Na última quarta-feira, no Ministério das Infraestruturas, deu-se o início de (mais) um furacão no caso TAP. O adjunto do ministro foi exonerado e saiu aos tiros com João Galamba, que acusou de querer mentir à comissão parlamentar de inquérito sobre a TAP. O ministro veio desmentir e está aberto mais um sub-episódio que acrescenta dúvidas e contradições ao caso mais bicudo do tempo desta governação socialista. João Galamba não se demite, mas passou a estar ainda mais debaixo de fogo intenso.

Na oposição, o PSD já pede a sua cabeça e o Bloco de Esquerda quer explicações do ministro sobre um caso que “é demasiado grave para se deixar que passe como a espuma dos dias”. O Observador cruzou todas as informações divulgadas nas últimas intensas horas e que trouxeram novidades sobre a intervenção do ministro das Infraestruturas na polémica reunião preparatória da então CEO da TAP, antes desta ser ouvida no Parlamento sobre o caso Alexandra Reis.

Galamba participou na preparação da 1ª audição parlamentar da CEO da TAP

Deste confronto entre João Galamba e o seu adjunto no gabinete das Infraestruturas surgiu uma informação até aqui desconhecida. Além da polémica reunião preparatória da audição da CEO da TAP, a 17 de janeiro, existiu uma outra reunião para preparar esse mesmo encontro, um dia antes, e incluiu o ministro João Galamba. Esta informação foi avançada por Frederico Pinheiro, na nota que enviou à comunicação social a relatar a sua versão dos factos, e não foi desmentida por Galamba — que fez uma nota a desmentir algumas informações do seu ex-adjunto durante a tarde desta sexta-feira, mas não esta.

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Nesse primeiro encontro estiveram presentes, segundo o ex-adjunto, João Galamba, a então CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, Frederico Pinheiro, adjunto do Ministro, e Manuela Simões, diretora do departamento jurídico da TAP. “A reunião teve como objetivo articular com a TAP a gestão da informação a ser efetuada pela CEO na audição parlamentar agendada para essa semana, dia 18 de janeiro”, diz agora Frederico Pinheiro.

Galamba tinha dito, em comunicado a 6 de abril quando se soube da existência da polémica reunião preparatória, que não tinha estado nessa reunião com o PS, nomeadamente com o deputado socialista Carlos Pereira (o único da bancada do PS presente). Sabe-se agora que o ministro esteve na reunião que antecedeu essa, ou seja, acabou por participar na preparação da audição parlamentar de Christine Ourmières-Widener.

De recordar que tanto o Governo como o PS têm desvalorizado, perante as críticas da oposição, a existência destas reuniões preparatórias que descrevem como “comuns” na preparação de audições parlamentares tanto de membros do Governo como de entidades externas.

Como é que Christine soube da reunião com o PS? Foi Galamba

Na audição parlamentar em que se soube da existência da famosa reunião preparatória com deputados do PS, a 17 de janeiro, a então CEO da TAP disse que foi o Ministério das Infraestruturas que recomendou que estivesse presente na mesma. A versão do ministro foi diferente e expressa num comunicado: Christine teria estado porque manifestou “interesse em participar na reunião com o grupo parlamentar do PS”.

No comunicado que fez sobre esta polémica reunião, o Ministério disse apenas que o ministro “não se opôs à participação da TAP na reunião, agendada pela Área Governativa dos Assuntos Parlamentares”. Ficou sempre sem resposta a pergunta sobre como a CEO teria sabido da existência desta reunião.

A SIC revelou, esta quinta-feira, uma troca de mensagens entre Frederico Pinheiro e Galamba onde o primeiro pergunta ao ministro: “A TAP quer participar na reunião de amanhã com o grupo parlamentar do PS [GPPS], pode ser?”. A resposta do ministro: “Pode”. Galamba autorizou, assim, a presença da então CEO da TAP numa reunião preparatória da qual tentou descolar-se no comunicado que fez a 6 de abril, quando empurrou a responsabilidade pela presença de Christine da reunião para a própria.

O envolvimento de Galamba no polémico encontro não ficou, no entanto, por aqui. Até agora, não existia informação sobre como é que a CEO da TAP tinha tido conhecimento da existência dessa reunião de 17 de janeiro com deputados do PS. Frederico Pinheiro diz quem foi: “O Ministro das Infraestruturas (…) reforçou que tinha sido o próprio, a 16 de janeiro, a revelar a Christine Ourmières-Widener a existência de uma reunião preparatória entre o Ministério das Infraestruturas e o GPPS, a realizar a 17 de janeiro”. Mais uma vez:  Galamba já falou depois deste comunicado, desmentindo alguns dados numa curta nota, mas não este.

Houve alguma combinação de perguntas com a CEO? Sim

Neste ponto, o Ministério das Infraestruturas remeteu, no comunicado do início deste mês, para o que Christine Ourmières-Widener tinha dito na audição parlamentar do dia 18 de janeiro: que na reunião do dia anterior “em nenhum momento sentiu qualquer tentativa de condicionamento ou instrumentalização”. Na audição parlamentar, a CEO da TAP disse: “Não me lembro de terem sido combinadas perguntas. Penso que a ideia era só fazer perguntas. Então, fizeram-me perguntas sobre o processo e eu respondi.” A fórmula usada na resposa não permite pôr de parte a hipótese de uma tentativa de combinação.

Esta quinta-feira, a SIC divulgou as perguntas que o deputado socialista Carlos Pereira iria fazer à CEO da TAP — que entretanto abandonou a comissão de inquérito na sequência desta polémica — e também as indicações dadas para as respostas de Christine Ourmières-Widener. Exemplo de uma delas: “Sobre razões da saída de Alexandra Reis: há divergências sobre a implementação do plano de reestruturação. Tem de haver um alinhamento de posições. Não há nada pessoal, isso é chocante até pensarem isso”.

Estas informações constavam das notas reunidas pelo adjunto Frederico Pinheiro, que tinha estado nessa reunião onde garante que ficou também “claro” que nas reuniões com o PS “tinham sido articuladas perguntas a serem efetuadas pelo GPPS e tinham sido referidas as respostas e a estratégia comunicacional da CEO da TAP”.

Galamba tentou omitir informação ao Parlamento? Versões são contraditórias

Depois da audição parlamentar de Christine e das revelações que tinham sido feitas nesse dia (18 de janeiro), incluindo a reunião discreta com deputados do PS, o gabinete de Galamba reuniu-se para analisar os estragos e trabalhar numa reação. Segundo o comunicado de Frederico Pinheiro, nessa reunião com o ministro, o adjunto disse a Galamba que tinha “tomado notas da reunião, que registou no computador. Resumiam o que tinha sido abordado em ambas as reuniões”.

O ex-adjunto diz que “ficou indicado que, em caso de requerimento pela Comissão Parlamentar de Inquérito, as notas não seriam partilhadas por serem um documento informal”.

Adjunto exonerado põe Galamba em xeque acusando ministro de querer mentir à comissão

De acordo com mensagens trocadas entre Galamba e Pinheiro — também divulgadas pelas SIC — o ministro mostrou-se irritado por saber tardiamente da existência de notas sobre a reunião discreta. “Frederico, parece que agora há notas da reunião que quando reunimos não tinhas. Manda as notas para mim e para a Cátia com a máxima urgência sff. Obrigada”, consta numa mensagem enviada por alguém do gabinete ao então adjunto. Outra mensagem, posterior, esta de Galamba, visivelmente irritado: “Como é que tu te lembras que tens notas um mês depois da reunião em que a Eugénia pediu tudo o que havia sobre a reunião com o grupo parlamentar?!?!? E por causa disso tivemos de pedir prorrogação de prazo para envio de documentos.”

Nada é dito, nesta notícia, sobre eventuais respostas do adjunto a estas mensagens do ministro, nem está referida a data das mesmas. No comunicado, tal como já foi referido, Frederico Pinheiro garante ter informado o ministro da existência destas notas no dia 18 de janeiro, dia seguinte à audição parlamentar da então CEO da TAP. O gabinete de Galamba nada diz, oficialmente, sobre o assunto. 

No seu comunicado, o ex-adjunto que saiu em rutura com o ministro garante ainda que, mais recentemente, a 24 de abril, foi informado por uma técnica do gabinete que iam responder à comissão parlamentar de inquérito com envio de documentação pedida e que iam dizer “que não existiam notas da reunião”. O comunicado afirma que Frederico Pinheiro contestou essa posição e que avisou que caso, mais tarde, fosse chamado ao Parlamento “seria obrigado a contradizer a informação que estava naquela resposta”. O mesmo foi debatido com o ministro que, segundo relata, “teve uma reação irada”. Galamba estava fora do país, numa viagem de trabalho a Singapura da qual só regressou no dia 26 de abril ao final do dia.

Na nota enviada esta sexta-feira à comunicação social, Galamba “nega categoricamente qualquer acusação de que, por qualquer forma, tenha procurado condicionar ou omitir informação prestada à comissão parlamentar de inquérito da TAP”. E contesta a versão de Frederico Pinheiro, garantindo que o adjunto negou “repetidamente a existência de notas” que eram pedidas pelo Parlamento e que isso “poderia ter levado a uma resposta errada à comissão parlamentar de inquérito por parte do Gabinete do Ministério das Infraestruturas”.

O ministro não só contraria a versão como argumenta que nunca teve intenção de mentir à Assembleia da República. Em síntese: o adjunto diz que o ministro queria mentir à comissão de inquérito, omitindo as notas; o ministro diz que foi o adjunto que negou a existência das notas e que, com isso, colocaria o Ministério em risco de mentir ao Parlamento.

Porque foi demitido o adjunto? Galamba justifica com omissão de notas

A 25 de abril, Frederico Pinheiro diz que enviou as notas tiradas nas reuniões de 16 e de 17 de janeiro ao ministro, sugerindo a sua divulgação, e no dia seguinte foi demitido, tendo reagido com agressões a outros membros do gabinete do ministro das Infraestruturas. João Galamba justificou a demissão do seu adjunto com “comportamentos incompatíveis com os deveres e responsabilidades inerentes ao exercício das funções num gabinete ministerial”.

Na nota que o seu gabinete emitiu depois desta primeira justificação mais vaga, João Galamba ligou a decisão ao episódio relativo às notas, acusando o adjunto de ter omitido as notas da reunião discreta “repetidamente” — as mesmas que o adjunto sai a garantir que queria revelar contra a vontade do ministro.

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