito de consolidar a expansão da sua república no início do século XIX e formar um império, com a expansão territorial até à costa do Pacífico e uma influência decisiva sobre as repúblicas nascentes na América Latina, constroem um novo imaginário do planisfério.

"O mundo que vamos ter daqui para a frente será muito diferente. Emergirão novas perspetivas, o mundo euro-americano vai deixar de ser hegemónico, determinadas por outro tipo de fatores que não aqueles que determinam a geopolítica europeia."

Através daquilo que ficou conhecido como a doutrina Monroe.
Precisamente. Que tem o nome do presidente Monroe, mas que foi na verdade teorizada por um grande homem, que eu também foco no livro e que também chega a presidente dos Estados Unidos, chamado John Quincy Adams. A constituição de um bloco Ocidental não significa apenas que a Europa não pode entrar na América e no Pacífico, significa uma nova representação do imaginário geopolítico em virtude de um regime político. Ora, estas derivações podemos encontrar em vários momentos da história da geopolítica europeia. Foquei-me no caso dos Estados Unidos porque também é interessante ver como desta ideia europeia brota uma potência nova; e este livro também aparece nesta altura para marcar uma espécie de ponto de separação entre o mundo e a geopolítica que foram fundados a partir desta ideia europeia, e que agora chegou ao fim, e o mundo que vamos ter daqui para a frente, que será já muito diferente. Emergirão novas perspetivas, o mundo euro-americano deixará de ser hegemónico, determinadas por outro tipo de fatores que não aqueles que determinam a geopolítica europeia.

Partindo do caso da doutrina Monroe: se a doutrina pode ser tão moldada pelas circunstâncias, continua a haver doutrina? É possível haver geopolítica quando verificamos que as considerações se formam numa ordem de tal modo abstrata que podem significar tudo e o seu contrário?
Um dos pontos interessantes aqui é estudar-se sem ideias pré-concebidas qual é exatamente o movimento da dialética entre a vontade humana e a força das circunstâncias (digamos assim, para simplificar). Desde que a consciência europeia se forma, na Grécia Antiga, que se debate entre um polo e outro. Entre a ideia de que a vontade humana é totalmente ineficaz, dependente, como se dizia no século XIX, de leis históricas ou materiais impessoais, e as vozes que reclamam o contrário. Que é verdade que somos condicionados pela nossa geografia, pela demografia, pela torrente dos acontecimentos históricos, mas que isso nunca determinaria completamente a capacidade de o homem e a sociedade decidirem, pelo menos em parte, o seu futuro. As duas ideias estão presentes na consciência europeia e nunca uma predomina sobre a outra a ponto de a apagar. Mantêm-se sempre as duas teses vivas. Em grande medida, a riqueza da consciência europeia faz-se disso, de ter havido um debate incessante entre estas duas posições. O que acontece também na ascensão da geopolítica europeia é precisamente o facto de aparecer uma perspetiva política no mundo que diz que a vontade humana não é ineficaz. Essa é que é a grande novidade. Nesse sentido, também me parece que a ascensão da geopolítica europeia está ligada ao seu desejo democrático.

A construção de um novo imaginário do planisfério ficou conhecida como a "doutrina Monroe", mas foi na verdade teorizada por John Quincy Adams (na foto)

Parece-me possível contestar que a geopolítica moderna, dominada pelos Estados Unidos, é no fundo uma continuação da geopolítica europeia. Quando a Europa está concentrada em si própria, um dos pontos capitais da organização do espaço é precisamente a importância das descontinuidades geográficas. É importante dividir a Península Ibérica para que o acesso ao mediterrâneo não seja dominado por uma potência. É importante para os Ingleses apoiarem a candidatura de D. Afonso V ao reino de Castela para não se formar um bloco hispano-franco no centro da Europa. É uma perspectiva muito diferente dos “blocos” americanos e da política alicerçada em unidades geográficas. Isto não é uma diferença decisiva?
Diríamos à partida que sim, mas tento demonstrar que não. Porquê? É por isso que procurei apresentar o livro sob a forma de uma cronologia regressiva. Começar a história no momento presente e ir regredindo até àquilo que me parece ser a origem de tudo isto, a batalha de Salamina. Os Estados Unidos são fundados num continente, com uma forma política e uma forma económica que são indubitavelmente europeus. Os Estados Unidos nascem como um ramo da família europeia e perfilhando a mesma visão geopolítica, na medida em que ela resulta de uma processo de colonização. Mas mais importante do que isso, o que tento mostrar é que há uma descontinuidade geográfica que na verdade vai ser formadora da consciência europeia na Idade Moderna e que surge precisamente de um episódio a que dou toda a importância no livro – a descoberta da América. O facto de os europeus descobrirem um continente que ninguém sabia que existia não tem paralelo com nenhuma outra etapa daquilo a que chamamos “descobrimentos”.

Em que medida?
A experiência do encontro com uma novidade absoluta vai não só transformar tudo na política europeia, como vai levar os europeus a encararem aquele território como uma extensão do seu próprio continente. E a consciência geopolítica europeia é algo tão rico que, no preciso momento em que os europeus querem ver o grande continente descoberto como uma extensão do seu território, nasce a semente da má consciência europeia com a expansão. Foco isso na figura de um grande homem, espanhol, chamado Bartolmé de las Casas. Isso exemplifica bem como é complexa a morfologia da consciência europeia, que sempre foi muito plural. A consciência que diz “a América é nossa” é a mesma que o nega, em nome de valores também eles europeus. Coexistem a vontade imperial e a consciência anti-imperialista — que culminará, no século XX, na descolonização dos impérios – com uma fonte de grande importância na Europa – o Cristianismo, aqui interpretado de um ponto de vista estritamente geopolítico.

"O desígnio da Revolução Americana, como o da Revolução Francesa, é o de emancipar a humanidade como um todo. E o que é muito curioso, para se ver como isto é uma característica europeia, é que há uma justificação da expansão inglesa, logo no século XVIII, que apresenta o Império como o garante da liberdade do mundo."

No campo das ideias, parece não haver distinção entre os conceitos de “colonização” e “esfera de influência”. Quem cria esferas de influência fá-lo com má consciência, como se estivesse a criar colónias, e na partilha de África essa mesma ideia é usada como fonte de legitimidade. Como é que isto acontece?
É uma história muito complexa. Aquilo que me parece ser o ponto de partida para essa discussão é aquilo a que depois se convencionou chamar as Invasões Bárbaras, os grandes movimentos migratórios que levaram tribos germânicas e euro-asiáticas para dentro do Império Romano. Em grande medida, a história da humanidade é feita destas deslocações que tendem a dirimir os seus encontros ou pelo extermínio, ou pela subjugação, ou sob a fusão. Até ao momento em que entra em cena a geopolítica europeia, que começa a tornar mais complexa a história do encontro entre povos. Metem-se no meio valores religiosos, visto que as religiões europeias têm uma natureza evangélica, uma mensagem universalista e deveres de apostolado, coisa que configura os entendimentos que se tem de império ou colonização, e também valores políticos. Isto é, a geopolítica europeia traz a vontade de organizar sociedades com valores políticos e morais de uma normatividade que têm um alcance universal. Isso faz com que o que é especificamente europeu na geopolítica seja a vontade de justificar esferas de influência, impérios, mas também o seu inverso, à luz destes valores políticos. O caso americano é nisto particularmente interessante,

Porquê o americano?
Porque os americanos são sistematicamente acusados de hipocrisia. É curioso perceber que, ainda assim, os Americanos nunca abdicam de procurar justificar os seus atos à luz destes valores. A ideia de que há um país que se sente responsável pelos destinos do mundo em nome de princípios universais que são bens, não só para os americanos, mas também para os destinatários do seu poder, é tipicamente americana – e é ela que produz essa hipocrisia que lhes é apontada. O desígnio da Revolução Americana, como o da Revolução Francesa, é o de emancipar a humanidade como um todo. E o que é muito curioso, para se ver como isto é uma característica europeia, é que há uma justificação da expansão inglesa, logo no século XVIII, que apresenta o Império como o garante da liberdade do mundo. Homens como [Edmund] Burke fazem esta defesa: se a constituição britânica é a mais livre, um império sob a égide dessa constituição será um império da liberdade. E para tornar as coisas mais complexas, à luz desta justificação do Império haverá também pensadores a dizer que se deve dar a independência aos americanos, visto que não estariam a viver à luz dos princípios de liberdade que justificariam o Império. Será também em nome disso que Burke criticará a colonização feita pela East India Company.

A East India Company 8Companhia Britânica das Índias Orientais) foi criada a 31 de dezembro de 1600 e dissolvida a 1 de junhto de 1874

Bridgeman Images

Falámos antes das migrações bárbaras, que trazem para a Europa uma ideia peculiar. O direito romano é um direito de espaço, de quem está para cá da fronteira; o direito visigótico é pessoal, a vassalagem é uma relação pessoal. Eu posso migrar, mas continuo a ser vassalo do rei que está noutro sítio. A geopolítica europeia é, em certa medida, herdeira de Roma, feita de espaços. Não vemos, hoje, um regresso desta ideia visigótica nas comunidades que migram para os países europeus ou para os Estados Unidos e que continuam a funcionar como comunidades próprias? Não estaremos a assistir ao ressurgir de um princípio geopolítico em que a geografia física não é tão importante?
Preferiria ver a formação da perspetiva europeia como uma síntese dos contributos dos povos bárbaros com as influências romanas…

Sim, mas mesmo que admitamos que há este lado sintético na perspetiva europeia, quando o foco da geopolítica migra para os Estados Unidos é incontestável que a questão do espaço é mais forte…
Depende. Há de facto uma história complexa, que é a da relação com a fronteira. A ideia imperial é mais estranha de fronteira fixa do que qualquer outra organização política. O império supõe que a fronteira é mais flexível do que um Estado democrático. Isso é muito visível no confronto entre os Persas e os Atenienses e os espartanos. De certa maneira, a ideia imperial traz consigo a ideia da vassalagem pessoal, sempre. É irrelevante a nossa língua, cor de pele ou religião: somos súbditos do império porque somos súbditos do imperador. A ideia imperial dispensa a ideia de fronteira. Estamos habituados a associar império e fronteira, na medida em que os impérios dos últimos 200 anos já nascem à luz de uma ideia estabilizada de fronteira na consciência europeia, mas diria que isso seria uma espécie de anacronismo nesta discussão.

"Há um debate que dura até hoje sobre o estatuto de cidadania das populações dos territórios que são administrados diretamente pelos Estados Unidos. É um debate que até se nota na cartografia, onde nos mapas dos Estados Unidos não aparecem as centenas de ilhas que estão sob administração direta daquele país."

Como por exemplo…
Como por exemplo, Atenas. Não tem fronteiras no sentido que hoje atribuímos à palavra; no entanto, há uma identificação espacial do que pertence a Atenas. Quando Atenas se democratiza, uma das grandes reformas é que só pode ser cidadão pleno ateniense quem puder mostrar que é filho de pai e mãe Ateniense. Quer isto dizer que a democracia traz consigo uma tentativa de estabilizar a jurisdição no espaço e nas características partilhadas necessárias para se participar na vida democrática. Isto também se verá mais tarde. Há um debate que dura até hoje sobre o estatuto de cidadania das populações dos territórios que são administrados diretamente pelos Estados Unidos. É um debate que até se nota na cartografia, onde nos mapas dos Estados Unidos não aparecem as centenas de ilhas que estão sob administração direta daquele país. Aqui se veem as tensões que surgem da tentativa de organizar um império sob valores democráticos. E isto para não falar do grande precedente romano.

Quando Dante fala de Imperium, diz que Roma tem o império do mundo porque todos a imitam. Não administra, mas manda nas consciências dos territórios que a querem imitar. Neste sentido da palavra, também se percebe que, durante a cortina de ferro, os comunistas falassem de um imperialismo americano neste sentido mais lato, em que todos os estados que imitassem o modo de vida americano estivessem sujeitos ao seu império. Agora, do ponto de vista geopolítico, estas comunidades que se veem muito hoje, e que parecem “deslocadas” no espaço, não trazem um novo princípio geopolítico, que colide com a ideia democrática de definição do seu espaço?
O mundo sempre se organizou assim. No espaço coexistem sempre comunidades com conceções do bem totalmente distintas e que muitas vezes não querem ter relações umas com as outras precisamente por causa disso. Agora, a Europa criou uma modalidade de organização que é a da uniformidade da jurisdição do poder político. Não falo disso neste livro, mas falei noutro que publiquei, chamado Soberania. A ideia de soberania, também ela especificamente europeia, pretende afirmar que podemos organizar as nossas comunidades políticas de acordo com o princípio da igualdade, que implica homogeneidade de jurisdição. O que pode estar a acontecer agora, com os grandes movimentos migratórios, é o desmantelamento provável dessa ideia de soberania. A ideia de soberania sempre trouxe consigo a ideia de que a vontade humana é de tal maneira poderosa que consegue organizar socialmente as comunidades sem ter de atender a considerações infra ou extra-políticas: origem cultural, valores religiosos, tudo isso a soberania consegue neutralizar. Se a soberania, entendida neste sentido, entrar em crise, então é preciso ver que haverá a possibilidade de muitos povos se instalarem no espaço europeu e usarem as suas estruturas, sim, mas desaparecerá também com ela a ideia de homogeneidade de jurisdição, que é um valor acarinhado por ser a única forma, pensavam os teorizadores da soberania, de realizar o ideal da igualdade. Há aqui grandes imponderáveis tanto no espaço europeu como fora dele.

"Quando Atenas se democratiza, só pode ser cidadão pleno quem puder mostrar que é filho de pai e mãe Ateniense. A democracia tenta estabilizar a jurisdição no espaço e nas características partilhadas"

Sobre a questão da “Nova Ordem” mundial. Estamos habituados a associar o crescimento económico de alguns atores ao crescimento da sua influência geopolítica. Mas isto traz de facto uma mudança de consciência geopolítica. Isto é, a China ou a Índia trazem um entendimento próprio da geopolítica?
Duas coisas importantes aí: diria, e no livro tento demonstrar, que a ideia de que a acumulação de poder político advém de um crescimento económico é uma ideia especificamente europeia, é uma invenção europeia que fez da Europa o agente político hegemónico do mundo. A Europa inventa uma forma económica que é absolutamente espetacular nos seus efeitos materiais, a que se convencionou chamar capitalismo, que tocou numa fonte de criatividade e engenho humano que transforma o mundo. Levamos vidas que, do ponto de vista material, são incomparáveis com as dos meus avós. E isso é a história de qualquer sociedade que tenha sido atravessada por esta experiência da adoção da forma económica moderna. Temos agora duas potências, a Índia e a China, que eram as grandes potências mundiais no século XVII. Os últimos duzentos anos, para estas potências, são de grande humilhação, e são percebidos como tal.

E estes países tomam consciência de que precisam de imitar os europeus?
Sim, mas não nas suas matrizes culturais e políticas. Antes, na adoção das formas económicas modernas, e fazem-no com um sucesso absolutamente extraordinário, que leva a que possam agora voltar a projetar o seu peso demográfico, alicerçado na tecnologia e na economia. Aquilo a que estamos a assistir é ao retomar dos lugares tradicionais destes países. Agora, se a Europa, como Marx previu, exportou a sua forma económica para o mundo inteiro, não significa isso um garante da sobrevivência das suas formas políticas, espirituais e culturais. Se houve formas religiosas e axiológicas que foram exportadas em virtude da hegemonia política da Europa, agora que essa hegemonia chegou ao fim, teremos a tentativa de consolidação de formas espirituais, culturais e axiológicas com origem em espaços e matrizes não europeus. Quer isto dizer o quê em concreto? Que se o motor exportador da democracia liberal entrou em declínio, teremos um mundo no século XXI mais inóspito para os valores da democracia liberal e para os direitos humanos entendidos à maneira europeia, que tivemos até agora.

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