Nuno Melo está visivelmente cansado quando, no final do primeiro dia de Congresso do PPE, se senta no multiusos Ahoy, em Roterdão, para beber um café. Dirige-se à cafetaria, mas nem essa sorte tem. Já não servem e nem vale a pena contrariar o rigor holandês. É a lei de Murphy prestes a mudar de nome para lei CDS.

Ser um Melo híbrido — metade eurodeputado, metade presidente do CDS — exige um “esforço maior”, já que anda sempre entre Lisboa, Bruxelas e Famalicão, já para não falar nas  “reuniões descentralizadas” noutros pontos do país.

“Tenho liderado não só a partir de Bruxelas, mas em Portugal também”, conta o líder do CDS. E é para Portugal, para o PSD de Luís Montenegro, que envia o primeiro recado em conversa com o Observador: “O CDS vai sozinho a votos nas Europeias e isso não muda com a mudança de líder”.

Melo anima-se assim que começa a falar do CDS, que faz questão de lembrar que é um “partido fundador do PPE”. Para que não restem dúvidas de que se trata de um sinal para o parceiro de coligação de muitas batalhas, acrescenta de imediato: “O PSD não é fundador. Nós somos“.

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O presidente do CDS diz que o resultado das diretas do PSD nada muda no guião que desenhou para o partido: “Tinha boas relações com Jorge Moreira da Silva como tenho com Luís Montenegro”. Apesar desse bom relacionamento, isso não muda a estratégia que definiu quando foi eleito, ainda na era Rio. “O último resultado em legislativas obriga a que o CDS mostre nas urnas que tem peso político próprio.”

Melo diz que uma “candidatura isolada” é aquilo que é a sua “vontade” e o que “do ponto de vista estratégico deve acontecer”, reiterando que é inevitável que o CDS faça “essa prova de vida nas primeiras eleições de círculo nacional”. É um fechar da porta a um acordo pré-eleitoral com o PSD de Montenegro, que também está, naturalmente, pouco interessado numa coligação nas próximas eleições europeias.

O presidente do CDS deixa, no entanto, uma pequena brecha para mudar de ideias se o partido assim o entender. “Faltam dois anos. Dois anos em política são uma enormidade e talvez até tenhamos um Congresso antes das próximas eleições europeias e, por isso, tudo o que digo é com a cautela de quem está a perspetivar a realidade de um partido a dois anos.”

Ainda sobre a relação entre os dois partidos, Nuno Melo diz que “PSD e CDS estão condenados, mesmo na atual conjuntura, a ter boas relações”, lembrando que há “mais de 40 autarquias que são governadas pelos dois partidos e muitas das maiorias alcançadas em autárquicas só foram conseguidas pela junção dos dois”. A relação, comenta, “é histórica, mas também é de agora”.

O presidente do CDS recusa-se depois a fazer mais considerações sobre a liderança de Luís Montenegro porque cometeria uma “deselegância de comentar escolhas que cabem aos militantes do outro partido”. Ainda assim, deseja sucesso ao novo líder do PSD, que não encara como concorrente na disputa de eleitorado.

“O que é importante é que o PSD cresça e o CDS cresça para que, juntos, no espaço político à direita, possam funcionar como uma alternativa verdadeira a um domínio de esquerda que vai sendo muito prolongado.”

Menos de dois meses depois de ter sido eleito, Nuno Melo diz que, como esperava, o “palco político no Parlamento Europeu ganhou uma dimensão política muito maior a partir do momento em que o CDS perdeu a dimensão parlamentar nacional”. Apesar disso, o grande objetivo do CDS continua a ser, assume, o regresso à Assembleia da República, que garante “um espaço mediático diário”.

Um PPE tem “menor relevância nas governações” e a Merkel “que não está aqui”

Sobre o Congresso do PPE, onde conversa com o Observador, Nuno Melo diz que “o PPE, sendo o maior partido no Parlamento Europeu, é neste momento um partido com menor relevância europeia se tivermos em conta as governações”.

O eurodeputado recorda que “os partidos afiliados ao PPE foram perdendo eleições em muitos países onde eram preponderantes e, por isso, o PPE tem atualmente menos peso de Governo, continua a ter peso parlamentar, embora haja uma tendência ascendente em muitos desses países europeus”. Sobre os ciclos que podem a vir a mudar de forma mais favorável para o PPE, Nuno Melo destaca que o Partido Popular em Espanha está a “ganhar músculo”.

O presidente do CDS comenta que o “PPE vive muito uma dimensão continental, que é capitaneada por franceses e alemães, sendo que na Alemanha perdeu eleições e em França os gaulistas têm menos de seis por cento dos votos”.

Nuno Melo diz que “não deixa de ser relevante que no painel de chefes de Governo [que ocorreu no primeiro dia de Congresso do PPE] estivesse um grego, um croata, um holandês e a presidente do Parlamento Europeu, uma maltesa. Isto é relevante numa Europa que usualmente é tratada pela dominada pelo eixo franco-alemão, mas que não se vê no PPE”.

Nuno Melo lembra ainda que o grande momento do último Congresso foi “o encerramento da chanceler Angela Merkel, que era o que era na União Europeia. E hoje não está aqui”.