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O plano de Bill Gates para a crise climática — que vai matar cinco vezes mais que a pandemia

Num novo livro, Bill Gates sugere um guia para entender e combater as alterações climáticas. Da energia à mobilidade e à alimentação, o milionário e filantropo fala para cidadãos, governos e empresas.

Quando, em abril de 1975, fundou a Microsoft com Paul Allen, Bill Gates não imaginava que quatro décadas depois teria abandonado uma vida dedicada ao desenvolvimento de software — da qual resultou a conceção da empresa fundadora do mundo tecnológico digital moderno — para se dedicar ao investimento em causas sociais. Frequentemente considerado a pessoa mais rica do mundo (atualmente em segundo lugar atrás de Jeff Bezos), Bill Gates já não tem qualquer cargo executivo na Microsoft e ocupa-se a tempo inteiro, com a mulher, da Fundação Bill e Melinda Gates, a maior fundação privada de caridade a nível global, com investimentos sobretudo na área da educação e da saúde global.

Nos últimos anos, o fundador da Microsoft dedicou-se também ao estudo das alterações climáticas e ao investimento em soluções globais. No livro Como Evitar um Desastre Climático — publicado esta semana em todo o mundo e com edição portuguesa pela Ideias de Ler —, Gates diz que foi o “problema da escassez energética” que o alertou em primeiro lugar para o grande desafio climático da história moderna: a desigualdade no acesso aos recursos. Quando viajava pelos países mais pobres na África e na Ásia, para “aprender mais sobre mortalidade infantil, SIDA e outros grandes problemas”, inquietou-se com o que via da janela do avião: “Porque está tudo às escuras? Onde estão as luzes que se veem em Nova Iorque, Paris ou Pequim?”

O livro "Como Evitar um Desastre Climático" saiu esta semana em Portugal pela Ideias de Ler

A pobreza energética transportou-o para outras dúvidas óbvias. “Como é difícil alguém manter-se saudável se as clínicas locais não podem armazenar vacinas porque os frigoríficos não funcionam“, questiona-se Bill Gates no livro — uma pergunta que, com a pandemia da Covid-19, ganha uma nova atualidade. O estudo das desigualdades globais no acesso à energia levou o milionário a focar grande parte do seu investimento no estudo e na procura de soluções para o problema de fundo: as crescentes emissões de gases com efeito de estufa, que ao longo dos últimos dois séculos têm provocado um aumento significativo da temperatura média do planeta, com consequências dramáticas para a vida humana, sobretudo nas regiões mais pobres do globo.

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Em Como Evitar um Desastre Climático, Bill Gates traça um itinerário com um objetivo claro: reduzir as emissões poluentes a zero. “Se não pararmos de lançar emissões de gases com efeito de estufa na atmosfera, a temperatura média do planeta continuará a subir”, diz o milionário, comparando o problema a “uma banheira a encher lentamente: podemos diminuir o fluxo da água na torneira ao ponto de o converter numas pingas, porém, a banheira continuará a encher e, com o passar do tempo, acabará por transbordar”. Não basta, portanto, reduzir as emissões. “A única solução válida é acabar com todas“, diz Gates.

As cinco mudanças que a Humanidade tem de fazer para evitar uma mortalidade cinco vezes superior à da pandemia

O milionário recorre à comparação com a pandemia da Covid-19 para explicar o impacto das alterações climáticas na vida humana. “Se quiser imaginar os danos que podemos esperar das alterações climáticas, olhe em volta e imagine o sofrimento atual a prolongar-se durante muito mais tempo. A perda de vidas e o impacto económico causados por esta pandemia encontram-se ao nível do que acontecerá com regularidade se não eliminarmos as emissões de carbono”, assevera Bill Gates. Feitas as contas à mortalidade direta causada pela pandemia e aos valores e à mortalidade provocada pelos efeitos das alterações climáticas — e os números são concretos, como explicava recentemente o diretor-geral da OMS —, chegaremos provavelmente a 2100 com uma crise climática cinco vezes mais mortífera do que a atual pandemia.

"A coisa mais importante que temos de fazer para evitar um desastre climático é descobrir como poderemos colher os benefícios da eletricidade, tal como a conhecimentos, sem a emissão de gases com efeito de estufa"
Bill Gates

Bill Gates centra o novo livro no caminho que é necessário percorrer — entre os atuais 51 mil milhões de toneladas de gases de efeito de estufa emitidos todos os anos no planeta Terra e o objetivo zero. Para o filantropo norte-americano, há cinco aspetos da vida comunitária que a Humanidade precisa de mudar radicalmente, uma vez que são esses cinco aspetos os responsáveis pelas emissões de gases com efeito de estufa para a atmosfera.

1. Como nos mantemos ligados (27% das emissões)

Gates começa por falar do problema da eletricidade. Por um lado, é um “milagre” pelo qual estamos “apaixonados”, uma vez que permite o funcionamento de praticamente todos os serviços de que necessitamos no dia-a-dia. Por outro lado, os processos associados à produção e ao armazenamento da eletricidade são responsáveis por mais de um quarto das emissões de gases com efeito de estufa a nível global. “A coisa mais importante que temos de fazer para evitar um desastre climático é descobrir como poderemos colher os benefícios da eletricidade, tal como a conhecimentos, sem a emissão de gases com efeito de estufa”, diz Gates, que propõe a produção de eletricidade sem emissões de dióxido de carbono — designadamente através do “promissor” método da fusão nuclear, da instalação de eólicas offshore ou do recurso à energia geotérmica — e a aposta em novos modelos sustentáveis de armazenamento de energia, como o recurso ao hidrogénio verde.

O que é, como funciona e porque está a ser polémico. 9 respostas para explicar o hidrogénio verde

2. Como produzimos (31% das emissões)

Em segundo lugar, Bill Gates aborda a questão dos materiais que usamos todos os dias na construção das cidades humanas, de entre os quais se destacam o betão, o cimento, o aço e o plástico. Apesar de todos eles serem, diz o empresário, maravilhas da tecnologia que permitiram à Humanidade um progresso rápido da organização social, a produção dos próprios materiais é responsável por um terço das emissões globais de dióxido de carbono. A propósito do exemplo da produção do aço (que passa pela adição de carbono ao ferro), Bill Gates nota o único motivo por trás do atual processo produtivo: “Porque é barato. Se não fosse pelas alterações climáticas, nunca teríamos um incentivo para fazer de outra maneira”. No que toca ao cimento, usado como base do betão, o processo é ainda mais poluente, uma vez que “por cada tonelada de cimento obtida produzimos uma tonelada de dióxido de carbono” — já que é necessário obter cálcio através de uma reação química com a pedra calcária. O pior de todos é mesmo o plástico, que rapidamente deixou de ser um milagre tecnológico para ganhar o estatuto de ameaça mundial — e que tem mais consequências negativas a nível ambiental (como o impacto nos oceanos) do que a nível climático. Como solucionar este problema? Segundo Bill Gates, o melhor modelo para resolver esta crise com origem nos próprios materiais é a eletrificação dos processos de produção, recorrendo a energias renováveis, eliminando grande parte dos subprodutos indesejáveis — o que “vai obrigar a muita inovação”.

De solução milagrosa a ameaça mundial. De onde vem e para onde vai o plástico?

2019 New York Times Dealbook

O milionário já não ocupa qualquer cargo executivo na Microsoft e dedica-se à Fundação Bill e Melinda Gates

Getty Images for The New York Ti

3. Como cultivamos (19% das emissões)

A produção alimentar global é outro dos problemas clássicos no estudo das alterações climáticas e Bill Gates não o deixa de fora da análise. Assumindo que cresceu numa família “louca por hambúrgueres”, o filantropo confessa que deixou de os comer com a regularidade de que gostaria devido ao que aprendeu sobre o impacto da produção de carne no ambiente. Com efeito, há poucas dúvidas sobre o impacto ambiental da indústria pecuária: 14,5% de todas as emissões de gases com efeitos de estufa a nível global têm origem no gado, que ocupa 59% de todos os terrenos agrícolas do mundo. Para produzir um bife de 75 gramas, são libertados oito quilogramas de de gases para a atmosfera. Ao contrário do que propõem os vegetarianos, Bill Gates recusa que a solução realista passe pelo fim da criação de gado — e propõe uma redução significativa do consumo de carne aliada ao investimento em soluções alternativas, incluindo os substitutos de carne feitos a partir de ingredientes vegetais.

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4. Como nos deslocamos (16% das emissões)

A gasolina, diz Bill Gates, “é extremamente potente e estupidamente barata” — e este é um dos principais problemas climáticos da atualidade: ainda não compensa optar por modelos mais sustentáveis de transporte individual. O magnata explica que, apesar de a Humanidade só ter começado a usar combustíveis fósseis há 200 anos, vivemos hoje numa dependência “absoluta” da gasolina e do gasóleo. A primeira proposta de Bill Gates parece óbvia: o carro elétrico. Todavia, o empresário reconhece que o preço de um veículo elétrico é ainda muito elevado, devido aos custos de produção, aos preços das baterias e aos custos associados ao uso, em comparação com os combustíveis baratos, pelo que será preciso esperar algumas décadas para que o mercado se inverta. Gates diz-se também otimista com os biocombustíveis, mas admite os desafios: o preço ainda longe de compensar e a possibilidade limitada de uso em veículos pesados.

5. Como nos mantemos quentes ou frescos (7% das emissões)

Com o aumento da temperatura média do planeta, é expectável nas próximas décadas um aumento do recurso à utilização de equipamentos de ar-condicionado — que são dos principais consumidores de energia de uma habitação vulgar nos países desenvolvidos e uma necessidade imperiosa em determinadas instalações industriais. Até 2050, estima a Agência Internacional de Energia, a quantidade de energia necessária para alimentar os ares-condicionados vai triplicar. Uma grande parte do problema, assinala Bill Gates, poderia ser resolvida logo no momento da compra: um equipamento com mais eficiência energética pode ser mais caro à partida, mas resulta em poupança certa a médio e a longo prazo.

O plano para os governos — e para cada um

Depois de usar grande parte das quase 300 páginas do livro a explicar os cinco aspetos da vida humana que mais contribuem para as alterações climáticas e a propor soluções de fundo, Bill Gates sugere um plano concreto para cumprir a meta mais ambiciosa: a neutralidade carbónica em 2050. O milionário propõe uma ação concreta da parte dos governos e dá sugestões a cada leitor para mudanças no quotidiano que ajudem a alcançar aqueles objetivos.

É necessário "colocar um preço nas emissões de carbono".
Bill Gates

Do lado dos governos, diz Bill Gates, é preciso aumentar a oferta e a procura no mercado da inovação direcionada para o clima, designadamente quintuplicando o investimento na ciência climática e no desenvolvimento de energias limpas; apostando mais em projetos que, embora com alto risco de perdas, possam proporcionar grandes resultados; promover a investigação científica nas áreas mais relacionadas com as necessidades reais; trabalhar de modo mais próximo com a indústria, e usar o seu próprio poder de comprar de bens e serviços para apostar em infraestruturas mais modernas e amigas do ambiente. Do ponto de vista legislativo, Bill Gates salienta a necessidade de incluir as questões ambientais na equação económica. É necessário, diz o empresário, “colocar um preço nas emissões de carbono“, de modo a eliminar artificialmente a grande diferença de custos ainda existente entre as opções sustentáveis e as opções não sustentáveis.

“A curto prazo, o efeito de existir um preço a pagar sobre emissões poluentes é óbvio, dado que um aumento dos preços dos combustíveis fósseis diz ao mercado que haverá um custo adicional associado aos produtos que emitem gases com efeito de estufa”, diz Bill Gates.

No final do livro, o empresário deixa um conjunto de sugestões que os cidadãos comuns podem seguir se quiserem contribuir para os esforços de mitigação da crise ambiental. Bill Gates propõe aos cidadãos que se envolvam nos processos de decisão locais, que optem na medida das suas possibilidades por energias renováveis, que comprem carros elétricos, que experimentem um hambúrguer vegetariano ou que apliquem medidas sustentáveis internas nas suas pequenas empresas.

Apesar do cenário aparentemente negro reforçado pelo ano dramático da pandemia, Bill Gates diz-se otimista, sobretudo depois da mudança de poder na Casa Branca. “Com a eleição de Joe Biden para presidente dos Estados Unidos, o país está preparado para retomar um papel de liderança neste desafio“, diz o empresário. Este fator, aliado ao compromisso da China em atingir a neutralidade carbónica até 2060 e à reunião climática das Nações Unidas agendada para este ano na Escócia, leva Bill Gates a considerar que estão reunidas as oportunidades para fazer avanços significativos na esfera ambiental.

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