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Liz Truss Holds Press Conference After Sacking Her Chancellor
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Oito minutos em palco, caril com gosto a traição e a competição com uma alface. Liz Truss pode não sobreviver até ao Natal

PM britânica demitiu o aliado de sempre e reverteu parte da sua política económica. As sondagens revelam um governo em crise profunda. E o Partido estuda formas de a afastar.

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Kwasi Kwarteng estava em Washington, numa reunião para explicitar as suas políticas ao Fundo Monetário Internacional. O ministro das Finanças de Liz Truss mantinha-se firme, convicto que a política de redução de impostos sem corte na despesa que propunha não seria o desastre que os mercados pensam. Julgava que tinha o apoio da sua primeira-ministra, com quem sempre partilhou a visão de que uma política económica liberal era a única forma de garantir crescimento económico, apesar da inflação galopante e da crise energética que se forma no horizonte. Horas antes, tinha garantido à BBC: “Não vou a lado nenhum.”

Aquilo que Kwarteng não sabia é que, a quase seis mil quilómetros de distância, Liz Truss punha um plano em marcha para salvar o seu governo que implicava precisamente atirar o seu ministro das Finanças pela janela fora. A fazer fé no The Times, às 9h30 da manhã de sexta-feira (hora de Londres), enquanto Kwarteng provavelmente ainda dormia, Truss já estava a telefonar a Jeremy Hunt, apoiante do seu adversário na corrida à liderança, Rishi Sunak, — e economicamente muito mais centrista do que Truss —, para o convidar para a pasta das Finanças. Hunt pediu tempo para pensar e acabou por aceitar. Depois, apanhou o comboio de regresso a Londres a partir da Bélgica, onde estava de férias com a mulher.

Liz Truss appoints Jeremy Hunt as chancellor after sacking Kwasi Kwarteng

Jeremy Hunt, antigo apoiante de Sunak, é o novo ministro das Finanças

Anadolu Agency via Getty Images

De seguida, a primeira-ministra britânica deu ordem a Kwarteng para regressar de urgência a Londres e convocou uma conferência de imprensa de urgência para depois do almoço. Os jornais britânicos começaram então a avançar a notícia: o ministro das Finanças ia ser despedido e Liz Truss ia provavelmente anunciar um recuo estrondoso na sua política económica. Os jornalistas começaram a seguir freneticamente o rumo do voo 292 da British Airways, que trazia o ministro de volta a casa. Oficialmente, Kwarteng ainda não sabia de nada.

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A situação já era tensa ainda antes desta sexta-feira. A Economist não tinha poupado nas palavras no início da semana, decretando a morte política de Liz Truss: “Será lembrada como a primeira-ministra cujo controlo do poder foi o mais curto de sempre na História política do Reino Unido. A senhora Truss entrou em Downing Street a 6 de setembro. Fez explodir o próprio governo com um pacote de de descidas de impostos e garantias no preço da energia sem financiamento a 23 de setembro. Retirem-se os dez dias de luto pela morte da Rainha e ela só esteve em controlo durante sete dias. Esse é o prazo de validade de uma alface.

O soundbyte pegou. O jornal Daily Star rapidamente criou um live stream onde colocou uma foto de Truss ao lado de uma alface e onde é possível acompanhar em direto qual durará mais. O que os media britânicos não imaginavam é que, depois desta sexta-feira, o prazo de validade de Truss se poderia encurtar ainda mais.

A conferência de imprensa de oito minutos, quatro perguntas e nenhum pedido de desculpas

Chegado a Londres, Kwarteng seguiu direto para o Número 10 de Downing Street para se encontrar com Liz Truss e ouvir de viva voz as razões para a sua demissão. De seguida, publicou a sua carta de demissão, onde, apesar de deixar palavras calorosas para a primeira-ministra, sublinhou que estava a tentar aplicar a “visão” de Truss. Esta apressou-se a publicar uma carta de resposta onde reconhecia que ambos partilham “da mesma convicção firme de apostar no crescimento”.

Conservative Party Conference - Day One

Kwasi Kwarteng era aliado político próximo de longa data de Liz Truss, mas foi demitido

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Mas palavras leva-as o vento. Pouco depois, a primeira-ministra entrava numa sala cheia de jornalistas para uma conferência de imprensa que durou menos de oito minutos e que ditaria a total inversão da política económica que sempre defendeu ao longo da campanha para a eleição de líder dos conservadores: para além de reformular a equipa das Finanças e trazer agora vozes mais centristas, Truss decidiu manter o aumento de impostos decidido por Rishi Sunak no governo de Boris Johnson de 19% para 25% para as empresas. “Partes do nosso mini-Orçamento foram mais longe e mais rápido do que aquilo que os mercados esperavam”, foi o único mea culpa que deixou.

Respondeu a apenas quatro perguntas de jornalistas, revelando o desconforto com a situação que o seu rosto não denotava. “Não vai pedir desculpa ao seu partido?”, foi a última, deixada por Robert Peston da ITV. Truss disse que não e abandonou a sala, perante os gritos de “Primeira-ministra! Primeira-ministra!” de uma série de jornalistas exaltados que esperavam mais explicações.

“Ela é mais impopular do que Boris Johnson durante o pior período da sua liderança, em meados de janeiro deste ano, quando o escândalo do Partygate estava no auge.”
John Curtice, cientista político especialista em sondagens

Implodia naquele preciso momento a imagem cuidadosamente construída pela sua equipa ao longo dos meses de campanha. Afinal, Truss não é a liberal implacável que se recusa a aumentar impostos. Também não é a mulher que, inspirada em Margaret Thatcher, está pronta a revolucionar o sistema económico do país, com a ajuda do braço-direito Kwasi Kwarteng, com quem partilhou anos de descontentamento nos Comuns pela situação atual. Afinal, Truss cede nas suas ideias e sacrifica aliados. O importante, como a própria explicou, é manter-se para cumprir a “missão” — muito embora já ninguém entenda exatamente que missão é essa.

Tudo isto acontece num momento em que as sondagens a pintam como uma das primeiras-ministras mais impopulares de sempre, dentro e fora do partido. 63% dos eleitores do Partido Conservador consideram agora que a nomeação de Truss foi um erro. A nível nacional, a oposição do Partido Trabalhista já reúne 51% das intenções de voto, contra apenas 23% para os tories. 42% acham que o líder do Labour, Keir Starmer, seria o melhor primeiro-ministro entre todos os líderes partidários; Truss não vai além dos 13%.

“Ela é mais impopular do que Boris Johnson durante o pior período da sua liderança, em meados de janeiro deste ano, quando o escândalo do Partygate estava no auge”, ilustrou à BBC John Curtice, histórico cientista político perito em sondagens. “Ela está no mesmo nível de popularidade que John Major tinha umas semanas depois da Quarta-Feira Negra de setembro de 1992”, quando os mercados castigaram forte e feio aquele governo conservador. Os trabalhistas conseguiram uma vitória estrondosa nas eleições seguintes, em 1997, com Tony Blair.

Sunak And Truss Face Off In Final Tory Leadership Hustings

As sondagens mostram que Truss tem um nível de popularidade muito baixo, a menos de dois meses de ter chegado à liderança do governo

Getty Images

Temendo uma travessia no deserto como essa — os conservadores só regressaram ao poder 13 anos mais tarde, com David Cameron —, o Partido Conservador já se agitava. Na quarta-feira, Liz Truss foi à reunião interna com a sua bancada parlamentar e os relatos mostram que foi um desastre. “Pelo menos o Boris falava connosco como se fosse uma mulher traída, a dizer para nos recordarmos dos bons velhos tempos. Para ela é mais difícil, porque não houve bons tempos”, ilustrou um deputado ao Telegraph. “Depois daquela reunião, não aposto sequer dois tostões em como ela sobrevive”, disse outro.

Ao longo da semana, o clima de desconforto adensava-se. Truss continuava a tentar agradar aos deputados conservadores, marcando encontros com eles para explicar a sua política. Na quinta-feira, organizou um almoço com alguns, mas o resultado não foi positivo. A revista Spectator revela que a maioria não quis tirar fotografias com ela: “Um colega saiu literalmente a correr da reunião por estar tão envergonhado e não querer ser captado pela câmara”, contou um dos presentes.

Deputados conservadores desenham plano para trazer Sunak de volta. “Hienas”, acusam outros

Depois desta sexta-feira, em que Truss demitiu Kwasi Kwarteng e quebrou uma promessa eleitoral, o clima tornou-se ainda mais febril entre as fileiras dos tories. À noite, um grupo de deputados do partido juntou-se num dos gabinetes do Parlamento. Encomendaram caril para jantar e, entre uma garfada e outra, começaram a planear o afastamento da primeira-ministra já a partir da próxima segunda-feira, conta o The Telegraph.

“A malta do Rishi, a malta da Penny e os apoiantes de Truss com bom-senso que percebem que ela é um desastre precisam de se sentar e decidir quem deve ser o candidato da unidade.”
Deputado conservador ao The Times

A defenestração de Truss, contudo, é tudo menos fácil. Para além do embaraço de substituir uma líder que esteve menos de dois meses no cargo, o próprio processo de substituição é complexo, devido a uma regra instituída no partido de conceder um período de “estado de graça” de um ano a cada novo líder. Muitos deputados conservadores, porém, estão prontos a ignorar essa indicação e já enviaram as suas cartas a pedir uma moção de censura interna ao Comité 1922, órgão responsável pela organização do Partido. As regras internas preveem que o período de “estado de graça” possa ser levantado caso haja uma “vaga de fundo” a favor da destituição, como explica a New Statesman, que cita fontes do Comité a preverem que tal possa acontecer mais perto do Natal.

Só que alguns não querem esperar. Na sexta-feira, o The Times revelou o plano que está a ser gizado por “20 ou 30” deputados: irem apenas dois candidatos a votos para substituir Truss, com um a desistir à última hora, para a campanha não se arrastar. E até já há ideias sobre quem podem ser esses dois candidatos. São eles Rishi Sunak, derrotado por Truss na última campanha, e Penny Mordaunt, que venceu a votação entre os deputados, mas não convenceu os militantes fora do Parlamento. “A malta do Rishi, a malta da Penny e os apoiantes de Truss com bom-senso que percebem que ela é um desastre precisam de se sentar e decidir quem deve ser o candidato da unidade”, explicou um dos conspiradores ao jornal. “Ou é o Rishi como primeiro-ministro e a Penny como vice e ministra dos Negócios Estrangeiros, ou a Penny como primeira-ministra e o Rishi como ministro das Finanças.”

O clima de divisão dentro do Partido Conservador, porém, é notório. Num grupo de WhatsApp de deputados, cujo conteúdo foi vertido para um editor da Sky News, o deputado Crispin Blunt defendeu a solução Sunak-Mordaunt, mas foi recebido com acidez pela colega Nadine Dorries: “Adoro-te, Crispin, mas se achas mesmo que podemos impor outro líder, sem uma eleição nacional, e que os media e as pessoas iam aceitar isso, precisas de te ir deitar.” Ao Telegraph, o deputado veterano Christopher Chope lamentou o frenesim dos colegas: “Se é assim que os meus colegas se querem comportar, não posso travá-los, mas sinceramente acho que parecem um bando de hienas.”

The Chancellor Of The Exchequer Delivers The 2021 UK Budget

Rishi Sunak é um dos nomes falados pelos deputados conservadores para substituir a primeira-ministra

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Divididos sobre como avançar, os conservadores passarão certamente todo o fim de semana a sussurrar ao telefone e a conspirar em reuniões privadas. Em público, tentarão estancar a pressão da oposição, que pede em coro eleições antecipadas. Consigam ou não forçar a demissão de Liz Truss agora, poucos acreditam que ela irá durar até às eleições de 2024. “Sinto que é game over, confessou um dos apoiantes da primeira-ministra ao The Guardian. Truss até pode continuar no cargo, seja até 31 de outubro, quando o ministro das Finanças apresentar nova proposta económica, até ao Natal ou até às próximas eleições. Mas, dentro e fora do Partido Conservador, consolidou-se a ideia de que já não tem autoridade real e de que o seu executivo não passa de uma espécie de governo provisório.

“Até tenho pena dela”, comentou por estes dias um dos conspiradores com o Telegraph. “Todos nós já nos candidatámos a um trabalho e quando lá chegámos percebemos que não éramos capazes.” Liz Truss até pode vir a ter um prazo de validade maior do que o de uma alface, mas falta-lhe provar aos colegas e ao país que também tem mais talento político do que uma.

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